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A aprendizagem do judô e os níveis de raiva e agressividade

*Professor de Educação Física e Judô da FEDF
(Brasil)
**Professor Titular Visitante da Universidade de Brasília
(Cuba)

Milton Hidenobu Hokino *
hokino@hudah.com.br
Hiram M. Valdés Casal **
hiramv@uol.com.br

Resumo:
    O objetivo da pesquisa é verificar através do teste de STAXI, o potencial de raiva médio e individual, das pessoas que iniciam no judô, assim como verificar se após algum tempo de aprendizagem, houve alguma modificação nestes potenciais.
    Foram analisados 38 alunos no total, sendo 27 homens e 11 mulheres. Utilizou-se como protocolo, o teste de STAXI do Manual do Inventário de Expressão de Raiva como Estado e Traço, de Charles D. Spielberger, o qual foi adaptado e padronizado para a população brasileira.
    Na verificação dos resultados da pesquisa, não foram detectados, valores estatisticamente significativos, na média geral dos níveis de raiva, e nos testes iniciais e finais, do grupo pesquisado. Mas analisando individualmente alguns casos, encontramos algumas modificações significativas, comparando os níveis iniciais e os finais, após a iniciação no Judô. Entre as diferenças significativas, estão a diminuição do estado geral de raiva, a diminuição de expressão de raiva para fora, e o aumento do controle de expressão de raiva. Resultados semelhantes, foram detectados em outra pesquisa, realizada com praticantes de outros esportes de lutas como Kung Fu e Tae Kwon Do.
    Unitermos: Raiva. Agressão. Violência. Judô.

Resumen:
    El objetivo de la investigación es verificar mediante el test STAXI, el potencial de cólera media e individual de las personaas que se inician en Judo, así como verificar si después de algún tiempo de aprendizaje hubo alguna modificación de estos potenciales.
    Fueron analizados 38 alumnos en total, siendo 27 hombres y 11 mujeres. Se utilizó como portocolo el test de STAXI del Manual del Inventario de Espresión de Cólera como Estado y Rasgo, de charles D. Speiberger el cual fue adaptado y normalizado para la población brasileña.
    En los resultados de la investigación no se detectan valores estadísticamente sisgnificativos en la media general de los niveles de hostilidad y en los tests iniciales y finales del grupo investigado. Analizando individualmente algunos casos, encontramos algunas modificaciones signitficativas, comparando los niveles iniciales y finales, después de la iniciación en el Judo. Entre las diferencias significativas están la disminución del estado general de cólera, la disminución de la espresión de cólera hacia fuera y el aumento del control de la expresión de cólera. Resultados semejantes fueron encontrados en otra investigación, realizada con practicantes de otros deportes de combate como Kung Fu y Tae Kwon Do.
    Palabras clave: Cólera. Agresión. Violencia. Judo.

http://www.efdeportes.com/ Revista Digital - Buenos Aires - Año 6 - N° 31 - Febrero de 2001

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Introdução

Diferenciação entre Raiva, Agressividade, Agressão e violência.

    O conceito de raiva, usualmente se refere a um estado emocional que abrange sentimentos que variam de leves aborrecimentos, até a fúria e cólera. A Agressividade, a Agressão e a Violência se referem a comportamentos expressados em relação a outras pessoas, em relação a objetos do meio ou até mesmo em relação à própria pessoa.

     A emoção de Raiva é uma condição necessária, mas não suficiente para o desenvolvimento de comportamentos agressivos, pois a maneira como uma pessoa vivencia suas emoções de Raiva e as expressam em comportamentos agressivos ou não, dependerá de muitos fatores, principalmente de sua personalidade.

    A personalidade de uma pessoa é determinada por diversos fatores, entre os principais estão a sua constituição Biológica e Psicológica, e principalmente, as influências do meio social e cultural em que vive, como também, das influências educacionais e esportivas que recebe.

    São nas influências Educacionais e Esportivas, que nós professores de Educação Física atuamos, e na qual reside nossa maior responsabilidade, pois podemos influir no comportamento de crianças, adolescentes e jovens, cujas personalidades encontram-se em constante formação.

    Através de um adequado processo de ensino e treinamento psicológico, pode-se influenciar na personalidade do atleta, e consequentemente na sua maneira de experienciar e vivenciar seus sentimentos de Raiva, e expressar sua agressividade de maneira adequada, ou seja, poderá se proporcionar um auto controle, que favorecerá o seu rendimento esportivo e influenciará na sua Educação Social, Cultural e Desportiva.

    A Experiência de Raiva é conceituada como tendo dois componentes principais: Estado e Traço de Raiva. O Manual do Inventário de Expressão da Raiva como Estado e Traço (STAXI = State Trait Anger Expression Inventory), de Charles D. Spielberger, fornece medidas concisas de Experiência e Expressão de Raiva.

    O Estado de Raiva é definido como um estado Emocional caracterizado por sentimentos subjetivos que variam de intensidade que vão de um leve aborrecimento até a cólera. A intensidade do Estado de Raiva varia em função da injustiça percebida, ataque ou tratamento injusto pelos outros e frustrações resultantes de obstáculos ao comportamento dirigido a um objetivo.

    O Traço de Raiva é definido como a disposição de perceber uma gama diversa de situações como desagradáveis e frustradoras, e a reagir a tais situações com elevações freqüentes no Estado de Raiva. Os indivíduos com um traço de raiva muito alto experienciam o estado de raiva mais freqüentemente e com maior intensidade do que indivíduos com traço de raiva baixo.

    A Expressão de Raiva é conceituada como tendo três componentes principais. O primeiro componente - a Raiva para Fora - envolve a expressão da raiva em relação a outras pessoas ou objetos do meio. O segundo componente - a Raiva para Dentro - envolve a repressão dos sentimentos de raiva, ou seja é dirigida para dentro da pessoa. Diferenças individuais no grau em que uma pessoa tenta controlar a expressão de raiva constituem o terceiro componente da expressão de raiva - o Controle de Raiva.

    O comportamento agressivo é um dos fatores que mais tem gerado conflitos em nossa sociedade, gerando uma ambivalência em relação à agressividade, pois muitos a admiram, principalmente quando ela se apresenta como iniciativa criadora, mas muitos também a condenam e a repudiam quando ela se apresenta como uma das alterações condutais que mais preocupam os estudiosos, educadores e pais. A estas circunstancias soma-se a diversidade e a distancia existente nas conceituações teóricas acerca de sua origem, funções e modificabilidade da agressão, criando consequentemente confusão com respeito ao que deve ser feito ou não se deve fazer, quando nos encontramos diante de um comportamento agressivo.

    A agressão é usualmente definida como uma conduta manifestada com a intenção de destruir, ferir, degradar ou subjugar uma pessoa (inclusive a si próprio), um grupo de pessoas ou um objeto material. Ao atos agressivos percorrem uma escala que vai de um olhar inamistoso, uma palavra mais rude, uma bofetada, o assassinato, o suicídio, até a destruição de uma cidade e de uma população.

    Muitos autores acreditam que o homem possui um instinto de agressão. Apresentando-se o estímulo apropriado- frustração por exemplo - uma pessoa irá naturalmente reagir de modo agressivo. Ela não precisa aprender a ser agressiva, mas no entanto aprende maneiras específicas e culturalmente prescritas de condutas agressivas.

    Para alguns autores (Lorenz, 1966), a agressão é um impulso inato inevitável, que desempenhou uma função positiva na história da evolução do ser humano. Seguindo a coerência desta afirmativa, este impulso não deveria ser inibido, senão canalizado, para que sua descarga fosse realizada através de atividades socialmente adequadas.

    Segundo outras posturas (Bandura, 1979), considera-se que a agressão é aprendida mediante uma aprendizagem social. Para estes autores, trata-se de condutas indesejáveis que podem ser eliminadas mediante modificação de conduta.

    Existem posturas intermediárias (Bolby, 1969), que conceituam a agressão como um impulso aprendido em uma história de frustrações e necessidades precoces insatisfeitas. A repressão destes impulsos afetaria negativamente o desenvolvimento do indivíduo, por isso no contexto da psicoterapia, tenta-se conhecer e compensar as frustrações das quais foi gerado.

    Outras posturas (Coll, 1993), consideram que as condutas agressivas não constituem “per se” um distúrbio de comportamento; são outros pontos chaves que nos permitem identificá-las como tal distúrbio: sua finalidade, sua persistência, estabilidade e generalização, os quais, nos fornecerão os dados para determinar se uma conduta é agressiva ou não.

    Na vida, como nos esportes, muitas vezes o progresso e a realização dependem de uma agressividade adequada. Por isso a agressividade não é necessariamente um atributo indesejável da personalidade, basta que ela seja usada de maneira construtiva e positiva, de acordo com as regras desportivas e culturais, inerentes ao desporto praticado.

    No âmbito esportivo, há portanto, necessidade de se diferenciar os tipos de agressividade. Pode ocorrer a agressividade no sentido de combatividade, positiva e sublime, como resultado da lealdade a um valor, a um nome, à Pátria, a um clube a uma equipe; como também, pode ocorrer a agressividade prejudicial, que viola as regras sociais e desportivas, podendo se encaminhar para a agressão e à violência.


Os Esportes para a Catarse da Agressividade

    As pessoas, geralmente desejam e procuram estímulos que provocam “estado de agitação”, excitações e estímulos emocionais, na maioria das vezes, como um meio de fuga da mediocridade, do trabalho enfadonho, do tédio da vida rotineira, ou para a catarse de inibições forçadas e frustrações acumuladas. Praticamente todo o colorido da vida parece advir destes reflexos emocionais, sem os quais a vida parece insípida e monótona, principalmente para os jovens cheios de energia. Por isso, tem-se defendido os esportes como um escoadouro inofensivo para estas tendências, pois poucos espetáculos proporcionam a oportunidade de catarse como os eventos esportivos, graças à identificação dos espectadores com o atleta ou com a equipe.

    Para os atletas, o esporte serviria como um canal para expressar principalmente as tendências agressivas, como um meio para sublimar as tendências anti-sociais, tornando seus praticantes mais sociáveis e amistosos, ou seja, serviria para que a agressividade se expressasse de maneira inofensiva e aceitável e fosse transformada em hábitos saudáveis.


O Judô - Princípios Históricos e Filosóficos

    O Desporto Judô, como o conhecemos hoje, teve suas origens no jiu-jitsu, que era uma arte marcial, praticada no antigo Japão, cuja finalidade era formar guerreiros. Por volta de 1877, quando o Japão saia de um longo período de guerras e se preparava para os anos de paz e reconstrução; um professor da Universidade de Tóquio, o alemão Dr. Baelz, começou a incentivar os estudantes para que praticassem a arte dos Samurais, que eram os antigos guerreiros japoneses. Mas notou-se no jiu-jitsu, daquela época, uma falta de embasamento pedagógico e objetivos educacionais, impossibilitando chamá-lo de esporte.

    Jigoro Kano, que na época, era um dos estudantes da Universidade de Tóquio, interessou-se pelo estudo dos aspectos menos agressivos do jiu-jitsu. Pesquisou e analisou os diversos estilos da época, eliminou os golpes menos violentos e desenvolveu um sistema de luta, acompanhado de uma filosofia, que procurava acentuar o lado educacional, moral e espiritual, baseando-se em um modo de vida de melhor utilização da energia humana; cuja finalidade principal era formar cidadãos pacíficos e não guerreiros. A este sistema de lutas Jigoro Kano denominou JUDÔ, e em 1882, fundou sua escola com o nome de JUDÔ KODOKAN. O crescimento e divulgação do Judô pelo mundo, foi lento mas constante. O impulso decisivo ocorreu nas Olimpíadas de Tóquio em 1964, quando o Judô se tornou um Esporte de projeção Internacional.

    Quando foi criado, o Judô tinha como princípio ser uma luta exclusivamente desportiva, servindo como canalização da excessiva combatividade, acalmando o espírito, o nervosismo e cultivando as qualidades morais, ao fazer da prática do esporte uma disciplina que é necessária observar até para com os adversários.

    A filosofia do Judô é fortemente influenciada pela filosofia de vida oriental, a qual transforma a disciplina e o equilíbrio em formas de viver e encarar o semelhante. As palavras de Jigoro Kano sintetizam o princípio do Judô: “pelo treinamento em ataques e defesas, educa-se o corpo e o espírito, tornando o essência espiritual do Judô uma parte de seu próprio ser.” Assim, todos os valores que o judoca aprende nos seus treinamentos, como exemplo, a humildade e a perseverança, devem ser praticados nos atos do dia a dia. Disciplina, Respeito, Educação, desenvolvimento da Força Física e Técnica, são as cinco regras básicas que o judoca deve perseguir.

    Com o processo de imigração japonesa para o Brasil, o desporto se infiltrou na cultura brasileira; e pelo que se pode concluir hoje, através dos resultados positivos alcançados pelos brasileiros nos vários campeonatos como as Olimpíadas, os mundiais, os pan-americanos, etc; e também pelo grande número de escolinhas e praticantes existentes, principalmente no período formativo; o Judô foi bem aceito em nossa cultura.

    Sendo o Judô um traço de aculturamento japonês no desporto brasileiro, é evidente que traz na sua prática a terminologia daquela cultura: como os nomes das técnicas, nos gestos como os cumprimentos, etc. Entretanto, é necessário se considerar que os “imputs” da cultura em que se encontra inserido o aluno, bem como os aspectos culturais do desporto brasileiro não venham a ser ignorados, assim também, no que se refere à cultura que traz cada um dos praticantes individualmente. Assim as adaptações são fundamentais no processo de transmissão de conhecimentos, e isto dependerá principalmente da experiência, capacidade e sensibilidade do professor.


A Agressividade no Judô

    No Judô, como em qualquer esporte de lutas, necessita de um certo grau de agressividade para se alcançar êxitos, principalmente no rendimento competitivo. A agressividade exigida, é a agressividade positiva, de acordo com as regras de conduta e das regras desportivas de competição. Este tipo de agressividade necessita de um apurado autocontrole por parte do atleta, que o conseguirá através de uma adequada orientação e muito treinamento.

    Este adequado comportamento agressivo, é incentivado principalmente nas competições , pois quando uma luta termina empatada, os árbitros costumam dar a vitória ao competidor que foi mais agressivo, mais combativo, ou seja aquele que se empenhou mais em conseguir a vitória. A agressividade excessiva e prejudicial é totalmente desincentivada nas competições de Judô, pois qualquer ato contrário às regras de conduta, ou às regras de competição, é punida com perda de pontos ou desclassificação, chegando até à suspensão das competições e da federação de Judô.

    Um dos problemas, que podem surgir nas competições, é o dano psicológico causado pelo valorização excessiva da vitória, e da superação dos adversários; quando não se consegue a vitória, por exemplo: podem surgir a frustração e a raiva, podendo levar a atos agressivos prejudiciais e à violência; ou pode provocar também, o pior, que é a desistência de atletas promissores, mas que desistem, por falta de uma adequada orientação psicológica e desportiva. A orientação adequada poderia ser por exemplo a da auto superação, do aperfeiçoamento constante, da persistência e da dedicação, e principalmente da Educação Social, Cultural e Desportiva através da participação em Competições Esportivas.


Metodologia

    A Pesquisa foi realizada entre os alunos Iniciantes dos Centros de Iniciação Desportiva (CID), CID JUDÔ CASEB, e CID JUDÔ CRESCER, ambos da FEDF. Foram pesquisados no total 38 pessoas, sendo 27 homens e 11 mulheres, com idade superior a 14 anos de idade, todos alunos iniciantes de Judô.

    Como protocolo, utilizou-se o teste de STAXI, retirado do Manual do Inventário de Expressão de Raiva como Estado e Traço, de Charles D. Spielberger, o qual foi traduzido e padronizado para a população Brasileira por Angela Biaggio, servindo como parâmetro de comparação com os dados desta pesquisa.

    Escalas do Teste de STAXI

  1. ESTADO DE RAIVA: Mede a intensidade de sentimentos de Raiva num determinado momento.

  2. TRAÇO DE RAIVA: Mede as diferenças individuais na disposição de vivenciar a Raiva.

  3. TEMPERAMENTO RAIVOSO: Mede a propensão geral de vivenciar e expressar a Raiva sem provocação específica.

  4. REAÇÃO DE RAIVA: Mede diferenças individuais na disposição para expressar a raiva quando criticado ou tratado de maneira injusta.

  5. RAIVA PARA DENTRO: Mede a freqüência com que os sentimentos de Raiva são Reprimidos ou Guardados.

  6. RAIVA PARA FORA: Mede a freqüência com que o indivíduo expressa sua raiva em relação a outras pessoas ou objetos do meio.

  7. CONTROLE DE RAIVA: Mede a freqüência com que o indivíduo tenta Controlar a expressão de Raiva.

  8. EXPRESSÃO DE RAIVA: Fornece um índice geral sobre a freqüência com que a raiva é expressada sem levar em conta a direção: Dentro, Fora ou Controlada.


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