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História e filosofia da musculação

Historia y filosofía del fisicoculturismo

 

Estudante de Educação Física

(Brasil)

Letícia Miranda

leticia.transforma@yahoo.com.br

 

 

 

 

Resumo

          Por vezes a história das práticas corporais é considerada desnecessária, uma vez que não são de aproveitamento prático. Porém, não é possível conhecer o valor de algo sem antes conhecer sua história e filosofia de aplicação. É possível observar isso através da própria Musculação, atualmente denominada como Treinamento Resistido, onde é possível compreender sua dimensão quando se compreende que essa é uma prática muito antiga, que surgiu na Grécia Antiga, e desde então auxilia atletas no ganho de condicionamento físico, força e volume muscular. A Musculação também passa por dificuldades para ser aceita na sociedade, pela cultura de valorização do pensar, e discriminação dos trabalhos manuais. Com o surgimento dos Culturistas, a Musculação começa a ser divulgada, e desde o surgimento dos ideais da democratização da Educação Física na década de 80, começa a se propagar, o que resulta hoje em uma procura cada vez maior por academias.

          Unitermos: Musculação. História. Musculação. Treinamento resistido.

 

 
EFDeportes.com, Revista Digital. Buenos Aires, Año 19, Nº 195, Agosto de 2014. http://www.efdeportes.com

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Introdução

    Por vezes a História e a Filosofia das práticas corporais da Educação Física são depreciadas por serem consideradas “(...) de uma utilidade prática menor” (MELO, 1997, p. 56). Porém, através do conhecimento da evolução histórica e do questionamento das possíveis aplicações do objeto de estudo é possível entender o seu valor para a sociedade. Isto é, as causas e efeitos de uma determinada prática são conhecidas quando há um olhar sobre sua evolução histórica e há o questionamento das consequências que a mesma pode vir a acarretar.

    Assim também acontece com a Musculação, atualmente conhecida como Treinamento Resistido. Só é possível entender a importância dessa prática, tanto no presente quanto no passado, a partir do olhar crítico de sua história e filosofia. Afinal, segundo MELO (1997, p. 58), “(...) o passado também estabelece condicionantes.”

Origens da Musculação

    Em meio ao cenário de cultura corporal da Grécia Antiga surgem as práticas que deram origem à Musculação. Bittencourt (1984) afirma que foi Milon de Crotona, atleta seis vezes campeão dos Jogos Olímpicos da Grécia Antiga, deu base às primeiras práticas da musculação, uma vez que o atleta realizava seus treinamentos com um bezerro às costas. À medida com que o bezerro crescia, o atleta era favorecido com relação à força.

    Outro indício do princípio da musculação foi a prática do levantamento de peso. Segundo Bittencourt (1984, p. 06):

    Os levantamentos de peso não faziam parte do programa oficial em Olímpia. Entretanto, foi encontrada nesta cidade uma pedra com o peso de 143,5 Kg, com local para empunhadura e inscrições que diziam ter o atleta Bybom a levantado, acima de sua cabeça, com uma das mãos.

    Segundo Ramos (1982. p. 94) na Grécia Antiga surgiu os primeiros locais propícios às práticas da “musculação”, estes eram os ginásios, que se constituíam como “Estabelecimento Público destinado ao treinamento atlético, constituído de salas cobertas e locais ao ar livre”.

    O ginásio era propriedade do Estado e aparelhado com pistas de corrida, locais para saltos, arremessos e lutas, acomodações para os espectadores, recintos para massagens, unção, banhos e discussões filosóficas. Normalmente, situava-se nas proximidades dos rios, bosques, colinas etc. Em alguns, (...) havia separação por idade. (...) todos convenientemente localizados dentro de bosques de oliveiras consagrados às divindades. (RAMOS, 1982. p. 108)

    O início da prática do Culturismo, segundo Bittencourt (1984), está registrada nas estátuas gregas e nas pinturas de Michelangelo na Capela Cistina.

Evolução histórica da Musculação

    Após declínio da cultura grega, sobreveio a Idade Média, a época na qual não houve significativa evolução nas práticas corporais.

    Somente no século XIX, os médicos higienistas, com seus ideais de eugenia de raça e higienização, pregam a importância de o indivíduo realizar atividades físicas para manter o indivíduo forte e saudável, porém, com o intuito de preparar os homens para o trabalho e as mulheres para as linhas de produção e serviços domésticos. Assim as atividades físicas se aplicam para “(...) criar o corpo saudável, robusto e harmonioso (...) em oposição ao corpo relapso, flácido e doentio do indivíduo colonial (...)” (CASTELLANI, 1994. p. 43). Nesse contexto são implementadas as práticas da educação física nas escolas, ainda voltadas às práticas da ginástica. As práticas que acontecem fora dos muros escolares ainda não são reconhecidas como parte da educação física, visto que não tem relação com o forjar do indivíduo para o trabalho, pelo contrário, são práticas voltadas ao lazer e entretenimento.

    Um fato que evidencia a conotação de lazer e entretenimento das práticas corporais, até então, informais, eram os “homens mais fortes do mundo” que se colocavam como atrações dos teatros e circos. Por mais que isso não fosse reconhecido como prática formal, essas exibições contribuíram fazendo com que a musculação se tornasse conhecida. Atletas como Louis Attila, Eugen Sandow e Charles Samson, difundiram os resultados que a musculação poderia proporcionar. (BITTENCOURT, 1984. p. 11)

    A difícil aceitação das práticas corporais se dava pelo fato da sociedade da Revolução Industrial dar valor ao trabalho da razão, sendo as atividades físicas vistas com preconceito por se tratarem de trabalhos manuais. Ainda houve influência da Igreja Católica, muito influente até então, que defendia que o corpo não é nada mais do que “(...) um meio ou instrumento a serviço da alma” (CASTELLANI, 1994. p. 52), portanto, as práticas corporais são vistas como pecado por serem consideradas práticas de vaidade.

Louis Attila e Eugene Sandow

http://www.dennisrogers.net/forty-years-with-the-worlds-strongest-men/

    O fato que deu à prática do culturismo uma grande visibilidade aconteceu em 1887. O atleta Louis Atilla, recebeu do Príncipe de Gales, uma estátua de Hércules com 36 diamantes cravejados. Isso despertou a ambição dos homens, que passaram a buscar a musculação. “Ginásios foram abertos por toda a Europa, que na época era o berço dos homens fortes.” (BITTENCOURT, 1984. p. 11). Nesse contexto é possível perceber ainda a influência da antiga cultura grega, que subsiste no cuidado com o corpo a fim de aproximar-se do divino, de ser reconhecido e aceito na sociedade, e de ser remunerado e beneficiado com bens materiais pelas práticas que o sujeito desenvolve relacionadas ao corpo.

    A prática da musculação só ganhou credibilidade no século XX, mais precisamente em 1939, quando ocorreu a regulamentação do Culturismo feito pela American Athetic Union. Nesse mesmo ano foi criado o evento Mr. América, o qual avaliava os competidores pelos aspectos da hipertrofia, definição muscular, proporção entre as dimensões dos grupos musculares e sequencia de poses. A criação desse evento e a regulamentação representam o auge da prática do culturismo até então. (BITTENCOURT, 1984. p. 12)

    Posteriormente, em 1984, os títulos mais cobiçados passaram a ser o Mister e Miss Olympia, onde é possível observar que houve inserção da mulher como praticante de Halterofilismo e competidora de Culturismo. Arnold Schwarzenegger foi campeão do Mister Olympia sete vezes. (BITTENCOURT, 1984. p. 12)

    Mesmo sendo reconhecida, a prática da musculação ainda não era democratizada, uma vez que uma minoria tinha acesso à mesma. Em aulas ministradas pela Profa. Dra. Renata Costa Toledo Russo foi exposto que, esse quadro se reverte na década de 80, não somente no campo da musculação, mas em toda a Educação Física informal, isto é, em todas as práticas corporais que acontecem fora dos muros escolares. A ideia que surge é a de que todo cidadão tem os mesmos direitos. A discussão acerca desse assunto faz com que a Educação Física seja repensada, e além do professor que atua dentro da escola (Licenciado), surge o profissional que é especialista em atividades fora da escola, o Bacharel. Oliveira afirma que “Os anos de 98 foram o start para a regulamentação definitiva da área, frente à possibilidade do aumento dos nichos de atuação profissional (...)”, assim,

    (...) o processo de regulamentação está firmado em três princípios: a relação de consumo, alvo da regulamentação; a saúde - que justifica a regulamentação como medida de proteção social; e a ciência, que procura conferir legitimidade e exclusividade aos diplomados (BRACHT e CRISÓRIO, 2003 apud OLIVEIRA).

    Discussões acerca da saúde ocorrem mundialmente durante o séc. XX, até que a Organização Mundial da Saúde (OMS) institui a Política de Saúde em 1978, em que os países devem se comprometer em zelar pela saúde da população. Isto colabora diretamente com a popularização da musculação, que a partir daí, passa a ser considerada importante, não somente para a estética, mas para a saúde.

    E esse processo de popularização da musculação vem se acentuando cada vez mais, o que é possível observar pelo número de academias de musculação que são abertas todos os anos e pelo perfil da maioria dos praticantes que se constitui por indivíduos pertencentes à classe média.

Conclusão

    Durante a maior parte da história da humanidade houve resistência quanto à prática da Musculação, isso se deu pela sua marginalização, ora pela Igreja Católica, ora pelos interesses políticos, ora pelo próprio preconceito da população acerca da Musculação.

    A população, ainda hoje, tem ideias equivocadas acerca de como a Musculação pode ajudar na perca de peso e do processo de ganho de massa muscular. Cabe aos profissionais instruírem a população, a fim de atentá-los para os benefícios da Musculação que vão além da estética.

    É comum que os médicos receitem a Musculação como forma de prevenção e tratamento de doenças, e reabilitação. Assim, se prova que a Musculação se trata de uma prática relacionada à saúde, sendo, então, de extrema importância para proporcionar a qualidade de vida para a sociedade.

Nota

  1. Aulas ministradas pela Profa. Dra. Renata Costa Toledo Russo, nos dias 19 e 26 de fevereiro de 2014, na Escola de Educação Física de Jundiaí-SP.

Referências bibliográficas

  • BITTENCOURT, Nelson. Musculação: uma abordagem metodológica. Rio de Janeiro: Sprint, 1984.

  • CASTELLANI Filho, Lino. Educação Física no Brasil: a história que não se conta. 4ª ed. Campinas: Papirus, 1994.

  • MELO, Victor Andrade de. Porque devemos estudar história da Educação Física/Esportes nos cursos de graduação? Revista Motriz. Vol 3. Nº 1. Junho/1997.

  • OLIVEIRA, José Eduardo Costa de. O Campo de Atuação do Profissional de Educação Física e Esporte. EFDeportes.com, Revista Digital. Buenos Aires, Nº 161, 2011. http://www.efdeportes.com/efd161/o-campo-de-atuacao-de-educacao-fisica.htm

  • RAMOS, Jair Jordão. Os exercícios físicos na história e na arte: do homem primitivo aos nossos dias. São Paulo: Ibrasa, 1982.

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