Lecturas: Educación Física y Deportes | http://www.efdeportes.com

ISSN 1514-3465

 

Papel dos alunos treinadores durante uma intervenção

com o Sport Education Model. Uma pesquisa na Escola

Municipal Santos Dumont, Paiçandu, PR, Brasil

The Role of Student Coaches in an Intervention with the Sport Education Model. 

A Research at the Municipal School Santos Dumont in Paiçandu, Paraná, Brazil

Rol de los alumnos entrenadores durante una intervención con el Sport Education Model

Una investigación en la Escuela Municipal Santos Dumont, Paiçandu, PR, Brasil

 

Eliane Maria de Almeida*

elianemarialmeida@hotmail.com

Luciane Cristina Arantes**

luarantes100@gmail.com

 

*Doutoranda em educação

pelo Programa de Pós-Graduação em Educação

Mestra em Educação Física Escolar

pelo Programa de Mestrado Profissional

em Educação Física em Rede Nacional (PROEF)

Membro do Grupo de Pesquisa Educação, Política

e Prática Pedagógica da Cultura Corporal (GEPPECC)

**Graduada em Educação Física pela UEM

Mestra em Educação Física pela UFSC

Doutora em Educação Física pelo Programa Associado

de Pós Graduação UEM/UEL

Pós-doutorado na UFSC

Professora adjunta do Curso de Educação Física

e do Programa Associado de Pós-Graduação UEM/UEL

da Universidade Estadual de Maringá

Membro dos grupos de pesquisa GEPEDH

e colaboradora no GEFFE

(Brasil)

 

Recepção: 20/11/2021 - Aceitação: 02/10/2022

1ª Revisão: 07/07/2022 - 2ª Revisão: 29/09/2022

 

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Citação sugerida: Almeida, E.M. de, e Arantes, L.C. (2022). Papel dos alunos treinadores durante uma intervenção com o Sport Education Model. Uma pesquisa na Escola Municipal Santos Dumont, Paiçandu, PR, Brasil. Lecturas: Educación Física y Deportes, 27(294), 71-89. https://doi.org/10.46642/efd.v27i294.3267

 

Resumo

    Introdução: O Sport Education Model é um modelo de ensino que busca promover experiências autenticas aos alunos a partir de um ensino que integra as principais características do esporte institucionalizado. Esse modelo já foi alvo de diversas pesquisas no Brasil, porém nenhuma delas versou, especificamente, sobre os papéis desempenhados pelos alunos durante as aulas. Objetivo: Identificar o papel dos alunos treinadores no processo de apropriação dos conhecimentos preestabelecidos em uma intervenção com o Sport Education Model (SEM), nos anos iniciais do ensino fundamental. Métodos: Uma turma do quarto ano do ensino fundamental, composta por dezessete alunos (6 meninas e 11 meninos) participou de uma temporada de vinte (20) aulas subsidiadas no SEM. Tratou-se de uma pesquisa-ação, com o seguinte ciclo: planejamento, implementação, descrição e avaliação das ações adotadas. A coleta de dados ocorreu por meio de registro de imagem de vídeo, diários de campo das aulas durante o período de intervenção; aplicação de questionário e produção textual dos alunos ao fim da temporada. Resultados: Constatou-se que os alunos treinadores foram capazes de realizar as tarefas solicitadas pela professora pesquisadora, bem como identificaram e discutiram os problemas e possíveis soluções para eles nas aulas. Conclusões: Por meio da formação de pequenos grupos, que permanecem juntos durante a temporada, e da figura do aluno treinador, o SEM potencializou a autonomia dos alunos; o trabalho específico com o aluno treinador potencializou o alcance dos objetivos preestabelecidos para a temporada, bem como favoreceu o desenvolvimento da autonomia e da liderança desses alunos.

    Unitermos: Educação Física. Modelos educacionais. Esportes. Ensino. Atletismo.

 

Abstract

    Introduction: The Sport Education Model is a teaching model that aims to foster authentic experiences for students by means of a teaching approach that integrates the main aspects of institutionalized sport. This model has already been the subject of several studies in Brazil, but none of them dealt specifically with the roles played by students during classes. Aim: To identify the role of student-coaches in the process of appropriation of predetermined knowledge within an intervention based on the Sport Education Model (SEM) in the early years of elementary school. Methods: A 4th grade elementary class with seventeen students (6 girls and 11 boys) participated in a season of twenty (20) classes grounded on the SEM. This was an action research with the following cycle: planning, implementation, description, and assessment of the actions taken. Data collection was performed through video image recording, field diaries of the classes during the interventions, questionnaire administration and text production by the students at the end of the season. Results: It was found that the student-coaches were able to perform the tasks requested by the research teacher, as well as to identify and discuss the problems and possible solutions for them in class. Conclusions: By forming small groups that remain together throughout the season, and with the role of the student-coach, the SEM empowered students’ autonomy; the specific task with the student-coach enhanced the achievement of the predetermined goals for the season and benefited the development of students’ leadership skills and autonomy.

    Keywords: Physical Education. Educational models. Sports. Teaching. Track and field.

 

Resumen

    Introducción: El Sport Education Model es un modelo de enseñanza que busca promover experiencias auténticas a estudiantes a partir de una enseñanza que integre las principales características del deporte institucionalizado. Este modelo ya ha sido objeto de varios estudios en Brasil, pero ninguno de ellos se ocupó específicamente de los roles que desempeñan los estudiantes. Objetivo: Identificar el papel de los estudiantes entrenadores en el proceso de apropiación de saberes preestablecidos en una intervención con el Sport Education Model (SEM), en los primeros años de la enseñanza básica. Métodos: Una clase de cuarto grado de primaria, compuesta 6 niñas y 11 niños participó de una temporada de veinte clases fundamentadas en SEM. Fue una investigación acción, que incluyó: planificación, implementación, descripción y evaluación de acciones adoptadas. La recolección de datos se realizó a través del registro de imágenes de video, diarios de campo de clases durante la intervención; aplicación de un cuestionario y producción textual por parte de los estudiantes al final de la temporada. Resultados: Se constató que los estudiantes entrenadores fueron capaces de realizar las tareas solicitadas por el docente investigador, así como también identificaron y discutieron problemas y posibles soluciones en las clases. Conclusiones: A través de la formación de pequeños grupos y a través de la figura del alumno entrenador, el SEM potenció la autonomía de los alumnos; el trabajo específico con el alumno entrenador impulsó la consecución de los objetivos preestablecidos, así como favoreció el desarrollo de la autonomía y liderazgo de estos alumnos.

    Palabras clave: Educación Física. Modelos educativos. Deportes. Enseñanza. Atletismo.

 

Lecturas: Educación Física y Deportes, Vol. 27, Núm. 294, Nov. (2022)


 

Introdução 

 

    O Sport Education Model (SEM) é um modelo de ensino que se subsidia em pressupostos construtivistas e busca promover experiências esportivas autênticas para os alunos. Ele integra seis características do esporte institucionalizado, quais sejam: “a época esportiva, a afiliação, a competição formal, o registro estatístico, a festividade e os eventos culminantes”. (Mesquita et al., 2014, p. 2)

 

    De acordo com Pereira (2012), o SEM promove o desenvolvimento da autonomia dos alunos, devido à responsabilidade que lhes é dada no processo de ensino e de aprendizagem e execução das tarefas e papéis, fazendo com que os alunos sejam ativos no processo de aprendizagem.

 

Imagem 1. Os alunos treinadores contribuem para o empoderamento na atuação de 

seu papel na equipe e favorecem a construção da própria experiência de aprendizagem

Imagem 1. Os alunos treinadores contribuem para o empoderamento na atuação de seu papel na equipe e favorecem a construção da própria experiência de aprendizagem

Fonte: Pexels.com - Foto: Pavel Danilyuk

 

    Nesse contexto, o papel do professor é modificado, uma vez que se coloca o aluno no centro do processo de ensino e de aprendizagem e o professor como gestor pedagógico. Apesar de parecer que o professor tem função secundarizada, ele não deixa de ter função essencial nas aulas, já que exerce função de facilitador de aprendizagem, isto é, prepara e habitua os alunos para o modelo de ensino, antevê situações e cria estratégias para que os educandos superem questões frustrantes e alcancem os objetivos educacionais e do SEM. (Pereira, 2012; Siedentop, Hastie, e Mars, 2011; Coelho, 2011, Pereira, 2015)

 

    No SEM, os alunos são organizados em pequenos grupos que permanecem juntos durante toda a temporada e aprendem diversas funções relacionadas com a modalidade esportiva estudada (Pereira, 2015; Coelho, 2011; Mesquita et al., 2016). De acordo com Soares, e Antunes (2016), por meio da execução dos papéis, o SEM proporciona aos alunos a atuação na organização e na coorientação das atividades da aula.

 

    Vale ressaltar que, na investigação ora apresentada, os estudantes não haviam participado de aulas cuja organização fossem parecidas com as do SEM, nem de experiências em que um dos alunos exercessem a figura de liderança, sem o direcionamento do professor. Desse modo, a execução correta dos papéis propostos no modelo de ensino era uma das preocupações no início da investigação, sobretudo a figura do aluno treinador, o qual teria que exercer um papel de liderança e coorientação dos alunos de sua equipe.

 

    Estudos como os de Ward (2005), Ward, e Lee (2005), Farias, Hastie, e Mesquita (2018), indicam que a estratégia da instrução por pares favorece o processo de coorientação instrucional e de tomada de decisão por parte dos estudantes, além de melhorar a compreensão sobre o conteúdo estudado. No SEM, é comum a aprendizagem por meio de descoberta guiada, a qual é desenvolvida a partir de algumas estratégias, dentre elas a presença de um aluno treinador. (Farias, Hastie, e Mesquita, 2018; Puente-Maxera, Méndez-Giménez, e Ojeda, 2018; 2019)

 

    Especificamente sobre a figura dos alunos treinadores, observa-se que há muitas dificuldades dos professores para atuarem e desenvolverem a capacidade de liderança e a autonomia desses alunos, para que estes exerçam esse papel de forma adequada durante a temporada, promovendo o bom desenvolvimento e desempenho de sua equipe e das aulas ao longo da temporada. (Hastie et al., 2011; Wallhead, e O'Sullivan, 2005; Farias, Hastie, e Mesquita, 2018)

 

    Apesar das dificuldades no desenvolvimento da autonomia e da liderança dos alunos treinadores, pesquisadores como Ward (2005), Coelho (2011), Farias, Hastie, e Mesquita (2018), Puente-Maxera, Méndez-Giménez, e Ojeda (2018) indicam que experiências de preparação de alunos treinadores contribuem para o empoderamento desses alunos na atuação de seu papel na equipe, bem como favorecem a construção da própria experiência de aprendizagem. Assim, este estudo busca identificar o papel dos alunos treinadores no processo de apropriação dos conhecimentos preestabelecidos em uma intervenção com o Sport Education Model (SEM), nos anos iniciais do ensino fundamental.

 

Metodologia 

 

    Esta pesquisa foi realizada em uma escola municipal de ensino fundamental – anos iniciais, Escola Municipal Santos Dumont, localizada no município de Paiçandu, no interior do Estado do Paraná, Brasil. O estabelecimento foi escolhido de forma intencional e possuía, na época da pesquisa, um total de 73 alunos matriculados, do primeiro até o quinto ano. Os participantes do estudo foram dezessete alunos1 (6 meninas e 11 meninos), entre 9 e 11 anos, matriculados no quarto ano do Ensino Fundamental – Anos Iniciais.

 

    A unidade didática foi denominada de temporada, nomenclatura utilizada em competições esportivas institucionalizadas, e foi implementada em vinte (20) encontros de cento e vinte (120) minutos. Ela teve por tema a modalidade esportiva atletismo e foi composta por três de suas provas, quais sejam: salto em altura, lançamento de dardo e corrida de resistência. A escolha da modalidade se deu em virtude deste esporte já fazer parte da proposta curricular do município em que a pesquisa foi realizada, além disso os planos de aula atrelavam o SEM às dimensões do conteúdo (conceituais, procedimentais e atitudinais), assim como nas pesquisas de Ginciene, e Matthiesen (2017; 2018), conforme apresentado no quadro a seguir:

 

Quadro 1. Síntese dos objetivos propostos na intervenção pedagógica com o Sport Education Model

Objetivo atitudinal

Objetivo procedimental

Objetivo conceitual

  1. Realizar as atividades em grupo, colaborando e respeitando-se mutuamente.

  2. Reconhecer os próprios limites e os limites dos colegas de equipe e de turma.

  3. Conhecer/Entender a importância do fair play.

  1. Correr e saltar impondo ritmo adequado às provas de atletismo.

  2. Realizar o lançamento de dardo, salto em altura e acorrida de resistência

  3. Realizar de forma articulada condutas motoras de base e neuromotoras presentes nas provas de atletismo da temporada.

  1. Conhecer as características do Sport Education Model e valorizar a festividade e o Fair play presente no esporte institucionalizado.

  2. Conhecer as principais regras e funções de arbitragem das provas do atletismo: lançamento de dardo, salto em altura e corrida de resistência.

  3. Conhecer algumas das mudanças ocorridas na prova de salto em altura, lançamento de dardo e corrida de resistência ao longo do tempo.

Fonte: Produzido pelas autoras, subsidiadas em Siedentop, Hastie, e Mars (2011); 

Matthiesen (2012); González, Darido, e Oliveira (2017)

 

    A temporada foi dividida da seguinte maneira: a) Introdução ao SEM, com aulas sob a orientação, majoritariamente, do professor; b) pré-temporada e temporada, com inserção gradativa dos “papéis” dos alunos (alunos treinadores, anotadores e atletas), treino das habilidades técnicas da modalidade esportiva estudada e competições; c) evento culminante, com competição entre as equipes e premiação dos vencedores.

 

    Foram utilizados os seguintes “papéis” na temporada: atletas, anotadores, árbitros e treinadores2, em que os três primeiros eram realizados por todos os alunos rotativamente, exceto o papel de aluno treinador,uma vez que este foi selecionado pela professora pesquisadora previamente. Os alunos foram divididos em três pequenos grupos fixos, heterogêneos e equilibrados, os quais foram organizados pela professora pesquisadora, por ser a primeira vez que o SEM seria aplicado com a turma. Os nomes das equipes foram escolhidos pelos alunos, quais sejam: Vanderlei Cordeiro de Lima, Andreas Thorkilden e Talles Frederico Sousa Silva.

 

    No que diz respeito aos alunos treinadores, eles foram escolhidos pela professora pesquisadora, a partir de sua percepção de aspectos de liderança e responsabilidade entre os alunos da turma. Foram selecionados dois alunos do sexo masculino e uma do sexo feminino, os quais participavam ativamente das aulas de educação física, bem como se envolviam em práticas esportivas fora do ambiente escolar.

 

    Foram empregadas quatro estratégias para apoiar e desenvolver a autonomia e a liderança dos alunos treinadores ao longo da temporada, quais sejam: 1) Explicação prévia da organização da aula subsequente; 2) solicitação de tarefas aos alunos treinadores, as quais diziam respeito aos objetivos propostos para a aula; 3) solicitação de atividades de aquecimento com foco nas habilidades motoras básicas a serem executadas na competição do dia; 4) discussão das dificuldades observadas na aula anterior e possíveis ações ou modificações que poderiam ser realizadas nas aulas. Essas ações3 ocorreram semanalmente ao longo de toda temporada, por meio de conversas entre a professora pesquisadora e os alunos treinadores, no período em que a professora realizava a preparação das aulas. Este estudo classifica-se como uma pesquisa-ação, uma pesquisa qualitativa, que visa a ação ou resolução de um problema (Thiollent, 1986). Nela, participantes e pesquisadores trabalham cooperativamente na condução e produção do conhecimento. A pesquisa-ação envolve um ciclo que é composto por planejamento, implementação, descrição e avaliação das ações adotadas durante todo o processo investigativo.

 

    Durante o processo de intervenção pedagógica foram selecionadas algumas fontes de coleta de dados, quais sejam: 1) gravação das aulas, todas as vinte (20) aulas foram filmadas usando um celular Samsung A07, o qual ficavam posicionado em uma das laterais da quadra e alcançava todo o espaço em que ocorria a aula4; 2) diário de campo reflexivo, em que se descrevia toda a realização da aula e era avaliado a proximidade entre as ocorrência da aula com a proposta do SEM; 3) questionário, foi realizada a aplicação do questionário de avaliação de domínio afetivo para fim de temporada (Assess Affective Domain End-of-season Survey), disponível no livro Complete Guide to Sport Education. O questionário foi traduzido para o português e adaptado para melhor entendimento dos alunos. Todos os alunos da turma responderam ao questionário, que se compunha por onze (11) afirmações relacionadas às características do modelo de ensino e justificavam as suas respostas; 4) produção textual, que consistiu na produção de um texto cujo tema foi as aulas de Educação Física com o SEM, na aula de produção textual.

 

    Finalizado o processo de intervenção e de avaliação, foram realizados o tratamento e a discussão dos resultados, por meio da análise dos diários de campo, das imagens das aulas, dos textos dos alunos e das respostas dos questionários. Para tanto, optou-se por utilizar aspectos da análise de conteúdo (Bardin, 2011), por meio da pré-exploração e da leitura flutuante dos diários de campo, dos textos produzidos pelos alunos sobre a temporada e do questionário para o fim de temporada, com vistas a estabelecer as unidades de análise.

 

    A partir da seleção e agrupamento das unidades de análise, foi realizada a sua codificação semântica, por meio de classificação dos textos que tratassem de temáticas relevantes para análise. Dentre as temáticas evidenciou-se a importância do papel do aluno treinador para o alcance dos objetivos propostos para a temporada, o que se tornou uma categoria a ser analisada. Desse modo, a partir do referencial teórico do SEM, realizaram-se inferências e análises da influência da figura do aluno treinador no sucesso do SEM, e as interpretações são explanadas a seguir.

 

    Para superar a sua subjetividade da professora pesquisadora no processo de implementação e nas análises das aulas realizou-se a descrição do diário de campo reflexivo, com vistas a manter as aulas embasadas nos pressupostos do SEM, bem como a avaliação por pares, em que o processo de implementação, interpretação e análise dos dados encontrados foi avaliado pelos demais pesquisadores envolvidos na investigação.

 

    Esta pesquisa foi aprovada pelo Comitê de Ética da Universidade Estadual de Maringá, parecer nº 236.092, e os responsáveis pelos alunos participantes assinaram termo de consentimento, enquanto que as crianças assinaram termo de assentimento.

 

Resultados 

 

    Na presente investigação, os pesquisadores articularam a proposta do SEM com a proposta curricular do município em que a intervenção ocorreu. Desse modo, a seleção do conteúdo e seus objetivos basearam-se na proposta curricular municipal e eles foram organizados conforme as dimensões do conteúdo, quais sejam: conceituais, procedimentais de atitudinais5.

 

    Tal organização ocorre pois os Parâmetros Curriculares Nacionais (PCN’s) apresentam uma compreensão acerca dos conteúdos da Educação Física a partir das dimensões conceituais, procedimentais e atitudinais, as quais proporcionariam o alcance dos objetivos educacionais. De acordo com o documento,a dimensão conceitual diz respeito aos fatos históricos, conceitos e princípios de regras e táticas, bem como reflexões relativas ao desempenho, à ética e à estética; a dimensão procedimental se refere à tomada de decisões e à realização de diversas ações para atingir uma meta, não apenas no universo da aquisição das habilidades motoras, mas também da organização e sistematização dos conteúdos estudados; a dimensão atitudinal é representada pelas normas, valores e atitudes vivenciadas pelos alunos e reproduzidas na vida cotidiana deles, consigo mesmo e com os outros. (Brasil, 1998)

 

    Ao longo das aulas com o SEM, os alunos foram gradativamente tomando papel central no processo de aprendizagem, tendo como figura de destaque os alunos treinadores, no processo de alcance dos objetivos educacionais estabelecidos para a temporada. Para a apresentação desses resultados, optou-se por expor os acontecimentos, as ações e/ou opiniões identificadas nos e pelos alunos treinadores no decorrer da investigação a partir da consecução das dimensões do conteúdos, quais sejam: (a) conceitual, (b) procedimental e (c) atitudinal, as quais são expostas à seguir.

 

a.     Dimensão conceitual 

 

    No que diz respeito a dimensão conceitual, isto é, à apropriação de saberes relativos aos conteúdos estudados, nesta investigação, os alunos treinadores realizavam a cada aula uma tarefa relacionada aos saberes conceituais e depois compartilhavam os resultados de suas pesquisas com os alunos de suas respectivas equipes durante a aula, conforme relatos abaixo:

 

    O aluno Kiyoshi Takahashi explicou aos colegas que naquela aula iríamos trabalhar a frequência cardíaca e que eles realizariam um pega-pega, pois quando nós corremos o nosso coração acelera (Diário de campo aula 14).

[...] pedi aos alunos treinadores que realizassem a explicação sobre as mudanças ocorridas na prova do lançamento de dardo, uma vez que eu tinha pedido para eles pesquisarem (Diário de campo aula 10).

    A estratégia de solicitar aos alunos treinadores a pesquisa e a preparação de atividades de aquecimento que estivessem voltadas para os objetivos das aulas favoreceu o desenvolvimento da autonomia e da capacidade desses alunos de organizar o próprio processo de aprendizagem e de suas equipes.

 

    Do mesmo modo que no estudo de Ginciene, e Matthiesen (2017), na intervenção deste estudo, o nome das equipes foi uma homenagem a atletas das provas de atletismo estudadas durante a temporada, o que permitiu que os alunos conhecessem um pouco sobre esses atletas, conforme explicitado nos excertos abaixo:

    As equipes tinham seus nomes e eram: Vanderlei Cordeiro de Lima, Andreas Thorkildsen e Talles Frederico Souza Silva (Eliane Reinert, 9 anos).

 

    Jan Zelezny apresentou o nome do atleta (Andreas Thorkildsen), seu país de origem (Noruega) e outros dados, tais como peso e altura do atleta, prova que participou e sua maior marca. [...] O grupo trouxe também uma imagem do atleta (Diário de campo - aula 03).

 

    O aluno Kiyoshi Takahashi apresentou o nome do atleta (Talles Frederico), sua cidade de origem (São Gonçalo) e outros dados como peso e altura do atleta, e suas principais competições (Diário de campo - aula 03).

 

    O aluno Kenenisa Bekele apresentou o atleta homenageado, isto é, Vanderlei Cordeiro de Lima e eu complementei informando o seu melhor tempo (2:08 minutos) e, também, o tempo do queniano que é o mais rápido na prova atualmente (2h 01 minutos) (Diário de campo - aula 04).

    Os exemplos supracitados indicam que a proposição do SEM, com a formação de equipes e a presença do aluno treinador, potencializa a discussão sistematizada das dimensões conceituais do conteúdo pelos alunos nas aulas de educação física, o que permite que eles se apropriem da organização e da lógica da modalidade atletismo, bem como conheçam seus fatos históricos como esporte competitivo e suas relações com a saúde.

 

b.     Dimensão procedimental 

 

    No que se refere à dimensão procedimental, ou seja, a realização das habilidades técnicas e táticas do conteúdo estudado. Durante as aulas, os alunos treinadores tinham por função auxiliar os alunos de suas equipes no treinamento das habilidades motoras específicas das provas de atletismo estudadas, o que pode ser observado nos excertos a seguir:

    A aluna treinadora da equipe Vanderlei organizou o circuito de corrida e os alunos realizaram o percurso de acordo com o que ela solicitou (Diário de campo – aula 04).

 

    O aluno Jan Zelezny atuou mais ativamente na organização das atividades, o que possibilitou aos alunos de sua equipe mais envolvimento, além disso as meninas realizaram mais vezes os lançamentos (Diário de campo – aula 14).

 

    Os treinadores explicavam as provas para os alunos fazerem (Jessé Farias, 9 anos).

 

    Eu gostei porque ele (aluno treinador) me ajudava (Birhanu Legese, 9 anos).

    Nas exposições acima, observa-se que os alunos treinadores tiveram papel central no desenvolvimento e sucesso da dimensão procedimental, de modo que eles conseguiram organizar e orientar as atividades propostas para a aula, o que foi evidenciado pelos demais alunos das equipes.

 

    Ademais, observa-se que as dimensões procedimentais e conceituais possuem grande proximidade, uma vez que os conteúdos da cultura corporal de movimento envolvem a experiência corporal e sua compreensão (Brasil, 1998; Darido, 2012). Ao trabalhar com as mudanças ocorridas na prova de salto em altura, foi possível evidenciar a proximidade entre essas dimensões, conforme excertos a seguir:

    [...] aluna pediu que todos os alunos se reunissem no colchonete, mostrou a imagem dos três saltos aos colegas e pediu-lhes que realizassem as formas de salto. Assim, aluna Eliane Reinert orientava os alunos a executarem os saltos da forma correta (faz a tesourinha, pula de barriga) e dava feedback positivo aos alunos (Diário de campo – aula 08).

 

    [...] o aluno Kiyoshi Takahashi pediu para os colegas sentarem e explicou o salto tesoura, [...] os alunos olhavam a imagem e depois realizavam o salto (Diário de campo – aula 08).

 

    [...] o aluno treinador Jan Zelezny demonstrou aos seus colegas de equipe a forma de execução dos saltos tesoura e fosbury flop, lembrando da quantidade de passadas para a realização do salto fosbury; o aluno Jan Zelezny realizou o salto e pediu para os colegas executarem, de modo que os alunos realizaram uma vez o salto tesoura e depois tentaram executar o fosbury. [...] os alunos se preocuparam com a orientação dos alunos treinadores, tais como o número de passadas, a forma de execução dos pés no salto tesoura, cair de barriga no salto rolo ventral, e cair de costa no fosbury flop (Diário de campo – aula 08).

    Os excertos acima confirmam a proximidade entre as dimensões conceituais e procedimentais relativas as mudanças ocorridas na prova de salto em altura, evidenciando, assim, que os pressupostos do SEM propiciam essa articulação entre essas dimensões de forma sistematizada e não dicotomizada. Além disso, salienta-se o papel dos alunos treinadores para o alcance desses objetivos, uma vez que os diários de campo indicam a responsabilidade e a liderança dos alunos treinadores na explanação dos tipos de salto em altura e na orientação a seus colegas de equipe.

 

c.     Dimensão atitudinal 

 

    Quanto à dimensão atitudinal, ou seja, à aprendizagem e à construção de valores e atitudes positivas nas/para as atividades corporais (Darido, 2012). A organização do SEM, por pautar-se nos princípios do Fair Play permite o trato dessa dimensão de forma contextualizada, além disso a figura do aluno treinador favoreceu a construção e a efetivação desses valores para uma prática responsável das atividades, conforme apresentado a seguir:

 

    Os alunos já têm se organizado em equipes e os alunos treinadores conversam com seus colegas de equipe sobre o comportamento e o fair play, durante a realização das atividades (Diário de campo - aula 05).

    A avaliação fair play é realizada de forma autônoma pelas equipes, e os alunos não costumam mentir sobre a avaliação dos colegas e autoavaliação, sendo que na equipe do Kiyoshi Takahashi cada aluno está fazendo a sua própria avaliação (Diário de campo – aula 10).

 

    Você sabia o que você fazia de errado (Eliane Reinert, 9 anos).

 

    A gente fala dos comportamentos dos colegas (Kiyoshi Takahashi, 9 anos).

 

    A organização dos alunos proposta pelo SEM - pequenos grupos que trabalham juntos - aliada aos princípios do Fair Play estimula o trabalho em equipe, a preferência pelo jogo justo e responsável e, portanto, a apreensão da dimensão atitudinal de forma efetiva e evidente, garantindo a compreensão do conteúdo de forma ampliada.

    Conforme apresentado acima, assim como pesquisas anteriores, a organização do SEM propiciou o alcance das dimensões do conteúdo, superando a concepção da educação física como uma disciplina majoritariamente, procedimental, e possibilitando, além da aquisição de habilidades motoras, melhorias na apropriação dos conhecimentos históricos e sociais do conteúdo estudados e melhorias na autonomia e relacionamento social dos alunos (Vargas, 2018; Ginciene, e Matthiesen, 2017; 2018). Porém, a presença do aluno treinador, atuando de forma ativa nas aulas, parece ter favorecido o envolvimento e autonomia dos seus colegas de equipe, bem como ter sido um dos fatores importantes para o entrosamento e trabalho em equipes dos alunos na realização das atividades das aulas, assim como identificado por Farias, Hastie, e Mesquita (2018), e Puente-Maxera, Méndez-Giménez, e Ojeda (2018).

 

Discussões 

 

    A presente investigação buscou identificar o papel do aluno treinador na apreensão dos objetivos de aprendizagem estabelecidos em uma temporada baseada no SEM. A função do aluno treinador é o papel com maior responsabilidade e liderança no SEM com relação a sua equipe, assim a criação de estratégias que contribuam para o desenvolvimento desses aspectos nos alunos tem sido alvo de investigações. (Ward, 2005, Ward, e Lee, 2005; Farias, Hastie, e Mesquita, 2018; Puente-Maxera, e Méndez-Giménez; Ojeda, 2018)

 

    Farias, Hastie, e Mesquita (2017) afirmam que modelos de ensino centrados no aluno, como o SEM, apresentam estruturas conceituais e pedagógicas que proporcionam aprendizagens significativas e autênticas. Nesta perspectiva, o professor precisa estabelecer estratégias para o desenvolvimento da habilidade de liderança do aluno treinador, além de facilitar a compreensão sobre o esporte estudado (táticas e regras) e nortear as formas de instruções e de envolvimento e interação dos alunos da equipe nas aulas.

 

    Pereira (2012) relata que muitos professores apresentaram dificuldade para atender às demandas do momento da aula, para promover feedback apropriado aos alunos treinadores e dar-lhes voz. Outros estudos relatam que os professores não conseguem oferecer atividades que facilitem a atuação do aluno treinador, quanto ao seu papel no ensino das habilidades técnicas e táticas das modalidades ensinadas, o que torna as aulas pouco produtivas e a figura do aluno treinador pouco relevante. (Pereira, 2012; Ginciene, e Matthiesen, 2017; 2018; Pereira, 2015; Mesquita et al., 2016)

 

    Estudos como o de Pereira (2015) e Hastie, Ojeda, e Luquin (2011) evidenciam que nem sempre os alunos mais habilidosos da turma são os alunos mais aptos a serem treinadores, pois saber realizar as habilidades técnicas e táticas básicas de forma eficiente não significa ser capaz de transmitir esses conhecimentos aos colegas. Por outro lado, Puente-Maxera, Méndez-Giménez, e Ojeda (2019) observaram que a utilização de alunos mais habilidosos como alunos treinadores favoreceu a aprendizagem dos demais alunos, uma vez que eles transmitiam as atividades propostas de forma correta, bem como foi possível observar maior envolvimento e protagonismo por parte dos outros alunos das equipes.

 

    Puente-Maxera, Méndez-Giménez, e Ojeda (2018) ressaltam que a capacidade de comunicação se torna um aspecto a ser considerado no momento de escolha do aluno treinador, uma vez que a forma de comunicação facilitará ou não a apropriação dos conhecimentos pelos alunos. Assim, observou-se na presente investigação que a comunicação entre alunos treinadores e alunos atletas foi o principal meio para a resolução dos problemas das aulas e para a orientação na realização das atividades.

 

    De acordo com Siedentop, Hastie, e Mars (2011), o aluno treinador tem papel essencial para o sucesso de modelo de ensino e a postura dele é que vai determinar a postura e o envolvimento do grupo. Desse modo, a escolha do aluno que desempenhará esse papel deve levar em consideração não apenas seu desempenho motor, mas sua capacidade de comunicação, liderança e responsabilidade, sendo as duas últimas as principais características levadas em conta no momento de escolha dos alunos treinadores na presente investigação.

 

    Pesquisas anteriores indicam a necessidade de se desenvolver um protocolo de formação específica para os alunos treinadores, de modo que favoreça o desenvolvimento da autonomia, da responsabilidade e da liderança dos alunos treinadores. (Wallhead, e O’Sullivan, 2005; Wallhead, Bush, e Hook, 2007; Ojeda, 2013; Farias, Hastie, e Mesquita, 2017)

 

    Farias, Hastie, e Mesquita (2017) alertam que colocar os alunos em equipes, por si só, não garante o processo de envolvimento ativo dos alunos nem do aluno treinador. Assim, subsidiada em Pereira (2015) e Coelho (2011), esta investigação buscou fornecer conhecimentos e formações para a efetivação do ensino colaborativo e/ou por pares nas aulas.

 

    Foram identificados resultados positivos em um protocolo de formação do aluno treinador, cujo intuito era auxiliá-lo na transmissão de informação, no fornecimento de feedbacks e na melhoria da capacidade de jogar. Nessa formação, os alunos treinadores aprenderam a utilizar o quadro negro como meio para apropriação dos conceitos táticos e resolução de problemas, o que propiciou maior autonomia e tomada de iniciativa de todos os alunos das equipes. (Ojeda, 2019; Puente-Maxera, Méndez-Giménez, e Ojeda, 2019)

 

    Estudos anteriores apontam também para a boa eficiência do procedimento denominado Instructional scaffolding ou andaime, em que o aluno atua a partir do suporte pedagógico de um adulto (professor) ou alguém com mais conhecimento sobre o conteúdo estudado. Ademais, foram encontradas algumas ações que favorecem o aumento da responsabilidade e a capacidade de liderança dos alunos, tais como: ensino recíproco, descoberta guiada, uso de cartões de tarefas, conhecimento prévio dos alunos, identificação de problemas técnicos e táticos, reflexão sobre a ação e manual de equipes com descrição das funções a serem desempenhadas pelos alunos e das propostas de atividades para as aulas, além da apresentação de desenhos de jogos e das regras do esporte estudados e suas possíveis adaptações. (Farias, Hastie, e Mesquita, 2018; Puente-Maxera, Méndez-Giménez, e Ojeda, 2018)

 

    Farias, Hastie, e Mesquita (2018) realizaram um estudo longitudinal com a preparação de alunos treinadores por meio de atividades instrutivas, interativas e análise de vídeos e áudios. De acordo com os autores, há uma relação estreita entre o desenvolvimento do aluno treinador nas aulas e sua capacidade de questionar, explicar e resolver problemas propostos pelo e com o auxílio do professor. Ao fim do estudo, os pesquisadores observaram os alunos treinadores mais responsáveis e mais ativos no monitoramento do desenvolvimento dos membros de suas equipes e na resolução de problemas.

 

    Desse modo, as estratégias de preparação dos alunos treinadores atreladas à organização do SEM facilitaram a compreensão tática e a jogabilidade dos alunos. Do mesmo modo, nesta investigação, os alunos treinadores conseguiram aplicar as instruções fornecidas pela professora pesquisadora e criar estratégias para melhorar o desempenho de suas equipes, facilitando o processo de aprendizagem dos estudantes.

 

    Utilizando estratégias empregadas por outros pesquisadores, como Coelho (2011), nesta pesquisa, a professora pesquisadora passou a realizar um momento de diálogo com os alunos treinadores, no momento dedicado à preparação da aula, com o intuito de promover ações que facilitassem a aquisição da autonomia e desenvolvessem a liderança dos mesmos, na realização das atividades das aulas. Nesse momento, era oferecido o feedback aos alunos treinadores, no que se refere aos comportamentos e atitudes deles e dos colegas de equipe, bem como relativo à organização da aula, às atividades a serem desenvolvidas e à solicitação de tarefas de casa.

 

    No que diz respeito ao alcance das dimensões do conteúdo, pesquisas nacionais,como de Vargas (2018), Ginciene (2016), e Ginciene, e Matthiesen (2018), indicaram que o SEM permite a articulação sistematizada das três dimensões nas aulas. Os estudos indicaram que o SEM propicia a apropriação aprofundada dos conhecimentos técnicos e críticos da modalidade esportiva estudada (dimensão conceitual), proficiência nas habilidades técnicas e táticas e relativas aos papéis presentes no conteúdo estudado (dimensão procedimental) e melhorias no trabalho coletivo, no respeito a seus pares e na autonomia para a resolução de problemas (dimensão conceitual).

 

    Os resultados supracitados foram identificados na presente pesquisa, assim, acredita-se que o trabalho desenvolvido com os alunos treinadores potencializou o alcance dos objetivos propostos nesta intervenção pedagógica, pois assim como na pesquisa de Farias, Hastie, e Mesquita (2017), o aluno treinador tornou-se figura central no processo de indução e envolvimento dos alunos nas atividades da aula.

 

    Nesse sentido, Pereira (2015), e Ojeda (2013; 2019) afirmam que há uma tendência de os alunos se sentirem melhor em atividades lideradas por um outro colega de classe, do mesmo modo que o aluno que dirige a atividade (aluno treinador) sente maior necessidade de se comprometer com a realização da atividade proposta. Observa-se, portanto, que os alunos preferem instruções lideradas por seus pares à realizada pelo professor, pois os educandos integram o mesmo sistema social. A presente investigação, assim como a pesquisa de Pereira (2015), constatou que os alunos tinham facilidade para aprender com um colega de turma e reconheciam sua capacidade de ensino, ao passo que o aluno treinador apresentava muita responsabilidade e entusiasmo na execução de seu papel.

 

    Conforme apresentado em pesquisa anteriores (Siedentop, Hastie, e Mars, 2011; Pereira, 2015), observou-se que o engajamento do aluno treinador nas atividades e na execução de sua função resulta, substancialmente, no engajamento da equipe. Quando os alunos treinadores não se empenhavam na execução das atividades, consequentemente, os seus colegas de equipe também não participavam, e o contrário também acontecia, isto é, quando eles se empenhavam os demais alunos faziam o mesmo.

 

    Portanto, conforme salienta Pereira (2015), a figura do aluno treinador possibilitou maior interdependência entre os alunos na realização e na gestão das tarefas e observância às instruções recebidas, além de maior nível de esforço e persistência e menor comparação de competência entre os indivíduos.

 

Conclusões 

 

    Os resultados até aqui apresentados reforçam que o trabalho colaborativo entre professor e aluno treinador potencializa o alcance dos objetivos de aprendizagem preestabelecidos para a temporada e, também, dos objetivos do SEM. Desse modo, a presente investigação resultou no desenvolvimento dos objetivos conceituais, procedimentais e atitudinais do conteúdo estudado, bem como possibilitou a formação de alunos competentes, entusiastas e literatos.

 

    Embora a literatura científica internacional já apresente algumas formas de atuação junto aos alunos treinadores com vistas a desenvolver suas habilidades de liderança e autonomia, observa-se que a utilização de reuniões semanais, com a discussão de aspectos ocorridos nas aulas e possíveis mudanças, bem como a solicitação de tarefas de casa, possibilitaram que os alunos treinadores se envolvessem de forma efetiva nas atividades das aulas e, consequentemente, potencializaram a aprendizagem e o envolvimento dos alunos de suas equipes.

 

    Nessa perspectiva, salienta-se a necessidade de novas pesquisas que realizem a aplicação de propostas de intervenção junto aos alunos treinadores na implementação de aulas com o SEM na realidade nacional. Tais pesquisas podem subsidiar-se em experiências realizadas previamente, no âmbito internacional, tais como o uso de ensino por pares, o ensino recíproco, o uso de manual de equipes, as fichas de treinamento, o uso de quadro negro, entre outros. Da mesma forma, no âmbito da prática docente, acredita-se que em futuras intervenções com o SEM possam ser utilizadas outras formas de trabalho junto aos alunos treinadores, as quais os levem a refletir sobre a suas ações e seu papel nas aulas, bem como avaliar e propor ações didáticas de acordo com as necessidades específicas de suas equipes,com vistas a alcançar dos objetivos propostos para a temporada.

 

Notas 

  1. Para garantir a confidencialidade dos alunos participantes da pesquisa optou-se por realizar a substituição dos nomes verdadeiros por nome de atletas do atletismo.

  2. No SEM, os alunos desempenham diferentes papéis, tal qual no esporte institucionalizado. Nesta investigação utilizou-se de quatro papéis, quais sejam: atleta, que aprendia as técnicas e táticas da modalidade esportiva estudada e a jogar de maneira justa e cooperativa; anotador, que registrava e acompanhava o desempenho e desenvolvimento de todos integrantes da equipe em um caderno de equipe, em todas as aulas; o árbitro, que organizava e coordenava as competições; e os treinadores, que direcionava as atividades a serem realizadas pela sua equipe, bem como coordenava os momentos de treinamento e competições.

  3. Durante a realização das aulas, a professora pesquisadora se reunia com os alunos treinadores por cerca de 10 minutos, uma vez por semana. Normalmente, este momento era realizado no dia em que a professora preparava suas aulas (hora atividade). Para que isso ocorresse, os alunos, com a devida autorização da professora regente de turma, se ausentavam da aula por alguns minutos.

  4. O percurso estabelecido para a corrida de resistência não foi gravado, devido a sua composição que envolvia diversos espaços da escola. Desse modo, foram gravadas apenas a área de largada e de chegada da corrida.

  5. No período de realização dessa investigação, a proposta curricular do município em que se realizou a pesquisa não tinha ocorrido a implementação da Base Nacional Comum Curricular.

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Lecturas: Educación Física y Deportes, Vol. 27, Núm. 294, Nov. (2022)