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ISSN 1514-3465

 

“Cultura do queimado e do futebol” nas aulas 

de Educação Física: análise de uma experiência

“Culture of Dodgeball and Soccer” in Physical Education Classes: an Analysis of an Experience

"Cultura del quemado y del fútbol" en las clases de Educación Física: análisis de una experiencia

 

Joana Helena Santos Rodrigues*

joana.helena.rodrigues@hotmail.com

Letícia Agripina Batista Santos**

leticia.labsle@gmail.com

Beatriz Barreto e Silva***

beatrizbarreto08@gmail.com

Cristiano Mezzaroba****

cristiano_mezzaroba@yahoo.com.br

 

*Graduanda do curso de Licenciatura em Educação Física

pela Universidade Federal de Sergipe

Membro do Grupo de Estudos e Pesquisas Formação

e Atuação de Educadores – Interação

da Universidade Federal de Sergipe. Bolsista PIBIC

**Graduanda do curso de Licenciatura em Educação Física

pela Universidade Federal de Sergipe

Membro do Grupo de Estudos e Pesquisas História, Sociedade e Educação

no Estado de Sergipe – HISTEDBr, da Universidade Federal de Sergipe

Bolsista de Iniciação Científica da CNPq

***Graduanda do curso de Licenciatura em Educação Física

pela Universidade Federal de Sergipe

Membro do Grupo de Estudos e Pesquisas Sociedade, Cultura

e Educação Física - GEPESCEF, da Universidade Federal de Sergipe

Bolsista de Iniciação Científica (COPES/UFS/CNPq)

****Professor do Departamento de Educação Física e do Programa de Pós-Graduação

em Educação da Universidade Federal de Sergipe

Licenciado em Educação Física e Ciências Sociais (ambos pela UFSC)

com Mestrado em Educação Física (UFSC) e Doutorado em Educação (UFSC)

Coordenador do GEPESCEF/UFS – Grupo de Estudos e Pesquisas

Sociedade, Cultura e Educação Física

Pesquisador no Laboratório de Pesquisas Sociológicas Pierre Bourdieu (LAPSB/UFSC)

e no Núcleo de Estudos e Pesquisas Educação e Sociedade Contemporânea (UFSC/CNPq)

(Brasil)

 

Recepção: 04/09/2020 - Aceitação: 30/12/2020

1ª Revisão: 21/11/2020 - 2ª Revisão: 08/12/2020

 

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Citação sugerida: Rodrigues, J.H.S., Santos, L.A.B., Silva, B.B., e Mezzaroba, C. (2021). “Cultura do queimado e do futebol” nas aulas de Educação Física: análise de uma experiência. Lecturas: Educación Física y Deportes, 25(273), 30-44. https://doi.org/10.46642/efd.v25i273.2576

 

Resumo

    O presente artigo tem a intenção de apresentar uma experiência de observação nas aulas de Educação Física (EF), ocorrida numa escola de rede pública estadual localizada na cidade de São Cristóvão (Sergipe, Brasil), procurando identificar conteúdos hegemônicos, de modo que se pôde chegar àquilo que denominamos como “Cultura do queimado e do futebol”, aqui entendidas como práticas hegemônicas observadas nas aulas de EF, analisando-as em relação às suas limitações e potencialidades quanto às experiências da cultura corporal de movimento nas aulas deste componente curricular para os anos finais do ensino fundamental. Analisamos criticamente esses dois conteúdos e identificamos como práticas escolares podem restringir as possibilidades de acesso, conhecimento e experiência prática no contexto formativo. A presente pesquisa demonstrou que apesar de perceber um movimento de ruptura com uma perspectiva de hegemonia esportiva, ainda é possível verificar a existência de aulas de EF que se limitam a determinadas práticas corporais, não oportunizando ao aluno a experimentação das diversas possibilidades da cultura corporal de movimento. Diante disso, como acadêmicas(os) em formação, temos o desafio de promovermos mudanças significativas nesta realidade que, por ser um construto cultural, é passível de modificações e ressignificações.

    Unitermos: Queimado. Futebol. Cultura. Conteúdo. Educação Física.

 

Abstract

    This article intends to present an observation experience of Physical Education (PE) classes, which took place in a state public school located in the city of São Cristóvão (Sergipe, Brazil), seeking to identify hegemonic contents, so that it was possible to arrive at what we call “Culture of the dodgeball and soccer”, in this article understood as hegemonic practices observed in Physical Education (PE) classes, analyzing them in relation to their limitations and potentialities concerning the experiences of movement in the classes of this curricular component for the final years of elementary school. We analyze in a critical way these two contents and identify how school practices can restrict the possibilities of access, knowledge and practical experience in the teacher training context. The present research demonstrated that despite perceiving a rupture movement with a perspective of sports hegemony, it is still possible to verify the existence of PE classes that are limited to certain body practices, not providing the students with the opportunity to experiment with the various possibilities of movement. Therefore, as undergraduates in the teaching formation process, we have the challenge of promoting significant changes in this reality, which, being a cultural construct, is subject to modifications and reframing.

    Keywords: Dodgeball. Soccer. Culture. Content. Physical Education.

 

Resumen

    Este artículo pretende presentar una experiencia de observación en las clases de Educación Física (EF), llevada a cabo en una escuela pública estatal ubicada en la ciudad de São Cristóvão (Sergipe, Brasil), buscando identificar contenidos hegemónicos, para que fuera posible llegar en lo que llamamos “Cultura del quemado y el fútbol”, aquí entendido como prácticas hegemónicas observadas en las clases de EF, analizándolas en relación a sus limitaciones y potencialidades respecto a las vivencias de la cultura corporal del movimiento en las clases de este componente curricular para los estudiantes de los últimos años de la escuela primaria. Analizamos críticamente estos dos contenidos e identificamos cómo las prácticas escolares pueden restringir las posibilidades de acceso, conocimiento y experiencia práctica en el contexto formativo. La presente investigación demostró que a pesar de percibir un movimiento de ruptura con una perspectiva de hegemonía deportiva, aún es posible verificar la existencia de clases de EF que se limitan a determinadas prácticas corporales, no permitiendo al alumno experimentar con las diversas posibilidades de la cultura corporal de movimiento. Por lo tanto, como estudiantes en formación, enfrentamos el desafío de promover cambios significativos en esta realidad, que, como construcción cultural, está sujeta a modificaciones y replanteos.

    Palabras clave: Quemado. Fútbol. Cultura. Contenido. Educación Física.

 

Lecturas: Educación Física y Deportes, Vol. 25, Núm. 273, Feb. (2021)


 

Introdução 

 

    Este artigo é derivado de um trabalho proposto na disciplina de Educação Física Escolar II, realizada no curso de Licenciatura em Educação Física da Universidade Federal de Sergipe, o qual foi desenvolvido através de observações numa escola de rede pública estadual localizada na cidade de São Cristóvão, Sergipe. O objetivo da atividade foi adquirir experiências formativas do contexto escolar e das aulas de Educação Física (EF) do Ensino Fundamental maior. Antecipadamente, foram elaborados protocolos de observação, para que fossem utilizados durante as visitas na escola e nas aulas de EF, a fim de direcionar o ato observacional frente ao contexto ao qual os sujeitos envolvidos no processo de formação estavam adentrando. Ao final das observações, os trabalhos foram organizados em forma de apresentação de seminários para a turma envolvida na experiência.

 

    Esse trabalho é de grande valia para quem cursa Licenciatura em EF, já que envolve a aproximação empírica entre a escola e a universidade, proporcionando aos acadêmicos a possibilidade de relacionar as teorias e discussões do curso com a realidade escolar e exercitar a docência, analisando e refletindo sobre o contexto escolar vivenciado, identificando os conflitos existentes e incentivando os acadêmicos e acadêmicas a problematizá-los. Há também uma relevância social, pois estimula a provocação e o questionamento quanto a como os conteúdos podem ampliar ou limitar as práticas corporais de crianças e jovens desde cedo, convidando sujeitos em formação a refletir sobre o que é relevante para a formação dos escolares.

 

    Tal experiência acadêmica acabou se tornando uma dimensão maior pela potência da observação, o que permitiu identificar uma certa hegemonia do queimado1 e do futebol2 nas aulas observadas.

 

    Assim, denominou-se como “cultura do queimado e do futebol” o que foi possível constar no período de observação das aulas de EF, e no texto que segue, tais constatações refletem-se quanto às possíveis limitações e implicações dessas práticas hegemônicas na formação do professor de EF, além das implicações na bagagem corporal e de conhecimento dos alunos e alunas participantes, e, claro, ao próprio papel da EF escolar.

 

    Dessa forma, teve-se como objetivo geral analisar essa experiência de observação do contexto escolar e das aulas de EF, identificando conteúdos hegemônicos e analisando-os em relação às suas limitações e potencialidades quanto às experiências da cultura corporal de movimento na EF escolar para anos finais do ensino fundamental.

 

Métodos 

 

    A presente pesquisa é de natureza qualitativa, caracterizada pela subjetividade do objeto de estudo, uma vez que, para Minayo (2001, p. 22), “[...] a abordagem qualitativa aprofunda-se no mundo dos significados das ações e relações humanas, um lado não perceptível e não captável em equações, médias e estatísticas.” A investigação contou com uma abordagem descritiva, já que, de acordo com Gil (2008), ela tem como principal objetivo descrever o objeto de estudo, podendo ser os fenômenos ou população, que nesse caso, foi a “cultura do futebol e queimado”.

 

    Além disso, configurou-se como uma pesquisa do tipo observacional, isto é, pautou-se em várias observações a partir de um roteiro elaborado anteriormente, de maneira coletiva, na disciplina do curso. Esse roteiro foi organizado em dois grandes blocos (um bloco com questões mais gerais3,sendo que o segundo bloco envolvia questões mais específicas4 do componente curricular), de modo que os observadores permaneceram alheios à comunidade escolar, ou seja, não se configurou como uma pesquisa-ação, tampouco como pesquisa participante.

 

    Para o trabalho da disciplina buscou-se uma escola que fosse acessível ao grupo de acadêmicos, facilitando a mobilidade. Assim, concordou-se quanto à possibilidade da observação ser realizada em uma escola próxima ao campus da Universidade Federal de Sergipe.

 

    Sempre que possível, os responsáveis pela observação dirigiam-se à escola com seus quatro5 integrantes, a não ser que algum dos integrantes tivesse um imprevisto, indo os restantes. A permanência no contexto escolar era das 07 às 11 horas. Nesse período, observaram a entrada e a saída dos alunos, as aulas de EF e o intervalo. Além disso, cada integrante anotava suas observações, embasado no roteiro organizado previamente, a partir do que foi visto, e construíram diários de campo. Ao final de todas as observações, utilizaram-se os diários de campo, junto à transcrição de uma entrevista realizada com a professora de EF e realizaram uma análise crítica referente ao que foi observado na sua totalidade. A partir disso, elaboraram um único arquivo de texto no Microsoft Word com 57 (cinquenta e sete) páginas, as quais serviram como dados do campo de pesquisa e estão presentes, de maneira resumida e analisada neste texto, que se deteve em abordar quanto à “cultura do queimado e do futebol”.

 

Resultados e discussões 

 

    As análises feitas neste tópico tem como base as observações realizadas na escola e durante as aulas de EF, além dos referenciais teóricos pautados em Jocimar Daolio (2006), Suraya Darido (2001), Fernando González, e Paulo Fensterseifer (2009), com os quais foram discutidos sobre os aspectos culturais nas aulas de EF, pontuando a importância da adoção de práticas pedagógicas que contribuam para a construção de uma aprendizagem significativa e relevante, bem como, a reflexão sobre os problemas que ainda persistem na área da EF escolar.

 

    A princípio, destacam-se que diversos aspectos presentes na observação contribuíram para a identificação do fenômeno aqui estudado. O primeiro que se destaca diz respeito ao fato de que em todas as aulas de EF observadas, do 7° ao 9° ano, notou-se que não houve um planejamento sistematizado em relação às aulas e que a professora aplicou a mesma atividade para todas as turmas, ou seja, o jogo do queimado6 e o futebol, sem que houvesse alteração nos níveis de dificuldade/progressão. Logo, percebeu-se que as aulas de EF da escola observada, restringiram-se a essas duas práticas, ambas adaptadas ao espaço disponível, já que não tinha uma quadra adequada, as quais se repetiam durante o intervalo dos alunos e persistiram no evento do “Interclasse”, evento competitivo que ocorreu na escola, em que só havia o queimado e o futebol como modalidades.

 

    Foi a partir desses aspectos observados que percebeu-se a existência da “cultura do queimado e do futebol” nas aulas de EF e que se perpetuam em outras atividades da escola. Vale destacar que essa constatação é resultado das observações realizadas entre outubro/novembro de 2019, logo, cabe menção ao cuidado quanto a afirmações generalistas no período temporal compreendido.

 

    Nessas visitas realizadas à escola, durante o período que ocorreram as observações, solicitou-se o acesso ao Projeto Político Pedagógico (PPP) da instituição7, afim de que se pudesse verificar as perspectivas educacionais pensadas pela escola e, com isso, fosse possível realizar um contraponto com o que foi observado. O PPP diz respeito às propostas pedagógicas de toda a escola, que deve ser confeccionado junto à comunidade escolar e que:

    [...] expressa o posicionamento político (as finalidades da Educação escolar para a sociedade e para a escola, a filosofia, o tipo de homem que queremos formar etc.) e o posicionamento pedagógico (estrutura curricular, sistema de avaliação, calendário escolar, objetivos educacionais geral, diretriz para a elaboração dos planos de ensino etc.,) de uma escola. (Scarpato, 2007, p.31)

    Acessou-se o PPP da escola com período de aplicação dos anos de 2009 e 2010, mas, segundo a professora de EF, ele estava sendo reformulado, pois teria de se adequar às novas normas do currículo de Sergipe. O objetivo geral da escola constava como “Desenvolver ações que promovam a integração entre a escola e a comunidade, buscando o desenvolvimento da cidadania e procurando criar condições para otimizar o aproveitamento dos espaços e recursos que possuímos”8.

 

    É importante, primeiramente, destacar-se a utilização do termo “cidadania” no objetivo geral da instituição. Considerando que um dos principais objetivos da escola é contribuir para o desenvolvimento da cidadania do aluno, é fundamental que todas as disciplinas escolares contribuam de alguma forma para atingir tal objetivo, inclusive a EF. Sendo assim, percebe-se que a forma com que as aulas de EF foram realizadas na escola, durante o período das observações, estava distante do objetivo pensado pela instituição, já que, se ela busca colaborar com a formação cidadã do aluno, o queimado e o futebol não deveriam ser apenas “praticados” por eles, mas questionados, tematizados e refletidos, de modo que valores sociais também fossem incorporados à realização dessas práticas corporais.

 

    Ademais, apesar da busca pelo desenvolvimento da cidadania, como constava no objetivo geral da escola, notou-se a ausência do termo “conhecimento”, que é um outro conceito importante, se não o principal, que define a função social da escola, pois, considerando que ela é o lócus do conhecimento sistematizado, as ações escolares devem estar a serviço dele para a manutenção da cidadania. Ou seja, a cidadania é construída a partir do conhecimento sobre o mundo que é mediado por diferentes áreas, sendo a escola a “instituição cujo papel consiste na socialização do saber sistematizado”. (Saviani, 2011, p.14)

 

    Para se entender a manifestação do queimado e do futebol nas aulas de EF, precisa-se, antes de tudo, que se compreenda o conceito do termo “cultura”. É importante frisar que, como existem várias concepções sobre o termo, partiu-se de uma concepção da antropologia social, segundo a perspectiva de Daolio (2004), para se definir o fenômeno aqui analisado.

 

    Em seu livro “Educação Física e o conceito de cultura”, Jocimar Daolio utilizou a visão antropológica de Clifford Geertz para conceitualizar a cultura e a sua relação com a EF. De acordo com Daolio (2004):

    “Para Geertz, a cultura é a própria condição de vida de todos os seres humanos. É produto das ações humanas, mas é também processo contínuo pelo qual as pessoas dão sentidos às suas ações. Constitui-se em processo singular e privado, mas é também plural e público. É universal, porque todos os humanos a produzem, mas é também local, uma vez que é a dinâmica específica de vida que significa o que o ser humano faz. A cultura ocorre na mediação dos indivíduos entre si, manipulando padrões de significados que fazem sentido num contexto específico.” (Daolio, 2004, p. 11)

    Dessa forma, pode-se compreender a cultura como tudo que é produzido pelo ser humano, material e não material, englobando o conjunto de comportamentos sociais comuns que definem códigos, regras e significados que pessoas de um mesmo grupo cultuam. Ou seja, a cultura é uma construção social e histórica humana em constante movimento.

 

    Partindo desse pressuposto, ao considerarmos o homem como um ser produtor de cultura, infere-se que as práticas corporais produzidas por ele também podem ser consideradas construções culturais, visto que elas determinam padrões sociais constituintes do indivíduo, pois toda prática corporal carrega consigo concepções e valores cultuados por uma sociedade. (Daolio, 2004)

 

    É diante dessa perspectiva que o estudo do movimento humano se insere na EF escolar, problematizando a tradicional preocupação direcionada somente às questões biológicas do corpo e refletindo e ampliando a discussão a partir da perspectiva sociocultural que esse campo de conhecimento pode contemplar, considerando a compreensão de que o movimento humano historicamente sistematizado, como prática social que representa uma cultura, possui significados que permitem compreender a respeito do desenvolvimento cultural da sociedade; sendo, portanto, passível de reflexões e decodificações, que decorre, principalmente, da vivência de cada sujeito com a sua prática. (Daolio, 2004)

 

    O texto “Entre o não mais e o ainda não: pensando saídas do não lugar da EF escolar II” de González, e Fensterseifer (2010) traz uma citação bastante esclarecedora a respeito da relação entre a perspectiva sociocultural com o papel da EF enquanto componente curricular:

    “[...] não apenas um constituinte do rol de disciplinas escolares, mas um elemento da organização curricular da escola que, em sua especificidade de conteúdos, traz uma seleção de conhecimentos que, organizados e sistematizados, devem proporcionar ao aluno uma reflexão acerca de uma dimensão da cultura e que, aliado a outros elementos dessa organização curricular, visa a contribuir com a formação cultural do aluno. (Souza Júnior, 2001 apud González, e Fensterseifer, 2010, p. 12)

    Segundo Bracht (1992, p. 15), a EF “[...] abrange as atividades pedagógicas, tendo como tema o movimento corporal e que toma lugar na instituição educacional”. Logo, ao compor a grade curricular escolar, a EF possui um conjunto sistematizado de conhecimentos que devem ser contextualizados, visando contribuir na formação integral do indivíduo. A Base Nacional Comum Curricular – BNCC (Brasil, 2018), divide esses conhecimentos em seis unidades temáticas: Lutas, Jogos e brincadeiras, Esportes, Dança, Esportes de aventura e Ginástica, sendo função da EF Escolar permitir o acesso, de forma sistematizada, a esses tipos de saberes culturais.

 

    No entanto, o que se vê muitas vezes são aulas de EF que contemplam alguns aspectos da cultura corporal de movimento e deixam de lado outros. Apesar do Movimento Renovador da EF brasileira, que ocorreu no decorrer dos anos de 1980 ter estimulado mudanças significativas na área, ainda é bastante comum se associarem as aulas de EF apenas às práticas esportivas e que tem o jogo de futebol como conteúdo predominante desse processo. (Basei, e Vieira, 2007).

 

    A espetacularização do futebol através da mídia influencia na força que esse esporte conquistou, principalmente após a década de 1970 com o desenvolvimento do fenômeno esportivo, dentro das aulas de EF. É comum se constatar alunos pedindo, insistentemente, ao professor(a), para praticarem esse esporte nas aulas, realizando gestos de comemoração de jogadores famosos ou até falando que querem ser atletas profissionais quando crescerem. Isso se configura como sendo a chamada “hegemonia esportiva”, já que a espetacularização do futebol pela sociedade contribui para que exista uma cultura desse esporte na escola, o que leva os alunos a acreditarem que aula de EF sem o futebol não é aula de EF. (Betti, 2002)

 

    Além disso, alguns jogos, por apresentarem um caráter lúdico e por representarem uma manifestação cultural, passam a compor boa parte do tipo de “prática” que se tem na EF escolar nos anos iniciais. Identificou-se no contexto observado que essa prática também é recorrente em aulas de EF dos anos finais, o que pode ser motivado pelo fato de que desde cedo o aluno é inserido nesse universo lúdico dos jogos. De acordo com Oliveira, Gomes, Moreira, e Coffani (2019):

    “[...] se valoriza a Educação Física na escola quando desenvolve práticas pedagógicas condizentes com o contexto cultural e social dos alunos. Assim, é possível confiar que as brincadeiras e os jogos, sendo práticas culturais corporais presentes desde os primórdios da humanidade, possibilitam a interação sociocultural dos alunos, facilitando o processo de ensino e aprendizagem devido às variadas possibilidades de trabalho pedagógico.” (Oliveira, Gomes, Moreira, e Coffani, 2019, p. 36)

    Outrossim, é comum o uso de jogos populares, a exemplo do queimado, como um jogo pré-desportivo, sendo utilizados pelo docente como ferramenta auxiliar para desenvolver outros conhecimentos específicos de algumas modalidades esportivas. Dessa forma, por ser um jogo simples, de fácil entendimento, que precisa de poucos materiais para realizá-lo e, como a maioria dos alunos já o conhecem, o professor recorre frequentemente ao queimado durante as aulas.

 

    A BNCC estabelece que uma das unidades temáticas que devem ser abordadas pela EF Escolar são os Jogos e brincadeiras que, de acordo com esse documento, são manifestações culturais que possuem múltiplos sentidos. Além do caráter lúdico, que proporciona para o praticante um sentimento de autorrealização e contentamento, os jogos permitem a interação social, fortalecendo o sentimento de pertencimento a um grupo e, consequentemente, contribui na construção da identidade cultural do indivíduo, promove o desenvolvimento de competências sociais como a autonomia, o agir coletivo, o desenvolvimento da noção de regras, a comunicação. etc. (Brasil, 2018)

 

    Vale destacar que, influenciado pelo contexto cultural do aluno, da escola, ou até mesmo do professor, assim como determinados esportes possuem um maior prestígio nas aulas, algumas práticas corporais são realizadas com maior frequência, construindo assim uma “cultura” de determinados conteúdos nas aulas de EF9. No contexto escolar observado, além de se perceber que o futebol era o conteúdo esportivo hegemônico, identificou-se que o queimado era o jogo predominante nas aulas. Desse modo, se Betti (2002) chamava a atenção da limitação das práticas de EF em relação ao esporte, presenciou-se, também, essa limitação nos jogos, principalmente através do queimado.

 

    Partindo dessa perspectiva, foi possível perceber, na observação realizada na escola em questão, que existe uma “cultura do futebol e do queimado” nas aulas de EF, logo que as aulas práticas, nos dias observados, limitaram-se apenas às práticas desses dois conteúdos, sendo eles tratados em todas as turmas observadas, sem que existisse uma distinção de conteúdos para os diferentes níveis de ensino e sem que houvesse um trato pedagógico com a sua realização, já que a professora entregava a bola para os alunos, deixava que eles praticassem o jogo (o “jogo livre”, como habitualmente se conhece) enquanto fazia a chamada da turma e executava a função de árbitra das partidas, não ocorrendo nenhum tipo de reflexão sobre a prática ou alguma mediação mais comunicativa em relação aos acontecimentos. Os alunos, por sua vez, ficavam responsáveis por separarem os times de acordo com as suas preferências (escolhiam por afinidade e habilidade no jogo) e quando ocorria algum conflito em relação às regras do jogo, consultavam a professora para validar ou não a situação do momento.

 

    Essa limitação ao jogo do queimado e do futebol não permite que os alunos tenham acesso ao leque de conhecimentos que a EF pode e deve oferecer, pois, tendo seu objeto de conhecimento entendido como a “Cultura Corporal de Movimento” (Betti, 2003; Bracht, 1999), o componente curricular EF tem o papel fundamental de possibilitar o acesso a essa cultura de maneira sistemática, ampla, diversa e crítica, dentro do ambiente escolar, não se limitando apenas à realização de alguns conteúdos ou levando em consideração apenas a prática pela prática. Esses dois autores consideram o movimento humano para além dos conhecimentos das ciências físicas e biológicas, perspectivando-o como uma forma do movimento corporal ser uma forma de comunicação com o mundo, a partir dos simbolismos do plano da cultura.

 

    A experiência aqui relatada demonstrou que, ainda que exista um movimento de ruptura com uma perspectiva técnica esportiva das aulas de EF, e que outras práticas corporais da cultura corporal de movimento estejam sendo inseridas no contexto escolar, a EF ainda se limita em contemplar determinadas “práticas”, em detrimento de outras, o que demonstra que, enquanto área, a EF escolar se caracteriza por aquilo que González, e Fensterseifer (2009) denominam como o “não mais” e o “ainda não”, ou seja, dificilmente visualizam-se as questões técnicas e mecânicas que caracterizavam as aulas de EF sendo realizadas, mas também ainda não se alcança uma legitimidade pedagógica enquanto campo de conhecimento, visto que, além de se perceber a existência de conteúdos culturais hegemônicos nas aulas, foi possível verificar uma não tematização deles.

 

    É importante frisar que, ainda que o futebol e o queimado sejam elementos da cultura corporal de movimento, com seus aspectos culturais e históricos, as aulas de EF não deveriam se reduzir à reprodução apenas dessas duas práticas corporais sem levar em consideração a necessidade de assimilação dos conteúdos, que o aluno deve fazer para que ele aprenda efetivamente. Isso significa que a fragilidade no processo de ensino-aprendizagem não está somente no conteúdo, mas sim em como ele é tratado pelo educador, ou seja, sua abordagem e contextualização:

    “Na prática concreta de aula, significa que o aluno deve aprender a jogar queimada, futebol de casais ou basquetebol, mas, juntamente com estes conhecimentos, deve aprender quais os benefícios de tais práticas, porque se pratica tais manifestações da cultura corporal de movimento hoje, quais as relações dessas atividades com a produção da mídia televisiva, imprensa, dentre outras. Dessa forma, mais do que ensinar a fazer, o objetivo é que os alunos e alunas obtenham uma contextualização das informações como também aprendam a se relacionar com os colegas, reconhecendo quais valores estão por trás de tais práticas.” (Darido et al., 2001, p. 21)

    Desse modo, não há problema algum em se trabalhar com o queimado ou futebol, práticas estas que foram executadas na escola observada, no entanto, faz-se necessário pensar em como ampliar esse conteúdo para que ele deixe de ser uma representação apenas da recreação e se torne relevante socialmente, para que, dessa forma, esse conteúdo possa contribuir efetivamente na constituição do indivíduo que se busca formar.

 

    Ainda que houvesse a prática do queimado sem a sistematização dos conteúdos, compreende-se que o jogo do queimado é o momento preferido pela maioria dos alunos e alunas, o que demonstra que o contexto cultural no qual a escola está inserida é um dos fatores, talvez o principal, para que esse jogo esteja tão presente nas aulas de EF. Quando a educadora foi questionada sobre o possível motivo da preferência dos alunos pelo jogo, ela respondeu da seguinte maneira:

    “[...] eles [os alunos] são muito ativos em si, todos eles. [...] A Educação Física é onde tem aquela fuga e nem todo professor de Educação Física aqui dentro da escola, ele trabalha saindo, porque não é obrigatório porque a gente não tem espaço. [...] E aí é onde há fuga, é onde eles vão respirar, onde eles vão interagir, onde vão trabalhar a sociabilização deles mesmos. Então por isso que eles pedem esse negócio e também pra sair de copiar, copiar, copiar. [...] É uma libertação, é por isso que é tão, tão querido, tão desejado, é uma maneira de... e tem muitos que querem sair só pra nada.” (Professora, 2019)

    A partir do depoimento da professora, percebe-se que a EF é a disciplina curricular preferida dos alunos. Para eles, o componente curricular EF representa o momento de liberdade e interação entre os colegas de turma. Porém, também se identifica na fala da professora alguns desafios presentes no contexto observado, como a compreensão de alunos, professores e da escola sobre o papel da EF escolar.

 

    Diante do que foi exposto na fala acima, pode-se inferir que a EF ainda não é reconhecida como um componente curricular, apesar da Lei de Diretrizes e Bases da Educação Brasileira – LDB (Brasil, 1996) reconhecê-la como tal, mas como um momento de descontração e recreação para os alunos. Esse não reconhecimento da EF como parte fundamental na formação dos educandos é também identificado pelo pouco investimento em espaços para as aulas e escassos materiais pedagógicos que, ainda que não conste no depoimento citado acima, foi observado pelos autores.

 

    Tais indícios comprovam a necessidade de redimensionar, na prática, a EF às mesmas concepções que são desenvolvidas para os demais componentes curriculares, de modo que os aspectos didáticos e a sistematização dos conteúdos legitimem sua colaboração na educação escolarizada. E esse redimensionamento demanda a participação ativa dos professores de EF, construindo coletivamente e organizando o Projeto Político Pedagógico da escola. Esse pode ser o primeiro passo para a desconstrução da concepção equivocada sobre a EF como atividade apendicular. (Melo, 2006)

 

    Entrando no campo das relações entre os alunos, pode-se apontar as situações de inclusão/exclusão como algo identificado pelos autores durante as observações na escola. A inclusão é entendida por Santos (2009) como qualquer manifestação em diferentes campos sociais que busca a superação da exclusão de pessoas, independentemente se essa exclusão é latente ou facilmente identificada. Incluir significa evitar que qualquer forma de exclusão seja posta, afastando as pessoas ou os grupos de pessoas de seus contextos.

 

    Durante as observações, pode-se constatar a manifestação da exclusão nos jogos do queimado e a partir das falas dos alunos dentro da sala de aula. A mais notada forma de exclusão foi a de gênero. As meninas eram tanto excluídas pelos meninos como também a maioria delas fazia questão de participar o mínimo possível das atividades. Os motivos para que as meninas não participem ou não queiram participar das práticas corporais podem ser diversos, e alguns deles remetem-se ao pensamento de como o corpo feminino vem sendo construído a partir da cultura, que acaba interferindo também na área da EF, marcada historicamente por um discurso reducionista ou limitante em relação ao corpo da mulher, no que diz respeito ao âmbito das práticas corporais. (Goellner, 2003)

 

    Tal fenômeno necessita de um olhar sensibilizado e aprofundado para compreender quais os motivos que podem ocasioná-lo. Pode-se exemplificar através de um acontecido durante o evento “Interclasse”, quando uma das meninas questionou a professora em relação aos meninos não a deixarem jogar, também informando que eles não passavam a bola, porém a professora acabou se distraindo e não pôde solucionar o problema, o que ocasionou a saída da aluna do jogo, evidenciando uma possível consequência da não problematização dos conteúdos nas aulas de EF, limitando a formação dos alunos e, em vez de colaborar com o rompimento de perspectivas estereotipadas de gênero, acaba contribuindo com o fortalecimento dessa visão reducionista em relação ao corpo feminino. (Santos, Lourenço, Silva, e Silva, 2007/2008)

 

    Jocimar Daolio (2006), especialista nas discussões sobre Cultura, Antropologia e EF escolar, aponta sobre os motivos para que as meninas sejam excluídas ou se sintam tentadas a não participarem das aulas de EF. Ele afirma que “[...] estamos diante de um fato social, pontuado por uma história cultural que delegou às meninas brasileiras a condição de ‘antas’ quando realizam atividades que exigem força, velocidade e destreza.” (Daolio, 2006, p. 74). Isso significa que numa esfera da representação dos corpos femininos, eles estão condicionados a serem considerados frágeis, fracos, delicados em relação ao corpo masculino e, por isso, são vistos como motivos de exclusão.

 

    Em conversa com uma aluna, quando questionada sobre sua opinião em relação à participação de meninos e meninas juntos no jogo do queimado, ela considerou o jogo como uma prática bastante atrativa, porém prefere que ele seja jogado separadamente, ou seja, meninas contra meninas e meninos contra meninos. Questionada sobre o porquê da preferência, ela informa que o motivo é: “Porque, primeiramente, os meninos jogam a bola forte e eu logo me barreio10” e é por isso que ela prefere que o jogo seja praticado somente por meninas. Percebe-se aqui uma relação de força física entre meninos e meninas em que os meninos, comumente considerados como os “mais fortes”, não aprenderam a ter uma atitude inclusiva dentro do jogo e as meninas tendem também a se excluir desse momento por se considerarem inábeis ou fracas, ideia culturalmente introjetada, desde cedo, via práticas diversas, como estas, nas aulas de EF.

 

    Em suma, a crítica que se faz aqui não está direcionada à realização do futebol e do queimado, mas em como esses conteúdos são trabalhados (sem mediação pedagógica ampla e adequada) dentro da instituição escolar observada. González, e Fraga (2012) afirmam que a EF, enquanto componente curricular, deve tematizar as diferentes manifestações da cultura corporal de movimento de forma progressiva e sistematizada, priorizando as finalidades escolares que a legitima como disciplina escolar.

 

    No entanto, nas aulas de EF observadas, foi possível perceber que não existia uma progressão dos conteúdos, visto que em todas as turmas em que se presenciaram as aulas o conteúdo foi o mesmo, também não existia uma sistematização de conhecimentos, já que o único conteúdo das aulas práticas sempre foi o queimado e o futebol e, por fim, não foi possível observar uma trato pedagógico e crítico com esse conteúdo, por isso que aqui há referência à “cultura do queimado e do futebol" como uma prática “cultural” que se naturalizou na EF escolar (e que em outras escolas com outros professores talvez essas “práticas” pudessem ser observadas sob outras formas, como meninos jogando futebol, meninas brincando de qualquer coisa, entre tantos exemplos comuns que são recorrentes) e, com isso, superficializa-se esse componente curricular que tem importante função social e pedagógica dentro do rol dos conhecimentos escolares.

 

Conclusões 

 

    A presente pesquisa, que foi resultado de uma experiência observacional do contexto escolar, foi iniciada como uma atividade de disciplina e, pela potência da observação realizada, acabou tomando uma dimensão maior, pois permitiu perceber a persistência da adoção de práticas hegemônicas no âmbito da EF escolar que, no caso desta experiência, constatou a presença de uma “cultura do queimado e do futebol” no contexto educacional observado. Vale reforçar que as considerações aqui apresentadas são derivadas do contexto específico e datado que foi observado, logo, não se podem realizar afirmações que generalizem a existência de tal fenômeno em outros contextos escolares que não foram analisados.

 

    Dessa forma, esse estudo teve como objetivo analisar como as aulas de EF ainda se limitam a determinadas práticas corporais e refletir sobre as implicações dessas limitações. Diante disso, identificou-se que o queimado e o futebol foram as duas práticas predominantes não só nas aulas de EF, como também durante o intervalo e no evento escolar.

 

    Fato esse que chamou atenção e que faz refletir sobre como ainda há muito a se discutir sobre o componente curricular EF, pois, apesar de haver um movimento de ruptura com uma perspectiva de hegemonia esportiva, ainda é possível se verificar a existência de aulas de EF que se limitam a determinadas práticas corporais superficializadas, não oportunizando ao aluno a experimentação das diversas possibilidades da cultura corporal de movimento, que deveriam ser proporcionadas por essa área do conhecimento, além de restringir o conteúdo à dimensão procedimental, preterindo as dimensões conceitual e atitudinal. (Darido, 2001)

 

    Na observação realizada, identificaram-se diversos aspectos característicos da área da EF escolar, que já vinham sendo discutidos nos debates realizados no interior da disciplina “Educação Física Escolar II” (Séries Finais do Ensino Fundamental), mas que, ao se colocar no papel de observador crítico frente a uma realidade, que até então os autores tinham parcamente explorado, permitiu-lhes perceber pontos que precisam ser discutidos, repensados e superados, no que concerne ao modo como esse componente curricular vem sendo abordado dentro do âmbito escolar.

 

    Em suma, é importante se pensar que, quando em formação, os acadêmicos e acadêmicas têm a responsabilidade e a capacidade de promover mudanças significativas nesta realidade que, por ser um construto cultural, é passível de modificações e ressignificações. Para isso, faz-se necessário, primeiramente, que se perceba a existência de limitações referentes a este componente curricular e a compreensão da necessidade de se buscar formas de superá-las. Diante disso, a experiência aqui relatada demonstrou que, como futuros docentes, apresenta-se o desafio de contribuir com a construção de uma EF mais humana e formativa, que colabore efetivamente na formação cidadã do aluno.

 

    Tal movimento se soma aos argumentos de Bracht (2019), que chama atenção da necessidade da EF “ser constantemente reinventada” (Bracht, 2019): “[...] o que confere aos seus agentes não um consolo do respaldo da necessidade natural (como uma lei natural que nos protege), mas nos impulsiona para a autocrítica constante e a usar nossa imaginação criativa, nossa capacidade instituinte.” (Bracht, 2019, p. 28)

 

Notas 

  1. Queimado é um jogo popular que, de acordo com Conti (2015), apresenta variações em sua nomenclatura, podendo ser chamado de “bola queimada”, “baleado”, “queimada”, “mata-mata”, “caçador” entre outros, dependendo da região do país.

  2. No presente texto, chama-se “futebol” o jogo com os pés realizado pelos alunos que apresenta algumas características do futsal e do futebol. Porém, considerando a limitação do espaço e materiais, além das regras não convencionais, essa prática não se caracterizou como nenhum desses esportes em seus sentidos formais.

  3. Os pontos mais gerais observados foram referentes à estrutura física e material da escola, chegada e saída das crianças/jovens, intervalo/recreio (brincadeiras e práticas corporais desenvolvidas pelas crianças/jovens, se suas práticas eram livres ou orientadas ou com supervisão de professores/adultos; além da alimentação), existência e estado de bebedouro, existência e estado de uso dos banheiros, relações e interações entre as crianças/jovens e destas com os professores(as), bem como com a equipe da escola.

  4. Os pontos mais específicos observados foram referentes ao planejamento, ao trabalho com os conteúdos e os procedimentos práticos do professor(a) para o desenvolvimento de sua aula, à comunicação do professor(a) com os alunos(as), à ocorrência de bullying e estereótipos entre os participantes, ao envolvimento dos alunos(as) nas aulas, quais materiais pedagógicos e equipamentos tecnológicos eram utilizados nas aulas, ao comportamento do professor em relação à resolução de problemas cotidianos e à avaliação.

  5. A pesquisa observacional foi realizada por 4 (quatro) integrantes, sendo que um deles, não participou da feitura deste artigo, por decisão própria e questões de ordem particular, embora concordou com sua publicação.

  6. Na literatura internacional, o texto de Butler, Burns, e Robson (2020) também se refere ao jogo do queimado nas aulas de EF: “Dodgeball: inadvertently teaching oppression in Physical and Health Education”.

  7. Apesar de terem acessado o PPP da escola, não foi possível uma análise aprofundada, pois, além de não se poder registrar fotograficamente, também não havia uma versão digitalizada para uma consulta mais longa e aprofundada.

  8. Trecho retirado do PPP da escola e copiado junto às anotações das observações.

  9. Alguns autores, como Araújo, Rocha, e Bossle (2018), Silva, Nunez, e Dagostin (2009), Betti (1995), e Stroher, e Musis (2017) já chamaram atenção para essa questão da limitação da EF à determinados conteúdos.

  10. Expressão regional utilizada para acusar chateação, insatisfação, aborrecimento.

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Lecturas: Educación Física y Deportes, Vol. 25, Núm. 273, Feb. (2021)