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Conceitos e definição de Dança de Salão

Conceptos y definición de Baile de Salón

 

Mestre em Ciências Biológicas, UFPR

Especialista em Educação, IBPEX

Licenciada em Ciências Biológicas, UFPR

Maristela Zamoner

maristela.zamoner@gmail.com

(Brasil)

 

 

 

 

Resumo

          A cientificidade de uma determinada área do conhecimento se estabelece por meio de terminologia específica própria, apurada, sem ambivalências de significações, polissemias ou sinonímias. Entretanto, constata-se que a terminologia Dança de Salão é conceituada de forma confusa na literatura, imiscuindo-se com outras modalidades por falta de uma definição precisa. Tal situação vem tornando a produção científica na área passível de distorções, a unicidade na comunicação profissional falha e o ensino indeterminado. Esta pesquisa traz: uma retomada histórica focada no que caracteriza a Dança de Salão; uma proposta de definição e sua comparação com modalidades adjacentes para as quais são sugeridos conceitos.

          Unitermos: Dança de Salão. Conceito. Definição.

 

 
EFDeportes.com, Revista Digital. Buenos Aires, Año 17, Nº 172, Septiembre de 2012. http://www.efdeportes.com/

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Introdução

    Os homens criam e utilizam palavras para expressar conceitos desde os tempos mais remotos e a produção destes termos ocorre, notadamente, nas áreas científicas e técnicas (KRIEGER e FINATTO, 2004).

    Segundo Queiroz (2006), Wüster é considerado o pioneiro nos estudos terminológicos, tendo se interessado pelos problemas de imprecisão, diversificação e polissemia da linguagem, defendendo que a terminologia não deveria ser ambígua, de denominações plurivalentes e múltiplas, nem admitir termos homônimos, polissêmicos e sinônimos. Conforme a autora, Wüster estabeleceu que a terminologia deve ser concebida como matéria autônoma, os termos devem ser entendidos como unidades específicas da área em questão e sua finalidade é garantir a precisão e a unicidade da comunicação profissional.

    Zamoner (2012b), ao pesquisar as referências bibliográficas utilizadas nas produções científicas sobre Dança de Salão, constata que a conceituação desta terminologia ainda é confusa na literatura. Na mesma pesquisa a autora revela que são utilizados em referências bibliográficas textos sobre danças de outras modalidades como se fossem Dança de Salão. Para a autora, esta constatação sugere a existência de equívocos nos conceitos de Dança de Salão.

    Esta nebulosidade conceitual dificulta a consolidação da Dança de Salão como objeto de estudo científico uma vez que, segundo Santos (2003) a cientificidade de uma determinada área do conhecimento se estabelece pela utilização de instrumental teórico-metodológico, por meio de terminologia específica própria, apurada, sem ambivalências de significações, polissemias ou sinonímias.

    Entende-se que, conforme as explanações de Baramont (2010), passa a ser necessário propor uma definição para a Dança de Salão, o que vai além de conceituá-la uma vez que, ao definir, exclui-se o que não é pertinente e delimita-se seu significado.

    Desta forma, os objetivos da pesquisa são:

  1. Apresentar critérios históricos para caracterização da Dança de Salão;

  2. Propor uma definição e submetê-la à comparação com modalidades adjacentes;

  3. Sugerir conceitos para danças confundidas com Dança de Salão, a serem utilizados no âmbito profissional desta área.

    Espera-se que, em atendendo tais objetivos, haja um ponto de partida para o futuro estabelecimento deste campo do conhecimento passível de consagração como Ciência. Entretanto, conforme Perna (2011), não se objetiva fugir da idéia de gerar “um mote para novas pesquisas e não simplesmente apresentar textos como a palavra final”.

Terminologia nas diferentes áreas do conhecimento

    Nas mais diversas áreas do conhecimento humano, a padronização de nomenclaturas próprias e suas regras, é parte indispensável do processo de sistematização do saber. Diversos exemplos podem ser apresentados, sendo que, praticamente todos os seus históricos, apresentam pontos em comum:

  • O crescimento do campo do conhecimento ocorre e a dificuldade de troca de saberes se verifica pela constatação de que um mesmo termo designa conhecimentos diferentes e termos distintos são utilizados para o mesmo saber;

  • Pesquisadores notam a necessidade da propositura de conceitos exclusivos para cada saber, apresentando propostas até que se estabeleça alguma solidez conceitual ou de definição;

  • A fluidez de informações ocorre, viabilizando a unicidade da comunicação profissional, o avanço seguro da produção científica e do seu ensino.

    Desta forma, as mais diversas áreas do conhecimento desenvolvem meios particulares de padronização do uso de termos e construção de seus conceitos, estabelecendo uma nomenclatura própria. O estudo dos processos que levaram ao estabelecimento de terminologias sólidas em cada área do conhecimento pode fornecer diretrizes e caminhos para que o mesmo possa ser feito em áreas ainda novas, como da Dança de Salão.

    Um dos exemplos mais tradicionais, que mostra a necessidade de que cada saber tenha um único nome, refere-se à adoção de diferentes termos para as mesmas partes anatômicas do corpo humano. Esta realidade impedia a circulação de conhecimentos de um país para outro, considerando idiomas variados e expressões idiomáticas. Tal contexto resultou na primeira reunião de anatomistas, no ano de 1895, consecutindo na primeira Nomenclatura Anatômica – Nomina Anatômica (BUSETTI e BUSETTI, 2005). Este documento adotou o latim, língua extinta, livre do risco de sofrer variações. Desde então, realizam-se periodicamente reuniões de anatomistas, quando são inseridos novos termos e retirados termos obsoletos ou errados (VESALIUS, 2003).

    Outra situação bastante conhecida diz respeito à nomenclatura científica dos seres vivos. Em 1735, Karl von Linné, botânico e médico sueco, publica o livro "Systema Naturae", onde propõe regras visando a atribuição de nomes para animais e plantas. Na 10a edição deste livro, em 1758, Lenné apresentou uma forma de nomenclatura simplificada, segundo a qual, cada organismo receberia uma unidade nominal composta por dois nomes, seguidos e inseparáveis, estabelecendo as bases da nomenclatura binominal moderna (SOARES, 1993). As regras atuais baseadas na obra de Linné, foram firmadas no I Congresso Internacional de Nomenclatura Científica, em 1898, e revistas em 1927, em Budapeste, Hungria. Este sistema contribuiu muito para contornar o problema de que um nome vulgar designava, com certa freqüência, mais de um ser vivo, trazendo complicações para o desenvolvimento científico na área.

    Os profissionais da área do direito também fazem uso de uma terminologia específica. Segundo Nicoletti Camillo (2001), a maioria dos juristas entende que a linguagem jurídica é tradicionalmente aceita como científica ou técnica e toma como base a linguagem da lei. Para o autor, é uma linguagem cuja maioria dos termos e expressões são nitidamente técnicos, carecendo de interpretação pelos bacharéis. O autor ainda ressalta que a linguagem jurídica é científica uma vez que instrumentaliza a Ciência Dogmática do Direito, permitindo atingir o verdadeiro sentido e alcance das normas jurídicas. É uma linguagem permeada por termos técnicos (por exemplo: “homicídio privilegiado”), expressões jurídicas ou não em latim (por exemplo: habeas corpus, ipsis litteris), arcaísmos (por exemplo: pretório) entre outros (REICHMANN, 2007).

    Na área da música, a primeira proposta de nomes para as notas musicais, amplamente aceita, foi do monge italiano Guido D’Arezzo, no século XI. Ele associou as primeiras sílabas do Hino a São João Batista às notas iniciais de cada verso e as sílabas Ut, Ré, Mi, Fá, Sol e Lá passaram a servir como referenciais para os sons (FREIRE, 2008).

Dança de Salão, especificidades da terminologia

    Perna (2005) reconhece que, na realidade, a Dança de Salão também é denominada como Dança Social e a razão desta sinonímia seria o fato de que “são praticadas com objetivos claros de socialização e diversão por casais, propiciando o entretenimento de relações sociais de romance e amizade, dentre outras”. Um fator complicador é que estas razões, muito bem colocadas pelo autor, abrangem mais de um tipo de dança.

    Cada Dança de Salão tem origem técnica em territórios e culturas distintas. Por exemplo, o Samba de Gafieira, surgiu no Rio de Janeiro e disseminou-se por outros territórios e culturas mantendo suas características técnicas, sendo dançado em músicas típicas de determinado gênero musical, que, aqui, genericamente, denominamos Samba. Seu passo básico é diferente do passo básico do Bolero, do Tango, da Salsa ou qualquer outro. Entretanto, o Curinga (DEMÁRIO e ZAMONER, 1999), anteriormente denominado “dois e dois”, também estaria enquadrado como Dança de Salão, ou Dança Social, pelas razões registradas por Perna (2005). Porém, o Curinga é o mesmo passo básico dançado em uma variedade enorme de gêneros musicais, a exemplificar: Bolero, Samba, Tango, Salsa, Vaneira, entre outros. Estes conflitos conceituais também são reportados na literatura como problemáticos do ponto de vista do ensino (ZAMONER, 2005).

    As confusões ocorrem ainda entre: Danças Tradicionalistas dançadas socialmente; Danças Folclóricas; Danças Populares; Danças da Moda; Danças Esportivas; Danças Cênicas.

    Por esta razão, é necessário que estas danças, tecnicamente diferentes, recebam, cada uma delas, terminologia que as defina com exclusividade. A construção deste saber precisa ser feita uma vez que a sua falta, quando a Dança de Salão começa a figurar no campo do conhecimento científico do país, permite a ocorrência de distorções.

Discussão conceitual com base histórica

    É indispensável uma breve e objetiva retomada histórica da Dança de Salão com foco nas características necessárias para construção de sua definição exclusiva, considerando especialmente a existência de danças conceitualmente adjacentes a Dança de Salão.

Dança Folclórica e Popular

    Para Santos (2008), as Danças Folclóricas foram desenvolvidas a partir dos costumes e tradições de um povo. Ossona (1988) conceitua Danças Folclóricas como as que “tem sua origem em cerimônias de ritos tradicionais pertencentes a um estrato popular” e as Danças Populares como as “que o povo dança em toda ocasião feliz. Pela sua antiguidade, a origem destas danças é indecifrável; adotam formas e estilos próprios de cada região e não tem tradicionalmente relação com cerimônias”. A autora ainda traz o conceito de Dança Popularizada como aquela vinda dos meios aristocráticos, produzida por mestres, adotada e adaptada imediatamente pelo povo.

    As Danças Populares teriam esta denominação por serem criadas e pertencerem a um povo, considerando-o, do ponto de vista histórico e sociológico, como uma classe social anterior à Revolução Francesa, constituída por camponeses, gente do mar, operários (RIBAS, 1982). Sob este significado, as Danças Populares, hoje, precisariam ser recontextualizadas para uma nova acepção de povo, entretanto, mantendo a essência do significado.

    Perna (2005) diferencia Dança Popular de Dança Folclórica considerando que a primeira é manifestação de um momento e a segunda é tradição mantida no tempo e surgida em festas relacionadas à natureza, fatos históricos, religião ou tradição cultural transmitida através das gerações. Oliveira (1991) faz considerações importantes sobre as características que as Danças Populares e Folclóricas têm em comum:

    "...Danças Populares ou folclóricas [são] tipos específicos de danças que anonimamente caíram no domínio público e são dançadas em várias ocasiões sociais (...) Danças Populares ou folclóricas são as danças típicas, particulares de cada região ou país, que (...) por razões históricas não se universalizaram."

    Entenderemos aqui que a “universalização” de uma dança ocorre quando sua prática social atinge territórios variados, ocupados por povos culturalmente distintos. A dança produzida e universalizada massivamente pela mídia, para esta pesquisa, não é entendida como Popular, e aqui será denominada, segundo Sborquia (2002), Dança da Moda.

    É possível notar que uma característica comum à Dança Popular e Folclórica, na literatura, é a restrição geográfica. Ou seja, elas não se espalham significativamente atingindo povos culturalmente distintos, ao contrário da Dança de Salão que é praticada de forma social, sem respeitar limites geopolíticos e atingindo diferentes povos e culturas.

    Perna (2005) entende que uma Dança Popular pode tornar-se Folclórica quando perde a característica de manifestação cultural temporária, deixando de ser moda, sendo praticada não de forma social, mas, cênica, visando preservação cultural. O exemplo que o autor coloca é da Quadrilha que teria sido uma Dança Popular e atualmente configura-se como uma Dança Folclórica. O mesmo pode-se inferir sobre a Dança de Salão, que deixa de ser Popular quando se universaliza e, mesmo mantendo características técnicas que remontam suas origens, é praticada socialmente por vários povos culturalmente distintos.

    Rocha e Almeida (2007) consideram que, por exemplo, a Valsa e o Tango, tiveram origem comum em Danças Populares, que não existiam de forma hermeticamente isolada das práticas aristocráticas ao ponto de serem refinadas sob a influência de nobres. Da mesma forma no Brasil não era rígida a separação social que havia entre a Dança Erudita, associada às classes dominantes, e a Dança Popular, que acontecia em terreiros e senzalas freqüentados pelas classes subalternas (D’AMORIM, E. e ARAÚJO, D., 2003).

Dança Social

    Embora as terminologias Dança Social e Dança de Salão sejam conhecidas como sinônimas, conforme Zamoner (2005) precisam ser distinguidas exigindo-se, para cada uma, definições próprias que considerem suas diferenças. A autora lembra:

    O dois e dois, é passo que ocorre de maneira despretensiosa, sem interesse histórico, geográfico e muito menos técnico, atendendo a uma finalidade exclusivamente social, recreativa. A Dança de Salão, que preserva a origem histórica e geográfica, que preserva as características técnicas, é outra: é arte.

    Entender conceitualmente “recreação” e “arte” acaba sendo pertinente para diferenciar Dança de Salão de Dança Social.

    Waichman (1993) cita: “é comum que se entenda a recreação como âmbito das práticas sociais relacionadas diretamente com o entretenimento (o passatempo), entendido como um consumo do tempo liberado de obrigações.” Jensen (1971) propõe que recreação é “qualquer atividade em que um indivíduo participa voluntariamente e da qual ele obtém satisfação imediata e contínua”.

    A palavra “arte”, de acordo com Ximenes (1997), é a atividade de expressão estética de sensações e idéias. Para Luft (2002), é a atividade criadora, que expressa de forma estética sensações ou idéias. Há inclusive quem associe arte ao supérfluo, ao inútil (COLI, 1995). Etimologicamente, o termo é derivado de ars, artis do latim. Ars – conjunto de regras e preceitos para dizer ou fazer bem qualquer coisa – denota ofício, profissão, implica em habilidade, no sentido de ser capaz de fazer algo. Em sentido lato, “técnica” e “arte” se identificam. O vocábulo “técnica” provém do grego techné, que tem o mesmo significado de ars do latim. Techné, designa uma técnica, habilidade espontânea ou adquirida através do ensino, como também, resultado de uma criação genial ou metódica. Segundo Jaeger (1995), a palavra techné abrange significados que "não correspondem à mera rotina, mas baseiam-se em regras gerais e conhecimentos sólidos”.

    Os conceitos de recreação e de arte são distintos. Recreação aparece como desvinculada de técnica, ao contrário de arte, que chega a confundir-se com ela em sua origem etimológica. Por isto, Dança Social e Dança de Salão devem ser conceituadas diferentemente, uma vez que a primeira não se fundamenta em preceitos técnicos apurados e a segunda sim.

    Algumas considerações da literatura ainda podem ser contributivas para compreensão da necessidade cogente de distinguir estas duas formas de dança. Freitas e Barbosa (1998) entendem a Dança de Salão como uma conseqüência da mistura entre Dança Social e Popular. Portanto, não pode ser nenhuma delas. Desta forma, entendemos que, possivelmente, cada Dança de Salão iniciou sua história numa Dança Popular que foi adaptada para ser dançada socialmente em salões. Assim, confirma-se que qualquer Dança Popular pode vir a ser uma Dança de Salão, quando for dançada socialmente e tiver sua prática universalizada.

    Sobre a Dança Social, Manfredini et al. (2003) a consideram como diversão. Moreno (2004) reforça esta conclusão, acrescentando com objetividade que Dança de Salão vai muito além da recreação: é arte. Mesquita (In PERNA, 2012) traz contribuição no mesmo sentido, diferenciando Dança de Salão de Dança Social, esta última, segundo o autor, de “estilo menos técnico, como praticado em bailes de terceira idade e cerimônias como bailes de formatura e outras”.

Dança Tradicionalista

    Ainda é necessário discutir brevemente o enquadramento das danças de prática social ensinadas nos Centros de Tradição Gaúcha, os CTGs. No contexto brasileiro, é importante lembrar que, geograficamente, não ultrapassam a barreira de São Paulo nas mesmas condições que se encontram no sul do Brasil. Embora os CTGs, como tantos grupos folclóricos, encontrem-se espalhados por diferentes culturas, os bailes que tem como prática habitual estas danças estão mais restritos ao sul do Brasil ou a determinadas culturas. Zamoner (2005) considera ser muito mais fácil imaginar que em bailes no sul do Brasil seja comum dançar Samba, Soltinho e Bolero do que em bailes cariocas dançar Vaneira, Bugio ou Chamamé, danças disseminadas por CTGs. Para que possam ser consideradas como Dança de Salão, precisam:

  1. Mudar do perfil preservacionista para o conservacionista, admitindo que a prática social permita incorporação de movimentos novos e exclusão de movimentos anteriormente estabelecidos;

  2. Se universalizar ao ponto de serem praticadas habitualmente nos bailes comuns por muitos povos de diferentes culturas;

  3. Assumir características técnicas específicas asseguradoras de que a distinção entre uma dança e outra não se faça principalmente pela música e sim por passos básicos tecnicamente bem distintos.

    Sobre este último ponto, lembramos que Demário e Zamoner (1999) entendem o Curinga como passo básico de parte significativa das danças disseminadas pelos CTGs.

    Para Perna (2001), a “Dança Folclórica é uma tradição que se mantém através dos tempos e é originada por festas ligadas à (...) tradição cultural transmitida de geração a geração”. Tendo este conceito como base para leitura do estatuto da Confederação Brasileira de Tradição Gaúcha, as danças disseminadas pelos CTGs seriam Folclóricas:

    Art. 1.º - “A Confederação Brasileira da Tradição Gaúcha, denominada também pela sigla CBTG é a Entidade Maior do movimento Tradicionalista Gaúcho Brasileiro, cuja essencialidade é valorizar, organizar, defender, promover e representar as tradições e a cultura gaúcha (...)

    Art. 7.º - O Sistema Confederativo do Movimento Tradicionalista Gaúcho Brasileiro é constituído pela seguinte organização política e administrativa: (...)

  • 2.º - As entidades singulares são organizações caracterizadas como pessoas jurídicas, sociedade de pessoas físicas, de natureza sociocultural, com a finalidade de congregar um quadro social identificado e voltado a desenvolver o Movimento Tradicionalista Gaúcho, no conjunto da sociedade civil onde estão inseridas e são denominadas pelo prefixo “CTG – Centro de Tradições Gaúchas”, seguido por um sufixo de livre escolha. ” (grifo meu)

    Notamos aqui que as Danças Tradicionalistas são preservacionistas, não admitindo que sejam tecnicamente alteradas, enquanto a Dança de Salão é conservacionista, admitindo de forma sustentável, alterações que não comprometam as características técnicas que a definem.

    Aqui, sugere-se que as danças disseminadas pelos CTGs denominem-se Danças Tradicionalistas Sociais quando ocorrem em bailes e mantém-se tecnicamente engessadas em documentos que asseguram sua imutabilidade.

Dança Esportiva

    Teria havido um ponto na história, na década de 20, em que surgiram as competições envolvendo danças até então conhecidas como Dança de Salão, o que exigiu padronizações, estabelecimento de critérios de avaliação e congelamento de passos e figuras (RIED, 2002).

    A manutenção do mesmo termo, Dança de Salão, para as duas modalidades é equivocada por designar danças diferentes, como já fundamentado. Em outras áreas do conhecimento utiliza-se o princípio da prioridade, assegurando que o surgido depois deve receber nome novo (ICZN, 1999). Seguindo este princípio, já estabelecido na Ciência, e considerando as diferenças técnicas profundas entre estas danças, a dança competitiva não poderia ser denominada Dança de Salão.

    Embora o uso do termo Dança de Salão continue para designar esta nova modalidade, Toneli (2007) considera que a partir deste ponto surge o que denomina Ballroom Dancing ou Dança Esportiva, estabelecendo ser uma forma de Dança de Salão competitiva, atualmente prestes a se tornar uma modalidade olímpica. A Confederação Brasileira de Dança Esportiva a define em seu site eletrônico (s/d):

    A Dança Esportiva é a Dança de Salão Internacional, praticada em todo mundo.
É também um Esporte Olímpico reconhecido pelo Comitê Olímpico Internacional desde 1997.
Ela é um esporte olímpico, porque possui regras, passos com descrição técnica e interpretativa, distribuído em categorias de "F" a "A", de acordo com a categoria do casal participante. 

    Dentre os praticantes, há 5 milhões de atletas federados nos cinco continentes e as competições são realizadas há mais de 100 anos.

    Nota-se que características importantes da Dança de Salão são perdidas nesta nova modalidade, exigindo definitivamente outra terminologia para sua conceituação, considerando-se, aqui, Dança Esportiva a mais apropriada.

Dança Cênica

    Outro aspecto histórico decisivo para definição de Dança de Salão diz respeito ao salão propriamente dito. Em Zamoner (2012a), encontramos muitas conceituações de “salão”, mas, considerando-o lato sensu, nota-se que ele é distinto de espaços denominados “palco”.

    Retomando historicamente a Dança Cênica, notamos que não possui, em seu surgimento específico, as características que aqui atribuímos à Dança de Salão. Como vimos, cada Dança de Salão teria origem na mistura de uma Dança Popular com uma Dança Erudita ou Social. Danças que nasceram para o palco, tendo como elementos o artista e o expectador que não alternam nestes papeis, formando-se coreograficamente, diferem da Dança de Salão. Mesquita (In PERNA, 2012), também ressalta a importância desta diferenciação ficar clara para o público, praticantes e profissionais. Seu trabalho merece destaque para a finalidade da presente pesquisa, sendo mais especificamente discutido na seqüência.

    O autor refere-se a um estreitamento histórico entre salão e palco na corte francesa. Inicialmente, o texto traz que:

    Ao longo da história, as danças de salão seguiram um caminho divergente ao das Danças Cênicas, apesar de não haver distinção entre ambas no período de seu surgimento, na corte francesa. Uma época em que o espaço para o baile coincidia com o espaço cênico (...). Com o passar dos anos, o balé se volta para os palcos, como fazer artístico, enquanto as danças dos salões de baile ficam restritas àqueles espaços de manifestação da cultura popular, como lazer e entretenimento (MESQUITA, J. In PERNA, 2012).

    Prossegue seu escrito considerando o fato de que o baile pode ser entendido como um espaço cênico devido à participação ativa de seus freqüentadores que alternam nos papeis de dançarinos e de espectadores. Complementa com a veracidade do inverso em que bailarinos de Dança Cênica buscam uma atuação com a naturalidade de um baile. Segundo o autor, as danças apresentadas em teatros e as praticadas em bailes ficaram afastadas por séculos. Na seqüência, revela que ao final do século XX, mais precisamente nas últimas décadas, a base técnica da Dança de Salão sofre transposição para o palco, como criações artísticas. Lembra ainda que, no Brasil, o surgimento de escolas propicia o ensino sistematizado da Dança de Salão afetando a forma de dançar e os rituais dos bailes. Desta forma, ocorreram os “shows” de dança durante o baile que, inicialmente surgiram pelo improviso de casais e com o tempo passaram a ser coreografados. Este processo é acrescido pela constatação de que alguns destes dançarinos passaram a se interessar por modalidades de dança e atividades de ator típicas do espaço cênico, como complemento para melhoria de seu desempenho. Isto ocorreria enquanto dançarinos do palco também se interessavam pela Dança de Salão, trazendo suas vivências e influências. Desta forma, os números curtos trazidos para os bailes ganharam vulto de espetáculo artístico chegando ao palco.

    Assim, teria havido um processo denominado pelo autor de “transposição das danças de salão para o palco”. O autor tece algumas críticas a grupos que fizeram esta transposição de maneira distorcida, sem as adaptações espaciais necessárias a um palco italiano, sem desvencilhar do entretenimento de um salão, perdendo a essência da origem com características de “show para turista” ou Dança Esportiva. Apesar do reconhecimento destas falhas o autor ressalta que se estabeleceram trabalhos de excelente qualidade, reconhecidos nacional e internacionalmente, como a Mimulus Cia de Dança.

    Torna-se necessário, portanto, estabelecimento terminológico próprio:

    (...) fica até difícil denominá-la [a transposição da Dança de Salão para os palcos] pois é extremamente incoerente chamar de dança de salão o que está num outro espaço e já adquiriu uma linguagem com características bem peculiares para estar no palco como produto artístico. Acredito que uma nova denominação deva surgir, deixando clara a separação entre as danças que são praticadas no baile e as de apresentação. Mesquita (In PERNA, 2012).

    A transposição, termo muito bem empregado por Mesquita (In PERNA, 2011), da Dança de Salão para o palco, tem como conseqüência sua obrigatória transposição terminológica, que pode ser entendida como tendo ocorrido da Dança de Salão para Dança Cênica, denominação citada pelo próprio autor.

    Cabe, portanto, uma breve revisão conceitual de Dança Cênica. Segundo Siqueira (2003), a Dança Cênica implica em “treinamento, aprendizado profissional com vistas ao domínio técnico”. Marques (2006) considera que Dança Cênica “é aquela que tem finalidade prioritariamente estética, e que, por isso, implica algumas condições, entre elas, formação, profissionalização e público”. Em Siqueira (2006), encontramos que “dança cênica, especialmente, por seu caráter organizado, se estabelece como código não-verbal que, através de movimentos, gestos, e recursos como figurino, cenário e iluminação, transmite mensagens ao espectador, sem necessariamente fazer uso de palavras”.

    Retornando a Siqueira (2003), a autora entende que um espetáculo de dança “Reúne (...) pensamento e uma ou várias técnicas para transformá-lo em movimento coreografado”. No caso aqui discutido, a técnica que transforma pensamento em movimento coreografado é de Dança de Salão.

    No âmbito da Dança Cênica verificam-se ainda a existência de subdivisões. Neste sentido, Michailowsky (1956) propõe as categorias: a) dança clássica; b) dança característica: que refletiria o temperamento de um povo; c) dança estilizada: que representaria o caráter original de danças nacionais.

    Mesquita (In PERNA, 2011) reporta que críticos referem-se ao trabalho da Mimulus Cia de Dança como “Dança de Salão Contemporânea”, o que poderia configurar-se como mais uma subdivisão específica da Dança Cênica. Na mesma publicação o autor lista os veículos que registraram as críticas ao trabalho da Mimulus Cia de Dança, juntamente com seus autores: Jornal Times Union (USA), por Tresca Weinstein; Le Figaro (França), por Agnès Benoist; The New York Times (USA), por Jennifer Dunning; Susy Q, Revista de Dança (Espanha), por Adolfo Simón; Jornal Estado de Minas (Brasil), por Marcello Castilho Avellar; Jornal o Estado de São Paulo (Brasil), por Helena Katz; Jornal Hoje em Dia (Brasil), por Miguel Anunciação; Jornal Dance (Brasil), por Milton Saldanha.

    Cristovão Christianis, autor, estudioso, professor e profissional da Dança de Salão, em comunicação pessoal por transmissão eletrônica de voz no dia 17 de julho de 2012 sugere a possibilidade de referir-se a este tipo de trabalho como “Dança de Salão de Projeção”, baseado no fato de que “Dança Folclórica de Projeção” é nomenclatura utilizada por autores como Ely (2009) para referir-se ao resultado da transposição ao palco sofrida pela Dança Folclórica.

    Independente da nomenclatura adotada para subdivisão da Dança Cênica que individualiza o uso de técnicas de Dança de Salão no palco, é importante lembrar que alguns autores nomeiam especificamente determinados trabalhos de outras subdivisões da Dança Cênica, praticamente, como mais um nível de subdivisão. Neste sentido, Lara (2011) reforça que algumas técnicas levam o nome do profissional que a desenvolveu, exemplificando: “técnica Cunningham se refere a Merce Cunningham, coreógrafo norte-americano; Graham está relacionada a Martha Graham, coreógrafa também norte-americana e assim por diante”.

    Considerando que: 1 - autores batizam técnicas com os nomes de seus criadores; 2 - na esfera da Dança de Salão de Projeção há vasto registro bibliográfico sobre a expressividade do trabalho de Jomar Mesquita, em artigos e eventos científicos, livros, revistas e jornais do âmbito jornalístico nacionais e internacionais; 3 - nesta mesma esfera a crítica nacional e internacional é bem historiada e restrita ao seu trabalho; sugere-se que a técnica de Dança de Salão de Projeção estabelecida solidamente por Jomar Mesquita seja denominada Técnica Mesquita.

    Na mesma referida comunicação pessoal, Cristovão Christianis considera fundamental registrar que outros coreógrafos tiveram importância neste histórico de transposição da Dança de Salão para o palco, mesmo sem terem alcançado a organização profissional e o vulto internacional atingidos pela produção artística de Jomar Mesquita. Para Christianis estes outros trabalhos poderiam ser referenciados por nomes de técnicas específicas, exemplifica: Técnica Ramos (João Carlos Ramos), bailarino e coreógrafo referenciado também por Mesquita (In PERNA, 2011), Técnica Jesus (Carlinhos de Jesus), Técnica Arôxa (Jaime Arôxa).

    Entende-se aqui que esta questão das técnicas desenvolvidas por diferentes coreógrafos que trabalharam ou trabalham a transposição da Dança de Salão para o palco merece ser pesquisada de forma mais profunda. Fica clara a necessidade do estabelecimento de critérios que consolidem os diferentes trabalhos como técnicas próprias ou não, para que cada uma delas possa ser caracterizada com exclusividade.

    Para a definição de Dança de Salão, é indispensável ainda acrescentar às suas características o fato de não ter como objetivo o palco, a formação de espetáculos e não constituir-se dos papeis não alternáveis de artista e platéia.

Valsa a primeira Dança de Salão

    As Danças Social e Popular antecessoras da Valsa tiveram como característica a dependência entre os casais e pares não enlaçados, a exemplo do gracioso Minueto de origem francesa, e das Contradanças inglesas, não tão galantes, mas, com muitas figuras (PERNA, 2005).

    Segundo Boyle (2011), a história da primeira Dança de Salão, a Valsa, remonta a 1500. A autora escreve que existem muitas referências a uma Valsa a partir do século XVI e exemplifica citando Montaigne, filósofo francês, que escreveu sobre uma dança que teria visto no ano de 1580 em Augsburg, na qual os dançarinos se abraçavam tão próximos que seus rostos se tocavam. Para a autora os camponeses da Baviera, Tirol, e Styria começaram a dançar uma dança chamada Walzer, para casais, por volta de 1750, enquanto as classes superiores do século XVIII continuaram a dançar o Minueto. Teria ocorrido de nobres entediados freqüentarem bailes do povo, conhecendo a Walzer, dança que chocava o resto da aristocracia. Então, a passagem desta dança das festas populares aos bailes dos salões aristocráticos teria ocorrido com alterações técnicas. Os nobres modificaram os passos largos e selvagens do povo, tornando-os mais curtos, elegantes e aumentando a distância entre o casal. Em torno da década de 1780, já estabelecida tecnicamente nos salões, tornou-se moda, espalhando-se por muitos países nos anos seguintes.

    A partir desta universalização, que caracteriza seu enquadramento como Dança de Salão, oportunizou-se o contato e a mistura com Danças Populares de outras localidades. Assim teria se dado uma profusão criativa de diversas outras danças que assumiram a condição de Dança de Salão.

    Para alguns autores, a Valsa é derivada de duas danças alemãs populares, as alemandas e o lander, este último, uma dança austríaca também praticada na Baviera e Boêmia (GARCIA e HASS, 2003). Destas regiões teriam sido trazidas para Paris, que era o polo de difusão cultural da época e a partir daí, atingido diversas outras localidades, inclusive o Brasil (PERNA, 2005). Segundo o autor, é praticada até os dias de hoje em uma diversidade de eventos dançantes, nunca tendo sido considerada uma dança popular, conhecida sempre como uma dança aristocrática.

    A Valsa foi a primeira Dança de Salão em que a unidade de dança passou a ser o par enlaçado e independente (PERNA, 2005). Houve, portanto, um momento em que os casais começaram a dançar livres, sem vincularem-se a outros casais, o que trouxe a possibilidade do improviso e com ele a condição de adaptação e evolução mais rápidas. A partir deste ponto a liberdade dos casais associada às características de cada dança local favoreceu a incorporação de movimentos novos que surgiam a partir da criatividade dos dançarinos. Alguns destes movimentos novos eram copiados, disseminando-se com a dança a que se incorporavam, formando assim novas danças que, ao se universalizarem, passavam a ser Dança de Salão.

O salão universaliza, configurando a Dança de Salão

    O termo “salão” relaciona-se com a necessidade de salas amplas apropriadas para realização de evoluções das danças em eventos dançantes (PERNA, 2005).

    No momento do surgimento da Dança de Salão, marcado pela Valsa, o local em que este evento se estabeleceu, e a partir do qual se disseminou, foi o salão aristocrático de baile, que era diferente dos locais da Dança Popular. O salão, portanto, é uma das características distintivas mais antigas da Dança de Salão.

    A Valsa surgiu como Dança Popular, inicialmente era proibida nos salões aristocráticos, mas, foi a partir deles que se disseminou ganhando universalidade. Assim, percebe-se que é o “salão” que faz com que a Dança Popular, ao ser dançada socialmente, se torne uma Dança de Salão por universalizar-se.

    Os espaços populares eram freqüentados pelas classes mais baixas, compostas por pessoas que trabalhavam em determinada localidade, que não viajavam habitualmente e não freqüentavam bailes aristocráticos de regiões distintas. Desta forma, a Dança Popular acabava restrita a determinados povoados.

    Já os freqüentadores dos salões aristocráticos, que assimilavam as Danças Populares locais, trazendo-as ao salão de forma adaptada, eram de classes superiores, compostas por pessoas que podiam viajar e freqüentar bailes de outras localidades, promovendo intercâmbio de danças diferentes. Assim, a universalização da Valsa se deu a partir dos salões aristocráticos, devido a fenômenos como, por exemplo, a ampliação da sua prática dos limites da Alemanha para Paris e diversas outras localidades (PERNA, 2005).

    Para Ried (2002) os nobres se diferenciavam de várias maneiras e uma delas era pelas danças inseridas em sua educação e praticadas só pela aristocracia. A Dança Erudita, bem exemplificada pelo Minueto, conforme visto na literatura citada, era criada por mestres, fora dos salões, e ensinada aos nobres para ser, depois, praticada nos salões. Era, portanto, uma dança para o salão e não de salão. Desta forma, a Dança Erudita não se caracteriza pelo salão nem se universaliza por ele e sim por um processo sistematizado de ensino que foi parte da educação da aristocracia.

    Até hoje, um pensamento tradicional faz com que o verbete “salão de dança” remeta à imagem de um ambiente como o salão de bailes do palácio de Buckingham, em Londres, Inglaterra, do Palácio Imperial de Hofburg, em Viena ou o Salão de Baile do Palácio do Itamaraty em Brasília, no Brasil. Como discutido em Zamoner (2012a), os salões assumem novas e variadas formas na atualidade, mas, continuam sendo os locais onde Danças Populares, dançadas socialmente, estabelecem-se artística e tecnicamente, iniciando um processo de disseminação que leva a universalização.

    Lembramos aqui que a palavra “universo” admite como significado, conforme o Dicionário Digital on-line Michaellis (2009): “Um todo composto de partes, harmonicamente dispostas”. Neste contexto, “um todo” corresponde ao conjunto formado pelas “partes” que são, cada uma, um dos diferentes povos e culturas que optam por praticar “harmonicamente” a mesma dança. Portanto, cada Dança de Salão compreende uma universalização própria, caracterizada quantitativa e qualitativamente pelos povos e culturas distintos que a praticam.

    Desta forma, a palavra “salão” fica historicamente ligada ao surgimento e a definição de Dança de Salão.

Revisão de conceitos para Dança de Salão

    Na literatura, alguns autores propõem conceitos de Dança de Salão que pretendem distingui-la de outras danças, o que se revela uma tarefa de complexa execução por meio de uma breve conceituação, como veremos, exigindo a formulação de uma definição.

    Moreno (2004) traz o conceito de que “Dança de Salão é a arte de dançar em casal”, semelhante a Gonzaga (1996) que propõe ser a “arte de dançar a dois”. Reforçamos que, como arte, a Dança de Salão não pode ser folclore, nem pode estar restrita somente ao popular ou ao social.

    Zamoner (2005) propõe o conceito:

    Dança de Salão é a arte de interpretar a música através de movimentos dos corpos de um casal, quando o cavalheiro* atrai a dama a realizar esses movimentos.

    *Há que se lembrar, conduções de damas, no papel de damas, figuraram como uma realidade que não se propagou.

    Este conceito abrange a dança em casal, a condução e a música. Excluindo a Dança Social que não é arte e sim recreação e a Esportiva que é um esporte. Entretanto, não distingue indiscutivelmente de Dança Cênica, Tradicionalista, Folclórica e Popular que, conforme o ponto de vista, podem ser entendidas como compatíveis com este conceito.

    Nota-se que nenhum dos conceitos propostos na literatura permitem uma definição exclusiva de Dança de Salão.

Critérios para a definição de Dança de Salão

    A revisão apresentada permite que se elenquem características da Dança de Salão, indispensáveis para sua definição:

  1. A unidade básica da dança é um par independente de outros;

  2. O par é sempre composto por uma dama e um cavalheiro, o que independe do sexo de quem os interpreta (Zamoner, 2011);

  3. As movimentações são improvisadas conforme a criatividade do par, em resposta à música;

  4. Há condução durante toda a dança, mesmo nos momentos em que o par se solta, tradicionalmente feita pelo cavalheiro e seguida pela dama;

  5. Movimentos podem ser incorporados ou deixar de ser feitos, promovendo evolução;

  6. Cada uma de suas danças, conforme sua origem, tem características técnicas e artísticas exclusivas que não se perdem em sua evolução conservacionista;

  7. Sobrevivem e propagam-se em eventos sociais;

  8. Tem caráter desvinculado de prática competitiva;

  9. Se universalizam em práticas sociais (salões) sem restringirem-se a um povo, uma cultura ou limite geopolítico;

  10. Os papéis de dançarino e de quem o assiste alternam-se em sua prática.

    Enquadram-se nestes critérios: Samba de Gafieira, Bolero Carioca, Tango, Valsa, Swing, Zouk, Merengue, Salsa, entre outras.

    As danças que geram dúvidas neste âmbito, por não se enquadrarem nos 10 critérios elencados, podem se configurar como exceções, precisando ser estudadas individualmente para admitirem-se, ou não, como Dança de Salão. Um exemplo é a Roda de Cassino, forma alternativa de dançar a Salsa, em que cada casal é dependente dos demais. Esta dança não atende ao critério, para ser considerada como Dança de Salão, de que cada par seja independente, podendo ser entendida como uma exceção.

Proposta para definição de Dança de Salão

    Desta forma, esta pesquisa propõe que se atenda a estes 10 critérios para que uma dança seja definida como Dança de Salão. Propõe-se, então, a definição:

Dança de Salão é a arte conservacionista que se universaliza em práticas sociais, não cênicas, nem esportivas, consistindo na interpretação improvisada da música através dos movimentos dos corpos de um casal independente, quando o cavalheiro conduz a dama.

    A terminologia Dança de Salão, no singular, foi consagrada pelo uso, abrigando, sob seu significado, as várias danças que se enquadram na definição proposta. Por esta razão, sugere-se que se utilize, no âmbito científico, profissional e educacional, a terminologia Dança de Salão para designar individualmente cada uma das danças que se enquadram na definição proposta e o seu conjunto.

    É importante lembrar ainda que alterar para o plural implicaria em ampliar as confusões conceituais já constatadas, uma vez que até mesmo na Fundação Biblioteca Nacional, Agência Brasileira do ISBN, a categoria de assunto desta área é denominada Dança de Salão, no singular. Os autores mais citados da área fazem uso do termo no singular, como pode ser constatado em Zamoner (2012b).

    Na sua escrita, por entender-se como um nome próprio, é adequado ainda o uso de letras maiúsculas.

Glossário sugerido

    Para os estudos, abordagens profissionais e ensino da Dança de Salão sugere-se, a partir da definição construída nesta pesquisa, o uso do glossário que segue.

  • Dança de Salão – é a arte conservacionista que se universaliza em práticas sociais, não cênicas, nem esportivas, consistindo na interpretação improvisada da música através dos movimentos dos corpos de um casal independente, quando o cavalheiro conduz a dama.

    • Exemplos: Samba de Gafieira, Bolero Carioca, Tango, Lambada, Swing (Soltinho).

  • Dança Social – é a dança recreativa de prática social, não cênica, nem competitiva, sem natureza artística, desprovida de técnica elaborada ligada a sua origem, que se universaliza e consiste em movimentos dos corpos de um casal independente, sob a condução do cavalheiro.

    • Exemplo: Curinga.

  • Dança Erudita – é a dança recreativa, não cênica, nem competitiva, com formação de pares não enlaçados que dançam de forma dependente uns dos outros, criada por mestres e ensinada aos nobres, antes dos bailes, para ser praticada em salões aristocráticos antigos. Portanto, trata-se de dança criada para o salão e não dança surgida de salão.

    • Exemplo: Minueto, Gavota.

  • Dança Folclórica – é dança preservacionista derivada de Dança Popular que deixou de ter prática social. Em geral é dançada com o uso de trajes típicos.

    • Exemplo: Tarantela, italiana.

  • Dança Popular – é uma manifestação cultural de um povo, mantida por prática social, passível de evolução, que não se universaliza, não é competitiva nem cênica. Não é dançada necessariamente com trajes típicos.

    • Exemplos: Cueca, no Chile, Frevo, no Brasil, ambas danças ainda praticadas; Waltzer, dançada popularmente por volta do século XV em algumas regiões como a periferia de Viena, era mais grosseira que a Valsa, entretanto, deu origem a ela quando adaptada para os salões aristocráticos.

  • Dança Popularizada – é a dança vinda dos meios aristocráticos, produzida por mestres, adotada e adaptada imediatamente pelo povo.

    • Exemplos (segundo Ossona, 1988): Polcas e Mazurcas.

  • Discoteca – é a dança em que não se formam pares enlaçados, cada indivíduo movimenta-se aleatoriamente, balançando o corpo, pode-se dançar sozinho, um de frente para o outro ou formando círculos de variados tamanhos. Segundo Perna (2005), consiste “em dançar separado da parceira, sacudindo e balançando, com rebolados e amplos movimentos, além de muitas caras e bocas”.

    • Exemplo: dança da discoteca

  • Dança Esportiva – dança de caráter competitivo, enquadrada como modalidade olímpica.

    • Exemplo: Slow-waltz, quick-step.

  • Dança Cênica – é a dança que implica em treinamento profissional, é coreografada a partir de uma ou mais técnicas e faz uso de recursos como figurino, cenário e iluminação.

  • Dança de Salão de Projeção – termo sugerido por Cristovão Christianis para designar a subdivisão da Dança Cênica resultante da transposição da Dança de Salão para o palco.

    • Exemplo: dança difundida pela Mimulus Cia de Dança, para a qual se sugere a denominação específica de Técnica Mesquita, referenciando seu criador Jomar Mesquita.

  • Dança Tradicionalista Social - é dança preservacionista de prática social, não cênica, nem competitiva. Pode ser dançada socialmente com trajes típicos.

    • Exemplo: Danças Gaúchas disseminadas pelos CTGs.

  • Dança da Moda – dança que se universaliza por mecanismos midiáticos.

    • Exemplos: Macarena, Axé.

Comparativos

    Abaixo se apresenta o Quadro 1, que parte da definição de Dança de Salão proposta, para comparação com algumas danças adjacentes, que são confundidas com ela na literatura e em sua prática.

Quadro 1. Comparativo de características da Dança de Salão em relação a danças com ela confundidas

Fonte. Pesquisa bibliográfica, propostas de conceitos e definição de Dança de Salão, da autora

Considerações finais

    Espera-se, com os resultados desta pesquisa, iniciar uma discussão que leve a consolidação de uma definição de Dança de Salão exclusiva, em especial, no contexto brasileiro.

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Site consultado

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Agradecimentos

  • Cristovão Christianis pela colaboração na revisão conteudística do artigo e sua discussão, trazendo contribuições preciosas sobre as denominações envolvendo a transposição da Dança de Salão para o palco.

  • Deni Lineu Schwartz Filho, pela sugestão de desenvolver esta pesquisa.

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