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Prevenção da queda do idoso. As alterações induzidas pelo treino da
força no desempenho do Timed Get-Up & Go Test e do Functional Reach Test
Nelson Sousa e Urbano Marques

http://www.efdeportes.com/ Revista Digital - Buenos Aires - Año 8 - N° 53 - Octubre de 2002

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    Após a análise da Figura 2., podemos verificar que antes do início do programa de treino não existiam diferenças significativas entre os dois grupos, porém após o programa de treino da força verificou-se diferenças estatisticamente significativas entre os mesmos.


Discussão

O efeito do treino ao nível da força

    Os resultados de outros trabalhos têm demonstrado de uma forma consistente, que através de um estímulo com uma intensidade suficiente, a força muscular aumenta entre a população idosa.

    O grupo experimental que esteve sob influência do programa de treino, aumentou significativamente os índices de força máxima em todos os grupos musculares estimulados pelo treino. Estas alterações vão de encontro com o resultado de vários outros estudos, onde se tornou evidente que o treino de força induz ganhos de força máxima, entre a população idosa (Agre et al., 1996; Buchner & Delateur, 1991; Chandler et al., 1998; Evans, 1999; Fiatarone et al., 1990; Fiatarone et el., 1994; Frontera et al., 1988; Grimby et al., 1992; Häkkinen et al., 1998; Häkkinen & Häkkinen, 1995; Hortobágyi et al., 2001; Hurley et al., 1995; Laidlaw et al., 1999; Lan et al., 1998; Lemmer et al., 2000; Nichols et al., 1993; Nicklas et al., 1995; Sauvage et al., 1992; Taaffe et al., 1996; Taaffe et al., 1999; Tracy et al., 1999; Trueth et al., 1994; Westhoff et al., 2000).

    Estudos prévios que aplicaram o treino de força com alta intensidade em amostras constituídas por idosos, documentaram ganhos de força máxima idênticos aos observados no presente estudo (Evans, 1999; Fiatarone et al, 1990; Frontera et al., 1988; Grimbly et al., 1992; Nelson et al., 1994; Nichols et al., 1993; Pyka et al., 1994; Rooks et al., 1997; Schlicht et al., 2001). Neste sentido, alguns autores sugerem que para se conseguir grandes ganhos de força máxima com amostras de indivíduos idosos, deve-se trabalhar com alta intensidade (e.g., Evans, 1999; Fiatarone et al, 1990; Frontera et al., 1988; Grimbly et al., 1992; Schlicht et al., 2001).

    No entanto, relembre-se que a intensidade utilizada neste estudo foi progressiva e que o programa de treino teve início com 50% de intensidade (4 semanas), e terminou com 80% de intensidade (2 semanas) de 1RM. Assim, este programa de treino não se considera exclusivamente de alta intensidade, tal como defendido pelos autores supra-citados, mas sim que este programa de treino foi desenvolvido com moderada a alta intensidade. Estudos prévios com combinação de intensidade semelhante (progressiva), também mostraram ganhos de força entre esta população (Häkkinen et al., 1998).

    A intensidade de treino foi diferente entre cada momento de avaliação de força máxima (1 RM). Assim, entre o primeiro momento de avaliação e o segundo, os indivíduos do grupo experimental trabalharam sempre a 50% de 1RM, entre o segundo momento de avaliação e o terceiro, os indivíduos trabalharam entre 60 a 65% de 1RM, e entre o terceiro momento de avaliação e o quarto, os indivíduos trabalharam entre os 70 e 80% de 1RM. No entanto, os ganhos de força máxima foram sempre (de momento em momento) linearmente progressivos com diferenças significativas, como podemos observar no quadro 2.

    Estes dados sugerem que ambas intensidades, moderada e alta, foram efectivas para proporcionar ganhos de força máxima. Por sua vez, estes vêm reforçar uma das sugestões mais recentes relativamente ao treino da força com idosos, na qual o treino de baixa e moderada intensidade é tão eficaz como o treino de alta intensidade, ao nível da indução de ganhos de força entre a população idosa (Agre et al., 1996; Chandler et al., 1998; Hortobágyi et al., 2001; Laidlaw et al., 1999; Lan et al., 1998; Taaffe et al., 1999; Taaffe et al., 1996; Westhoff et al., 2000; Willoughby & Pelsue, 1998).

    De facto, alguns estudos prévios do treino da força de alta e baixa intensidade, documentaram ganhos de força máxima idênticos aos que foram identificados neste estudo. Para aclarar este particular aspecto (alta intensidade vs. baixa intensidade) segue-se um pequeno resumo dos resultados alcançados por alguns autores (ver Quadro 3.).

Quadro 3. Resultados de alguns estudos ao nível do aumento dos índices de força máxima.

    De acordo com vários autores, um factor determinante para o aumento de ganhos de força, para além dos efeitos do treino por si só, são as adaptações neurais que se verificam nas primeiras semanas de treino (Häkkinen et al., 1998; Häkkinen et al., 1996; Häkkinen & Häkkinen, 1995; Keen et al., 1994; Moritani, & Devries, 1980; Tracy et al., 1999). Estas adaptações, estão por sua vez relacionadas com o aumento da activação de unidades motoras (que se observa nos músculos), que são responsáveis pelos grandes ganhos verificados no início de um programa de treino, em particular se os intervenientes não tiverem qualquer experiência de treino de força (Häkkinen & Komi, 1983; Komi, 1986; Narici et al., 1996; Sale, 1991).

    Também é de salientar que nenhum indivíduo do grupo experimental contraiu qualquer tipo de lesão durante todo o processo de treino. Para tal, muito contribuiu as duas semanas de familiarização que antecederam o início do programa de treino, e as medidas de segurança respeitadas sempre com o máximo rigor. Desta forma, vamos de encontro com a sugestão de vários autores, na qual quando respeitadas todas as medidas de segurança, a população idosa pode suportar o treino de força intenso (Hurley et al., 1995; Lemmer et al., 2000; Pollock et al., 1991; Schlicht et al., 2001).


Efeitos no desempenho do Timed Get Up & Go Test

    Os resultados do desempenho deste teste funcional mostram, após o programa de treino (pós-teste), diferenças significativas. Ou seja, relativamente ao pré-teste o acto de levantar e sentar da cadeira e a velocidade máxima da marcha foram tarefas que melhoraram após a aplicação do programa de treino da força, enquanto que no grupo de controlo, não se identificaram alterações significativas.

    Estes resultados vêm desta forma solidificar a literatura, quando refere a importância do aumento dos níveis de força máxima para retardar desordens relacionadas com a marcha (Aniansson et al., 1980; Bassey et al., 1988; Gersten et al., 1970; Luukinen et al., 1995; Schlicht et al., 2001; Thompson, L. 1994; Westhoff et al., 2000), e desempenho de tarefas como o sentar e levantar de uma cadeira (Aniansson et al., 1980; Bassey et al., 1988; Cheng et al., 1998; Schlicht et al., 2001; Westhoff et al., 2000), que por sua vez estão directamente relacionadas com o aumento do risco de quedas (Rubenstein & Josephson, 1992; Schlicht et al., 2001; Thompson, L., 1994).

    Westhoff e colaboradores (2000), também verificaram melhorias neste teste funcional após a aplicação de um programa de treino da força. Para estes investigadores o treino da força tem uma grande influência no desempenho de todas as tarefas que exijam uma intervenção directa dos membros inferiores.

    Mais ainda, se relacionarmos este teste funcional (TUG) apenas com a velocidade da marcha, facilmente nos apercebemos que em estudos prévios a relação entre o aumento da força máxima e o aumento da velocidade máxima da marcha, já tinha sido estabelecida (Bassey et al., 1988; Fiatarone et al., 1990; Schlicht et al., 2001; Westhoff et al., 2000).

    Assim, estes resultados vêm confirmar que o aumento da força (em especial dos membros inferiores), proporciona melhoria no desempenho da marcha, aumentando desta forma a velocidade máxima da mesma. Enquanto que a melhoria do desempenho de tarefas da vida diária como o sentar e levantar de uma cadeira (também relacionado com este teste funcional), ainda não foi devidamente associada aos aumentos de força máxima. Contudo, estes resultados podem sugerir que o treino de força melhora o desempenho de habilidades que exigem contracções rápidas (recrutamento das fibras tipo II), como se verifica nas tarefas de sentar e levantar de uma cadeira. Hikida e colaboradores (2000) estudam os efeitos de um programa de treino da força com alta intensidade (80-85% de 1RM) ao nível das características das fibras musculares. O programa de treino consistia em três exercícios para os membros inferiores (extensão de pernas, prensa de pernas e agachamentos), com a duração de 16 semanas (2 sessões semanais). Após as 16 semanas de treino, estes investigadores verificaram uma maior hipertrofia nas fibras musculares tipo II (34% nas tipo IIA e 52% nas tipo IIB, respectivamente), relativamente às fibras tipo I, de referir ainda que as fibras tipo II são mais hipertróficas por natureza.

    Assim, o treino de força pode ser um importante instrumento para combater um dos principais sintomas do enfraquecimento muscular com o envelhecimento, nomeadamente a perda selectiva das fibras musculares tipo II (Essen-Gustavsson, & Borges, 1986; Hortobágyi et al., 2001; Larsson et al. 1979; Lexell et al., 1986; Lexell et al., 1988; Nelson et al., 1994) e proporcionar melhorias no desempenho de tarefas espontâneas da vida diária (e.g., sentar e levantar de uma cadeira e o desviar de um obstáculo).


Efeitos no desempenho do Functional Reach Test

    Os resultados do desempenho deste teste funcional mostram, após o programa de treino (pós-teste), diferenças significativas relativamente ao pré-teste. O equilíbrio e o controlo postural foram aspectos que melhoraram após a aplicação do programa de treino da força. No grupo de controlo, não se identificaram alterações significativas.

    Estes resultados vêm por sua vez contrariar a hipótese defendida por alguns investigadores, na qual o treino da força não melhora os níveis de equilíbrio (Buchner et al., 1997; Wolfson et al., 1995). O equilíbrio é um processo complexo, envolve vários factores que podem explicar a discrepância dos resultados deste estudos com outros prévios. Assim, para além da força muscular, o equilíbrio pode ser fortemente influenciado por múltiplas patologias, como problemas visuais e vestibulares (Westhoff et al., 2000).

    Em estudos recentes, não se identificaram associações significativas entre o aumento de força máxima e o aumento do equilíbrio (Schlicht et al., 2001; Westhoff et al., 2000). Porém, nestes estudos, os investigadores apenas estimularam os músculos dos membros inferiores, não incluindo nos seus programas de treino qualquer exercício para os músculos do tronco ou membros superiores. Neste estudo, não só foram incluídos exercícios para os membros inferiores, como também para os principais grupos musculares do tronco e membros superiores.

    Estes resultados podem sugerir que os músculos do tronco são importantes para melhorar o desempenho do equilíbrio e controlo postular. Mais ainda, se analisarmos em termos percentuais os ganhos de força máxima por exercício (neste estudo) podemos comprovar que os maiores ganhos de força máxima foram identificados ao nível dos músculos do tronco, nos exercícios military press (47.66%) e supino (43.75%). Enquanto que no sentido oposto, encontramos os ganhos de força máxima ao nível dos membros inferiores, nos exercícios prensa de pernas (36%) e extensão de pernas (31,74%), todos eles ganhos significativos, mas ligeiramente menores que os anteriormente referidos.

    Estes dados podem sugerir que na amostra deste estudo, os membros inferiores eram os grupos musculares mais estimulados, logo o nível de atrofia muscular pode estar mais acelerada nos músculos do tronco e membros superiores, possibilitando desta forma, maiores ganhos de força nos mesmos. Porém, esta sugestão contraria os resultados de estudos realizados por outros autores, que sugerem uma maior perda de força muscular ao nível dos membros inferiores com o envelhecimento (Larsson, 1978; Larsson et al., 1979; Murray et al., 1985; Spirduso, 1995).

    Assim, parece-nos importante incluir sempre nos programas de treino para a população idosa, exercícios para os principais grupos musculares do corpo, uma vez que os mesmos têm uma grande influência nas actividades da vida diária (Evans, 1999).


Conclusões

    O presente estudo veio confirmar o resultado de outros estudos, onde se sugere que os idosos podem suportar programas de treino intenso (quando respeitadas todas as medidas de segurança), e que o treino de força, aumenta de facto, os níveis de força máxima entre esta população. Os resultados do presente estudo também sugerem que ambas intensidades, moderada e alta, proporcionam ganhos similares de força máxima.

    Em suma, descobrimos que um programa de treino da força com aumento progressivo de intensidade, aumentou significativamente (p<0,05) os níveis de força máxima ao fim de 12 semanas.

    Todavia, o treino de força pode ainda estar directamente associado à diminuição do risco de quedas, uma vez que este programa de treino influenciou significativamente (p<0,05) o desempenho de dois testes funcionais altamente relacionados com o risco de quedas nos idosos, o Timed Get-Up & Go Test e o Functional Reach Test, respectivamente.

    identificou-se ganhos de força máxima entre os 31,74% e os 47,66% (consoante os exercícios), sendo os maiores ganhos ao nível dos exercícios de military press (47,66%) e supino (43,75%), e os menores nos exercícios de extensão de pernas (31,74%) e prensa de pernas (36%).

    Ao nível do desempenho dos testes funcionais, o grupo experimental (que esteve sob influência do programa de treino da força), melhorou significativamente o seu desempenho, onde para além do equilíbrio funcional estático e dinâmico, estão incluídas tarefas da vida diária como o sentar e levantar de uma cadeira, marcha e o alcançar.


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