Práticas de esporte e lazer nas políticas públicas da cidade de Aracaju

Sport and leisure practices in public policy in Aracaju city

Prácticas de deporte y recreación en las políticas públicas de la ciudad de Aracaju

 

Caroline Martins Ferreira*

fmartins.carol@gmail.com

Romário Santos Carvalho*

rs.carvalho@yahoo.com.br

Profa. Dra. Núbia Josania Paes de Lira**

nubiapaesdelira@yahoo.com.br

 

*Graduada/o em Educação Física Licenciatura – UFS (Universidade Federal de Sergipe)

Graduada/o em Educação Física Bacharelado – UNIT (Universidade Tiradentes)

**Graduação em Educação Física - UFS (Universidade Federal de Sergipe).

Especialização em Educação Física Escolar - UNIT (Universidade Tiradentes).

Mestrado em Educação – UFS (Universidade Federal de Sergipe).

Doutorado em Educação com pesquisa sobre Formação Continuada de Professores

UFS (Universidade Federal de Sergipe)

(Brasil)

 

Recepção: 17/04/2018 - Aceitação: 05/05/2019

1ª Revisão: 23/03//2019 - 2ª Revisão: 12/04/2019

 

Este trabalho está sob uma licença Creative Commons

Atribuição-NãoComercial-SemDerivações 4.0 Internacional (CC BY-NC-ND 4.0)

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Resumo

    O presente artigo tem como objetivo geral analisar as políticas públicas de esporte e lazer na cidade de Aracaju considerando a ocupação dos diversos espaços públicos. Os objetivos específicos são: a) constatar o número de projetos/programas e os respectivos locais de sua efetivação; b) verificar os objetivos de cada projeto/programa e a relação com a população atendida e c) identificar quais os fatores/problemas apresentados que possam dificultar a realização ou a continuidade do programa nos polos. O procedimento metodológico utilizado foi um estudo descritivo exploratório, com aplicação de entrevistas semiestruturadas na Secretaria Estadual de Esporte e Lazer e Juventude, na Secretaria Municipal da Juventude e do Esporte e nos locais onde os projetos são executados. Nos resultados alcançados identificou-se que a cidade possui políticas públicas com projetos que ofertam práticas de esporte e lazer, porém evidencia-se a necessidade de ampliação e qualificação dos mesmos. Tal carência foi analisada a partir da identificação de 4 (quatro) projetos/programas que beneficiam apenas 04 (quatro) dos 39 (trinta e nove) bairros que a cidade de Aracaju possui mesmo com as vastas possibilidades de espaços não ocupados, como: praias, parques, praças, entre outros; e da constatação de que apenas 600 pessoas são atendidas em todos os projetos/programas na cidade de Aracaju, configurando um quantitativo ínfimo, se considerarmos uma população de 650.106 habitantes aracajuanos. E ainda que haja problemáticas em relação ao quantitativo de verbas recebidas, tem-se de lidar com as dificuldades para dar continuidade ao projeto.

    Unitermos: Políticas públicas. Esporte. Lazer.

 

Abstract

    This article has a general goal to analyze the public policy of sport and leisure in the city of Aracaju-SE, considering the occupation of the various public spaces. The specific objectives are: a) to verify the number of projects/programs and their respective places; b) to verify the objectives of each project/program and the relationship with the population registered; and c) identify which factors/problems were presented that may make the achievement or continuity of the program at centers difficult. The methodological procedure used was an exploratory descriptive study, carried out through part structured at the Secretaria Estadual de Esporte e Lazer e Juventude and the Secretaria Municipal da Juventude e do Esporte and on places where the projects are executed. In the results, it was identified that the city has public policies with projects that offer sport and leisure practices, but it highlights the need to increase and qualify them. This necessity was analyzed from the identification of four (4) projects/programs benefiting only 04 (four) of the 39 (thirty-nine) districts that Aracaju has, even with many possibilities of unoccupied spaces, such as: beaches, parks, squares, among others; and the finding that only 600 people are served in all projects/programs in the city of Aracaju, setting a small amount if we consider a population of 650,106 Aracajuanos, even though the funds received were the main problem for the continuity of the projects.

    Keywords: Public policy. Sport. Leisure.

 

Resumen

    El presente artículo tiene como objetivo general analizar las políticas públicas de deporte y recreación en la ciudad de Aracaju considerando la ocupación de los diversos espacios públicos. Los objetivos específicos son: a) constatar el número de proyectos/programas y los respectivos lugares donde se realizan; b) verificar los objetivos de cada proyecto/programa y la relación con la población atendida y c) identificar cuáles son los factores/problemas presentados que puedan dificultar la realización o la continuidad del programa en los polos. El procedimiento metodológico utilizado fue un estudio descriptivo exploratorio, con aplicación de entrevistas semiestructuradas en la Secretaría Estatal de Deporte y Recreación y Juventud, en la Secretaría Municipal de la Juventud y del Deporte y en los lugares donde se ejecutan los proyectos. En los resultados alcanzados se identificó que la ciudad posee políticas públicas con proyectos que ofrecen prácticas de deporte y recreación, pero se evidencia la necesidad de ampliación y calificación de los mismos. Esta carencia fue analizada a partir de la identificación de 4 (cuatro) proyectos/programas que benefician apenas a 4 (cuatro) de los 39 (treinta y nueve) barrios que la ciudad de Aracaju posee incluso con las vastas posibilidades de espacios no ocupados, como: playas, parques, plazas, entre otros; y de la constatación de que sólo 600 personas son atendidas en todos los proyectos/programas en la ciudad de Aracaju, configurando una cantidad ínfimo, si consideramos una población de 650.106 habitantes. Y aunque hay problemas en relación con la cantidad de fondos recibidos, se tiene que lidiar con las dificultades para dar continuidad al proyecto.

    Palabras clave: Políticas públicas. Deporte. Recreación.

 

Lecturas: Educación Física y Deportes, Vol. 24, Núm. 252, May. (2019)


 

Introdução

 

    O Brasil há muito é conhecido como o país do futebol e nos últimos anos foi sede dos principais megaeventos esportivos mundiais, a Copa do Mundo de Futebol em 2014 e a Olimpíada em 2016. Estes acontecimentos remetem a análise dos legados imateriais que podem desencadear ações de ampliação ou diversificação da cultura, criando incentivos em relação à prática esportiva no país ou até mesmo provocando mudanças nos hábitos das pessoas em relação à prática de exercícios físicos e do lazer. A efetivação desses megaeventos “tem feito com que outras pessoas, grupos e instituições passem a se atentar às políticas públicas de esporte e lazer no Brasil. Afinal, esse tipo de ação acaba tendo grande repercussão midiática e simbólica”. (Starepravo, Souza, & Marchi, 2011, p.234).

 

    As Secretarias de Esporte e Lazer, em âmbito municipal e estadual, são instituições responsáveis pela implantação ou ampliação de programas de esporte e lazer que fomentam a cultura a partir da criação de espaços para desenvolvimento de projetos que favoreçam cada comunidade para que ela possa usufruir dos seus direitos. Entretanto, dados da Pesquisa Nacional por Amostras de Domicílios (Pnad), colhidos em 2015, citado por Silva et al. (2018), mostram que apenas 31,8% dos trabalhadores brasileiros que foram entrevistados praticam atividade física de quatro a sete vezes por semana; daqueles que não praticam: 50,3% afirmaram que não têm tempo, 33,3% disseram que não gostam, 10 % tem problemas financeiros e 6,3% utilizam outras justificativas, como: questões de saúde, falta de acesso às atividades, falta de companhia para realizá-las e outros motivos não especificados. Cabe salientar que as oportunidades precisam estar disponíveis à população considerando as suas especificidades e buscando implementar ações voltadas à superação dos entraves que cada público apresenta.

 

    A cidade de Aracaju, capital do Estado de Sergipe, tem sido intitulada, nos meios midiáticos, como a “capital da qualidade de vida”, fato esse que nos fez refletir sobre quais políticas públicas de esporte e lazer, possivelmente existentes, têm sido ofertadas às crianças, adolescentes, adultos e idosos como contribuição para uma comunidade mais ativa, de modo a configurar um permanente incentivo ao consumo deste bem cultural.

 

    Um dos grandes desafios contemporâneos está em possibilitar a ocupação do tempo livre com práticas que representem benefícios quanto ao convívio saudável entre as pessoas e destas com os diversos espaços da cidade, o que certamente representaria um diferencial ao destacar uma diminuição na ociosidade dos habitantes com utilização desses intervalos de tempo nas atividades diárias - seja com estudos ou com trabalho - para a realização de atividades prazerosas, recreativas e divertidas,reforçando assim a principal característica da cidade em relação à qualidade de vida. No Brasil, segundo dados do Diagnóstico do Esporte no Brasil (DIESPORTE, 2013), 26,8% de crianças até 15 anos de idade abandonam as práticas esportivas e dos 16 aos 24 anos o abandono chega a 45%, informações relevantes para a implementação das políticas públicas de esporte e lazer.

 

    Geralmente os locais que mais disponibilizam o acesso ao esporte é a escola ou as escolinhas de esporte do bairro; quando não, a sua prática está sempre presente de forma mais lúdica na rua, tornando-se assistemática e isenta de configurações de ações ao incentivo para a permanência das práticas no cotidiano das pessoas.

 

    As crianças e adolescentes por diversas vezes encontram no esporte a esperança de seguir caminhos diferentes aos que lhes são oferecidos, principalmente na classe pobre ou de extrema pobreza1: desde o sonho de se tornar um atleta profissional a simplesmente aprender sobre novas modalidades esportivas ou conhecer novas pessoas, ou, simplesmente, ter direito de usufruir da cultura do seu país.

 

    Nessa perspectiva, a implementação de políticas públicas de esporte e lazer insere-se no bojo das ações que estimulam a ocupação dos espaços públicos de forma inteligente e saudável, nas quais a prática do esporte e das atividades de lazer é realizada com o acompanhamento de profissionais capacitados por meio de projetos bem elaborados pelos órgãos competentes, configurando, assim, mais um fator de ocupação do cotidiano com qualidade de vida e mais longe dos problemas sociais que assolam a sociedade; pois como afirma Weller (2005, p.2) “uma das maiores preocupações dos profissionais que atuam nesta área é restituir o direito de ser criança a criança”, ampliando o incentivo à cultura de fato vivida em sua essência.

 

    A prática esportiva alcança patamares da vida do ser humano que se ocupa do tempo livre com qualidade e na convivência com seus pares, através de atividades que envolvem esforço físico, vigoroso ou do uso de habilidades motoras relativamente complexas, cuja participação é motivada por uma combinação de fatores intrínsecos e extrínsecos, que aproxima as emoções humanas vividas nas práticas esportivas como um importante agregador das ações coletivas entre pessoas da mesma geração ou intergeracional (Barbanti, 2003). Nada mais é do que o esporte, sendo visto por outro prisma, como uma prática recorrente na vida de quem o utiliza como um instrumento agregador, não necessariamente esportista, mas pessoas que se juntam para realizá-lo com ou sem nenhuma regra, com o intuito de somente reproduzir gestos, jogadas, movimentos e assim estarem abertos a novas, divertidas e até surpreendentes experiências.

 

    Fazendo uma abordagem mais exemplificada e ligada ao contexto em questão, Goellner (2004, p.1) abrange várias características que estão relacionadas ao esporte:

    O esporte é plural e manifesta-se de diferentes maneiras em diferentes culturas e tempos e a essas manifestações agregam-se múltiplos valores. Solidariedade, consagração, celebração, são palavras por demais positivas se pensarmos nas zonas de sombra que também residem no interior do mundo esportivo. Nacionalismos exacerbados, exploração comercial e econômica, corrupção, especialização precoce, doping, violência, discriminação sexual também tem sido temas a fazer parte do cotidiano esportivo mesmo que, por vezes, os minimizemos e busquemos, a todo custo, recuperar a tradição e com ela fazer valer o que do esporte pode ser identificado como promotor de uma humanidade imanente a cada um de nós.

    Já em relação ao lazer, o sociólogo Requixa (1976), citado por Aquino e Martins (2007), afirma que ele pode ser entendido como um conjunto de coisas que o indivíduo pode fazer de livre e espontânea vontade, seja para se divertir, descansar e até mesmo para desenvolver a capacidade de criação, após as suas obrigações familiares, sociais e profissionais. Também citado por Aquino e Martins (2007, p.486), o pesquisador brasileiro Marcelino (1983) diz que o lazer é uma atividade desinteressada, sem fins lucrativos, além disso ele acrescenta que “a democracia política e econômica é condição básica, ainda que não suficiente, para uma verdadeira cultura popular; para a eliminação das barreiras sociais que inibem a criação e práticas culturais”.Em outro estudo, o lazer é divido em dois modos: o abstrato e o concreto. Segundo Sttiger (1998), o abstrato está relacionado às atividades realizadas no tempo livre, como descanso, distrações e esportes de maneira geral, utilizado para recuperar as energias; já o concreto está relacionado à indústria cultural, transformando os bens culturais da sociedade em mercadorias para passar o tempo, logo, os indivíduos tornam-se meros consumidores da cultura.

 

    Essa variedade de conceitos apresentados nos mostra as diversas facetas do lazer, tendo como sua principal característica a atividade desapegada das responsabilidades do trabalho, o tempo de ócio que pode ser explorado a partir de infinitas atividades, seja de um simples movimentar-se ao consumo da indústria artística e cultural ou não. Entretanto, há quem entenda esse período como algo relativamente perigoso, quando não orientado ou conduzido de forma responsável e inteligente por pessoas capacitadas e responsáveis. A partir disso, ratificamos a importância de políticas públicas bem elaboradas e fiscalizadas.

 

    Bonato (2006) mostra que o tempo do lazer pode trazer consequências, sendo elas positivas ou negativas para o desenvolvimento dos adolescentes. Ele cita Codina (2002), quem fala sobre os benefícios do lazer de forma positiva, este que estimula a manifestação da autorrealização do self no que diz respeito a percepção do adolescente sobre si relacionando ao lazer de forma negativa; ele também cita Kivel (1998); Zamora, Toledo, Santi, & Martinez (1995), quais defendem que o lazer pode se tornar nocivo ao adolescente e à sociedade quando esse tempo não é aproveitado da melhor maneira, o que possibilita o envolvimento do jovem com condutas de risco. A partir desse contexto, condutas de risco podem estar relacionadas a atividades que possam comprometer a saúde física e mental dos adolescentes.

 

    Muitas dessas condutas podem iniciar apenas pelo caráter exploratório do jovem, assim como pela influência do meio (grupo de iguais, família); entretanto, caso não sejam precocemente identificadas, podem levar à consolidação destas atitudes com significativas consequências nos níveis individual, familiar e social. (Feijó; Oliveira, 2001, p.125)

 

    A apresentação de diferentes conceitos e características do esporte e do lazer nos alerta para a importância do uso de políticas públicas para o alcance de um objetivo central, que é justamente a utilização de espaços físicos em prol de benefícios direcionados aos habitantes da cidade de Aracaju. Isso se dá porque o que tratamos como algo benéfico e necessário a uma pessoa que busca qualidade de vida, além dos outros fatores que preenchem os requisitos do seu cotidiano, nem sempre está ao seu alcance, sendo necessária a exigência por meio de um direito assegurado a todo e qualquer cidadão, além da necessidade em entender o que é e como funciona a ferramenta responsável por essa realização.

 

    Toda essa problemática traz à tona a sempre conflituosa discussão a respeito das desigualdades sociais em relação às oportunidades, já que quem tem condições de frequentar cinemas, teatros, academias e clubes, consegue também contratar professores particulares e pode usufruir das suas benesses, ao contrário, quem não tem, fica à mercê da boa disposição técnica e legislativamente compreendida como obrigação do poder público em proporcionar momentos que são direitos de todos.

 

    Junto aos conceitos de esporte e lazer trazemos a definição utilizada para políticas públicas,que se refere a um conjunto de ações coletivas que envolve, intencionalmente, a conquista e a garantia dos direitos sociais e que materializa o compromisso público com as demandas da população (Guareschi et al., 2004). Esta análise pode ser complementada pelas contribuições nos estudos de Meneses (2011, p.18), que aponta as políticas públicas “como o campo do conhecimento que busca, ao mesmo tempo, ‘colocar o governo em ação’ e/ou analisar essa ação e, quando necessário, propor mudanças no rumo ou no curso dessas ações”.

 

    Segundo o artigo 217 da Constituição Federal de 1988 é dever do Estado estimular práticas desportivas formais e não formais, disponibilizando recursos públicos para essa promoção. O parágrafo terceiro deste mesmo artigo também fala sobre o dever do poder público em fomentar o lazer, como meio de impulsão social. Por conta disso, existem as Secretarias que são responsáveis por colocar em prática o texto constitucional a partir das políticas públicas que, segundo Menezes (2011) podem ser entendidas como a prestação de serviços de responsabilidade do Estado à população.

 

    As políticas públicas, que devem contemplar todos os cidadãos à luz da Constituição, são elaboradas a partir de um processo que analisa e identifica as reais necessidades a serem atendidas por via de uma implantação ou implementação de algo já existente. A partir daí, colocamos em discussão quais as políticas públicas de esporte e lazer em Aracaju, com o intuito de ratificar ou não o título de “cidade da qualidade de vida”, para isso, iniciamos pelas visitas e consultas à SEEL2 e a SEJESP3.

 

    Este estudo foi impulsionado pelo propósito de identificar e analisar os projetos/programas realizados pela SEEL e SEJESP em relação às políticas públicas de esporte e lazer, já que a cidade de Aracaju apresenta inúmeros locais adequados para fomento desses programas; além da possibilidade de a população não ter conhecimento sobre, o que faz com que ela perca a oportunidade de usufruir de algo que é seu por direito. Por isso, torna-se relevante apresentar aos leitores, de forma sistematizada, o mapeamento de projetos na cidade de Aracaju, a quantidade de pessoas atendidas - destacando os grupamentos sociais e respectivas faixas etárias -, a identificação da compreensão dos campos de atuação profissional na área da Educação Física e, por fim e não menos importante, provocar na população o desejo de lutar pelos seus direitos, conhecendo as possibilidades e aplicações das verbas públicas destinadas ao esporte e ao lazer para poder usufruí-las da melhor maneira possível e com os melhores serviços prestados.

 

    O presente artigo tem por objetivo geral analisar a existência de políticas públicas de esporte e lazer na cidade de Aracaju, considerando a ocupação dos diversos espaços públicos adequados para prática de atividade física, esporte e/ou lazer, como praia, parques e praças, incentivando práticas de qualidade de vida. Com isso, os objetivos específicos são: a) constatar o número de projetos/programas e os respectivos locais de sua efetivação; b) verificar os objetivos de cada projeto/programa e a relação com população atendida e c) identificar quais os fatores/problemas apresentados que possam dificultar a realização ou a continuidade do programa nos polos.

 

Métodos

 

    Esse é um artigo caracterizado como um estudo descritivo que, segundo Minayo (2001), citado por Gerhardt e Silveira (2009), apresenta um universo de significados, valores, atitudes, com o objetivo de aprofundar as relações existentes dentro de um processo sem necessariamente reduzi-las a números, variáveis. Em se tratando de um estudo descritivo, Triviños (1987), também citado por Gerhardt e Silveira (2009), diz que o autor buscará descrever os fatos e fenômenos existentes em uma determinada realidade.

 

    A pesquisa de campo tem delimitação do tipo estudo de caso, classificado por Gil (2012), como um estudo que vem sendo utilizado por pesquisadores sociais, para descrever a situação do contexto onde está sendo feita determinada investigação e, neste específico, o estudo tem como campo de análise os projetos de esporte e lazer na cidade de Aracaju.

 

    A pesquisa foi realizada na cidade de Aracaju, capital de Sergipe, localizada no litoral do estado, que possui uma área territorial de 181,9 km², e que segundo informações do IBGE – Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística, a estimativa da população de acordo com o senso demográfico em 2017 é de 650.106 habitantes.

 

    Neste estudo foram utilizados dois instrumentos para coleta de dados: entrevistas semiestruturadas que foram aplicadas aos sujeitos responsáveis pela SEEL e SEJESP e os responsáveis pelos polos sede dos projetos/programas. O roteiro de questões foi uma combinação de perguntas abertas e fechadas em que o entrevistado teve a possibilidade de discorrer sobre o tema e o pesquisador seguiu um roteiro de questões pré-definidas, mas o contexto aproximado de uma conversa informal (Boni e Quaresma, 2005) e a utilização de fonte documental é a exploração das fontes documentais, como relatórios, documentos oficiais, reportagens e outros (Gil, 2012).

 

    O procedimento de coleta de dados foi iniciado com o agendamento das visitas à SEEL e SEJESP, visando a obtenção de informações e consequentemente autorização para a realização da pesquisa. Algumas informações já foram obtidas de imediato por meio da entrevista inicial na SEEL, quando nos foram repassados dados sobre os projetos realizados e as dificuldades enfrentadas para colocá-los em prática. Já na SEJESP, as informações foram enviadas por e-mail, onde constavam relatórios das atividades que foram desenvolvidas entre os anos de 2013 a 2017 e as que estão sendo realizadas no cronograma do presente ano.

 

    Durante esse processo foi realizado um mapeamento dos locais onde os projetos de esportes da cidade de Aracaju são desenvolvidos: escolas de esportes José Gerivaldo Garcia4 e Professor Kardec5, com o suporte e supervisão da SEEL, e nas praças dos bairros Olaria6 e 17 de Março7, de responsabilidade da SEJESP. Na sequência a realização da entrevista semiestruturada junto aos coordenadores/professores responsáveis por cada espaço. As questões inseridas na entrevista eram: ‘Fale sobre a instituição na comunidade’; ‘Qual a finalidade da instituição?’; ‘Quantos anos de existência nessa localidade?’; ‘Quais motivos levaram a escolha dessa localidade?’; ‘Quantos alunos são assistidos especificamente nessa escola?’; ‘Existe algum tipo de seleção para quem pode ter acesso às práticas esportivas na escola?’; ‘Existe número limite por turno para isso?’;‘Quais projetos são postos em prática na escola?’;‘Quantas modalidades são trabalhadas e em quantos dias da semana?’; ‘O desenvolvimento do projeto está indo ao encontro das expectativas iniciais desde quando a escola foi pensada?’; ‘Os problemas sociais outrora apresentados estão sendo impactados com trabalho desenvolvido nessa comunidade?’; ‘Existe evasão?’; ‘Ocorrendo, quais medidas são tomadas para que os alunos não se distanciem da escola?’; ‘Por fim, existe algum tipo de contato com os pais, um feedback, de que forma e com qual frequência ocorre?’.

 

Resultados e discussão

 

    Os resultados dos estudos de campo partem de três bases: os dados obtidos a partir das entrevistas; a análise documental sobre os relatórios e os sites oficiais das instituições SEEL e SEJESP.

 

    O acesso aos bens culturais ainda se configura como um dos grandes desafios a serem superados no âmbito dos direitos sociais. Assim, não temos outra opção a não ser cobrar dos órgãos responsáveis uma posição para que os mesmos sejam potencializados, seja em regiões periféricas, as menos favorecidas, ou qualquer outra parte em que possam ser utilizados recursos para tornar a situação menos crítica, já que as políticas públicas são prestações de serviços de responsabilidade do estado à população como um direito.

 

    Diante dessa realidade, uma das vertentes é a exigência do desenvolvimento de políticas públicas que venham a contemplar todos os cidadãos, independente de classe social, faixa etária e sexo. Sendo assim, a promoção de programas, projetos e eventos relacionados ao esporte e ao lazer na cidade de Aracaju, que possui diversos locais apropriados para a implementação das práticas citadas, torna-se uma quase uma obrigação.

 

    A partir disso, fomos em busca de informações que pudessem comprovar que existem políticas públicas de esporte e lazer direcionadas principalmente à juventude, com o objetivo de atestar Aracaju como uma cidade incentivadora dessas práticas, visando à confirmação do título da cidade da “qualidade de vida”.

 

    A análise sobre os projetos desenvolvidos pela SEEL, a partir das informações obtidas no site oficial da secretaria, explicita que compete à Secretaria a elaboração de políticas públicas, planos, programas e projetos nas áreas do esporte e do lazer. Diante disso, fomos em campo para averiguar e a partir de uma entrevista com o Secretário, tomamos conhecimento de algumas informações dos projetos realizados e como a Secretaria trabalha atualmente. Infelizmente, nos foi relatado que muitos documentos e relatórios dos anos anteriores foram perdidos com as constantes mudanças do local da sede e isso dificultou a coleta de dados dos anos anteriores de forma mais completa. Outro ponto crucial para nossa pesquisa foi a afirmação do recebimento de receitas inferiores à necessidade apresentada, acarretando na implantação de apenas duas escolas de esporte, assim como a utilização de parte dessas receitas para a reforma do Estádio Adolfo Rollemberg, interditado temporariamente por ação judicial, segundo o então Secretário.

 

    É necessário apresentar os entraves identificados durante a coleta de dados da pesquisa e tornar explícito que as políticas públicas apresentam lacunas que precisam ser enfrentadas. O primeiro destaque está relacionado a negligência no processo de fiscalização dos projetos executados na cidade que apresentam constantes mudanças de sede, o que configura a falta de valorização destas instituições e dos materiais com os registros históricos das políticas públicas já realizadas. Estes fatores contribuem para o extravio da memória da instituição e, consequentemente, das políticas públicas de esporte e lazer, que deveriam estar resguardadas em documentos importantes como os relatórios anuais que fazem parte da história do município e que ajudam a mensurar o trabalho feito nos anos anteriores.

 

    A segunda parte da análise diz respeito a utilização de receitas financeiras que eram destinadas ao esporte e lazer para cobrir o que seria de responsabilidade de outra secretaria, fatalmente essa verba fará falta futuramente. Pelo princípio da proibição de estorno de verbas, é vedada a transposição, o remanejamento ou a transferência de recursos de uma categoria de programação para outra ou de um órgão para outro, sem prévia autorização legislativa (CF, art. 167, VI). (Furtado, 2005, p.29)

 

    Autorização essa que não nos foi citada na entrevista, nem entregue por meio dos documentos.

 

    O que chama a atenção positivamente na implantação dos projetos nas escolas de esporte e lazer é a sua localização. Uma vez que estamos tratando de políticas públicas, é importante salientar que elas foram criadas e desenvolvidas em dois bairros periféricos, os quais segundo dados fornecidos pela SSP/SE8, possuem altos índices de criminalidade, estando entre os três primeiros locais com maior índice nos quesitos homicídio doloso, roubo e drogas (consumo pessoal e tráfico): Santos Dumont e Santa Maria. As duas escolas possuem esportes de combate, futebol, xadrez, ritmos e está sendo implantado o voleibol; no geral são assistidas de 400 a 500 crianças e jovens, dos 7 aos 17 anos, funcionando de segunda a sexta e aos sábados com torneios; cada escola é coordenada por um professor de educação física.

 

    No que diz respeito à qualidade do trabalho desenvolvido, segundo informações da responsável pela Escola de Esportes José Gerivaldo Garcia, fundada em 2014, o principal objetivo da instituição é resgatar as crianças carentes e incluí-las da melhor maneira possível no esporte, como forma de evitar a ociosidade e envolvimento com os problemas sociais existentes naquela área. Ainda conforme depoimento da profissional (Professora I), no início do projeto, um dos objetivos não estava sendo cumprido à risca: a aprendizagem dos fundamentos, técnicas e regras inerentes ao esporte. Mas se tínhamos uma escola de esportes, esses fatores deveriam obrigatoriamente fazer parte do processo. Na visão da professora, os estagiários, que são os responsáveis por ministrar as aulas, estavam fazendo o básico e só realizando o conhecido “rola a bola” que segundo Darido (2010, p.14), citado por Nascimento (2013) “a prática do ‘rola bola’ é bastante condenável, pois se desconsidera a importância dos procedimentos pedagógicos dos professores”. Porém, após a chegada da nova coordenação, os esportes foram padronizados e desenvolvidos através dos moldes corretos. Em relação ao trabalho buscou-se entender como era realizado.

 

    Não trabalhávamos com os fundamentos, regras, nem as técnicas dos esportes, os estagiários que ministravam as aulas mostraram resistência para modificar a forma das aulas, porque seriam mais trabalho para eles. Os alunos também reclamaram, mas houve um momento de conversa com eles, explicando que os jogadores profissionais precisavam dos treinos para participar de competições, só assim os alunos foram aceitando o treinamento e não somente o “rola bola”. (Professora I).

 

    Ainda sobre as características da escola, pudemos perceber que não existe uma interação direta e regular com os pais nem com as instituições de ensino regular dos assistidos, por não haver reuniões tampouco acompanhamento sobre notas e rendimentos: Não temos acompanhamento junto à escola, mas solicitamos declaração da instituição onde estão estudando, xerox do RG ou certidão de nascimento, xerox do comprovante de residência e foto 3x4, e os alunos frequentam a escola de esporte no horário oposto ao da escola normal.” (Professora I).

 

    Em relação à evasão, o principal motivo apresentado pela responsável se deve à mudança de bairro da família do aluno, uma vez que a distância influencia na frequência: Não proibimos o acesso dos alunos caso faltem muito, porque um dos objetivos da escola é tirar o máximo possível as crianças das ruas, principalmente porque tem um campo próximo a escola em que sempre tem pessoas usando drogas. ” (Professora I).

 

    No período da noite a escola fica aberta para a comunidade com a oferta de capoeira, jogos de bola, além de desenvolver o projeto Academia da Cidade, com aulas de zumba.

 

    Obviamente que a preocupação maior neste momento está distante dos princípios técnicos trabalhados em relação a determinada modalidade, porém o acompanhamento escolar e o contato com a família poderiam apresentar instrumentos que contribuem para a diminuição dos índices nos demais problemas sociais, favorecendo o trabalho realizado pelos projetos de forma mais eficaz e constante, através do desenvolvimento pessoal da criança ou do jovem assistido.

 

    Nesse contexto, não é suficiente treinar e simplesmente dar instrumentos práticos, sem lidar com aspectos do desenvolvimento pessoal, como assertividade, autoestima, iniciativa, visão de si mesmo, relação com o próximo, percepção das necessidades da família e da comunidade. (Feijo; De Macedo, 2012, p.195)

 

    Feijó e De Macedo (2012), também relatam que além da informação e do conhecimento, os projetos devem considerar a inclusão da família enquanto uma rede de apoio, para auxiliar no fortalecimento emocional dos jovens, entendendo que a família se constituirá como uma base necessária para o desenvolvimento, em diversos aspectos, do assistido.

 

    Outra realidade analisada foi a da Escola de Esportes Professor Kardec, fundada em maio de 2012, onde entrevistamos a (Professora II). Na entrevista com a profissional foram passadas informações importantes que ajudaram no conhecimento do trabalho realizado naquele local.

Estou há 2 meses à frente da escola de esportes. A escola de esportes antigamente só era utilizada para eventos, não tínhamos aulas regulares. Com a mudança do secretário de esportes, as aulas realmente começaram a acontecer. Aulas de artes marciais, futsal e futebol, e estão sendo acrescentados vôlei e handebol. Para participar é só preencher a ficha de matrícula, podem fazer até duas modalidades no horário oposto da escola e nas férias da escola eles podem ir o dia todo. (Professora II)

 

    Essas aulas são ministradas por estagiários e muitas vezes não contam com a supervisão da professora, devido ao acúmulo de funções, pois ela também fica responsável pela parte administrativa, realizando matrículas e verificando a assiduidade dos alunos e sempre que possível fazendo reunião com os pais, diferente da escola citada anteriormente. No presente local também ocorre o projeto Academia da Cidade e um fato nos chamou a atenção em relação a continuidade do trabalho: “a escola não tem nenhum tipo de segurança nem estacionamento para os carros e às 17 horas a escola é fechada por causa da insegurança e violência nas proximidades”. (Professora II).

 

    No tocante a insegurança e a violência, durante a entrevista ao Secretário (Sec. I) na SEEL também nos foi informado sobre alguns projetos planejados; um deles é o programa federal denominado Delas, pensado para o público feminino e que tem como foco principal a defesa pessoal. Ele será implantado em vinte e dois núcleos em todo o Estado e na capital terá como sede as duas escolas de esporte citadas na pesquisa, após o recebimento de um recurso que havia sido solicitado. No que diz respeito a valores captados para o investimento nos programas e projetos apurou-se que:

    Há a captação de recursos no valor de dois milhões de reais para custear a participação de jovens carentes nas corridas de rua, que geralmente são pagas, além do apoio da SEEL às federações de esportes, colaborando com a promoção de eventos das atividades planejadas pelas federações. (Sec. I).

    O outro campo de análise foi a SEJESP, de acordo com informações coletadas no site da prefeitura de Aracaju, essa Secretaria tem como finalidade a formulação e a gestão das políticas públicas relacionadas ao esporte e lazer na cidade de Aracaju, com o objetivo de melhorar a qualidade de vida da população. Entrevistamos o Secretário (SEC. II) que informou ter um projeto de esportes sendo executado em duas localidades, denominado Construindo Valores, nos bairros Olaria e 17 de março. Nesses locais nos foram apresentados relatórios das atividades desenvolvidas entre os anos de 2013 a 2017, atividades como: competições de futebol, de futsal, de vôlei e dia da criança do bairro 17 de março. Outro ponto de incentivo ao esporte também foi citado:

    Firmamos uma importante parceria da Secretaria com a SMTT9 e a prefeitura de Aracaju, que assinaram um projeto no dia 28 de agosto de 2017 para que as terças e quintas feiras das 04h30min às 06h30min e sábado das 05h00min às 10h ocorresse o fechamento da Avenida Santos Dumont, na Orla de Atalaia, com a extensão de 2,5 km, para a prática de ciclismo e corrida. (Sec. II)

    Nos relatórios da SEJESP, nossa fonte documental para análise, detectamos que as ações eram divididas em duas partes: na primeira, a Secretaria só apoiava os organizadores das atividades, com materiais físicos e/ou humanos; na segunda, apoiava as atividades que eram desenvolvidas e executadas por ela. Pudemos perceber que nesse recorte repassado pela SEJESP todas as ações desenvolvidas não eram permanentes, as principais são campeonatos de futsal, futebol, voleibol e a corrida da volta de Aracaju, evento que ocorre anualmente na data de aniversário da cidade.

 

    Analisando o relatório das ações desenvolvidas nesse recorte temporal, pudemos constatar que o trabalho exercido pela secretaria supracitada não estava de acordo com as suas responsabilidades, a partir da função que exerce, o órgão deveria no mínimo proporcionar algo mais concreto, mais longínquo; não é de se esperar da instituição somente a organização de campeonatos de pequeno porte, evento no aniversário da cidade ou auxílio através da distribuição de membros. Haja vista que, segundo o site, a secretaria tem como finalidade a formulação e a gestão das políticas públicas relacionadas ao esporte e lazer na cidade de Aracaju com o objetivo de melhorar a qualidade de vida da população.

 

    Realizamos visitas aos projetos e conversamos com os responsáveis que, através da entrevista semiestruturada, relataram todas as informações e características das aulas e alunos. No projeto do bairro Olaria, que acontece às segundas pela manhã, das 9h às 11h, e no turno vespertino às quartas das 14h às 16h, conversamos com o profissional (Professor III) responsável pelas atividades. Através das perguntas objetivou-se conhecer mais sobre o trabalho realizado naquele local:

    O projeto começou a ser desenvolvido no mês de fevereiro deste ano, com o objetivo de retirar as crianças da ociosidade e socializá-las. A escolha do local foi influenciada pela estrutura que já existia no local, que é uma quadra coberta numa praça onde também está localizado o CRAS10 e a solicitação do líder comunitário junto ao prefeito e ao vereador de um projeto esportivo para o bairro. (Professor III)

    Disse-nos, também, que nesse projeto não existe nenhum tipo de seleção para participar, os alunos fazem um cadastro simples, com nome, endereço e telefone. A princípio, eles não verificam se as crianças estão estudando, pretendem fazer isso posteriormente. Por ora, ocorre a modalidade futsal para meninos, apenas, com a média de 15 alunos no turno da manhã e 30 pela tarde, sendo que os adolescentes assistidos possuem entre 12 e 17 anos. O projeto é de grande valia por ocupar o tempo livre dos meninos e geralmente não acontece evasão. Eles têm o interesse de futuramente fazer reuniões e ter a opinião dos pais dos participantes.

 

    O professor do projeto no bairro 17 de março abordou sobre os turnos e critérios para inclusão no projeto: “as aulas acontecem às quartas pela manhã e às sextas à tarde, com mais de um ano de realização, são atendidos em média de 30 a 40 alunos, sem nenhum tipo de critério para participação. A escolha do local está relacionada ao alto índice de criminalidade” (Professor IV). Através do relato do professor, percebemos que a maioria das crianças e adolescentes que integram o projeto estão ligadas direta ou indiretamente à violência, muitas delas têm alguém da família que está preso ou foi assassinado no bairro. O principal objetivo do professor, através do projeto, é socializar os meninos. Há algum tempo já se consegue perceber uma mudança significativa no comportamento dos participantes, aulas com menos agressividade e palavras apropriadas para um ambiente tão amistoso e de aprendizagem e muito mais respeito para com os professores e colegas, peculiaridade que não se via no início do trabalho.

 

    Esse depoimento do profissional já seria de fundamental importância para um projeto bem mais elaborado, não apenas no que diz respeito a prática de esportes e socialização, mas, a crescente evolução no comportamento dos alunos já serviria de estímulo para realização de novos projetos contribuintes para o desenvolvimento intelectual dos moradores dessa comunidade, demonstrando o real interesse em combater o analfabetismo, a violência, a criminalidade e outros problemas sociais.

 

    Nesse local, o esporte praticado é o futsal e já estão planejando implantar o basquete. As meninas também estão presentes, porém ainda são minoria. O acompanhamento com os pais não é feito diretamente com as pessoas responsáveis pelo desenvolvimento do projeto, mas pelo CRAS. Em relação à evasão, a principal causa é a violência, ratificada através do exemplo do professor, que se deu com a ocorrência de um homicídio na praça, que fez com que os assistidos ficassem um tempo sem aparecer, mas depois retornaram as aulas e continuaram normalmente.

 

    Um fator relevante percebido durante as entrevistas é que as Secretarias não utilizam profissionais de Educação Física nos projetos e nas competições realizadas, eles aproveitam os estudantes do curso de Educação Física. Na SEEL existe professor, mas não é ele quem ministra as aulas e muitas vezes os estagiários trabalham sem nenhum tipo de supervisão. Segundo o Art 3 e § 1º da lei 11.788/08 os estagiários precisam ter o termo de compromisso entre o educando, a parte de concedente de estágio e a instituição de ensino; além desse contrato, o estudante precisa ter supervisão efetiva pela parte concedente, algo que, de acordo com as entrevistas, não acontece.

 

    Segundo Santos e Ramos (2017) desde a escola nos é negado o ensinamento sobre as modalidades esportivas e essa negação continua na fase adulta, com a falta de tempo, de boas condições financeiras para praticá-las e também ausência de projetos. Além de prejudicar a população, desfavorece os profissionais de educação física que poderiam utilizar esses projetos para trabalhar e incentivar a população a aproveitar os espaços públicos. Esses projetos têm a oportunidade de mudar esse quadro, modificar essa realidade, através do oferecimento da prática do esporte de maneira gratuita e com profissionais capacitados em diversos locais da cidade estudada.

 

    Porém, vale salientar que os espaços não podem ser apenas explorados por meio do viés esportivo, através do lazer, abrimos um leque de opções e aprendemos a distribuí-lo e utilizá-lo sem nenhuma preocupação, já que usaremos um período oposto ao das obrigações cotidianas, seja para a recreação, o entretenimento, a aprendizagem/prática artística e cultural ou até mesmo o jogo lúdico, sem nenhum tipo de regra ou padrão.

 

    Segundo Dumazedier (1973), citado por Leiro (2006, p. 6) o conceito de lazer segue como: Um conjunto de ocupações às quais o indivíduo pode entregar-se de livre vontade, seja para repousar, seja para divertir-se, recrear-se e entreter-se, ou ainda, para desenvolver sua informação ou formação desinteressada.

 

    Entretanto, a realidade apresentada ao longo da pesquisa nos mostra que apenas quatro bairros possuem projetos elaborados e realizados pelas Secretarias, ou seja, diversos locais onde poderiam ser desenvolvidos trabalhos voltados para a prática esportiva e de lazer na cidade estão inutilizados ou, no mínimo, mal aproveitados. Estamos pensando no viés da saúde, na qualidade de vida tão defendida e que intitula nosso município? A população realmente não gosta de atividade física, esportiva, lazer ou não tem incentivo, não enxerga políticas públicas capacitadas para tal? Existem profissionais de Educação Física no mercado necessitando de local para desenvolver o que aprenderam nas universidades, faculdades ou nas academias? E os poucos clubes suportam a disputa acirrada por emprego entre esses profissionais?

 

Conclusão

 

    O estudo apresenta as políticas públicas de esporte e lazer implementadas no município de Aracaju. A análise qualitativa dos dados repassados nos permite realizar questionamentos referentes ao título da cidade da “qualidade de vida”.

 

    A partir das entrevistas nas Secretarias e da relação dos dados com a bibliografia ao longo da referida pesquisa, respondemos à problemática atestando que o Estado de Sergipe, através do Município de Aracaju, está sim estimulando a população por meio da prática de esporte e lazer com suas políticas públicas. Entretanto, uma cidade com tantos locais apropriados para essas práticas deveria ser alvo de uma quantidade bem maior de projetos e/ou programas que fizessem valer a pena a possível e imediata ligação entre as práticas esportivas e de lazer à qualidade de vida propagada.

 

    A ínfima quantidade de projetos nos faz refletir sobre a quantidade de profissionais à disposição em relação à população do município, o que indicaria uma falta de disposição para instalação de mais programas, com mais qualidade e com profissionais capacitados e empenhados em levar à população um trabalho organizado e em longo prazo, no intento de alcançar os benefícios que essas atividades podem proporcionar.

 

    Após as visitas aos locais acima citados, percebemos o quão importantes são os projetos em desenvolvimento e o trabalho social realizado. Além disso, reconhecemos sim o esforço dos profissionais e estagiários e da Secretaria em mantê-los em funcionamento, porém é inadmissível aceitarmos a quantidade de praças utilizadas (locais onde são desenvolvidas políticas públicas de esporte e lazer) e do público atendido. Quando pensamos no universo que caracteriza a cidade, tanto em público quanto em local, percebemos que a expectativa é absurdamente superior à realidade atingida. Infelizmente temos em torno de 600 pessoas atendidas para uma população de 650.106 habitantes e quando pensamos sobre locais, temos somente quatro bairros, com dois espaços sendo aproveitadas pelo estado e dois pelo município.

 

    Importante também destacar a ampliação dos campos de atuação dos profissionais de Educação Física. Conforme se verifica nos dados obtidos junto ao CREF2011 estamos atualmente com 2.033 profissionais registrados no Conselho, sendo que a cada 6 meses novos profissionais são inseridos no quadro. Portanto, torna-se necessário que cada vez mais os profissionais de Educação Física se ocupem de ações de esporte e lazer nas políticas públicas, como mais um agente, em defesa dos direitos da população aracajuana em ser beneficiada.

 

    Recomendamos, assim, estudos posteriores após a realização dessa pesquisa com o objetivo de buscar respostas, já que conseguimos concluir que para o desenvolvimento dos projetos de esporte e lazer nos bairros não é necessário esperarmos pela construção de escolas de esportes,pois temos locais adequados para esse suporte, diria até de forma qualificada. Para ratificar, podemos citar diversos locais já estruturados, como a Praça da Juventude, Parque Governador Augusto Franco12, Parque Governador Antônio Carlos Valadares13 e tantas outras praças e parques que estão prontos para atender o público e que necessitam apenas de um trabalho em parceria com as demais secretarias, visando a realização dessas atividades e consequente qualidade vida.

 

    É pertinente falar também sobre recursos materiais: desde que a verba não seja destinada a outros fins, indubitavelmente esses projetos terão o suporte necessário. Em relação a um trabalho de qualidade, a solução já foi comentada anteriormente: diversos profissionais concluem as suas graduações sedentos por uma vaga no mercado de trabalho e a partir disso teríamos uma solução para outro problema que fatalmente fará parte da realidade da capital de Sergipe em um futuro próximo: a disputa no mercado de trabalho e suas consequências. Segue mais uma crítica: se projetos são repassados, são colocados em prática e os resultados não são entregues ou analisados/fiscalizados, cabe aos órgãos responsáveis cobrar pelo capital investido, buscando a veracidade, seriedade e frutos dos trabalhos realizados na capital.

 

    Esse estudo apresenta algumas cobranças em sua conclusão com o objetivo de incomodar os sujeitos do processo, alertar os leitores quanto aos seus direitos e buscar soluções para algo que parece simples, porém aos olhos dos responsáveis o que temos como direito se torna algo muito complexo e, em certos momentos, fora da realidade. Esperamos ter contribuído de forma eficaz para que as próximas pesquisas da área possam trazer tantas outras contribuições relacionadas ao conteúdo.

 

Notas

  1. Segundo a ABEP (Associação Brasileira de Empresas de Pesquisas), são as famílias que tem como renda média o salário no valor de até R$ 708,19.

  2. SEEL – Secretaria Estadual de Esporte e Lazer e Juventude.

  3. SEJESP – Secretaria Municipal da Juventude e do Esporte.

  4. R. Gen. Prado, 800 - Santos Dumont, Aracaju - SE, 49087-245.

  5. Avenida Jacy Carvalho - Santa Maria, Aracaju - SE, 49043-460.

  6. R. Sônia Regina Araújo dos Santos, 178 - Olaria, Aracaju - SE, 49092-353.

  7. R. O, 152-320 – 17 de março, Aracaju – SE.

  8. SSP/SE – Secretaria de Segurança Pública do Estado de Sergipe.

  9. SMTT- Superintendência Municipal de Transportes e Trânsito.

  10. CRAS – Centro de Referência de Assistência Social. É um local público, localizado prioritariamente em áreas de maior vulnerabilidade social, onde são oferecidos os serviços de Assistência Social, com o objetivo de fortalecer a convivência com a família e com a comunidade.

  11. CREF20 – Conselho Regional de Educação Física 20º região – Sergipe.

  12. Popularmente conhecido como Parque da Sementeira.

  13. Popularmente conhecido como Parque dos Cajueiros.

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