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ISSN 1514-3465

 

Vantagens e desvantagens das ações em situação de jogo 7x6

em Andebol de quadra. Perceção dos treinadores em Portugal

Advantages and Disadvantages in Indoor Handball’s 

7x6 Playing Actions. Coaches’ Perception in Portugal

Ventajas y desventajas de las acciones en una situación de juego 

7x6 en balonmano sala. Percepción de entrenadores de Portugal

 

João Carlos Rodrigues Branco*

quinzenasdecartas@gmail.com

António Manuel Tavares Azevedo**

toazevedo@esev.ipv.pt

Paulo Alexandre Mendes Ribeiro Eira**

peira@esev.ipv.pt

 

*Curso de Desporto e Atividade Física

Escola Superior de Educação de Viseu

Instituto Politécnico de Viseu

** Departamento de Ciências do Desporto e Motricidade

Escola Superior de Educação de Viseu

Instituto Politécnico de Viseu

Centro de Estudos em Educação e Inovação, Viseu

(Portugal)

 

Recepção: 30/08/2023 - Aceitação: 03/02/2024

1ª Revisão: 23/10/2023 - 2ª Revisão: 01/02/2024

 

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Citação sugerida: Branco, J.C.R., Azevedo, A.M.T., e Eira, P.A.M.R. (2024). Vantagens e desvantagens das ações em situação de jogo 7x6 em Andebol de quadra. Perceção dos treinadores em Portugal. Lecturas: Educación Física y Deportes, 28(310), 63-75. https://doi.org/10.46642/efd.v28i310.7197

 

Resumo

    A modalidade de andebol encerra uma complexidade de organização tática, técnica, física, psicológica e social. Tal tem conduzido treinadores e investigadores a quantificar indicadores predefinidos para analisar as ações que ocorrem com maior frequência em contexto de competição. Perante as restrições impostas pelos regulamentos, os atletas operam para tentar criar situações de superioridade numérica em relação à defesa adversária e, dessa forma, vencer. O presente estudo visa analisar as vantagens e desvantagens da utilização das ações em superioridade numérica ofensiva no contexto da modalidade. Para o efeito, foi concebido um guião de entrevista semiestruturada cujas categorias foram definidas a priori, aplicado a treinadores das duas principais divisões de elite do sistema competitivo da modalidade em Portugal. A criação de um plano estratégico para cada jogo ultrapassa os campos teórico e ideológico do treinador, na medida em que não decorre somente das suas ideias de jogo. As vantagens e desvantagens na utilização de ações em superioridade numérica derivam das crenças que o treinador possui acerca das características dos seus atletas e inerentes índices de preparação. Na génese de utilização das ações em superioridade numérica deverão estar, invariavelmente, os processos de análise e questionamento permanente durante os períodos de treino e/ou competição.

    Unitermos: Andebol. Treinador. Jogo. Superioridade numérica.

 

Abstract

    Handball contains tactical, technical, physical, psychological and social organization complexity. This has led coaches and researchers to quantify predefined indicators to analyze the actions that occur most frequently in competition context. Faced with the restrictions imposed by the regulations, athletes operate to try to create numerical superiority situations in relation to the opposing defense and, in this way, win. This study aims to analyze the advantages and disadvantages of the use of offensive numerical superiority actions in Handball. For this purpose, a semi-structured interview script was designed with previously defined categories, applied to the two main elite divisions coaches of the competitive system of Portuguese Handball. The creation of a strategic plan for each game goes beyond coaches’ theoretical and ideological fields, in that it does not stem solely from their ideas of the game. In this sense, the advantages and disadvantages in the use of actions in numerical superiority derive from coaches’ beliefs about their athletes’ characteristics and inherent rates of preparation. Therefore, the use of numerical superiority actions are conditioned by permanent processes of analysis and questioning during the periods of training and/or competition.

    Keywords: Handball. Coach. Game. Numerical superiority.

 

Resumen

    El balonmano implica una compleja organización táctica, técnica, física, psicológica y social. Esto ha llevado a entrenadores e investigadores a cuantificar indicadores predefinidos para analizar las acciones que ocurren con mayor frecuencia en el contexto de la competición. Dadas las restricciones impuestas por el reglamento, los deportistas operan para intentar crear situaciones de superioridad numérica en relación a la defensa del oponente y, de esta forma, superarlo. El presente estudio tiene como objetivo analizar las ventajas y desventajas del uso de acciones ofensivas de superioridad numérica en el contexto de la modalidad. Para ello, se diseñó una guía de entrevista semiestructurada, cuyas categorías fueron definidas a priori, aplicada a entrenadores de las dos principales divisiones de élite del sistema competitivo de este deporte en Portugal. La elaboración de un plan estratégico para cada partido va más allá del ámbito teórico e ideológico del entrenador, ya que no resulta únicamente de sus ideas de juego. Las ventajas y desventajas de utilizar acciones en superioridad numérica se derivan de las creencias que tiene el entrenador sobre las características de sus atletas y los ritmos de preparación inherentes. La génesis del uso de acciones en superioridad numérica deben ser invariablemente los procesos de análisis y cuestionamiento permanente durante los períodos de entrenamiento y/o competencia.

    Palabras clave: Balonmano. Entrenador. Juego. Superioridad numérica.

 

Lecturas: Educación Física y Deportes, Vol. 28, Núm. 310, Mar. (2024)


 

Introdução 

 

    A complexidade do desporto, refletida nas diversas modalidades de invasão, conduziu à emergência da criação de regulamentos competitivos, cujo intuito visa determinar, limitar e expandir as possibilidades técnicas e táticas dos atletas, de acordo com a exigência requerida em todos os momentos do “Jogo”. Da mesma forma, delimita uma atmosfera que tende a evitar a entropia máxima, o caos provocado pelo conjunto de ações de cooperação-oposição estabelecidas entre equipas, procurando salvaguardar inclusive a integridade física de todos os intervenientes. Noutro prisma de análise, ao longo da última década, as federações têm procurado criar regulamentação, ou proceder às alterações da regulamentação já existente, com o objetivo de clarificar a interpretação regulamentar de determinadas ações praticadas pelos seus principais atores, ou simplesmente de conferir uma maior dinâmica, fluidez e espetacularidade às ações de jogo (Bonjour et al., 2021). A este propósito, a Federação de Andebol de Portugal (FAP) seguiu a corrente de desenvolvimento, tendo desenvolvido o seu modelo de formação e desenvolvimento dos atletas a longo prazo, num documento designado “Etapas de Desenvolvimento do Praticante de Andebol”. (Santos et al., 2015)

 

    A exigência do desporto é ditada pelas suas regras (Tucher et al., 2015), na medida em que estas pretendem assegurar a equidade e igualdade no acesso a um qualquer encontro, pelo que a sua ausência, ditaria a impossibilidade de obtenção do sucesso desportivo, instaurada que estaria a desordem. (Lagiosa, 2023)

 

    No domínio do andebol, esta modalidade encerra uma complexidade de organização tática, técnica, física, psicológica e social (Mendes et al., 2021) de ordem tal que tem conduzido treinadores e investigadores a quantificar indicadores predefinidos para analisar as ações que ocorrem com maior frequência em contexto de competição (Tabben et al., 2019), para além das tomadas de decisão técnicas, táticas e fisiológicas (Hassan et al., 2017; Michalsik et al., 2015). Por sua vez, no campo da preparação e treino da modalidade, entre outras destacamos as investigações de Debanne et al. (2018), Dello Iacono et al. (2018), e Forthomme et al. (2018).

 

Imagen 1. O andebol encerra uma complexidade de organização tática, técnica, física, psicológica e social

Imagen 1. O andebol encerra uma complexidade de organização tática, técnica, física, psicológica e social

Fonte: Pixabay.com

 

    De acordo com as restrições impostas pelos regulamentos, os atletas operam para tentar criar situações de superioridade numérica em relação à defesa adversária e, dessa forma, vencer.

 

    Para além dos princípios básicos de jogo preconizados inicialmente por Bayer (1994), os quais impelem os atletas a recuperar a posse de bola, dificultar a progressão do adversário no terreno de jogo e impedir o remate por parte deste, existe igual preocupação em ocupar racionalmente as zonas cruciais do terreno de jogo, que agora variam em função do ajustamento das ações em superioridade numérica e do espaço onde as mesmas se desenrolam.

 

    A título de exemplo, se durante uma situação de ataque posicional os atletas ocupam posições específicas de acordo com a sua estrutura defensiva e ofensiva do adversário, adaptando os seus comportamentos de acordo com o sistema tático utilizado (Menezes et al., 2015), os corredores central e laterais do terreno sofrem uma remodelação concetual quando em situação de superioridade numérica, quer em conceito, quer em predominância de importância, com base na ocupação e disposição dos atletas. (Barreira et al., 2022)

 

    O ato de seleção de determinado sistema tático tende a otimizar as condutas técnico-táticas individuais, grupais e coletivas, relevando a importância do desenvolvimento das relações de cooperação e oposição entre os atletas de uma mesma equipa, assim como entre equipas. (Mendes et al., 2021)

 

    Com efeito, admite-se que uma equipa se encontra em “superioridade numérica” quando, em posse de bola, apresenta mais atletas à frente da linha da bola que a equipa adversária. Importa igualmente clarificar que a posse de bola acontece quando, de acordo com Garganta (1997, p. 209), qualquer dos atletas respeita pelo menos uma das seguintes situações: 1) realiza pelo menos 3 contactos consecutivos com a bola; 2) executa um passe “positivo” (permite a manutenção da posse de bola) 3) realiza um remate (processo de finalização).

 

    Durante um encontro “standard” de andebol (quando ambas as equipas se apresentam em igualdade numérica) é frequente ocorrer o desequilíbrio numérico, seja por motivos disciplinares, seja por opção técnica, pelo que tal situação estabelece situações de superioridade e inferioridade e requer adaptações constantes por parte dos atletas, no que concerne aos seus comportamentos táticos (Hill-Haas et al., 2010). Depreende-se, portanto, que o contexto de desigualdade numérica, presente ao longo de todo o jogo, pode ser benéfico ou prejudicial para as equipas, no qual as capacidades de resposta e adaptação aos constrangimentos da partida ditam o seu resultado. (Freitas et al., 2021; Nunes et al., 2020; Prudente, 2006)

 

    Suportados na crença de Bekris et al. (2012), quanto à insuficiência de estudos que analisam a condução de Jogo em superioridade numérica, Praça et al. (2018) concluíram que a presença de “mais um” atleta dentro do terreno de jogo provocou o decréscimo da intensidade do encontro, evidenciada através da diminuição do ritmo cardíaco em períodos substanciais, quando comparada com o confronto em igualdade numérica. Tal deve-se ao número de solicitações às quais o atleta estar sujeito, diminuir igualmente. Dito de outra forma, quanto maior for o número de atletas numa mesma dimensão de terreno, menor será o número de intervenções por parte de cada atleta.

 

    O estudo de Sampaio et al. (2014) corroborou esta mesma influência, considerando que a superioridade numérica provocou, aos atletas, a diminuição da intensidade em ações de cobertura racional de espaços e respetivas distâncias percorridas. Considerando as linhas de pensamento anteriores o presente estudo visa analisar as vantagens e desvantagens da utilização das ações em superioridade numérica ofensiva no contexto da modalidade de andebol.

 

Métodos 

 

    A temática e objetividade do estudo conduziram ao emprego de um processo de índole qualitativa por apresentar, entre outras vantagens, a de recolher informação que não se consume como possível noutras fontes (Santos, e Lima, 2019). Trata-se de investigar ideias, de descobrir significados nas ações dos treinadores e nas interações com as suas equipas, admitindo que existem múltiplas realidades sob a forma de construções mentais e sociais, experiencialmente localizadas e que dão sentido às suas experiências e ao mundo em que elas são vividas. (Creswell, 1998; Guba, 1990; Mertens, 1998; Tuckman, 2012)

 

Participantes 

 

    Foram pré-selecionados três treinadores, do género masculino e com experiência profissional superior a dez anos. Todos os participantes são ex-atletas de elite, vencedores de títulos nacionais e internacionais, com idades compreendidas entre os 48 e 57 anos. Na temporada desportiva de 2021/2022, encontravam-se a exercer funções nos escalões de seniores masculinos de clubes que militam nas duas principais divisões do sistema competitivo da modalidade no nosso país. Dos três técnicos entrevistados, dois são cidadãos nacionais e um possui a cidadania de um Estado-Membro da União Europeia. Dois dos três técnicos desportivos entrevistados possuem a mais alta qualificação técnica internacional da European Handball Federation (EHF): a EHF Pro License. Um dos treinadores entrevistados encontra-se atualmente a levar a cabo o estágio para a obtenção do Título Profissional de Treinador de Desporto (TPTD) de Grau III, título que irá alcançar no final da presente temporada desportiva. Duas das formações analisadas militaram na temporada desportiva de 2021/2022 no Campeonato Nacional de Andebol 1 (PO01) do escalão de Seniores Masculinos. A terceira formação analisada no presente estudo competiu na temporada desportiva de 2021/2022 no Campeonato Nacional da 2ª Divisão de Seniores Masculinos (PO02).

 

Instrumentos de recolha de dados 

 

    Na medida em que se pretendeu analisar opiniões, atitudes e representações dos participantes, recorreu-se à técnica de entrevista que, nesta ocasião, representa o meio privilegiado para aferir acerca do contexto social e emocional dos entrevistados (Santos, e Lima, 2019). Optou-se pela tipologia semiestruturada, tendo sido construído um guião-referencial para a colocação de questões abertas, de modo que a entrevista não decorresse, nem de forma rígida, nem totalmente livre, ao mesmo tempo concedendo liberdade ao entrevistado para apresentar as suas respostas de forma natural e com linguagem mais informal. O guião apresentou duas dimensões que visam perspetivar: (i) vantagens da utilização das ações em superioridade numérica ofensiva 7x6; (ii) desvantagens da utilização das ações em superioridade numérica ofensiva 7x6.

 

    Posteriormente, procedeu-se à análise de conteúdo que, de acordo com Bardin (2011, p. 49), se define como “um conjunto de técnicas de análise de comunicações que visa obter, por procedimentos sistemáticos e objetivos, a descrição do conteúdo das mensagens indicadores que permitam a inferência de conhecimentos relativos às condições de produção destas mensagens”. A análise de conteúdo é, portanto, uma técnica de tratamento de dados recolhidos a partir da realização de entrevistas que visa ajudar o investigador a descrever e a interpretar o que foi narrado pelo entrevistado, salientando os pontos fortes da sua narrativa acerca da temática em estudo.

 

Procedimentos 

 

    Os pedidos de colaboração foram enviados por carta aos clubes nos quais os três técnicos exercem funções, de modo a poder obter igualmente a anuência das instituições para o efeito. No conteúdo das cartas prestou-se o seguinte conjunto de informações: (i) a apresentação do tema do estudo; (ii) o enquadramento do procedimento metodológico a aplicar no âmbito dos objetivos do estudo; (iii) a descrição pormenorizada das condições dos procedimentos a utilizar no âmbito das entrevistas e dos procedimentos relativos à análise sequencial de jogo (salvaguarda da confidencialidade de todos os nomes dos participantes, das instituições das formações que constituíram a população-alvo do estudo, escolha da data da entrevista, duração máxima da entrevista, formato a utilizar para a entrevista, pedido para a autorização da gravação da entrevista para efeitos de validação da mesma junto do júri da prova na qual se insere o estudo e envio de uma cópia do ficheiro do áudio da entrevista e do estudo para aferição da sua validade relativamente às informações do estudo). Por razões de salvaguarda da confidencialidade da identidade das formações analisadas, dos seus técnicos e dos dados recolhidos, as 3 formações foram alvo de uma codificação e numeração (aleatória) para o presente estudo.Com efeito, os treinadores serão doravante designados pelas seguintes siglas: T1, T2 e T3.

 

    Primeiramente e, após a gravação das entrevistas, as mesmas foram transcritas para o formato de texto escrito, para garantir detalhe e precisão na captura da informação desejada. O passo seguinte consistiu na organização dos dados através de um processo de categorização, de modo a atribuir significado e/ou um padrão de temas e conceitos e, desta forma, aumentar a inteligibilidade e compreensão da informação retida.

 

    Releva-se o facto de este processo ter sido executado manualmente, ou seja, sem recurso ou auxílio de software de análise qualitativa.Com base nos padrões identificados, interpretou-se os dados para analisar as perceções, opiniões e experiências dos entrevistados, ou seja, tentou compreender-se o significado subjacente aos dados e como os mesmos se relacionam com o objetivo da pesquisa.

 

Resultados e discusão 

 

Vantagens da utilização das ações em superioridade numérica ofensiva 7x6 

 

    No domínio desta temática, o T1 evidenciou três vantagens: (i) a possibilidade de serem criadas situações de finalização sem recurso à utilização de dinâmicas ofensivas ou meios táticos complexos, (ii) a riqueza de linhas de passe e, por conseguinte, de tomadas de decisão possíveis ao portador da bola para a criação de situações de finalização com alta probabilidade de êxito e (iii) e o recurso a estas ações para reduzir o ritmo de jogo. Estas vantagens foram igualmente apontadas nos estudos de Amatria et al. (2020), constatando que as ações em superioridade numérica que culminam em golo refletiam um padrão de conduta constituída por um sistema tático não estruturado, assim como no de Hernández et al. (2010), os quais analisaram padrões de conduta análogos aos de contra-ataque, em oposição à lógica do processo ofensivo organizado. De facto, o estudo de Lozano, e Camerino (2012) apontou o contra-ataque como ação ofensiva de maior eficácia, independente do sistema defensivo adversário.

 

    Na perceção de T1,

    “O 7x6 permite situações de finalização sem grande estrutura, ou seja, sem termos de estar a utilizar muitas dinâmicas no ataque organizado, nomeadamente ações táticas de grupo (…) “a grande vantagem, é que nos podemos sempre utilizar que aquilo nunca se esgota. É uma fonte que não se esgota, em termos de utilização de capacidade de finalização. Só de pensar que o atleta que decide tem 6 linhas de passe, percebe-se bem. Outra vantagem também é que são normalmente situações, não é normalmente. Algumas vezes são situações claras de finalização, ou seja, o ponta entra com um ângulo razoável, os remates em penetração são remates, de primeira linha em penetração acontecem em circunstâncias favoráveis, os passes ao pivot permitem que o pivot finalize também com algum espaço, portanto, o 1 X guarda-redes normalmente aparece numa situação relativamente favorável.”

    Com efeito, os resultados obtidos por Amatria et al. (2020) assinalam a relação entre o êxito (finalização com sucesso) e as ações ofensivas realizadas em superioridade numérica.

 

    Por seu lado, o T2 apresentou como principal vantagem a maior frequência de finalizações que são construídas pela primeira linha para os seus pivots. Assume que a construção de finalização para os atletas do posto específico de pivot por parte das primeiras linhas é dos principais objetivos do desenvolvimento destas ações em superioridade numérica absoluta por parte dos atletas da sua formação, em virtude das características técnico-táticas dos atletas do seu plantel, bem como das características físicas dos seus pivots. Não obstante a riqueza técnica dos atletas que possui e a sua capacidade em servir os pivots por intermédio de vários tipos de passe, importa destacar que este processo é de enorme desgaste, quer pela luta corporal frente aos defensores, quer pela própria receção de bola por parte destes e é, por norma, uma ação que requer um conjunto de predicados ao nível das capacidades coordenativas, particularmente da capacidade de equilíbrio, visto que o contacto constante promovido pelos defensores conduz à retenção da bola pelos pivots, assim como a execução do remate em situações de acentuado estado de desequilíbrio e num curtíssimo espaço de terreno (inclusive, por vezes a escassos milímetro da linha que assinala a invasão da área restritiva):

    “As ações 7x6 permitem-nos desenvolver uma boa relação com os pivots, criar muitas situações de golo para os pivots. Considerando a nossa forma de jogar com pivots que são muito fortes no plano físico, assim como atletas que são dotados de uma enorme criatividade e riqueza nos recursos técnicos. Na nossa formação, creio que atletas como o atleta R.S. ou o atleta F.M. possuem a qualidade necessária para desenvolver estas ações. Se não tivéssemos pivots tão fortes fisicamente e tão bons, seria difícil jogar no 7x6.”

    Por fim, o T3 destacou como as principais vantagens da utilização destas ações: (i) a superioridade numérica absoluta existente sobre o adversário, (ii) o facto de algumas defensivas não estarem preparadas para atuar com eficácia neste sistema de jogo, isto é, a falta de estratégias defensivas por parte do adversário, (iii) a possibilidade de adaptar as características dos seus atletas a este tipo de ataque (iv) e a riqueza de tomadas de decisão que podem ser realizadas nestas ações. No seu contexto particular, o entrevistado destacou que o perfil dos atletas que possui nas suas fileiras facilita a utilização deste tipo das ações, na medida em que as suas características nos vários fatores de rendimento possibilitam a construção de um jogo ofensivo rico e variado em termos de combinações e ações:

    “Desde logo ter mais um elemento dentro de campo. Um atleta de campo a mais acaba por ser uma possível vantagem. Depois, algumas equipas ainda não estão preparadas para a defesa ao 7x6, o que pode significar que nas primeiras situações e tendo em conta que se possa ter sucesso, a equipa adversária possa não estar preparada para defender o 7x6, ou seja, pode haver grande eficácia, grande percentagem de sucesso para o nosso ataque. Eu diria que essas são as principais vantagens e também, se calhar, dependendo daquilo que for a defesa adversária, a principal vantagem é adaptar as características dos meus atletas a esse tipo de ataque.”

Desvantagens da utilização das ações em superioridade numérica ofensiva 7x6 

 

    No cenário oposto ao da dimensão anterior, o T1 elencou três desvantagens que recorrem da utilização deste tipo de ações: (i) a eventualidade de perda do equilíbrio defensivo em virtude da necessidade em realizar diversas substituições ataque-defesa (ii), a não conquista de vantagens sobre um adversário hábil na exploração de ações em rápida reposição da bola no terreno de jogo ou “contra-golo” e (iii) a perda de confiança dos atletas se as suas ações não forem, em termos de score, minimamente proveitosas. Considerando-se as desvantagens enunciadas em íntima simbiose, explora-se a interpretação e profundidade do raciocínio oferecido pelo entrevistado nesta questão:

    “...primeiro tem a questão do equilíbrio defensivo. É uma situação sempre crítica em termos de equilíbrio defensivo, ou seja, se apanharmos uma equipa que tenha grande capacidade de resposta ao 7x6 podemos passar muito tempo a sofrer contra-golo, a marcar e a sofrer por contra-golo e podemos perder alguma confiança no 7x6 porque sabemos que não estamos a conseguir encontrar o equilíbrio defensivo. E isso às vezes também nos acontecia um bocado, porque realmente, como tínhamos de fazer substituições ataque-defesa, isso também nos acontecia um bocado. Para outras equipas e como se calhar têm tudo estruturado de outra maneira, basta ter dois pivots que possam defender ao meio e metade do problema está resolvido, o central defende na ponta, sai o ponta e entra o guarda-redes, o lateral direito defende a dois.”

    O T2 destacou o facto de ter a baliza deserta. Neste propósito o entrevistado havia já relevado, noutra questão, esta desvantagem, principalmente frente a equipas que conseguissem, no âmbito das ações em contra-ataque ou contra-golo, visar com rapidez a baliza da sua formação. Por sua vez, o T3 destacou que o facto de não ter um guarda-redes na baliza é um fator que incute mais pressão nos atletas na hora de desenvolver este tipo de ações. O risco que a formação corre obriga a que os atletas atribuam mais valor à bola e tomem decisões com um menor grau de risco. Inversamente ao que havia referido na pergunta anterior, quanto ao grau de inadaptação de algumas defesas a este tipo de ações ou até mesmo à ausência de uma estratégia defensiva clara para defender com êxito este tipo de ações, o T3 destacou igualmente a desvantagem da utilização destas ações frente a formações que apresentem uma evidente estratégia defensiva neste contexto específico:

    “Desde logo a questão de não ter a segurança de ter um guarda-redes. De ter muitas vezes a pressão a que o 6x6 não obriga, ou seja, de ter de tomar a decisão pela certa, porque não havendo ninguém na retaguarda faz com que a importância da posse de bola seja claramente maior. E depois, por outro lado, a mesma coisa que disse na pergunta anterior, já há equipas que preparam bem a questão do 7x6 e é uma questão de perceber que se a primeira situação, a segunda ou a terceira não dão, o 7x6 é um sistema que não se pode utilizar porque não estamos a retirar sucesso desse tipo de ações.”

    Com efeito, depreende-se que o desenvolvimento deste tipo de ações é um recurso que pode ser utilizado pontualmente para a resolução de uma tipologia específica de problemas, nomeadamente quando o ataque 6x6 não está a ser eficaz ou perante a atuação do adversário em determinados sistemas defensivos. Contudo, como um recurso não prioritário que se consome, crê-se que se as ações 7x6 não forem proveitosas para a obtenção dos objetivos definidos, os treinadores abdicarão da realização de ações em superioridade numérica absoluta para desenvolver outras soluções treinadas no ataque em igualdade numérica 6x6.

 

Conclusões 

 

    Com o expresso objetivo de aproximar as equipas do sucesso competitivo, particularmente nas duas últimas décadas, inúmeras e de variada natureza têm sido as situações e combinações especiais a emergir deste processo evolutivo no plano das fases ofensivas do jogo de andebol.

 

    Este fenómeno, associado à evolução da regra que possibilitou a realização de substituições ilimitadas e sem qualquer condicionante ou restrição entre os guarda-redes e os colegas de campo acabou invariavelmente por condicionar, a um nível de base, os comportamentos dos atletas durante a realização de ações individuais, grupais ou coletivas, culminando no próprio pensamento dos treinadores, no que concerne à inclusão destes acontecimentos no modelo de jogo das suas equipas. Por conseguinte, os treinadores começaram igualmente a desenvolver exercícios específicos para a operacionalização dos comportamentos idealizados em situações de superioridade numérica, mais como marcador de união entre atletas do que por tendência habitual dos desportos coletivos de invasão.

 

    A criação de um plano estratégico para cada jogo ultrapassa os campos teórico e ideológico do treinador, na medida em que não decorre somente das suas ideias de jogo. Neste sentido, as vantagens e desvantagens na utilização de ações em superioridade numérica derivam das crenças que o treinador possui acerca das características dos seus atletas e inerentes índices de preparação. Na génese de utilização das ações em superioridade numérica deverão estar, invariavelmente, os processos de análise e questionamento permanente durante os períodos de treino e/ou competição. Concretamente, de acordo com as respostas dos atletas à condução do treino e com a análise do comportamento do adversário em competição.

 

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Lecturas: Educación Física y Deportes, Vol. 28, Núm. 310, Mar. (2024)