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Sexismo e Educação Física: o caso
de uma escola municipal da Bahia, Brasil

Sexismo y Educación Física: el caso de una escuela municipal de Bahía, Brasil

 

*Especialista em Fisiologia Aplicada a Saúde

e a Performance. Licenciado em Educação Física

Professor do Colégio Estadual Pedro Atanásio Garcia. GEPEECS/CNPq

**Licenciado em Educação Física; Professor do Colégio Pequeno Príncipe

***Mestre em Saúde Coletiva; Licenciado em Educação Física

Professor da UNEB/BA. GEPEECS/CNPq

****Especialista em Metodologia do Ensino de Educação Física

Licenciado em Educação Física. Professor da UNEB/BA; LEPEAF/CNPq

Deyvis Nascimento Rodrigues*

Leandro Harley Domingues Santos**

Ricardo Franklin de Freitas Mussi***

Cláudio Bispo de Almeida****

cbalmeida@uneb.br

(Brasil)

 

 

 

 

Resumo

          O sexismo aparece como um fator limitante no processo ensino-aprendizagem, e as aulas de Educação Física não estão isentas da segregação imposta por este tipo de preconceito. Esta pesquisa teve como principal objetivo descrever a postura dos alunos do 9º ano do ensino fundamental de uma escola Municipal de Guanambi (BA) quanto à participação de meninos e meninas nas aulas de Educação Física. Esta se caracteriza como um estudo de caso, cujo instrumento utilizado para coleta de dados foi um questionário referente à inclusão de meninos e meninas em aulas de Educação Física. Os dados foram analisados de acordo com o método de estatística descritiva. Os resultados mostram que no grupo dos meninos, durante as aulas, fica evidente a preferência pela prática de brincadeiras com pessoas do mesmo sexo. Fora do ambiente escolar a maior parte dos alunos, independente do sexo, declarou gostar de brincar com pessoas de ambos os sexos. Pode-se observar que entre os pesquisados o futebol foi citado como um esporte exclusivamente masculino, e atividades consideradas de baixo impacto foram indicadas como exclusivamente femininas. Conclui-se que o sexismo é uma realidade entre os alunos investigados, cabendo ao professor desenvolver programas que contribuam na redução do preconceito, frente ao reconhecimento da Educação Física Escolar como um dos responsáveis no desenvolvimento crítico e no rompimento das barreiras impostas pelas práticas sexistas.

          Unitermos: Educação Física. Sexismo. Educação.

 

Abstract

          Sexism appears as a limiting factor in the teaching-learning process, and Physical Education classes are not exempted from the segregation imposed by this type of prejudice. This study aimed to describe the attitude of the students in the 9th grade of basic education in a school hall Guanambi (BA) on the participation of boys and girls in physical education classes. This research is characterized as a case study, whose instrument used for data collection was a questionnaire relating to the inclusion of boys and girls in physical education classes. The analyzed according to the method of descriptive statistics. The results show that the group of boys during lessons is evident preference for practical jokes with people of the same sex. Outside the school environment most students, regardless of sex, declared like to play with people of both sexes. It can be observed that among the surveyed football was cited as an exclusively male sport, and considered low-impact activities were indicated as exclusively female. It was concluded that sexism is a reality among students investigated, whereas the teacher develop programs that contribute to the reduction of prejudice against the recognition of physical education as one of the responsible development and critical in breaking the barriers imposed by sexist practices.

          Keywords: Physical Education. Sexism. Education.

 

 
EFDeportes.com, Revista Digital. Buenos Aires - Año 18 - Nº 182 - Julio de 2013. http://www.efdeportes.com/

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Introdução

    Em pleno século XXI, o ser humano ainda parece ter dificuldade em conviver com as diferenças. Neste sentido, torna-se necessária a criação de leis que viabilizem a convivência harmônica entre os seres humanos, dentre elas figura à Declaração Universal dos Direitos Humanos (1948) que em seu Artigo II descreve, que

    toda pessoa tem capacidade para gozar os direitos e as liberdades estabelecidos nesta Declaração, sem distinção de qualquer espécie, seja de raça, cor, sexo, língua, religião, opinião política ou de outra natureza, origem nacional ou social, riqueza, nascimento, ou qualquer outra condição. 

    No Brasil, também existem leis que buscam legitimar as relações sociais, reduzindo a discriminação de determinados grupos sociais em razão de outros. Segundo o trecho do Artigo 5º da Constituição Federal, “todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza (BRASIL, 1988)”. Contudo, as leis não conseguem manter uma sociedade sem conflitos, que, na maioria das vezes são motivados por condutas preconceituosas.

    O preconceito é entendido etimologicamente como “um julgamento prévio, sem ouvir as partes, posição irrefletida, pré+concebida, irracional. Também pode ser entendido como um pré+juízo” (DINES, 1996-1997, p.32). Dines (1996-1997) ainda afirma que no Brasil, o preconceito pode ser visto como dano, estrago ou perda. Em outras palavras, é a adoção de uma opinião ou critério, antes de um julgamento justo, constituindo-se num mal, uma ofensa moral.

    Neste sentido, Chauí (1996-1997, p.67) descreve o preconceito como “uma ideia anterior à formação de um conceito”, ou seja, pensamento preconcebido, destituído de contextualização. A mesma autora ainda relata que o preconceito possui quatro marcas significativas: repudia o “ainda não compreendido”, buscando apenas o que lhe é familiar, transforma os “sentimentos de medo, angústia, insegurança diante do desconhecido” em uma ideia construída baseando-se em estereótipos, o “preconceito é conservador” e por fim, o “preconceito é intrinsecamente contraditório”, ao mesmo tempo em que admira o novo ele o teme.

    Fiske (1998) citado por Mesquita Filho, Eufrásio e Batista (2011) descreve que o preconceito pode ser entendido como uma atitude negativa (antipática, hostil), destinada aos membros de determinadas “minorias” sociais, podendo ser dividida nos seguintes compo­nentes: cognitivo, manifestado pela presença dos estereótipos; afetivo, preconceito em si; e comportamental, atos discriminatórios.

    Dentre as diversas representações preconceituosas, a prática baseada nas questões de gênero e sexo figura com certa regularidade e importância. Silva (2010) cita que os conflitos de gênero estão presentes nos mais diversos contextos históricos, com grande destaque na França pós-revolucionária, visto que, o ideal de igualdade, propostos pela revolução, não se aplicava as mulheres, o autor ainda descreve que o grande marco da luta por igualdade de gênero foi a revolução feminista de 1960.

    No Brasil, estes conflitos se intensificaram a partir do ano 2006, marcado pela criação da Lei nº 11.340, resultado de uma ação movida por Maria da Penha Maia Fernandes contra o Brasil na Comissão Interamericana dos Direitos Humanos da Organização dos Estados Americanos (OEA). Nesta ação, movida pela OEA, o Estado brasileiro foi condenado por negligência nos casos relativos à violência contra mulheres. De acordo com a Comissão o Brasil falhou em seu dever de proteger as mulheres, pois, não concedeu à senhora Maria da Penha o direito à proteção judicial.

    O sexismo é um dos grandes motivadores da violência contra a mulher, segregando homens e mulheres, podendo chegar a níveis extremos como nos casos de agressão. A violência contra a mulher exercida pelos homens pode ser dividida em três grupos de danos: a) Violência física – entendida como toda ação voluntaria, que provoque lesões e/ou danos físicos as mulheres; b) Violência psicológica – trata-se de condutas que produzam desvalorização ou sofrimento; c) Violência sexual – qualquer atividade sexual não desejada e forçada por parte do parceiro (FUENTES; LEIVA; CASADO, 2008).

    Ressalta-se que o indivíduo não nasce preconceituoso, ele é estimulado a exercer as condutas preconceituosas. Stein (2000) afirma que no contexto social aprende-se a ser homem ou mulher e essa aprendizagem de gênero fica marcada nas camadas profundas da perso­nalidade. Sendo assim, a escola possui um papel determinante na construção social do ser, removendo ou reforçando preconceitos. Soares e Souza (2011) dizem que as práticas preconceituosas, discriminatórias e segregacionistas ocorrem no contexto escolar, em alguns casos, de maneira não-intencional e sutil, através da frequente negligencia dos educadores no decorrer de suas aulas e também as práticas comportamentais espontâneas das crianças e adolescentes nos horários de intervalos.

    No contexto escolar, esta construção simbólica é feita através de comportamentos preconceituosos, onde meninos e meninas não podem dar as mãos, os meninos são mais fortes e velozes e as meninas são frágeis e delicadas (FERNANDES, 2011). Viana, Moura e Mourão (S/D), relatam que em alguns estudos, realizados com jovens mulheres praticantes de esportes coletivos, foi constatado que para a maioria destas mulheres as aulas de Educação Física (EF) foram importantes para a superação de dificuldades e para o aprimoramento de algumas capacidades. Desta maneira, o sexismo aparece como um fator limitante no processo ensino-aprendizagem.

    Uma vez constatada a presença do sexismo no ambiente escolar, os professores da área devem buscar alternativas que combatam a reprodução deste tipo de preconceito, garantindo uma maior participação nas aulas e desta maneira estimulando os alunos e as alunas à aprendizagem. Sendo assim, o objetivo deste trabalho foi descrever a postura dos alunos do ensino fundamental (9º ano) de uma escola Municipal de Guanambi (BA) quanto à participação de meninos e meninas nas aulas de Educação Física.

Sexismo

    Na sociedade brasileira o sujeito é classificado por rótulos que são impostos de acordo com suas características físicas, sociais ou culturais. Neste contexto, Ferreira (2004, p.119) classifica estas ações como manifestações preconceituosas declaradas ou sutis, motivadas por “diferenças de raça, gênero, orientação sexual, religião, nacionalidade, etnia, ideologia”, manifestações capazes de gerar, em suas vítimas, sofrimento físico e mental, além de graves consequências sociais e econômicas.

    Dentre as diversas “máscaras” adotadas pelo preconceito, o presente trabalho buscou ater-se ao preconceito sexista, que de acordo com Goellner et al. (2009, p.14) sexismo é o termo utilizado para descrever esta manifestação preconceituosa (discriminação e/ou violência) com base no sexo e no gênero, sobretudo em relação às mulheres. Os mesmos autores ainda descrevem que este preconceito “manifesta-se cada vez que se inferiorizam mulheres/homens apenas em função de serem mulheres/homens”.

    O autor Ferreira (2004) acrescenta que o sexismo representa um conjunto de avalições negativas e ações discriminatórias dirigidas, prioritariamente, as mulheres em função da sua condição de gênero, fruto da cultura patriarcal na qual o homem exerce o “controle das instituições econômicas, legais e políticas” e, a mulher, cabe o “cuidado da casa e dos filhos e a satisfação da sexualidade do marido”.

    Para Formiga (2007) o sexismo é ambivalente, apresentando-se de duas formas distintas: o sexismo hostil – mais flagrante pautado na discriminação através do comportamento e da crença de que a mulher é inferior ao homem; e o sexismo benevolente – com o preconceito apresentando-se como uma característica, aparentemente, “positiva”, contudo, pautado na postura de superproteção do homem para com a mulher, visto que, “a mulher é um ser frágil que requer cuidados”.

    Formiga, Golveia e Santos (2002), ressaltam que o sexismo ambivalente possui três subcomponentes: a) O paternalismo, no qual o homem trata a mulher como um ser incapaz, necessitando de “domínio” e “proteção”; b) Diferenciação de gênero, onde o homem discrimina a mulher em razão de suas características físicas (o homem é forte e a mulher delicada); c) Heterossexualidade, que se destaca pelo fato da mulher usar de seu atrativo e poder sexual para dominar o homem, além disso, observa-se o “mito” de que a mulher só vai ser feliz estando com um homem.

    Neste sentido, há relatos que descrevem que a mulher vem continuamente desempenhando funções secundárias na sociedade. Costa e Silva (2002), afirmam que somente a partir do século XVIII, as mulheres começaram a pensar e discutir sobre a discriminação a qual vinham sendo submetidas e passaram a compreender que as diferenças dos sexos não eram, necessariamente, oriundas das diferenças biológicas, mas sim decorrente das construções sociais e culturais que exaltam o masculino e inferiorizam o feminino.

    Ainda hoje a discriminação feminina tem atingindo os mais diversos campos da sociedade mundial: a educação, o trabalho, a política e a ciência. Além disso, o sexismo não exerce, unicamente, a segregação entre os sexos biológicos, seu caráter destrutivo influencia os diversos aspectos sociais, sejam eles políticos econômicos, históricos ou culturais. (FORMIGA; GOLVEIA; SANTOS, 2002; FORMIGA, 2007).

Sexismo no Brasil

    Formiga, Golveia e Santos (2002) lembram que, a Constituição da República Federativa do Brasil, promulgada em outubro de 1988, Art. 5º, Paragrafo I: Homens e mulheres são iguais em direitos e obrigações.

    No entanto, para Bandeira (2009), as mulheres somente conseguiram garantir seus direitos através de diversas lutas. De acordo com a autora a primeira resposta do Estado brasileiro a respeito destas questões foi à criação da Delegacia Especializada de Atendimento a Mulher (DEAM) em 1985, em São Paulo. Outro marco importante foi no ano de 2000 a “intensificação da luta pela democratização dos direitos humanos e pela cidadania” que impulsionou a criação da Secretaria Especial de Políticas para Mulheres. Mas, o grande movimento em prol da igualdade entre os sexos, deu-se com a promulgação da Lei nº 11.340 de 7 de agosto de 2006 (Lei Maria da Penha) que representa mecanismo inicial para coibir e prevenir a violência doméstica e familiar contra a mulher (BRASIL, 2006).

Sexismo e Educação Física

    A Educação Física Escolar (EFE) apresenta-se, dentre os componentes curriculares do ensino fundamental, como o componente onde ocorre o maior contato entre os corpos, desta maneira suas aulas tornam-se o principal ambiente de preconceitos referentes às características e aptidões físicas dos estudantes. Louro (2001) relata que em determinados componentes escolares ocorrem alguns conflitos sobre identidade de gênero que, muitas vezes, são feitos através dos discursos implícitos, contudo, nas aulas de Educação Física esse processo é, geralmente, mais evidente.

    Oliveira (1992) afirma que, no ambiente escolar o professor representa a figura fundamental no que diz respeito às relações de gênero, visto que, ele veicula ideias, percepções, conceitos e preconceitos adquiridos durante sua vida. Neste contexto, Altmann (2001) descreve que o professor de EF é uma referência importante para os alunos, visto que, no processo de ensino-aprendizagem desta disciplina incluem-se aspectos afetivos, sociais, éticos e de sexualidade.

    Na escola desenvolvem-se culturas diferenciadas para cada sexo, estas práticas permeadas de preconceitos e imagens estereotipadas acabam impedindo uma aprendizagem intercultural na Educação Física escolar, nas práticas esportivas e nas práticas de lazer (SARAIVA, 2002). Com o intuito de coibir estes preconceitos de caráter sexista, os Parâmetros Curriculares Nacionais da Educação Física para o Ensino Fundamental, descrevem como um dos objetivos a serem atingidos pelos alunos do terceiro e quarto ciclos:

    participar de atividades de natureza relacional, reconhecendo e respeitando suas características físicas e de desempenho motor, bem como a de seus colegas, sem discriminar por características pessoais, físicas, sexuais ou sociais (BRASIL, 1998).

    A EF como parte do processo educativo, pode carrear não só a manutenção de valores conservadores, mas também solidificá-los. A EFE pode propagar através dos próprios docentes, atitudes, hábitos e atividades diferentes para cada sexo (ABREU, 1993). No campo da EF, o sexismo é motivado principalmente pelo fato de, por muitos anos, classificarem as mulheres como fisicamente frágeis, por isso, submissas aos homens que culturalmente são reconhecidos fortes e, portanto, dominantes, vigorosos e intelectuais (VAITSMAN, 1994; PEREIRA; MOURÃO 2005). Oliveira (1992) relata que, na maioria dos casos, esses comportamentos são iniciados na família e reforçados na escola.

    Contudo, ainda que a EF corrobore com a propagação de preconceitos, a construção de aulas mistas contribui para melhor preparar o sujeito para a vida social, na qual o convívio com as diferenças é inevitável, além disso, esta disciplina contribui para que os estudantes aprendam a conviver em sintonia com seus corpos (OLIVEIRA, 1996; SILVA; GOMES; GOELLNER, 2008).

Metodologia

    Esta pesquisa se caracteriza como um estudo de caso, por buscar obter informações sobre características específicas de uma instituição em particular, além de permitir a descrição de determinado aspecto específico (ALMEIDA; OPPA; MORETTI-PIRES, 2012).

    O primeiro passo da pesquisa foi a caracterização da escola escolhida, que deveria cumprir os requisitos básicos de inclusão: a) pertencer à rede municipal de ensino; b) ter pelo menos uma turma de 8ª serie do ensino fundamental; c) ter professor graduado em Educação Física; d) está localizada na área urbana. Após a seleção da escola, foi encaminhado um ofício pedindo a permissão para realização do estudo.

    Após a autorização da escola, foi realizada instrução dos pesquisados quanto às questões fundamentais do estudo, entrega do termo de consentimento livre e esclarecido (TCLE) junto com o questionário, e como a maioria dos voluntários tinha idade inferior a 18 anos, estes foram instruídos a recolher a assinatura dos seus responsáveis. No dia seguinte, aqueles que apresentaram autorização dos responsáveis, entregaram o TCLE e os questionários respondidos. A coleta dos dados foi feita no mês de julho de 2012.

    O instrumento de coleta de dados foi adaptado de um dos questionários referentes à inclusão de meninos e meninas em aulas de EF propostos por Carvalho et al. (2010), o qual era composto por cinco questões que buscava obter informações sobre a opinião dos alunos quanto à participação de ambos os sexos em atividades praticadas no dia-a-dia. A principal adaptação foi a alteração da questão quatro, pois como este trabalho buscou analisar as aulas de Educação Física, em vez de perguntar “quatro coisas de meninos, de meninas e de ambos”, foi perguntado aos alunos “quatro esportes e jogos de meninos, de meninas e de ambos”.

    A análise dos dados foi feita de forma quantitativa onde as respostas do questionário foram analisadas de acordo com o método de estatística descritiva, onde os dados são apresentados na forma de tabelas de acordo com a distribuição de frequência. (MORO; PORATH; SANTOS, 2011).

Resultados e discussão

    A escola estudada está localizada no centro da cidade de Guanambi (BA), e atende alunos do 6º ao 9º ano do ensino fundamental, residentes na sede e na zona rural do município. Esta escola possui uma área ampla, contendo uma quadra (não coberta) e uma quadra de areia. A turma envolvida no processo tinha 40 alunos matriculados e era composta por alunos de ambos os sexos com idades de 14 a 19 anos. Dos 40 alunos matriculados apenas 28 compareceram no dia em que foram entregues os questionários, destes apenas 16 trouxeram os questionários e os TCLE. Sendo nove meninas e sete meninos.

    A primeira questão do instrumento refere-se à possibilidade de meninos e meninas participarem juntos das atividades recreativas. Os resultados, presentes na Tabela 1, indicam para maior aversão masculina em participar de atividades recreacionais com as meninas (contrários: 57,1% de meninos, e 33,3% das meninas).

    Estas informações corroboram com a afirmação de Foshee et al. (2008) apud Mesquita Filho et al. (2011), quando descrevem que o preconceito de gênero são mais frequentes entre os adolescentes masculinos. Contudo, a maioria dos investigados está de acordo com a participação conjunta de ambos os sexos. Esta maior aceitação participativa de ambos os sexos, indicam uma quebra do paradigma historicamente construído que diferenciam e separam o masculino do feminino, além disso, cabe ressaltar que as identidades de gênero são criadas pela sociedade e variam de cultura para cultura (PEREIRA; MOURÃO, 2005).

Tabela 01. Descrição sobre meninos e meninas brincarem juntos na opinião de alunos de uma escola municipal da cidade de Guanambi (BA)

    Ao analisar as respostas contidas na segunda pergunta, nota-se uma relevância das informações, pois, ao serem questionados sobre a preferência de cada grupo em relação à companhia nas brincadeiras realizadas na escola (Tabela 02), nota-se que a maioria dos meninos (57,1%) declarou gostar de brincar com os colegas de mesmo sexo, já a maioria das meninas (seis) declararam gostar de brincar com colegas de ambos os sexos. Esta opção dos meninos pode estar fundamentada no argumento de que meninas são frágeis e/ou não têm habilidade motora para realização dos esportes e estão mais propensas a se machucarem (FURLAN; SANTOS, 2010).

Tabela 02. Descrição sobre meninos e meninas gostarem de brincar na escola com meninos, meninas

 ou ambos os sexos na opinião de alunos de uma escola municipal da cidade de Guanambi (BA)

    Os dados obtidos mostrados na Tabela 02 requerem uma maior atenção, pois, como descreve Carvalho et al. (2010) a escola é uma instituição, onde acima de tudo adquirem-se conhecimentos, desta maneira, cabe aos professores investigarem o seu papel enquanto produtores de certos preconceitos. Sendo, as aulas de EF, na maioria das vezes, baseadas na prática corporais, deve-se tomar cuidado no sentido de impedir que o esporte se torne um ambiente de exclusão, visto que, sua realização é baseada, na maior parte, no desempenho e na habilidade (MENEZES et al. 2010).

    Desta maneira, Kunz et al. (2002) chamam a atenção para o fato de que as questões sexistas tornam-se presentes nas aulas de EF, à medida que se alimenta a ideia de que os meninos são mais fortes, mais rápidos e mais habilidosos, em contra partida as meninas são mais frágeis, mais dóceis e mais flexíveis. A perpetuação do preconceito sexista nas aulas de EF proporcionam disparidades no desempenho corporal e motor de meninas e meninos, gerando consequentemente uma maior aptidão de um sexo em relação ao outro (PEREIRA; MOURÃO, 2005).

    No entanto, na Tabela 03, a maioria dos alunos (75%) declarou gostar de brincar com pessoas de ambos os sexos fora da escola.

Tabela 03. Descrição sobre meninos e meninas gostarem de brincar fora da escola com meninos, 

meninas ou ambos os sexos na opinião de alunos de uma escola municipal da cidade de Guanambi (BA)

    Neste sentido, Abreu (1993) sugere que “meninos e meninas estejam juntos, vivenciando as experiências motoras” e que os professores “saibam conduzir os diversos problemas e contestações que surgirem por partes dos discentes”. Assim, os professores devem planejar suas aulas reforçando a interação entre meninos e meninas de forma progressiva, almejando o respeito e as limitações de cada indivíduo (CARVALHO et al., 2010).

    Na Tabela 04, os alunos descreveram quatro esportes e/ou jogos que eles acreditavam serem destinados as meninas, aos meninos e a ambos os sexos. Um dos fatos mais relevantes, foi que todos os meninos e meninas participantes neste trabalho, apontam o Futebol como esporte de menino. De acordo com D’Aquino (2005) esta escolha é decorrente da educação que rege nossa sociedade onde somos instruídos a acreditar que dança é coisa de menina e futebol é coisa de menino. Louro (1992) acrescenta que a sociedade corrompe os gestos humanos distinguindo o movimento corporal para os dois sexos, marcando e programando determinadas posturas para um ou outro sexo.

    Ainda podem-se notar na Tabela 04 diferenças apontadas pelos alunos quanto às atividades para cada sexo, pois, até mesmo as meninas apontaram atividades de baixo impacto como destinadas exclusivamente ao sexo feminino (peteca, balé).

    Confirmando, segundo Vilhena (2009, p.43), que “homens são desde a infância, incentivados a desenvolver atitudes competitivas, agressivas e a demonstrar poder pela força física”. Além disso, os dados corroboram com a pesquisa realizada por Carvalho et al. (2010), segundo o trabalho dos autores, os pesquisados relataram que as brincadeiras e danças entram como atividades tipicamente de meninas e os esportes como sendo prioritariamente dos meninos, mas, podendo ser praticados por ambos.

Tabela 04. Descrição sobre esportes e/ou jogos masculinos, feminino ou de ambos

 os sexos na opinião de alunos de uma escola municipal da cidade de Guanambi (BA)

    Os resultados apresentados pela Tabela 04 demonstram que, como sugerem Pereira e Mourão (2005), para muitos indivíduos as atividades corporais, sejam elas lúdicas ou desportivas, são diferenciadas de acordo com o sexo do praticante, sendo que as praticas esportivas (em especial o futebol) são tipicamente rotuladas como atividades masculinas.

    Mesmo os dados anteriores apontando para uma relação profunda de sexismo e intolerância, os dados da Tabela 05 apresentam para outra vertente, pois, quando questionados sobre a participação de ambos os sexos nas atividades propostas pelo professor, nota-se que a maior parte dos pesquisados (77,8% meninas e 42,8% meninos) relatou aceitar a participação de todos os colegas nas atividades propostas pelo professor.

    Estes dados contrapõem a afirmativa de Sousa e Altmann (1999) ao descrever que o fator habilidade influencia no processo de exclusão nas aulas de EF. Os dados obtidos neste trabalho demonstram que nenhum dos avaliados apresenta dificuldade em se relacionar com pessoas menos habilidosas. No entanto, cabe à escola e aos professores de EFE entender os motivos que levaram alguns alunos (25%) a apresentarem comportamento sexista, este entendimento torna-se necessário, pois, como sugerem Pereira e Mourão (2005), a escola exerce um papel importante na produção e reprodução de comportamentos segregacionistas.

Tabela 05. Descrição sobre a participação de estudantes de ambos os sexos nas atividades

 propostas pelo professor na opinião de alunos de uma escola municipal da cidade de Guanambi (BA)

    Estas informações demonstram o papel do professor como agente de combate aos preconceitos. Viana et al. (2012), relatam que a EFE possibilita o trabalho e a reflexão das questões de gênero ao levar os alunos a vivenciar práticas corporais, por se tratar de disciplina que trata da corporeidade, contribui para a interação de meninos e meninas, com o podendo intervir e estimular a reflexão e o respeito mútuo entre os sexos.

Conclusão

    Conclui-se que no grupo de meninos, durante as aulas de EF fica evidente a preferência pela prática de brincadeiras com pessoas do mesmo sexo. Em contrapartida, as meninas são mais receptivas à participação de colegas do sexo oposto. Fora do ambiente escolar a maior parte dos alunos, independente do sexo, declarou gostar de brincar com pessoas de ambos os sexos.

    Nas atividades propostas pelo professor, a maior parte dos pesquisados declarou aceitar a participação de colegas de ambos os sexos nas mesmas atividades. Entretanto, pode-se observar que entre os pesquisados o futebol foi citado como um esporte exclusivamente masculino, e atividades consideradas de baixo impacto foram indicadas como exclusivamente femininas.

    Finalmente, é importante considerar que o sexismo é uma realidade entre os alunos investigados, cabendo ao professor de Educação Física desenvolver programas que contribuam na redução do preconceito, frente ao reconhecimento da EFE como importante responsável no desenvolvimento crítico das crianças, rompendo as barreiras impostas pelas práticas sexistas.

Referências

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EFDeportes.com, Revista Digital · Año 18 · N° 182 | Buenos Aires, Julio de 2013  
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