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ISSN 1514-3465

 

Obesidade durante a pandemia da COVID-19: os impactos

no desenvolvimento infantil. Uma revisão de literatura

Obesity During the COVID-19 Pandemic: The Impacts on Child Development. A Literature Review

Obesidad durante la pandemia de COVID-19: los impactos en el desarrollo infantil. Una revisión de la literatura

 

Paulo Roberto Santos Lopes*
pauloroberto@unidavi.edu.br

André Everton de Freitas**

aefreitas13@gmail.com

Anelise Sonza+

anelise.sonza@udesc.br

Ana Inês Gonzáles++

ana.gozales@unidavi.edu.br

*Mestrado em Ciências do Movimento Humano

pela Universidade do Estado de Santa Catarina (UDESC)

Graduação em Educação Física pelo Centro Universitário

para o Desenvolvimento do Alto Vale do Itajaí (UNIDAVI)

Graduação em Fisioterapia (UNIDAVI)
Docente do UNIDAVI

*Pós-doutorando em Ciências do Movimento pela (UDESC

Doutorado em Ciências da Saúde pela Faculdade de Medicina (UFMG)

Mestrado em Engenharia de Produção (UFSC)

Graduação em Medicina (FASEH)

Graduação em Fisioterapia

pela Faculdade de Ciências Médicas de Minas Gerais (UFMG)

+Pós-doutorado pela Universidade Federal de Ciências

da Saúde de Porto Alegre (UFCSPA)

Doutorado em Neurociências (UFRGS)

Doutorado em cooperação internacional pela University of Calgary, Canadá

Doutorado sanduíche pela Universidade de Duisburg-Essen, Alemanha

Graduação em Fisioterapia pela UDESC

Mestrado em Ciências do Movimento Humano pela UDESC

Docente na Universidade do Estado de Santa Catarina (UDESC)

++Doutorado em Ciências do Movimento Humano (UDESC)
Mestrado em Ciências do Movimento Humano pela UDESC

Graduação em Fisioterapia pela UNESC

Docente do UNIDAVI

(Brasil)

 

Recepción: 03/04/2022- Aceptación: 02/01/2024

1ª Revisión: 09/11/2023 - 2ª Revisión: 29/12/2023

 

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Cita sugerida: Lopes, P.R.S., Freitas, A.E. de, Sonza, A., e Gonzáles, A.I. (2024). Efeitos da pandemia da COVID-19 na obesidade e desenvolvimento infantil. Uma revisão de literatura. Lecturas: Educación Física y Deportes, 29(311), 170-181. https://doi.org/10.46642/efd.v29i311.3447

 

Resumo

    A obesidade e a COVID-19 são pandemias que afetam negativamente a saúde e a qualidade de vida, sendo consideradas emergências de saúde em todo o mundo, causando altas taxas significativas negativas de doença, podendo gerar hospitalização e morte. Objetivo: Realizar uma análise reflexiva, através de uma revisão bibliográfica, sobre a obesidade infantil, considerando os impactos da pandemia da COVID-19 no desenvolvimento infantil. Metodologia: A pesquisa bibliográfica foi realizada no banco de dados PubMed usando o seguinte algoritmo: (SARS-CoV-2 OR COVID-19) AND (children OR child OR student OR teenager) AND (child obesity OR pediatric obesity). A seleção de estudos foi restrita ao período de 2019 a 2022. Dos 239 resultados, após os critérios e inclusão, apenas 11 estudos foram selecionados. Resultados: A pandemia da COVID-19 contribuiu para desvios no neurodesenvolvimento infantil, não apenas no âmbito motor e de coordenação, mas também nas esferas da linguagem, comportamento e interação social, mesmo em crianças não infectadas pelo SARS-CoV-2. Adicionalmente, a introdução de comportamentos sedentários nas crianças durante a pandemia, pode ter elevando o risco de Doenças Crônicas Não Transmissíveis (DCNT). Este cenário sendo refletido em alterações notáveis na baixa atividade física e nos padrões de comportamento sedentário. Conclusões: A pandemia da COVID-19 desencadeou não apenas uma crise sanitária, mas também um impacto significativo no estilo de vida das crianças, contribuindo para desafios adicionais relacionados à obesidade infantil. A compreensão desses efeitos é essencial para orientar estratégias eficazes de saúde pública e intervenções direcionadas a essa população vulnerável.

    Unitermos: Obesidade infantil. Desenvolvimento infantil. COVID-19.

 

Abstract

    Obesity and COVID-19 are pandemics that negatively affect health and quality of life, and are considered health emergencies worldwide, causing high significant negative rates of disease, which can lead to hospitalization and death. Objective: To carry out a reflective analysis, through a bibliographic review, on childhood obesity, considering the impacts of the COVID-19 pandemic on child development. Methodology: The bibliographic search was carried out in the PubMed database using the following algorithm: (SARS-CoV-2 OR COVID-19) AND (children OR child OR student OR teenager) AND (child obesity OR pediatric obesity). The selection of studies was restricted to the period 2019 to 2022. Of the 239 results, after the inclusion criteria, only 11 studies were selected. Results: The COVID-19 pandemic has contributed to deviations in children's neurodevelopment, not only in the motor and coordination spheres, but also in the spheres of language, behavior and social interaction, even in children not infected with SARS-CoV-2. In addition, the introduction of sedentary behavior in children during the pandemic may have increased the risk of Chronic Non-Communicable Diseases (CNCD). This scenario is reflected in notable changes in low physical activity and sedentary behavior patterns. Conclusions: The COVID-19 pandemic has triggered not only a health crisis, but also a significant impact on children's lifestyles, contributing to additional challenges related to childhood obesity. Understanding these effects is essential to guide effective public health strategies and interventions targeting this vulnerable population.

    Keywords: Childhood obesity. Child development. COVID-19.

 

Resumen

    La obesidad y el COVID-19 son pandemias que afectan negativamente la salud y la calidad de vida, siendo consideradas emergencias sanitarias a nivel mundial, provocando altos y significativos índices de enfermedad, que pueden derivar en hospitalización y muerte. Objetivo: Realizar un análisis reflexivo, a través de una revisión de la literatura, sobre la obesidad infantil, considerando los impactos de la pandemia de COVID-19 en el desarrollo infantil. Metodología: La búsqueda bibliográfica se realizó en la base de datos PubMed utilizando el siguiente algoritmo: (SARS-CoV-2 OR COVID-19) AND (children OR niño OR estudiante OR adolescente) AND (obesidad infantil OR obesidad pediátrica). La selección de estudios se restringió de 2019 a 2022. De 239 resultados, luego de los criterios e inclusión, se seleccionaron 11 estudios. Resultados: La pandemia de COVID-19 contribuyó a desviaciones en el neurodesarrollo de niños, en esferas motora y de coordinación, y también en las esferas del lenguaje, comportamiento e interacción social, incluso en niños no infectados por SARS-CoV-2. Además, la introducción de conductas sedentarias en niños durante la pandemia puede haber aumentado el riesgo de enfermedades crónicas no transmisibles (ECNT). Este escenario se refleja en cambios notables en patrones de baja actividad física y comportamiento sedentario. Conclusiones: La pandemia de COVID-19 desencadenó no solo una crisis de salud, sino también impactó en los estilos de vida de los niños, contribuyendo a desafíos adicionales relacionados con la obesidad infantil. Comprender estos efectos es esencial para guiar estrategias efectivas de salud pública e intervenciones específicas para esta población vulnerable.

    Palabras clave: Obesidad infantil. Desarrollo infantil. COVID-19.

 

Lecturas: Educación Física y Deportes, Vol. 29, Núm. 311, Abr. (2024)


 

Introdução 

 

    A obesidade e a COVID-19, ambas reconhecidas como pandemias globais, exercem impactos adversos na saúde e no bem-estar das crianças (Browne et al., 2021). Enquanto a obesidade infantil é apontada como uma emergência de saúde global, caracterizada pelo aumento alarmante de casos de sobrepeso e obesidade (Nicodemo et al., 2021), a COVID-19 emerge como uma doença altamente contagiosa, resultando em infecções respiratórias graves e taxas significativas de hospitalização e mortalidade. (Browne et al., 2021; WHO, 2020; Saúde, 2020)

 

    A doença causada pelo novo Coronavírus, provocou restrições e distanciamentos sociais ao redor do mundo (WHO, 2020; Saúde, 2020; Guan et al., 2020). No Brasil, as recomendações das medidas restritivas de distanciamento social, em geral, significaram fechar boa parte do comércio, estabelecimentos de ensino e praças e parque públicos. (Barros et al., 2020)

 

    Dessa forma, as medidas de restrição e distanciamento social, adotadas para conter a propagação da COVID-19, modificaram drasticamente a rotina das crianças, afastando-as de suas atividades escolares habituais. (Nicodemo et al., 2021; Rundle et al., 2020; Negata, 2020)

 

    A obesidade é identificada como um fator de risco independente para a gravidade da COVID-19, onde crianças com obesidade podem experimentar uma trajetória mais grave desta doença, incluindo a necessidade de suporte respiratório. (Browne et al., 2021)

 

    Com isso, várias discussões começaram a surgir em relação à saúde física, social e psicossocial, onde as medidas de isolamento social têm influenciado o comportamento e a saúde da população mundial (Viner et al., 2020). Embora as medidas de restrição possam ajudar na diminuição do contágio, tais restrições resultam em efeitos negativos para a população, levando assim ao comportamento sedentário (Hossain et al., 2020). Adicionalmente, a necessidade de confinamento em casa alterou drasticamente o cotidiano e a qualidade de vida das pessoas. (Nicodemo et al., 2021)

 

    Entretanto, embora o distanciamento social seja reconhecido como uma estratégia eficaz para conter a propagação da COVID-19, suas implicações na rotina diária das crianças são consideráveis (Nicodemo et al., 2021). Este cenário torna-se ainda mais relevante ao considerar o impacto potencial nas áreas de desenvolvimento musculoesquelético e formação psicossocial das crianças, uma vez que a saúde física e mental infantil pode ser significativamente afetada. (Viner et al., 2020)

 

    Diante deste contexto, o presente estudo tem como objetivo analisar minuciosamente os impactos da pandemia da COVID-19 nos índices e fatores de risco associados à obesidade infantil. Esta análise visa promover uma reflexão teórica abrangente sobre a obesidade infantil, integrando os desafios específicos causados pela pandemia da COVID-19 no desenvolvimento das crianças.

 

Metodologia 

 

    Esta pesquisa trata-se de uma revisão de literatura de caráter qualitativo, ou seja, não requer uso de técnicas estatísticas e não pode ser traduzido em números. A pesquisa bibliográfica foi realizada no banco de dados PubMed usando o seguinte algoritmo: (SARS-CoV-2 OR COVID-19) AND (children OR child OR student OR teenager) AND (child obesity OR pediatric obesity), onde os estudos variam entre os anos de 2019 a 2022. Dos 239 resultados, os títulos e resumos foram rastreados para identificar artigos relevantes. A última pesquisa bibliográfica foi realizada em 15 de fevereiro de 2022, com outra breve atualização de pesquisa em 12 de março de 2022.

 

    Os critérios de inclusão definidos para a seleção dos artigos foram: artigos publicados em português e inglês; artigos na íntegra que retratam a temática referente à obesidade infantil na pandemia da COVID-19; artigos que trouxeram faixa etária até 11 anos; e artigos publicados e indexados no referido banco de dados nos últimos três anos. Foram excluídos os arquivos do tipo carta ao editor, diretrizes, revisões sistemáticas, demais revisões e meta-análises.

 

    Foram selecionados 11 artigos que tinham interesse para o objetivo proposto, ou seja, promover uma reflexão teórica sobre a obesidade infantil e os impactos no desenvolvimento das crianças causados pela pandemia da COVID-19.

 

Resultados e discussões 

 

Definição e prevalência 

 

    A obesidade, é uma doença crônica não transmissível (DCNT) resultante da quebra do sistema regulador de energia do corpo, é impactada por fatores genéticos, ambientais e psicossociais (Browne et al., 2021). Segundo o Centers for Disease Control (CDC, 2021) dos EUA, os gráficos de crescimento padronizados, definem o excesso de adiposidade nas crianças e adolescentes como: excesso de peso (percentil 85-94); obesidade (percentil 95-98); e obesidade grave (percentil ≥ 99).

 

    A obesidade afeta mais de 337 milhões de crianças em todo o mundo, com 213 milhões de jovens classificados com sobrepeso e 124 milhões com obesidade e obesidade grave (NCD-RisC, 2017). As taxas de obesidade pediátrica variam de acordo com idade, etnia, localização e fatores sociais determinados (Yusuf et al., 2020; Browne et al., 2021). No Brasil, segundo os especialistas do Instituto Nacional de Saúde da Mulher, da Criança e do Adolescente Fernandes Figueira da Fundação Oswaldo Cruz (FIOCRUZ, 2021), a estimativa é que 6,4 milhões de crianças tenham excesso de peso no país, e 3,1 milhões já evoluíram para obesidade. A doença afeta 13,2% das crianças entre 5 e 9 anos, podendo trazer consequências preocupantes ao longo da vida. Segundo os dados de 2019, nessa faixa etária, 28% das crianças apresentam excesso de peso (Saúde, 2021). Entre os menores de 5 anos, o índice de sobrepeso é de 14,8%, sendo 7% já apresentando obesidade. (FIOCRUZ, 2021)

 

    A prevalência de COVID-19 no Brasil, segundo o Sistema de Vigilância Epidemiológica da Gripe, em 2020, na faixa etária de 0 a 19 anos, foram notificados 14.638 casos de Síndrome Respiratória Aguda Grave (SRAG) hospitalizados confirmados pela COVID-19, correspondendo 2,5% dos casos. E foram notificados 1.203 óbitos por SRAG confirmado por COVID-19, que corresponderam a 0,6% dos óbitos por COVID-19 no país. Até agosto de 2021, foram notificados 95.866 casos de SRAG hospitalizados, correspondendo a 6,7% dos casos de SRAG. Dentre os quais, 16.246 casos foram confirmados por COVID-19 (17%). Vale ressaltar que até agosto de 2021 foram notificados mais casos de SRAG hospitalizados por COVID-19 na faixa etária de 0 a 19 anos que em todo o ano de 2020. (FIOCRUZ, 2021)

 

Fatores de risco 

 

    A obesidade infantil é um problema de saúde complexo, segundo o CDC (2021) essa doença ocorre quando uma criança está acima do seu peso ideal ou saudável para sua idade e altura. As causas do ganho de peso são semelhantes entre jovens e adultos, incluindo comportamento e genética. A obesidade também é influenciada pelo fator sociocultural de uma pessoa, pois pode afetar a capacidade de fazer escolhas saudáveis. (CDC, 2021; Nicodemo et al., 2021)

 

    A ingestão de alimentos e bebidas com alto teor calórico e baixo teor de nutrientes, uso de medicamentos e rotinas de sono, são comportamentos que influenciam o ganho de peso excessivo, além de não praticar atividade física (AF) e passar muito tempo em atividades sedentárias, como assistir televisão ou outros dispositivos de tela. (Zhu et al., 2020; CDC, 2021)

 

    A COVID-19 aumenta os fatores de risco para obesidade por meio do aumento do estresse e do comportamento sedentário relacionada a mudanças ambientais, acadêmicas e sociais. (Browne et al., 2021; Nicodemo et al., 2021)

 

    Segundo Zhu et al. (2020) e CDC (2022), algumas condições e fatores de risco a serem considerados para possíveis complicações da COVID-19 em crianças, estão relacionadas a: obesidade; sedentarismo; nutrição inadequada; cardiopatias; hipertensão arterial; pneumopatias; doenças renais crônicas em estágio avançado (graus 3, 4 e 5); diabetes melito. (Zhu et al., 2020; CDC, 2021; Browne et al., 2021)

 

    A obesidade também é um fator de risco para o aumento da gravidade do COVID-19, pois o excesso de peso diminui a resposta imune do indivíduo (Santos et al., 2022). Uma resposta imune diminuída resulta da inflamação crônica exacerbada pelo estresse, causando complicações metabólicas associadas (Browne et al., 2021). A inflamação da doença da obesidade combinada com hiperinsuflação por COVID-19 e resposta imune enfraquecida (Korakas et al., 2020), aumenta o risco de indivíduos desenvolverem sepse avassaladora e falência de órgãos. (Shekerdemian et al., 2020)

 

Prejuízos no desenvolvimento infantil 

 

    A pandemia de COVID-19 trouxe impactos significativos para a vida de crianças e adolescentes em todo o mundo (Santos et al., 2022), afetando indiretamente as vias do neurodesenvolvimento, pois implica uma série de hábitos e atividades que são fundamentais para o desenvolvimento saudável de crianças que estão se desenvolvendo normalmente ou que se desviaram do desenvolvimento normal (Linhares, e Enumo, 2020). Os impactos da pandemia na infância têm efeitos diretos e indiretos, sendo que os efeitos diretos dizem respeito às manifestações clínicas, quanto os indiretos podem apresentar prejuízos no ensino, estresse, comportamento sedentário, entre outros. (FIOCRUZ, 2020)

 

    A pandemia acometeu diversamente as diferentes idades. A população pediátrica apresentou menor índice de complicações pelo SARS-CoV-2, no entanto, não significa que esse público esteja imune aos efeitos da pandemia referindo-se aos prejuízos sobre seu neurodesenvolvimento. (FIOCRUZ, 2021)

 

    Um estudo do Rhode Island Hospital e da Brown University, nos EUA, que acompanha o neurodesenvolvimento em crianças, comparou o desempenho das habilidades de aprendizagem precoce em um grupo de bebês nascidos entre 2011 e 2019 e outro grupo de bebês nascidos entre 2020 e 2021, como análise, as pontuações em habilidades motoras, cognitivas e de linguagem, os bebês nascidos durante a pandemia (2020-2021) apresentaram escores baixos. Outro aspecto destacado pelo estudo é que os meninos de menor nível socioeconômico apresentaram maiores comprometimentos nas áreas avaliadas. (Deoni et al., 2021)

 

    O isolamento social restringe interações pessoais e altera a rotina familiar e de lazer, pode levar a inúmeras implicações sobre o desenvolvimento físico, cognitivo, comportamental e social (FIOCRUZ, 2021). O desenvolvimento infantil saudável requer quantidade suficiente de atividades lúdicas, AF especialmente ao ar livre, limitações de comportamentos sedentários e sono adequado. Contudo, o isolamento social afetou diretamente a funcionalidade das crianças e adolescentes. De acordo Paterson et al. (2021), a pandemia impactou na frequência e a duração da AF e das atividades ao ar livre diminuíram, enquanto houve um aumento significativo do uso recreativo e escolar de telas digitais em todos os dispositivos e mídias.

 

    Segundo o CDC (2022), um a cada seis crianças com idade entre 2 a 8 anos, apresentam alguma dificuldade relacionada ao neurodesenvolvimento. Entre essas crianças estão aquelas com diagnóstico do transtorno do espectro autista, déficit intelectual, transtorno do déficit de atenção e hiperatividade (TDAH), dificuldade de aprendizagem, paralisia cerebral, atraso do desenvolvimento e outras dificuldades comportamentais e emocionais. Para essas crianças, o contexto da pandemia e o isolamento social, tornou-se algo muito mais desafiador, pois essas crianças necessitam de cuidados especializados, através equipe multiprofissional, com intuito de favorecer a estimulação das habilidades do neurodesenvolvimento. Sendo que é uma população que necessita de cuidados contínuos, a longo-prazo, além de adaptações no seu contexto escolar, seguindo os preceitos da inclusão escolar. (CDC, 2022)

 

    A obesidade durante a infância pode prejudicar o corpo de várias maneiras com riscos de saúde mais imediatos (Browne et al., 2021). Segundo o CDC (2022), as crianças que têm obesidade são mais propensas a apresentarem: pressão alta e colesterol alto, que são fatores de risco para doenças cardiovasculares; aumento do risco de intolerância à glicose, resistência à insulina e diabetes tipo 2; problemas respiratórios, como asma e apneia do sono; problemas articulares e desconforto musculoesquelético; doença hepática gordurosa, cálculos biliares e refluxo gastroesofágico (azia). (Zhu et al., 2020; CDC, 2021; Browne et al., 2021; CDC, 2022)

 

Importância da atividade física no contexto da pandemia da COVID-19 

 

    A AF é necessária em todas as etapas da vida, ela é um componente essencial para um estilo de vida saudável (Barros, 2020; Browne et al., 2021), tendo grande importância em todas as idades na prevenção de DCNT, como hipertensão arterial, doenças cardiovasculares e diabetes, com impacto significativo na morbimortalidade da população. (Barros, 2020)

 

    Além disso, a AF promove o bem-estar psicológico, aumenta a auto-estima, a capacidade de aprendizagem e ajuda as crianças e adolescentes a lidar com o estresse (Browne et al., 2021). Nesse sentido, a Associação Americana do Coração (AHA) recomenda que a avaliação física das crianças deve ser realizada por pediatras e ambiente escolar, visando na ajuda à prevenção primária das DCNT. (Rappaport, 2020)

 

    A Lei de Diretrizes e Base da Educação (LDB, 1996), juntamente com o Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA, 1990), deixam claras as obrigatoriedades dizendo que a criança e o adolescente têm direito à educação, cultura, esporte e lazer. Tal direito foi violado no período da pandemia, com enorme prejuízo para essa população.

 

    Mesmo antes da declaração da pandemia da COVID-19, as doenças ligadas à obesidade, sedentarismo e à falta de AF regular já estavam em curva ascendente na sociedade. Em tempos de pandemia, com necessidade do isolamento social, a limitação da circulação e de AF se impôs subitamente na vida das pessoas, com impacto enorme nas crianças e adolescentes. (Queiroz, 2020)

 

    A Academia Americana de Pediatria (AAP) e a Sociedade Brasileira de Pediatria (SBP) recomendam que, para o bom desenvolvimento físico e cognitivo das crianças, deve ser realizado pelo menos 60 minutos de AF moderada por dia (Barros, 2017; Queiroz, 2020). Na população infantil, as recomendações quanto à necessidade de AF e limitações ao tempo de exposição à tela de qualquer tipo, seja televisão, computador ou telefones celulares com acesso à rede mundial de computadores estão bem estabelecidas, sendo que essas recomendações variam de tempo 0 (zero) de tela para menores de dois anos até 2 horas por dia, já em adolescentes, sendo excluídas as horas que são utilizadas para obrigações como aulas por via remota. (Radesky, 2020; Queiroz, 2020)

 

    Boa parte da AF das crianças e adolescentes tem relação com a vida escolar e com a ida deles às praças e espaços públicos. Com o fechamento dos mesmos, a atividade das crianças ficou muito restrita ao âmbito doméstico (Hall et al., 2020). A AF reduzida se torna problemática não apenas por causa da importância da AF na prevenção da obesidade e doenças crônicas mais tarde na vida, mas também por causa das associações entre a AF com mudanças percebidas no bem-estar mental. (Gilbert et al., 2021)

 

Conclusões 

 

    Nesta revisão de literatura, pode-se perceber que a pandemia contribuiu para os desvios do neurodesenvolvimento em crianças que sempre haviam apresentado ganhos adequados, não apenas no aspecto motor/coordenação, mas igualmente nos campos da linguagem, comportamento e interação social, mesmo não sendo infectado pelo SARS-CoV-2. Entretanto, há que se considerar o envolvimento do sistema nervoso central e periférico em crianças que objetivamente adoeceram pelo agente.

 

    Além disso, a pandemia trouxe comportamento sedentário a mais variadas faixas etárias, com isso, aumentando o risco de DCNT. Contudo, são necessárias mais informações sobre como as restrições da COVID-19 podem afetar as crianças de forma diferenciada por raça e etnia, status socioeconômico e urbanidade. Embora este estudo contribua para uma compreensão inicial de como as restrições do COVID-19, serão necessários estudos para entender melhor os resultados imediatos e de longo prazo para a população infantil.

 

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Lecturas: Educación Física y Deportes, Vol. 29, Núm. 311, Abr. (2024)