efdeportes.com
Sistema de classificação de esportes com base nos critérios:
cooperação, interação com o adversário, ambiente,
desempenho comparado e objetivos táticos da ação

   
Departamento de Pedagogia
Curso de Educação Física
Universidade Regional do Noroeste
do Estado do Rio Grande do Sul
 
 
Fernando J. Gonzalez
fjg@unijui.tche.br
(Brasil)
 

 

 

 

 
Resumo
    Este artigo apresenta um Sistema de Classificação de Esportes, desenvolvido com base nos critérios de cooperação, relação de oposição com o adversário e tipo de ambiente onde se realiza a prática esportiva. Por sua vez os esportes sem interação direta com o adversário são subdivididos em categorias com base no tipo de desempenho comparado. Já os esportes com interação direta com o adversário são subdivididos segundo o objetivo tático da ação. Este sistema possibilita montar um quadro para classificar grande parte dos esportes, permitindo identificar, com base nessa taxionomia, as demandas diferenciadas impostas pelas distintas modalidades aos praticantes.
    Unitermos: Classificação. Esportes. Objetivo tático da ação. Taxonomia.
 

 
http://www.efdeportes.com/ Revista Digital - Buenos Aires - Año 10 - N° 71 - Abril de 2004

1 / 1

Introdução

    As atividades motoras em geral e os esportes em particular têm sido objetos de diversas classificações (PARLEBAS, 1988; RIERA; 1989; WERNER; ALMOND, 1990; FAMOSE, 1992; RUIZ, 1994; CASTEJÓN, 1995, HERNÁNDEZ, 1994 e 1995; HERNÁNDEZ et. al, 1999, HERNÁNDEZ, 2000; RITZDORF, 2000; SCHMIND; WRISBERG, 2001) com o propósito de identificar seus elementos universais1 e entender melhor suas lógicas internas2 , particularmente no que tange às solicitações colocadas por essas últimas aos praticantes das diferentes atividades. Estas classificações são montadas a partir de diversos critérios3 que intentam mostrar e destacar diferentes aspectos da estrutura4 e/ou da dinâmica5 dos esportes.

    Na continuação apresentaremos um sistema de classificação para o esporte desenvolvido na base de quatro critérios, com o propósito de caracterizar de forma específica as exigências que diferentes grupos ou categorias de modalidades impõem aos participantes das mesmas. Esse sistema de classificação, na verdade, reúne um conjunto de categorias identificadas em alguns dos trabalhos mencionados, porém combina-as de uma forma diferenciada no que respeita às relações que podem ser estabelecidas entre elas, entendendo que o mesmo traz uma contribuição para pensar o campo esportivo desde uma perspectiva que facilita a compreensão das demandas determinadas para os praticantes das diferentes modalidades.


Classificação dos Esportes: Relação de Cooperação e Oposição

    Dentro das classificações possíveis neste trabalho, optou-se, inicialmente, por aquela que permite dividir os esportes em quatro grandes categorias a partir da combinação de outras duas distribuições, o que permite construir uma matriz de análise que, embora não inclua todos os esportes, envolve uma importante parte do universo das modalidades. De forma resumida, pode-se dizer que os critérios são: a) se existe ou não relação com companheiros e, b) se existe ou não interação direta com o adversário. Com base nesses princípios é possível classificar as modalidades em individuais ou coletivas, quando utilizado o critério relação com os companheiros, e com e sem interação direta com o adversário, quando o critério utilizado é a relação com o oponente.

    Com base no primeiro critério os esportes podem ser classificados como individuais, segundo seu próprio nome indica, quando o sujeito participa sozinho durante a ação esportiva total (duração da prova, do jogo), sem a participação colaborativa de um colega, e em esportes coletivos, quando as modalidades exigem, pela sua estrutura e dinâmica, a coordenação das ações de duas ou mais pessoas para o desenvolvimento da atuação esportiva.

    Já quando considerada a relação com o rival como critério de classificação, a interação com o adversário pode ser identificada como a característica central dos esportes com oposição direta. Essa condição exige dos participantes adaptações e mudanças constantes na atuação motora em função da ação e da antecipação da atuação do adversário.

    Estes esportes também podem, de forma mais ampla, ser denominados de atividades motoras de situação, definidas como "atividades ludomotoras que exigem dos sujeitos participantes antecipar as ações do/s adversário/s (e colega/s se a atividade for em grupo) para organizar suas próprias ações orientadas a alcançar o/s objetivo/s das atividades lúdicas" (GONZALEZ, 1999, p.4). Outros autores denominam a condição de interação com o adversário de oposição direta (RIERA, 1989), da mesma forma que a categoria com interação supõe a presença do adversário que se enfrenta diretamente, o qual procura a todo momento neutralizar a atuação do rival.

    Combinando estas duas classificações teremos as seguintes categorias:

  • Esportes individuais em que não há interação com o oponente: são atividades motoras em que a atuação do sujeito não é condicionada diretamente pela necessidade de colaboração do colega nem pela ação direta do oponente.

  • Esportes coletivos em que não há interação com o oponente: são atividades que requerem a colaboração de dois ou mais atletas, mas que não implicam a interferência do adversário na atuação motora.

  • Esportes individuais em que há interação com o oponente: são aqueles em que os sujeitos se enfrentam diretamente, tentando em cada ato alcançar os objetivos do jogo evitando concomitantemente que o adversário o faça, porém sem a colaboração de um companheiro.

  • Esportes coletivos em que há interação com o oponente: são atividades nas quais os sujeitos, colaborando com seus companheiros de equipe de forma combinada, se enfrentam diretamente com a equipe adversária, tentando em cada ato atingir os objetivos do jogo, evitando ao mesmo tempo que os adversários o façam.

    O Quadro 1 mostra alguns exemplos:

Quadro 1 - Classificação em função da relação de cooperação e oposição


Classificação dos Esportes: em função das características do ambiente físico onde se realiza a pratica esportiva.

    Quando se observa o ambiente físico no qual se realiza a prática esportiva, pode-se perceber que a atuação dos praticantes é afetada de forma diferente por ele. Estas formas diferenciadas de o ambiente físico afetar as práticas motoras permitem classificar os esportes no mínimo em duas categorias. Uma reúne o conjunto de esportes que se realizam em ambientes que não sofrem modificações, isto é, não criam incertezas para o praticante no momento em que ele o conhece. Uma segunda categoria agrupa o conjunto de esportes em que o ambiente produz incertezas para o praticante, com base nas mudanças permanentes do ambiente físico onde se pratica a modalidade ou quando o mesmo é desconhecido pelo atleta. Assim, nesta lógica, as práticas motoras institucionalizadas classificam-se em:

  • Esportes sem estabilidade ambiental ou praticados em espaços não-padronizados: São aqueles que se realizam em espaços mutáveis e que, conseqüentemente, apresentam incertezas para o praticante, exigindo dele a permanente adaptação de sua ação motora às variações do ambiente.

  • Esportes com estabilidade ambiental ou praticados em espaços padronizados: São os que se realizam em espaços estandardizados e que não oferecem incertezas para o praticante.

    O Quadro 2 mostra alguns exemplos.

Quadro 2- Classificação em função das características do ambiente físico onde se realiza a prática esportiva.


Classificação dos Esportes: em função da lógica da comparação de desempenho e princípios táticos

    Este processo de análise das características esportivas permite identificar dentro das categorias de esportes com e sem interação direta com o adversário subcategorias que se vinculam a diferentes critérios. Para os esportes sem interação o critério utilizado é o tipo de desempenho motor8 comparado para designar o vencedor nas diferentes modalidades. Já para os esportes em que há interação o critério de classificação liga-se ao objetivo tático da ação, ou seja, a exigência que é colocada aos participantes pelas modalidades para conseguir o propósito do confronto deportivo.

    Assim, observamos que nos esportes sem interação com o adversário tem-se diferentes tipos de resultados como elemento de comparação de desempenho, permitindo classificar9 as modalidades em:

  • Esportes de "marca": são aqueles nos quais o resultado da ação motora comparado é um registro quantitativo de tempo, distância ou peso.

  • Esportes "estéticos": são aqueles nos quais o resultado da ação motora comparado é a qualidade do movimento segundo padrões técnico-combinatórios.

  • Esportes de precisão: são aqueles nos quais o resultado da ação motora comparado é a eficiência e eficácia de aproximar um objeto ou atingir um alvo.

    Já os esportes com interação com o adversário, adaptando a classificação de Almond (citado em DEVIS e PEIRÓ,1992) e dando ênfase aos princípios táticos do jogo, podem ser divididos em quatro categorias:

  • Esportes de combate ou luta: são aqueles caracterizados como disputas em que o(s) oponente(s) deve(m) ser subjugado(s), com técnicas, táticas e estratégias de desequilíbrio, contusão, imobilização ou exclusão de um determinado espaço na combinação de ações de ataque e defesa (BRASIL, 1998, p. 70).

  • Campo e taco : compreendem aqueles que têm como objetivo colocar a bola longe dos jogadores do campo a fim de recorrer espaços determinados para conseguir mais corridas que os adversários.

  • Esportes de rede/quadra dividida ou muro: são os que têm como objetivo colocar arremessar/lançar um móvel em setores onde o(s) adversário(s) seja(m) incapaz(es) de alcançá-lo ou forçá-lo(s) para que cometa/m um erro, servindo somente o tempo que o objeto está em movimento.

  • Esportes de invasão ou territoriais: constituem aqueles que têm como objetivo invadir a setor defendido pelo adversário procurando atingindo a meta contraria para pontuar, protegendo simultaneamente a sua própria meta.

    Nesse sentido, com base nas categorias descritas, pode ser montado um sistema que reúne o conjunto de classificações e permite localizar os diferentes tipos de esportes (Quadro 3). É possível realizar essa classificação em função das quatro categorias descritas: a) a relação com o adversário, b) a lógica de comparação de desempenho, c) as possibilidades de cooperação e, d) as características do ambiente físico onde se realiza a prática esportiva.

    O sistema de classificação apresentado não é completo, existem esportes que nele não estão contemplados (por exemplo, o kabaddi, esporte nacional da Índia, aqui classificado como esporte de luta e coletivo, poderia entender-se que não é compatível com esta classificação). Esta estrutura, contudo, possibilita a classificação da maioria das modalidades esportivas conhecidas, habilitando uma análise criteriosa dos elementos particulares do universo esportivo e permitindo mapear os elementos comuns entre diversas modalidades.

    As características da lógica interna dos esportes condicionam decisivamente os procedimentos de ensino e treinamento. Dessa forma, este conhecimento é fundamental para o profissional que pretenda mediar entre as manifestações esportivas e os sujeitos, haja vista que o reconhecimento das especificidades da modalidade permitirá hierarquizar os conteúdos (o que ensinamos) e selecionar de forma adequada os procedimentos de ensino (como ensinamos).


Quadro 3. Sistema de classificação dos esportes em função: da relação com o adversário,
lógica de comparação de desempenho, as possibilidades de cooperação e
as características do ambiente físico onde se realiza a prática esportiva.


Notas

  1. Definidos por Parlebas (2001, p. 463) como "modelos operativos que representam as estruturas básicas do funcionamento do jogo esportivo e que contêm sua lógica interna".

  2. Seguindo Parlebas (2001, p.302), define-se lógica interna como "o sistema das características pertinentes de uma situação motora e as conseqüências que entranha para a realização da ação motora correspondente".

  3. Caráter, norma ou modelo que serve para a apreciação de um objeto (coisa, idéia, acontecimento).

  4. Sistema de relações abstratas que forma um todo coerente, que subjaz à variedade e variabilidade dos fenômenos empíricos.

  5. Relações estabelecidas pelos participantes a partir das regras que regulam o esporte, jogo ou atividade motora.

  6. Esporte entendido aqui num sentido restrito como "uma ação social institucionalizada, convencionalmente regrada, que se desenvolve, com base lúdica, em forma de competição entre duas ou mais partes oponentes ou em contra a natureza, cujo objetivo é, por uma comparação de desempenhos, designar o vencedor ou registrar o recorde, sendo seu resultado determinado pela habilidade e estratégia do participante, e é gratificante tanto intrínseca (prazer, auto-realização, etc.) como extrinsecamente" (BETTI, 1997, p.35).

  7. Muitos dos esportes aqui mencionados podem ser praticados em duplas, alterando conseqüentemente a categoria.

  8. Aqui desempenho motor é entendido como desempenho esportivo, definido como: "produto avaliado da atividade motora num contexto institucionalizado de comparação social" (FAMOSE, 1999, p.36).

  9. Nesta classificação utilizamos duas categorias propostas por Dudley (apud CASTEJÓN, 1995) (Marca ou Desempenho e Estético) e uma proposta por Almod (apud DEVÍS e PEIRÓ, 1992) (Alvo).

  10. Esportes de translação: são aqueles que têm como objetivo deslocar-se de um lado ao outro antes de seus adversários e em que são permitidas (diferente dos esportes de marca) interferências intencionais e diretas dos atletas sobre as ações de seus adversários.

  11. Kabaddi é um esporte asiático intensamente praticado na Índia e outros países tais como: Paquistão, Bangladesh, Sri Lanka, Nepal e Japão. Trata-se de um esporte de equipe que tem como objetivo tocar e capturar os jogadores da equipe adversária. É jogado num espaço de 12,5 m x 10 m, dividido em duas metades. Informações disponíveis em http://www.alldesi.net/fun/sports/kabaddi.htm.


Referências

  • BETTI, M. Violência em Campo: Dinheiro, mídia e transgressão às regras no futebol espetáculo. Ijuí: Unijuí, 1997.

  • BRASIL. Secretaria de Educação Fundamental. Parâmetros curriculares nacionais. Brasília : MEC/SEF, 1998.

  • CASTEJÓN, F. J. O. Fundamentos de Iniciación Deportiva y Actividades Físicas Organizadas. Madrid: Dykinson, 1995.

  • DEVIS, J. D.; PEIRÓ, C. V. Nuevas perspectivas curriculares en educación física: la salud y los juegos modificados. Barcelona: Inde, 1992.

  • FAMOSE, P. Aprendizaje motor y dificultad de la tarea. Barcelona: Paidotribo, 1992.

  • FAMOSE, P. Rendimento motor: un intento de definición. In FAMOSE, P. (org.) Cognició y rendimiento motor. Barcelona: Paidotribo, 1999.

  • GONZALEZ, F. J. Influência do nível de desenvolvimento cognitivo na tomada de decisão durante jogos motores de situação. Revista Movimento, Porto Alegre , v. 10 , n. 1 , p. 3 -14 , 1999

  • HERNÁNDEZ, J. (Org.) La iniciación a los deportes desde su estructura e dinámica. Barcelona: Inde, 2000.

  • HERNÁNDEZ, J. et. all. ¿Taxonomía de las actividades o de las situaciones motrices?. Lecturas: Educación Física y Deportes. http://www.efdeportes.com/ Revista Digital Año 4. Nº 13. Buenos Aires, Marzo 1999.

  • HERNÁNDEZ, J. Fundamentos del deporte. Análisis de las estructuras de los juegos deportivos. Barcelona: INDE, 1994.

  • HERNÁNDEZ, J. La diversidad de prácticas análisis de la estructura de los deportes para su aplicación a la iniciación deportiva. In BLÁZQUEZ, D. La iniciación deportiva y el deporte escolar. Barcelona: Inde, 1995.

  • PARLEBAS, P. Elementos de sociología del deporte. Andalucia: Junta de Andalucia, 1988.

  • PARLEBAS, P. Juego deporte y sociedad. Léxico de praxiología motriz. Barcelona: Paidotribo, 2001.

  • RIERA, J. Fundamentos del aprendizaje deportivo. Barcelona: INDE, 1989.

  • RITZDORF, W. Treinamento da força e da potência muscular no esporte. In ELLIOTT, B.; MESTER, J. Treinamento no Esporte. Guarulhos, São Paulo: Phorte, 2000.

  • RUIZ, L. M. Deporte y aprendizaje: procesos de aplicación y desarrollo de habilidades. Barcelona: Visor, 1994.

  • SCHMIND, R.; WRISBERG, C. Aprendizagem e performance motora. SP: Artmed, 2001.

  • WERNER, P. ALMOND, L. Model of games education. Journal of Physical Education, Recreation and Dance, 41 (4), 1990, p.23-27.

Outro artigos em Portugués

  www.efdeportes.com/
http://www.efdeportes.com/ · FreeFind
   

revista digital · Año 10 · N° 71 | Buenos Aires, Abril 2004  
© 1997-2004 Derechos reservados