Judô infantil: existe uma idade ideal para começar a competir?

Judo child: is there an ideal age to start for the run?

Judo infantil. ¿Existe una edad ideal para competir?

 

Walter Reyes Boehl*

neco-boehl@hotmail.com

Denis Foster Gondim**

foster.denis@hotmail.com

Leonardo da Silva Lima***

leo.lm@hotmail.com

 

*Graduação em Licenciatura Educação Física, UFRGS

Graduação em Bacharelado Comunicação Social - Jornalismo, PUCRS

**Graduação em Licenciatura Plena em Educação Física pela ESEF/UPE

Mestrando do Programa de Pós-Graduação em Educação, UFPE

***Graduação em Licenciatura Educação Física, UFRGS

Especializando em Psicologia Educacional, IERGS/Uniasselvi

(Brasil)

 

Recepção: 15/01/2018 - Aceitação: 27/06/2018

1ª Revisão: 26/06/2018 - 2ª Revisão: 26/06/2018

 

Resumo

    O judô, mesmo que seja pedagogicamente um dos melhores esportes para crianças, quando mal utilizado, pode gerar alguns riscos para a sua formação. Infantes têm sido submetidos à especialização esportiva muito cedo com o objetivo de torná-los campeões. Esta pesquisa tem como escopo identificar qual a idade ideal, através da visão de professores que atuam como técnicos/treinadores e professores, para que os alunos possam ser iniciados no processo competição esportivos em eventos oficiais ou não oficiais (escolares). Analisamos se a possibilidade de especialização precoce está ocorrendo com alunos de turmas iniciais. Para tal, observou-se se ao aprender algumas técnicas (amortecer queda e derrubar), a criança encontra-se apta a participar de competições.Verificamos qual a finalidade, quando utilizada, da técnica de preferência (tokui-waza) nas aulas de iniciação. Na metodologia, foram utilizados questionários estruturados, compostos por 5 questões, constituídos da idade mínima para competir em eventos federativos ou escolares. Sobre a relação de aprendizagem de técnicas e o competir. Sobre metodologias pedagógicas de ensino/aprendizagem e o treinamento da técnica de preferência do aluno. A amostra da pesquisa é composta por professores de judô, faixas-pretas. Foram feitas análises de editais de torneios/competições expedidos por órgãos promotores de eventos de judô, observando a idade mínima ofertada para o referido evento. Por fim, tratamos de apresentar perspectivas em relação ao processo de ensino e aprendizagem e suas implicações na formação da criança.

    Unitermos: Iniciação esportiva. Judô. Especialização esportiva precoce.

 

Abstract

    Judo, even if it is pedagogically one of the best sports for children, when misused, can create some risks for its formation. Infants have been subjected to very early sports specialization with the aim of making them champions. This research aims to identify the ideal age, through the vision of teachers who act as coaches/coaches and teachers, so that students can be initiated in the process of sports competition in official or unofficial (school) events. We analyze if the possibility of early specialization is occurring with students from initial classes. For this, it was observed that when learning some techniques (cushion fall and overturn), the child is able to participate in competitions. We verify the purpose, when used, of the technique of preference (tokui-waza) in the initiation classes. In the methodology, we used structured questionnaires, composed of 5 questions, consisting of the minimum age to compete in federal or school events. About learning relationship of techniques and racing. On pedagogical methodologies of teaching/learning and the training of technique of preference of the student. The research sample is composed of judo teachers, black belts. There were analyzes of the notices of tournaments/competitions issued by judo event organizers, observing the minimum age offered for that event. Finally, we try to present perspectives regarding the teaching and learning process and its implications in the formation of the child.

    Keywords: Ages to begin sporting practices. Judo. Early sports specialization.

 

Resumen

    El judo, aunque sea pedagógicamente uno de los mejores deportes para niños, cuando se utiliza mal, puede generar algunos riesgos en la formación. Muchos niños y niñas han sido sometidos a la especialización deportiva precoz con el objetivo de transformarlos en campeones. Esta investigación tiene como objetivo identificar cuál es la edad ideal, a través de la visión de profesores que actúan como técnicos/entrenadores y profesores, para que los alumnos puedan ser iniciados en el proceso competitivo deportivo en eventos oficiales o no oficiales (escolar). Se analizó si la posibilidad de especialización precoz se está llevando a cabo con alumnos de clases de iniciación. Para ello, se observó si al aprender algunas técnicas (amortiguar caída y derribar), el niño se encuentra apto para participar en competencias. Verificamos cuál es la finalidad, cuándo se utiliza, cuál es la técnica preferida (tokui-waza) en las clases de iniciación. En cuanto a la metodología, se utilizaron cuestionarios estructurados, compuestos por 5 preguntas, constituidos por la edad mínima para competir en eventos federativos o escolares; sobre la relación de aprendizaje de técnicas y el competir; sobre las metodologías pedagógicas de enseñanza/aprendizaje y el entrenamiento de la técnica de preferencia del alumno. La muestra de la investigación estuvo compuesta por profesores de judo, cinturón negro. Se realizaron análisis de convocatorias a torneos/competiciones organizados por organismos promotores de eventos de judo, observando la edad mínima permitida para dicho evento. Por último, tratamos de presentar perspectivas en relación al proceso de enseñanza y aprendizaje y sus implicancias en la formación del niño y la niña.

    Palabras clave: Iniciación deportiva. Judo. Especialización deportiva precoz.

 

Lecturas: Educación Física y Deportes, Vol. 23, Núm. 241, Jun. (2018)


 

Introdução

 

    O judô é um dos esportes mais praticados em solo brasileiro, sendo um dos mais vitoriosos, com 22 medalhas, atrás apenas do vôlei (quadra e praia) com 23, em conquistas nos Jogos Olímpicos da era moderna (Boehl, 2016). A sua visibilidade tem aumentado nos meios de comunicação, ocupando espaço considerável. Isso faz que se torne um esporte muito popular, sendo bastante praticado nos clubes, nas academias, nas associações ou nos meios escolares. Conforme a Confederação Brasileira de Judô (CBJ, 2015), no Brasil, são cerca de dois milhões de praticantes, sendo aproximadamente 200 mil competidores federados. Dados que demonstram a sua magnitude enquanto prática esportiva e educacional. Entretanto, com o crescente número de competições e de participantes, pode se notar um incremento de público competidor com idade cada vez menor. Assim, professores têm se preocupado mais com a questão da vitória/medalhas, do que no processo de formação motora, cognitiva e social da criança.

 

    A competição, de acordo com Vargas Neto e Voser (2001), é um elemento intrínseco à raça humana. Eles sugerem que o simples querer alcançar, buscar, lutar por objetivos faz parte do competir do homem. Os autores crêem que são inúmeros benefícios que o esporte e a competição possibilitam. Porém, alertam que em muitos casos estes são deturpados quando a sua prática visa prestígio social ou quando seus rumos são alterados pelas influências políticas, econômicas e culturais. Com essas atitudes, alguns desses docentes acabam especializando precocemente o seu aluno.

 

    No judô, a iniciação acontece na terceira infância, ou seja, por volta dos 07 aos 10/11 anos de idade (Franchini, 1998). A ideia do período ideal de aprendizagem baseia-se no conceito de que certos momentos, durante o crescimento e desenvolvimento, são ótimos para influenciar a aprendizagem de um determinado tipo de comportamento. É, portanto, aquela fase em que a maturação das estruturas neuromotoras atingiu as capacidades mínimas imprescindíveis para a aprendizagem de definidas habilidades. Antes disso, as tentativas resultam de precária aprendizagem, enquanto que, após esse período, diversos fatores atuam no sentido de torná-las com déficit motor (Lima, 1989).

 

    De acordo com Gallahue (2013), a fase de desenvolvimento das habilidades motoras especializadas exibe três etapas: Estágio de transição (aprender a treinar), marcado pelas primeiras tentativas de refinamento e associar habilidades de movimento maduro. No momento do aprender a treinar, futuros atletas aprendem como treinar para obter melhor habilidade e performance. Para a maioria das crianças de 8 a 12 anos, este é um período crítico, durante o qual as habilidades de movimento fundamental maduro são refinadas e aplicadas aos esportes e jogos da cultura. Estágio de aplicação (treinar a treinar) durante este, o indivíduo torna-se mais consciente de seus dotes e limitações físicas pessoais e, assim, dirige seu foco para determinados tipos de esportes, tanto em ambientes competitivos quanto recreacionais. A ênfase está em aprimorar a proficiência. Gallahue (2013) enfatiza que o estágio de aplicação ao longo da vida (treinar para competir/participar). No estágio de aplicação ao longo da vida (treinar para competir/participar) os indivíduos geralmente reduzem o alcance de suas buscas atléticas pela escolha de algumas atividades para se engajar regularmente em situações competitivas, recreativas ou do dia-a-dia.

 

    Para Vargas Neto e Voser (2001), a especialização precoce acarreta diretamente quatro tipos de riscos para a saúde da criança. O primeiro, os riscos de tipo físico, no qual se detecta problemas ósseos, articulares, musculares e cardíacos. Pode ser que, no judô, como o número de repetições (uchi-komi) é enorme, nem sempre o local onde se faz a queda é apropriado para o amortecimento. O segundo, os riscos de tipo psicológico, em que, em crianças competidoras foram encontrados níveis anormalmente altos de ansiedade, estresse e frustração. O terceiro, riscos de tipo motriz, caracterizado pelo pobre repertório motor, focalizado apenas nos gestos técnicos do judô. Por fim, riscos de tipo esportivo, com a prática esportiva precoce se produz uma iniciação/especialização às cegas, pois é muito difícil conhecer com exatidão as características do futuro atleta de elite quando este ainda é muito pequeno. Pode ser que esteja ocorrendo uma iniciação/especialização da criança para uma prática esportiva para a qual ela não tem as mínimas condições especiais exigidas (Vargas Neto; Voser, 2001).

 

    Conforme Santos, Melo & Pires-Neto (1993), não é raro que o iniciante se interesse mais por uma técnica do que as outras. Assim, possivelmente, este venha adotá-la como sua técnica preferida, isto é, o tokui-waza. No entanto, as possibilidades de influência direta do professor na eleição por seus alunos do tokui-waza, conforme Santos et al. (1993), é comum. Determinar o tokui-waza, antes que as epífises ósseas estejam consolidadas, não é interessante.Sobretudo, se estas técnicas forem predominantemente de utilização de força (Santos, 2007).

 

    O benefício que um esporte de combate pode trazer para um infante passa a ser nulo no momento que professores/pais, julgam existir aptidão para as lutas, o insere em treinamentos de forma sistemática e intensa com a proposta de torná-lo um campeão. Para Vargas Neto e Voser (2001), programas de treinamentos sistematizados tomam conta do lugar onde deveria ser através da ludicidade. Com o crescimento dos programas de esportes juvenis, inúmeras crianças buscam a prática em clubes, colégios e escolas especializadas. Dentro deste ambiente, é possível perceber que os eventos esportivos, as competições e os treinamentos direcionados às crianças são estruturados com base nos modelos de competições de adultos (Vargas Neto; Voser, 2001).

 

    Conforme Rubio, Kuroda, Marques, Montoro & Queiroz (2000), as crianças são apresentadas e inseridas prematuramente na triste realidade do mundo dos adultos, em que o prazer do lúdico cede lugar à competência e à performance, a recreação transforma-se em competição. A especialização precoce é apontada como um grande risco do esporte competitivo durante a iniciação esportiva. A busca incessante pelo prestígio conduz professores e familiares a exporem as crianças a situações de grande exigência e tensão, de treinamentos intensivos e precoces em busca de altos rendimentos (Gabarra, Rubio e Ângelo, 2009).

 

    A iniciação esportiva no Brasil ocorre em diferentes ambientes, na educação formal e não formal. Na primeira, a escola em especial, pela disciplina de Educação Física, inclui o esporte entre os seus conteúdos. Portanto, o esporte é desenvolvido em diferentes níveis de ensino. Com relação anão formal, temos como referência a promoção de iniciação esportiva em clubes (Paes, 2006).

 

    A especialização esportiva, em contrapartida, é o período em que se adotam programas e métodos de treinamento especializados. É quando a criança faz, sistematicamente, um tipo de esporte, cujas aulas não são diversificadas, envolvendo ainda competições regulares, destinadas ao aprimoramento técnico dos fundamentos, assim como do conhecimento tático e o desenvolvimento das capacidades físicas direcionadas ao desempenho esportivo (Whitehead apud Fechio, Cichowicz, Castro & Alves, 2012).

 

    Muitos professores, na ânsia de obter resultados imediatos de seus pequenos alunos nos campeonatos mirins e infantis, não se atenta, para esse processo hierárquico de aprendizagem motora, promovendo a especialização precoce (Lima, 1989). Lima (1989) observa que esta atitude no ensino do judô resulta em limitação no desempenho técnico do futuro atleta em razão das lacunas que ficaram na composição do repertório das habilidades motoras básicas e da especialização inadequada (defeitos) das técnicas. Isto poderá dificultar o aprimoramento necessário ao judô de alto nível.

 

    O presente estudo tem como escopo verificar qual a idade ideal para as crianças praticantes de judô iniciar suas participações em eventos competitivos. Analisar se o aprendizado de algumas técnicas as torna aptas a competirem em torneios. Observar se a relação do treinamento do tokui-waza1 estaria conexa à especialização esportiva precoce, a melhora do gestual técnico ou se não há semelhança com os anteriores.

 

Métodos e procedimentos

 

    A amostra foi constituída por 23 professores de judô, faixas-pretas, graduação mínima shodan, homens, sendo 11 graduados em educação física, 2 cursando o bacharelado em educação física e 10 sem formação superior na área, todos trabalham com crianças, em clubes, academias, escolas ou projetos sociais, no Rio Grande do Sul. A coleta foi realizada no mês de outubro de 2014. Todos concordaram em responder ao questionário e foram lhes apresentados o Termo de Consentimento Livre e Esclarecido para participar da pesquisa.

 

    Ao grupo foi enviado, por e-mail, o questionário, no qual, havendo sua concordância e consentimento, deveriam preencher, além dos dados identificatórios, a quantidade de alunos por turmas, idade do mais novo, tempo de prática de judô e tempo de atuação como professor de judô. Precisariam responder a cinco (05) perguntas fechadas: qual a idade (em anos) mínima para que seu aluno comece a competir em eventos oficiais? Qual a idade (em anos) mínima para que seu aluno comece a competir em eventos escolares[2] ou não oficiais? Para você, a criança na iniciação do judô, ao aprender algumas técnicas (amortecer e derrubar, por exemplo), já está apta a competir? Sim ou não. Treinar o tokui-waza serve para: Especializar em uma técnica vitoriosa em competições; Melhorar a técnica que a criança mais gosta de realizar; É necessário, pois faz parte do processo pedagógico de ensino; Não costumo treinar tokui-waza com crianças na iniciação; Nenhuma das anteriores. Em uma turma de iniciação para crianças, você considera melhor: Ensinar o gesto técnico, aperfeiçoamento da técnica; Os jogos e brincadeiras; Deve haver jogos, brincadeiras, o ensino das técnicas sem preocupação com a perfeição da mesma; Nenhuma das anteriores.

 

    Através dos editais de eventos competitivos de federações e de entidades, promovidos pela Federação Gaúcha de Judô (FGJ), Liga Riograndense de Judô (LRSJ), Segunda Delegacia Regional de Judô (2ª DRJ), Confederação Brasileira de Judô (CBJ), VI Copa Rudder e torneios escolares em Porto Alegre/RS, entre os anos de 2013 e 2015, foi feita a análise das classes de idade, objetivando identificar a partir de que idade estas entidades oferecem a competição. Procurou-se traduzir como os professores estão lidando com seus alunos nestas situações. Este estudo pretende demonstrar quais são os tipos de formações e quais os aprendizados que estão sendo praticados nas turmas de iniciação. Verificar se a especialização precoce ocorre, quais são os riscos em potencial para a criança inserida neste meio. Se a especialização de gestos técnicos e a massificação do tokui-waza podem ser um malefício ao limitar o repertório motor.

 

Resultados e discussão

 

    Com relação ao tempo de exercício na função de docência de judô, a média dos 23 docentes ficou em 17, 30 anos ± 9, 66 anos. Quanto ao tempo de prática de judô, os professores apresentaram uma média de 31, 04 anos ± 9, 37 anos. Quando perguntados a sua situação em relação à graduação superior em educação física, dos entrevistados, 11 (47, 82%) disseram ser formados, 10 (43, 47%) afirmaram não ser e 02 (8, 69%) estarem cursando.

 

    No questionário, o professor apontou a idade do seu aluno mais novo, resultando na média de idade dos alunos mais novos das turmas em 5, 47 anos ± 2, 69 anos. Sobre o número de alunos da turma, média apresentada foi de 26, 34 ± 15, 58. Os professores apontaram uma média de idade para iniciar a competir em eventos oficiais de 8, 34 anos ± 2, 03 anos.

 

Gráfico 1. Idade em eventos oficiais

 

    Em não oficiais, eventos por escolas, clubes e associações não chancelados por federações ou ligas, observou-se que a média deidade é 6, 47 anos ± 1, 80 anos.

 

Gráfico 2. Idade em eventos não oficiais

 

    Não há conhecimento de estudos empíricos de referência que possam definir a “idade ótima" de iniciação à especialização esportiva numa modalidade (Milistetd, Mesquita, Do Nascimento & De Sousa Sobrinho, 2010). O que a literatura tem apontado é que não há uma idade considerada “ideal” ou “melhor” para as crianças começarem a competir no esporte, o que dependerá exclusivamente do indivíduo e do esporte praticado (Barbanti, 2005).

 

    Diversos autores recomendam que a participação em competições esportivas organizadas não se inicie antes dos 11 e 12 anos, ou até mais tarde. Nessas idades as crianças estariam preparadas para as exigências das competições: do ponto de vista das técnicas e habilidades, da compreensão das relações sociais, de experimentar o sucesso ou o insucesso (Marques; Oliveira, 2002). Diante disso, não há como definir se os professores estão iniciando precocemente os seus alunos em competição, contudo, há a necessidade de ampliar os estudos a cerca desse fenômeno para que aumente a segurança das crianças em relação a riscos físicos e psicológicos.

 

    Questionados se os seus alunos, ao aprenderem técnicas de fundamentos básicos do judô, como o derrubar e o amortecer, estariam aptos a competir esportivamente, sem relação de caráter oficial ou não, o resultado foi de 18 (78%) professores declararam que não; enquanto, outros 05 (22%) disseram que sim.

 

Gráfico 3. Aptidão para competir

 

    Segundo Darido e Farinha (1995) citando Bailey, médicos, fisioterapeutas e especialistas em desenvolvimento da criança desaprovam competições para crianças, apesar de reconhecerem o valor do esporte, porque a especialização infantil, no que concerne à competição precoce, pode causar danos, pois as demandas podem ser tão intensas que levariam a um efeito adverso ao crescimento e desenvolvimento. Nesse sentido, os pesquisados demonstraram precaução na inserção de seus alunos no âmbito competitivo desportivo. Demonstram que o aluno ao aprender somente tarefas fundamentais do esporte não os habilita ao meio competitivo.

 

    Em relação ao treinamento de tokui-waza (técnica preferida), 13 (57%) dos docentes responderam que não têm o hábito de treinar com iniciantes. 04 (17%) alegaram a melhoria da técnica. 04 (17%) dos professores acham necessário, pois faz parte do processo pedagógico de ensino; 02 (9%) professores não encontraram a resposta nas alternativas apresentadas. Nenhum (0%) dos docentes disse adotar o treinamento da técnica de preferência para especializar.

 

Gráfico 4. Treino de Tokui-Waza

 

    Conforme Darido e Farinha (1995) citando Bailey, as repetições excessivas de um mesmo gesto técnico podem causar traumas em alguma parte do corpo da criança. Diante disso, observa-se que os docentes coadunam com os pensamentos expostos na literatura científica, demonstrando que possuem uma preocupação muito mais voltada para um desenvolvimento lúdico do que uma formação atlética.

 

    Ao que consideram mais importante ensinar nas turmas iniciais, 18 (78%) responderam priorizar os jogos, as brincadeiras e o ensino das técnicas sem preocupação com a perfeição. O ensinar o gesto técnico, aperfeiçoamento da técnica, foi para 04 (18%) docentes e os jogos e as brincadeiras foi apontado por 01 (4%) professor. Conforme dos Santos e Sanchis (2015), os jogos e as brincadeiras favorecem o desenvolvimento da autoconfiança, a livre expressão corporal e a disciplina. Há uma necessidade que haja participação em atividades, brincadeiras e jogos do mundo infantil, indispensáveis para o desenvolvimento da personalidade na infância. Os achados nessa pesquisa vão ao encontro das premissas desses autores.

 

Gráfico 5. Prioridades no processo ensino-aprendizagem

 

    Nos editais, foi possível observar que a Confederação Brasileira de Judô (CBJ) patrocina competições somente a partir da classe sub-13 para crianças com idade entre 10 e 12 anos. No Rio Grande do Sul, a Liga Riograndense de Judô (LRSJ) promove eventos competitivos a partir da classe sub-7, ou seja, abrangendo crianças dos 4 ao 6 anos de idade. Diferentemente, a Federação Gaúcha de Judô (FGJ), em seus editais de competições, usa a nomenclatura “mirim” para crianças de 6 a 8 anos. Contudo, nem todas as competições da FGJ contemplam essa classe. Porém, há vinculado a essa entidade o “judô escolar”, a qual esse apresenta a classe pré-mirim 2, que é para infantes de 3 a 5 anosa Segunda Delegacia Regional de Judô (2ª DRJ) entidade também vinculada à FGJ até bem pouco tempo realizava eventos com a participação de judocas a partir da classe pré-mirim, 4 a 6 anos. A VI Copa Rudder de Judô, em seu edital, consta a participação da classe kids para judocas de 4 a 6 anos. Diante disso, podemos inferir que a CBJ não estimula a iniciação desportiva competitiva cedo, sendo que a as instituições oficiais, LRSJ, a FGJ, a 2ª DRJ, no período estudado, apresenta uma iniciação competitiva para idades inferiores aos 10 anos. Nesse contexto, as competições não oficiais também contemplam categorias para menores dessa idade.

 

Conclusão

 

    Não foi possível determinar uma idade ideal para que a criança seja inserida em competições desportivas. Constata-se que os professores apontaram entre 8 e 9 anos a idade que costumam colocar os seus alunos nos eventos oficiais e de 6 anos para os não oficiais. Por outro lado, a CBJ organiza e chancela eventos a partir do sub 13, o qual engloba crianças com mais de 10 e menos de 13 anos. A FGJ, no período observado, apresenta a classe mirim, de 4 a 6 anos; no entanto, a maioria das suas competições é a partir do infantil (8 a 10 anos). A 2ª DRJ também oferecia a pré-mirim e hoje oportuniza apenas a contar do infantil (8 a 10 anos). Contudo, a LRSJ realiza competições da classe sub-7 (4 a 6 anos) em diante. Portanto, não há uma homogeneidade entre as instituições, o que podemos inferir que os professores de judô coadunam com o pensamento da FGJ e da 2ª DRJ, onde a idade ideal seria entre 8 e 9 anos. Contudo, a CBJ indica o início em competição entre 10 e 12 anos, o que corrobora com o pensar dos estudiosos da área.

 

    Nas competições não oficiais, há eventos para 3 a 5 anos, indicando a idade aquém do que demonstraram os professores na pesquisa em tela. Os entrevistados não crêem que as crianças, ao aprenderem algumas técnicas iniciais, estejam aptas a entrarem em um torneio. Com esses dados pode ser interpretados que os docentes não estão preocupados com a busca incessante pelo prestígio da vitória. Estes procuram qualidade de desenvolvimento e melhor formação para antes de competir.

 

    Através das respostas é possível interpretar que a maioria não treina tokui-waza com seus aprendizes por não achá-lo essencial na fase inicial, priorizando o desenvolvimento motor amplo. Contudo, outros crêem necessário refinar a técnica do iniciante, o que pode caracterizar empobrecimento da bagagem motora da criança se outros aspectos forem negligenciados. Alguns pensam ser necessário, pois faz parte do sistema pedagógico de ensino do judô.

 

    Quando a maioria indica que em turma de iniciação, deve haver jogos, brincadeiras, o ensino das técnicas sem preocupação com a perfeição da mesma, entende-se que a preocupação está mais no desenvolvimento da criança do que na competição em si. Da nossa percepção que a especialização precoce não ocorra nesse momento, pois apenas quatro docentes disseram que o foco está mais no gestual e no refinamento das técnicas.

 

Notas

  1. Técnica de preferência ou golpe preferencial.

  2. Eventos escolares é uma denominação a torneios de caráter não oficial que um grupo de professores de judô, filiados à época à Federação Gaúcha de Judô do Sul, adotou. No período da pesquisa, esses torneios não faziam parte da estrutura da entidade federativa, contudo, a mesma supervisionava e cedia parte de estrutura e pessoal.

Referências

 

    Barbanti, V. J. (2005). Formação de esportistas. São Paulo: Editora Manole Ltda.

 

    Boehl, W. R. (2016). O desenvolvimento do judô no litoral norte do Rio Grande do Sul: da década de 1960 à década de 2010. 95 f. Trabalho de conclusão de curso (Graduação) - Escola de Educação Física, Fisioterapia e Dança, UFRGS, Porto Alegre

 

    CBJ Brasil: http://www.cbj.com.br/noticias/3707/engrenagem-do-judo-alavanca-desenvolvimento-da-modalidade-no-brasil.html acessado em 20 de maio de 2015.

 

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Lecturas: Educación Física y Deportes, Vol. 23, Núm. 241, Jun. (2018)