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Dialogando sobre educação, educação
física e inclusão escolar

   
Licenciada em Educação Física pela Universidade Castelo Branco.
Especialista em Psicomotricidade pela UCAM.
Pós-Graduada em Educação Física,
Cultura & Qualidade de Vida pela UGF
 
 
Flavia Fernades de Oliveira
tabininha@terra.com.br
(Brasil)
 

 

 

 

 
Resumo
    A Educação Inclusiva é hoje um dos desejos de uma sociedade que ainda estigmatiza e discrimina seus deficientes. Maior dignidade, respeito e integração é o que hoje a educação inclusiva brasileira vai procurar propiciar a sua sociedade. Seu maior desafio é transformar a mentalidade preconceituosa instalada, desencadeando um movimento coletivo capaz de ao longo dos anos, através da ação de profissionais da educação, mudar este quadro.
    Desta forma alterações e superações na Educação física escolar, será preciso, pois ela era oferecida nas escolas para portadores de necessidades educativas especiais, como educação física especial ou adaptada. E nas escolas para alunos “normais” como uma educação física referenciada na biologia e seletividade. E agora com a nova Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional, a Educação física deverá ser oferecida de acordo com as necessidades do aluno seja ele deficiente ou não, o que vem a alterar de forma sensível e significativa seu olhar para o mesmo.
    A partir desta nova realidade apresenta-se este artigo com a finalidade de levantar algumas questões relativas a práxis pedagógica da Educação Física Escolar inclusiva, dialogando sobre as possíveis dificuldades que docentes e discentes podem apresentar, neste novo panorama da educação inclusiva. Para tal realizou-se um estudo de abordagem onde foram ouvidos 16 professores de Educação Física da rede pública e particular do município do Rio de Janeiro. Analisando-se o discurso destes informantes observou-se uma dificuldade dos mesmos que embora tenham muita experiência na área escolar, ainda não estão demonstrando compreensão do conceito que se trabalha hoje sobre o que são fato alunos Portadores de Necessidades Educativas Especiais.
    Unitermos: Educação física. Inclusão. Deficiência. Sociedade.
 

 
http://www.efdeportes.com/ Revista Digital - Buenos Aires - Año 8 - N° 51 - Agosto de 2002

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I. Introdução

    Sabemos que são os seres humanos que fazem a história. Somos nós que transformamos as condições sociais, mudamos o mundo e nos modificamos, com nossas iniciativas, nossos acertos e nossos erros.

    Mas sabemos também que não influímos todos no mesmo nível e com a mesma profundidade sobre o movimento da história: alguns indivíduos ou grupos de indivíduos se destacam num exercício de liderança que lhes confere um papel especial. Mas sabemos também que a ação desses líderes não é arbitrária, eles não são motivados por ímpetos gratuitos, e se tornam líderes justamente porque atendem a uma demanda socialmente significativa.

    A partir da constatação de que a escola reproduz o mundo de forma capenga e deturpada. Considerada um marco na busca da educação inclusiva, A Declaração de Salamanca, assinada por 92 países, o Brasil não esteve presente, durante a Conferência Mundial sobre Educação para necessidades Especiais, em 1994 na Espanha, prega a necessidade de se reconhecer que a escola para todos é “um lugar que inclua todos os alunos e celebre a diferença”.

    Hoje são 5.000 estudantes com necessidades especiais integrando-se em 567 escolas da Rede Municipal de Ensino do Rio de Janeiro, mais da metade das 1.029 unidades escolares municipais. Fica para nós a questão: Até que ponto a escola brasileira e em especial as escolas municipais do Rio de Janeiro, estão preparadas para receber e desenvolver um projeto de educação inclusiva? Será que inclusão significa apenas ocupar o mesmo espaço físico?

    A escola está estruturada para trabalhar com a homogeneidade, mas esta não é a realidade que compõem a diversidade de pessoas carregadas de traços comuns, mas sobretudo diferenciados. Logo estamos diante de uma nova realidade que inclui, mas tem a diferença como sua marca.


II. A inclusão escolar

    A educação inclusiva se caracteriza como processo de incluir os portadores de necessidades especiais ou com distúrbios de aprendizagem na rede regular de ensino, em todos os seus graus, pois nem sempre a criança que é portadora de necessidades especiais (deficiente), apresenta distúrbio de aprendizagem, ou vice versa, então todos esses alunos são considerados portadores de necessidades educativas especiais. Fonseca (1991) descreve os tipos de deficiência e suas características gerais:

” ..., a criança com paralisia cerebral apresenta essencialmente um problema de envolvimento neuromotor. Do mesmo modo, a deficiência mental apresenta uma inferioridade intelectual generalizada como denominador comum. Por um outro lado, na criança deficiente visual ou auditiva, o problema situa-se ao nível da acuidade sensorial. No que respeita à criança emocionalmente perturbada esta apresenta um desajustamento psicológico como característica comportamental predominante.” (p.27)

    Para essas crianças é necessário que se desenvolva uma prática educacional mais específica no sentido de ampliar as suas capacidades. Para cada deficiência é enfatizado um tipo de cuidado no trabalho educativo. As crianças com deficiências receptivas ou sensoriais que é o caso dos deficientes auditivos e visuais, devem ser educados com mais atenção, para que não haja alteração na sua aprendizagem, é importante distinguir nesta deficiência até que ponto ela irá interferir na aprendizagem ou não. Já a portadora de deficiência integrativa ou intelectual, que é o caso da deficiência mental, que é uma lesão cerebral e pode ser dividida em mínima, ligeira ou severa; a dificuldade de aprendizagem, são problemas que irão levar essas crianças a terem um desajuste na aprendizagem. A deficiência expressiva é aquela que se limita às áreas motoras e verbal, enquanto a área motora afeta as praxias globais e fina, na área verbal há uma falta de conduta motora quanto ao aparelho fonador, esta multideficiência resulta da paralisia e descoordenação dos centros motores cerebrais, causando assim problemas de comportamento e aprendizagem. A LDB nº 9394/96 em seu Artigo 58 diz que entende-se:

“Por educação especial, para os efeitos desta Lei, a modalidade de educação escolar, oferecida preferencialmente na rede regular de ensino, para educandos portadores de necessidades especiais.”

    Logo, a lei determina que a Educação especial deve ser oferecida na rede regular de ensino, gerando uma modificação nos estabelecimentos de ensino e no sistema educacional.

    Discutir educação no século XXI supõem uma atitude crítica frente aos exageros da sociedade do conhecimento, é preciso situar a importância da educação na totalidade dos desafios e incertezas de nosso tempo, portanto, pensar em educação inclusiva é um dos nossos desafios, mas contudo, não podemos e nem devemos desprezar, as questões pertinentes a sua prática no seio da nossa sociedade escolar. “A Declaração de Salamanca”, retomou a discussão sobre educação especial na perspectiva de minimizar os abismos entre os humanos, partindo do pressuposto de “Educação para Todos“, que vem sendo defendido mundialmente pela UNESCO. Mas Glat (1998, p.45) aponta alguns problemas entre o discurso e a prática na social da educação para a integração, afirmando que:

“ Apesar da integração dos portadores de deficiência ser o discurso dominante na Educação especial no mundo todo, direcionando programas e políticas educacionais e de reabilitação, esses indivíduos, mesmo aqueles inseridos no sistema regular de ensino ou em empregos competitivos, continuam, na grande maioria dos casos socialmente isolados dos seus colegas não deficientes.
(...) o problema não é, em sua essência, de natureza legal ou ocupacional, mas sim de natureza relacional, e somente sob esse prisma pode ser melhor compreendido, e quem sabe, minimizado.
(...) a questão da integração dos deficientes envolve antes de mais nada o relacionamento entre essas pessoas e os considerados normais “.

    Com efeito o contato que passamos a Ter com outras formas de pensar e agir, nos colocam frente a mudanças e alterações na constituição da sociedade, implicando em mudanças também na constituição psíquica do homem. A educação inclusiva levará a transformação da representação da criança e do jovem sobre a deficiência, pois educando e crescendo junto aos “diferentes”, compreenderá a heterogeneidade, já que o trabalho é sempre voltado para a homogeneidade. Para nada se leva em conta a diversidade humana, esta é o eixo ético do ser humano, é difícil falar de ética com alguém totalmente diferente de você. E esta vivência acredita-se que a escola tem que propiciar ao cidadão, senão não é escola.

    A inclusão é consequência de uma escola de qualidade, isto é uma escola capaz de perceber cada aluno como um enigma a ser desvendado. O que percebe é que a criança com deficiência, na escola inclusiva hoje denuncia a falência do sistema escolar, e a má gestão escolar. O que se verifica é que os professores não sabem o que fazer, o que denuncia uma formação continuada inadequada ou inexistente do professor; outro ponto de dificuldade é a falta de relacionamento da escola com a família, a escola ainda encontra-se muitas vezes fechada à comunidade para discussão da perspectiva inclusiva. Essas entre tantas outras situações inadequadas no sistema brasileiro escolar, tem representado apenas a abertura das portas das escolas para educação inclusiva. Acreditamos que isto é muito pouco embora signifique uma nova atitude.

    Dentro deste contexto observa-se que muitos portadores de deficiência vivem em forma de isolamento social, pois vivem dentro da estrutura familiar e estas costumam segregá-los, fazendo com que eles fiquem esquecidos, ao invés de incluí-los. A crítica ao sistema de ensino brasileiro, é que o princípio da integração é utilizado, mas para constituir classes especiais em escolas regulares, ou seja, apóia-se a educação inclusiva, mas as crianças portadoras de deficiência e as ditas normais continuam excluídas das oportunidades de integração, convivência e inclusive de afeto.

    As escolas inclusivas devem atender a todos, a Declaração de Salamanca diz que:

“7. O princípio fundamental das escolas inclusivas consiste em que todos os alunos devam aprender juntos, sempre que possível, independentemente das dificuldades e das diferenças que apresentem. As escolas inclusivas devem reconhecer e satisfazer as necessidade diversas dos seus alunos, adaptando aos vários estilos e ritmos de aprendizagem, de modo a garantir um bom nível de educação para todos, através de currículos adequados, de uma boa organização escolar, de estratégias pedagógicas, de utilização de recursos e de uma cooperação com as respectivas comunidades. É preciso, portanto, um conjunto de apoios de serviços para satisfazer o conjunto de necessidades especiais dentro da escola.”

    Cabe então a escola criar estratégias para incluir esses alunos com necessidades especiais no ensino regular, reconhecendo as necessidades individuais de cada um. È importante que a mesma junto aos seus profissionais aceite as novas estratégias de ensino. Diferente de muitos outros países a inclusão no Brasil ainda está engatinhando, o sucesso escolar é não só um mérito dos alunos, mas também dos professores, que de uma maneira ou de outra deverão criar metodologias e estratégias de ensino para as crianças com necessidades especiais, mas em alguns casos para que esses professores consigam atingir os seus objetivos é necessário que se tenha um serviço de apoio funcionando, que em parágrafos da LDB no artigo 58 quando diz que:

”1º Haverá quando necessário, serviços de apoio especializado, na escola regular, para atender às peculiaridades da clientela de educação especial.
2º O atendimento educacional será feito em classes, escolas ou serviços especializados, sempre que, em função das condições específicas dos alunos, não for possível a sua integração nas classes comuns de ensino regular.”

    Será que os professores estão sendo apoiados, para que de fato possam trabalhar na perspectiva da educação inclusiva sem prejudicar o desenvolvimento dos alunos? Até que ponto o atraso e a lentidão na aprendizagem podem gerar uma insatisfação, um fracasso e até mesmo uma evasão de alunos da escola. Dar -se aí o papel das escolas e dos professores, de levar os aluno a aprender a viver socialmente, pois a escola é um espaço de transformação social, seja ela para crianças portadoras de necessidades especiais ou não.

    Segundo Ceccon (1993, p.82), “... a escola está dentro da sociedade, quando mexemos na escola, estamos mexendo na sociedade.” Acredita-se que, a partir da escola inclusiva haverá uma maior aceitação das crianças com necessidades especiais pela sociedade, não se pode mais ignorar a urgência de universalização da cidadania, que, por sua vez, requer uma nova ética e, por conseguinte, uma escola de educação e cidadania para todos.


III. Como fica a Educação Física Escolar?

    A educação física escolar, até décadas atrás apresentava um modelo em que o físico (corpo), a aptidão física e desempenho era o mais importante, desprezando muitas vezes os aspectos sociais, cognitivos e afetivos. O relevante dentro das aulas de educação física escolar era o Esporte-Rendimento, ou seja, o aluno deveria apresentar um bom desempenho e habilidades não só nas aulas, mas também nos jogos e em determinadas modalidades esportivas, levando o aluno a ser quase um atleta. Desta forma a educação física escolar apresentava um modelo excludente, por apresentar aulas com métodos de ensino por repetição, o que tornava essas mais monótonas, sem uma preocupação com a participação de todos os alunos.

    Com os avanços teóricos na Educação, e também na Educação Física, novas abordagens vêm surgindo, e a LDB e os Parâmetros Curriculares Nacionais, vêm contribuindo para levar a disciplina a um lugar de destaque na “ formação de cidadãos críticos, participativos e com responsabilidades sociais”. Porém, com todos estes avanços na Educação física escolar ainda está enraizado um modelo Biológico de homem, e muitos profissionais ainda estão preocupados com o corpo e suas capacidades fisiológicas, mantendo-se assim educação física ainda muito seletiva.

    A LDB em seu artigo 26 no parágrafo 3º diz que a Educação física está integrada a proposta pedagógica da escola, é componente curricular da educação básica, ajustando -se às condições da população escolar. Então como pode a Educação física partir de um modelo seletivo? Seria ela capaz de ter um comportamento excludente potencializado?

    Segundo os PCNs, que é um documento que traz subsídios para os profissionais da área de educação física, onde a proposta curricular é incluir os temas transversais nas aulas, que são Ética, Saúde, Meio Ambiente, Orientação Sexual, Pluralidade Cultural e Orientação para Trabalho e Consumo, o professor deve estimular uma reflexão, e assim contribuir para uma visão crítica da disciplina dentro do meio social, assim sendo a educação física reflete uma mudança no seu objetivo onde um deles é formar cidadãos e não formar atletas, tendo visto que um de seus principais objetivos no ensino fundamental é que os alunos sejam capazes de:

. participar de atividades corporais, estabelecendo relações equilibradas e construtivas com os outros, reconhecendo e respeitando características, físicas e de desempenho de si próprio e dos outros, sem discriminar por características, pessoais, físicas, sexuais ou sociais;

    Com isso as aulas de Educação física devem propiciar aos alunos através de atividades corporais uma atitude construtiva com os portadores de necessidades educativas especiais, possibilitando uma atitude de respeito, aceitação e solidariedade.

    O professor de Educação física deve desenvolver as potencialidades de seus alunos, portadores de necessidades educativas especiais e não excluir das aulas, muitas vezes, sob o pretexto de preservá-los. A escola opta por dispensá-los da educação física, por considerar professor despreparado para dar aula para esses alunos. Este por receio, por pouca remuneração achando que para dar aula dentro da educação inclusiva tem que ter uma melhor remuneração, e que ele está sendo pago para dar aula para “alunos normais” e não para pessoas portadoras de deficiência com traços fisionômicos, com alterações morfológicas, problemas psíquicos, ou com problemas de coordenação que acabam se destacando das demais.

    Assim sendo, a solução para o professor ou para a escola, nem sempre é o melhor para o aluno, antes de tomar uma atitude achando que irá expor o seu aluno a uma situação de vergonha perante aos outros, deve-se descobrir se o aluno gostaria de participar das atividades junto com os colegas. Essas atitudes acabam sendo complexas, no que diz respeito em aceitar as modificações, que irão partir de experiencias vivenciadas ao longo do tempo.

    Partindo do princípio que um dos objetivos gerais de Educação física no ensino Fundamental é que a criança através de atividades corporais conheça a si próprio e aos outros e principalmente que respeite as individualidades, para Seybold (1994)

“Quanto mais claramente se considerar a missão educativa da educação física, tanto mais importante se tornarão os fatores psíquicos, a evolução da forma de aprender e pensar da criança, dos interesses dos jovens, das formas de ação e de sociabilidade .”(p.18)

    A Educação física escolar como diz Seybold, partindo do princípio de adequação à criança, deve favorecer a mesma, um pleno desenvolvimento, de acordo com a sua necessidade e a sua capacidade de aquisição de movimentos, pois parte do princípio que elas tem necessidade natural de movimento. Então o professor não pode dispensar a oportunidade destes alunos em participar da aula, pois mesmo o aluno sendo deficiente físico, mental, auditivo, visual, múltiplas e até mesmo apresentando condutas típicas (que são os portadores de síndromes, quadros psicológicos, neurológicos ou psiquiátricos) eles têm necessidades de fazer atividades que desenvolva a sua relação social, motora e afetiva.


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