Lecturas: Educación Física y Deportes | http://www.efdeportes.com

ISSN 1514-3465

 

Jardim do Turia: uma celebração à diversidade esportiva valenciana em imagens

Turia Garden: a Celebration of Valencian Sporting Diversity in Images

Jardín del Turia: una celebración de la diversidad deportiva valenciana en imágenes

 

Rodrigo Koch

prof.koch.rodrigo@gmail.com

 

Pós-Doutor (Sociologia i Antropologia Social)

pelo Institut Universitari de Creativitat i Innovacions Educatives

de la Universitat de València

Doutor em Educação (Culturas Juvenis)

pela Universidade Federal de Santa Maria (UFSM)

Mestre em Educação (Estudos Culturais)

pela Universidade Luterana do Brasil (Ulbra)

Pós-graduado em Administração e Marketing Esportivo

pela Universidade Gama Filho (UGF)

Graduado em Educação Física

pela Universidade Luterana do Brasil (Ulbra)

(Brasil)

 

Recepção: 01/11/2021 - Aceitação: 05/03/2022

1ª Revisão: 01/02/2022 - 2ª Revisão: 28/02/2022

 

Level A conformance,
            W3C WAI Web Content Accessibility Guidelines 2.0
Documento acessível. Lei N° 26.653. WCAG 2.0

 

Creative Commons

Este trabalho está sob uma licença Creative Commons

Atribuição-NãoComercial-SemDerivações 4.0 Internacional (CC BY-NC-ND 4.0)

https://creativecommons.org/licenses/by-nc-nd/4.0/deed.pt

Citação sugerida: Koch, R. (2022). Jardim do Turia: uma celebração à diversidade esportiva valenciana em imagens. Lecturas: Educación Física y Deportes, 27(288), 189-205. https://doi.org/10.46642/efd.v27i288.3240

 

Resumo

    Este artigo trata-se de um relato de experiência inicial com objetivo de identificar hábitos desportivos entre os cidadãos valencianos, com olhares mais específicos para a prática e manifestações culturais atreladas ao futebol, pois os interesses futuros de investigação estão voltados para este campo. Foram utilizadas duas ferramentas metodológicas para a coleta de dados: observação e registro de imagens, com posterior descrição dos fatos para caracterizar a população. O Jardim do Turia, atualmente, reúne uma diversidade de modalidades desportivas e, tal condição fica mais bem exposta e descrita através de imagens; recurso utilizado neste artigo. A partir deste levantamento inicial das atividades desportivas praticadas pelos cidadãos e visitantes da Comunidade Valenciana, em seu principal espaço público, foi possível delinear as principais práticas corporais e esportivas desta população, além de apontar caminhos investigativos futuros na pesquisa pós-doutoral.

    Unitermos: Jardim do Turia. Sociologia do Esporte. Valência. Diversidade cultural.

 

Abstract

    This article is a report of an initial experience with the objective of identifying sporting habits among Valencian citizens, with more specific perspectives on the practice and cultural manifestations linked to football/soccer, as future research interests are focused on this field. Two methodological tools were used for data collection: observation and image recording, with subsequent description of the facts to characterize the population. Turia Garden currently brings together a variety of sports and this condition is better exposed and described through images; resource used in this article. From this initial survey of sports activities practiced by citizens and visitors of the Valencian Community, in its main public space, it was possible to outline the main bodily and sports practices of this population, in addition to pointing out future investigative paths in post-doctoral research.

    Keywords: Turia Garden. Sport Sociology. Valence. Cultural diversity.

 

Resumen

    Este artículo es un primer informe de experiencia con el fin de identificar hábitos deportivos entre los ciudadanos valencianos, con una mirada más específica sobre la práctica y manifestaciones culturales vinculadas al fútbol, ​​ya que los intereses de investigación futuros se centran en este campo. Se utilizaron dos herramientas metodológicas para la recolección de datos: observación y registro de imágenes, con posterior descripción de los hechos para caracterizar a la población. El Jardín del Turia reúne actualmente una diversidad de deportes y esta condición se expone y describe mejor a través de imágenes, recurso utilizado en este artículo. A partir de este primer relevamiento de las actividades deportivas practicadas por los ciudadanos y visitantes de la Comunidad Valenciana, en su principal espacio público, fue posible esbozar las principales prácticas físicas y deportivas de esta población, además de señalar futuras vías de investigación en la investigación post-doctoral.

    Palabras clave: Jardín del Turia. Sociología del Deporte. Valencia. Diversidad cultural.

 

Lecturas: Educación Física y Deportes, Vol. 27, Núm. 288, May. (2022)


 

Introdução 

 

    Este artigo foi desenvolvido a partir de observações feitas por este pesquisador em seus primeiros meses de residência na cidade de Valência (Espanha), por conta do período de estágio pós-doutoral na Universitat de València, vinculado à Facultat de Ciències Socials e ao Institut Universitari de Creatividad i Innovacions Educatives, no curso letivo de 2021-2022. O objetivo destas observações iniciais foi identificar hábitos desportivos entre os cidadãos valencianos, com olhares mais específicos para a prática e manifestações culturais atreladas ao futebol, pois os demais interesses de estudo estão voltados para este campo. No entanto, a diversidade esportiva encontrada no principal parque urbano da cidade despertou novos caminhos investigativos, que poderão ser explorados a partir do texto que segue tanto neste período de investigação como em futuros estágios, ou até mesmo por outros pesquisadores interessados na temática.

 

    Como metodologia foram utilizadas duas ferramentas para a coleta de dados: observação e registro de imagens, com posterior descrição dos fatos para caracterizar a população. A escolha destas ferramentas metodológicas se deve pela facilidade de emprego das mesmas e análise imediata e direta dos fatos, já que o objetivo deste levantamento foi apenas apurar condições iniciais e não aprofundadas dos comportamentos sociais a partir de práticas desportivas. O artigo está dividido em cinco partes: introdução, breve histórico da constituição do Jardim do Turia (locus das observações), metodologias empregadas, descrição dos resultados encontrados a partir das observações, registro de imagens e coleta de dados, e considerações finais.

 

    Acreditamos que a descrição das próximas páginas contribui não só para os estudos deste pesquisador, como também para outros pesquisadores com interesses voltados para práticas corporais e esportivas urbanas em espaços públicos, não só, mas também na região da Comunidade Valenciana.

 

O Jardim do Turia 

 

    Valência, na Espanha, foi fundada por soldados romanos aproximadamente entre 135 a.C. e 138 a.C. ao longo do plano e das margens do Rio Turia que estava há vários quilômetros da costa. A fundação de Valência ocorre, sobre uma ilha fluvial no delta do rio, produzida pela bifurcação do Turia. Posteriormente, em outros períodos históricos, Valência foi ocupada e dominada por árabes e depois tomada pelo catolicismo com as cruzadas. A cidade era definida como fluvial e não marítima devido à distância do mar em relação ao centro da cidade e das modestas instalações de seu porto, além do caráter torrencial do rio que provocava periodicamente inundações.

    Desde as suas origens que cidade de Valência está intimamente ligada ao rio Turia. [...] A identidade comum representa a intimidade que havia e há entre o rio e a cidade. A consolidação de Valência como cidade deve-se em parte à presença do rio sendo este um elemento importante e ao desenvolvimento da agricultura baseada na melhoria de um sistema de regadio eficiente, chamado “acéquias”. Este sistema de “valas” permitia controlar o curso da água, especialmente nos meses secos. O Turia era um rio domesticado e metade do seu caudal não era constante. A população nos meses de Primavera e Verão, aproveitava o caudal “seco” do rio para realizar festas, celebrações, feiras, mercados e outros usos quotidianos e de lazer. (Azevedo, 2013, p. 29)

    No entanto, por vezes o rio transbordava. Segundo Azevedo (2013) “as inundações produzidas pelas fortes chuvas nos meses de Outono, tinham como consequência natural o aumento do caudal levando-o a transbordar. Os primeiros relatos são registrados, no século XI

    [...]”. Uma das piores inundações ocorreu em setembro de 1870 quando houve um forte temporal. Houve vítimas, danos na agricultura, e destruição de pontes. A situação se agravou com o aparecimento da febre amarela, causando mais baixas na população. Segundo Llopis (2011), entre 1321 e 1957 registram-se vinte e dois transbordos e onze enchentes do rio na cidade. Ao final do século XIX o panorama urbano era o seguinte: após décadas de litígio, o governo havia aprovado o projeto de expansão de Valência, limitado pelo canal do Rio Turia e com muros de contenção em alguns pontos. (Llopis, 2011)

    Ao final do século XIX (1881-1890) projetos iniciais de ocupação das margens e posterior desvio do curso do Rio Turia começam a ganhar força. A ideia era proporcionar à Valência uma extensa área de terrenos para expansão e exploração imobiliária, dispor de vários hectares para o cultivo de cítricos, e transformar o canal do rio também em uma área comercial a ser explorada, com armazéns e docas de interesse geral. Os projetos indicavam que o Rio Turia se tornaria o canal de águas baixas, com zonas próprias para inundações controladas que tornariam o solo mais fértil.

 

    A data determinante para a transformação do Rio Turia em Jardim foi o dia 14 de outubro de 1957, quando o rio, pela última vez, transbordou e inundou a cidade, levando consigo sessenta e nove vidas e um incalculável prejuízo econômico (Azevedo 2013). Portanto, quando a barreira tradicional do Turia finalmente transborda a área urbana, é estabelecida na margem esquerda uma ampla zona habitada.

 

    La gran riada de València del 14 de octubre de 1957, popularmente conocida como La Riuà, marcó el futuro del urbanismo de la ciudad. El elevado número de víctimas que causó -según datos oficiales hubo 81 muertos, una cifra que nunca gozó de mucha credibilidad y a buen seguro que fue ampliamente superada por el número real de fallecidos y desaparecidos-, se debió en gran medida a la existencia de una población flotante que habitaba en chabolas y otras infraviviendas (bidonvilles) ocupando una parte del cauce del rio en las proximidades de València. (Alvarez García, 2019, p. 1138)

 

    Con la intención de evitar que esta catástrofe natural pudiera repetirse con tales consecuencias, el Ayuntamiento de Valencia, junto con la Confederación Hidrográfica del Júcar, planteó tres posibles soluciones entre las que destacaba el denominado ‘PLA SUD’ (1958). Este proyecto, aprobado por ley en diciembre de 1961 por el gobierno franquista, consistía en desviar el cauce del río a un nuevo canal alejado de la ciudad y con mayor volumen para prevenir las posibles inundaciones periódicas. (Serra Albert, 2019, p. 11)

 

    O centro vital de Valência sofre assim um notável deslocamento para o norte e a faixa do canal urbano se torna a espinha dorsal da nova cidade. O canal que abandona o Turia constitui uma magnífica oportunidade de dotar a cidade de algumas expansões verdes que faziam muita falta. O futuro desenvolvimento de Valência deveria ser para oeste e noroeste, onde os terrenos eram mais baratos, mais saneáveis e, por causa do declive, nunca haveria o problema de esgoto. O canal abandonado do rio permitiria sua transformação em rodovia da cidade baixa e, portanto, adversa aos conflitos urbanos da cidade (Llopis, 2011). O período franquista ao mesmo tempo que encobriu os problemas do Turia, utilizou também os projetos urbanos que envolviam o rio para propaganda política. Havia promessas, porém os avanços eram lentos.

 

    A intervenção definitiva, e mais importante é realizada após a última inundação -de 1957- e altera profundamente o leito do rio. A solução é radical e prende-se com a construção do Plano Sul (1964-1974) que consiste na construção de um novo caudal para o rio Turia a sul da cidade, retirando assim a água do centro. Assim sendo, coloca-se um “ponto final” nos problemas das inundações que tanto afetaram cidade [...] Esta solução permitiu, libertar para a cidade, novos e grandes espaços livres, cujo destino foi dos temas mais discutidos e debatidos durante a segunda metade do século XX. A oportunidade que se criou com o “vazio” e seco leito do rio era única. Abriram-se novas “pontes” para intervir num novo e enorme espaço público no interior da cidade. Estas soluções, [...] não passaram, [...] de projeto e provocaram a mobilização alternativa popular que defendia, a transformação do antigo caudal do rio num grande jardim. [...] Este momento, foi decisivo para transformar o caudal do rio Turia no parque público que hoje conhecemos. (Azevedo, 2013, pp. 31-32)

 

    Em 1958, baseado na Solução Sul, aprova-se um “novo” Rio Turia que iria percorrer o sul da cidade de Valência e iria manter as “acéquias”. Pretendia-se que o caudal tivesse 12,6 quilómetros de comprimento, 200 metros de largura e uma capacidade de escoamento de 5000 m3/segundo. Teria o início em Quart de Poblet e conclusão em Pinedo. (Azevedo, 2013, p. 62)

 

    Enfim, nos finais da década de 1960 são executadas as obras do “Plano Sul”. Em 1974, surge a proposta para que o velho canal do rio seja somente parque. A década é marcada por avanços urbanos em relação ao Rio Turia. Optou-se por utilizar o local, única e exclusivamente como espaço público, de modo a contribuir para a resolução de problemas que Valência tinha, sem que tal solução beneficiasse não somente os cidadãos motorizados. Os objetivos eram dotar a cidade de um espaço público de livre acesso, eliminar a agressividade ao meio ambiente e revalorizar a imagem histórica de Valência. “A construção do novo caudal levava a que o antigo começasse a ficar cada vez com menos água. É no período das obras que se ‘ocupa’ o antigo leito do rio com campos desportivos e começam a ser construídas ou remodeladas pontes especialmente nos primeiros setores – oeste – para facilitar o trânsito” (Azevedo, 2013, p. 64). No velho canal do Rio Turia convergem os espaços verdes e públicos mais importantes da cidade, que isolados como estão agora, ao mesmo tempo estão separados e integrados ao tecido urbano de forma harmônica. Com a intenção de conservar a imagem da cidade, se mantém uma corrente contínua de água em certos pontos, como uma fina lâmina, com objetivo ecológico de purificar e manter o grau de humidade. A partir de meados da década de 1970 a cidade se desenvolve na direção do mar, ao sul, e são criadas linhas ferroviárias com tuneis e trilhos aéreos. O velho leito do Rio Turia se converte então em um parque com árvores frondosas e um canal interior de drenagem. A parte final é transformada em estuário, o que permite também o desenvolvimento de esportes náuticos, e uma doca industrial e de carga com imbatíveis condições. Elege-se três temas considerados prioritários: o homem, a árvore e a água. (Llopis, 2011)

 

    O Turia se tornaria então em um grande parque de recreação e expansão da cidade com mais de 160 hectares. Não há dúvidas que, definitivamente, se trata de um rio que forma parte da história da cidade e que ainda que se qualifique como zona verde deverá conservar de alguma forma este caráter. Portanto, se propõe que o parque urbano conte com o elemento água com fins de manter viva a imagem do rio e sobretudo valorizar sua importância e beleza das antigas pontes da cidade. A década de 1980 apresenta outros avanços urbanos vinculados ao Turia -com o início da construção do parque que passa a ser conhecido como Jardim do Turia em 1985- e, finalmente a partir dos anos 1990 há as transformações finais que conduzem e condicionam o Turia em jardim, sendo acrescidos ao seu contexto o Palácio da Música (1987), o complexo da Cidade das Artes e das Ciências (a partir de 1998) e, o Parque da Cabecera (2002).

 

    A Cidade das Artes e das Ciências é um complexo arquitetônico, cultural e de entretenimento. Desenhado por Santiago Calatrava e Félix Candela, o projeto começou a ser executado em julho de 1996 e inaugurado em 16 de abril de 1998. O último componente da Cidade, o Palácio das Artes Rainha Sofía, foi inaugurado em 09 de outubro de 2005. O complexo é formado pelas seguintes construções: L'Hemisfèric (cinema, e planetário), El Museu de les Ciències Príncipe Felipe (museu interativo de ciências), L'Umbracle (trilha de caminhada com plantas selvagens, que conta também com uma galeria de arte com esculturas de artistas contemporâneos), L'Oceanogràfic (o maior aquário oceanográfico da Europa), El Palau de les arts Reina Sofia (casa de ópera e apresentações de artes), a Praça Principal (coberta, onde são realizados concertos e eventos esportivos), e futuramente as Torres de Valência, Castellón e Alicante.

 

    O antigo leito do rio Turia é atualmente um imenso parque público com uma área aproximada de 12 km de comprimento e mais de 150 metros de largura (em alguns pontos pode chegar aos 250 metros). O Jardim do Turia, está dividido por dezoito setores e constitui a coluna vertebral da cidade de Valência. Estes setores estão divididos espacialmente, pelas pontes, que fazem a ligação entre ambas as margens e que sempre estiveram presentes na paisagem urbana da cidade. Ao longo de todo espaço público do Turia há diversos campos esportivos.

 

Figura 1. Vista aérea de parte do Jardim do Turia e da cidade de Valência

Figura 1. Vista aérea de parte do Jardim do Turia e da cidade de Valência

Fonte: Google Images

 

    Recentemente, Valência foi eleita pelo segundo ano consecutivo a cidade mais saudável do mundo, tendo o Jardim do Turia como fator de destaque na avaliação. “Por segundo año consecutivo los resultados de este estudio han vuelto a coronar a la capital del Turia por ser la que mejor cuida de la salud de los suyos y sus visitantes”. O levantamento da Money.co.uk levou em conta os seguintes aspectos: níveis de obesidade, esperança de vida, níveis de contaminação, atenção sanitária, segurança, índice de criminalidade e horas de luz solar. O relatório final do estudo destaca ainda que “[...] cabe añadir los cinco millones de metros cuadrados de zonas verdes de la ciudad. El Parque de Cabecera, el Parque Central, los Jardines del Real o el Jardín del Turia son solo algunos de los principales lugares donde ciudadanos y visitantes pueden disfrutar de árboles, flores y pájaros”. 

Percurso metodológico 

 

    Esta é uma pesquisa descritiva, na qual foi caracterizado o perfil de uma população, através de fatos recentes. Neste estudo foram utilizados basicamente duas ferramentas metodológicas: observação (Marconi, e Lakatos 2003) e fotografias. A observação permite ao pesquisador observar o comportamento das pessoas em seu ambiente natural ou controlado. Foram registrados de forma sistemática os dados de comportamentos, fatos e ações. A atividade de observação se preocupa em utilizar os sentidos para entender o cotidiano e extrair conhecimentos, e é considerada como um método vantajoso porque permite conhecer os fatos e fenômenos diretamente. Entre os vários tipos de observação, nesta pesquisa foram utilizadas as observações sistemática e participante (Gil, 2008). Este pesquisador viveu na comunidade valenciana durante oito meses entre os anos de 2021 e 2022 e, frequentava o Jardim do Turia de três a cinco vezes semanais.

 

    Já as imagens oferecem registros restritos, mas poderosos das ações temporais e dos acontecimentos reais. Embora a pesquisa nas ciências sociais esteja tipicamente a serviço de complexas questões teóricas e abstratas, ela pode empregar, como dados primários, informação visual que não necessita ser nem em forma de palavras escritas, nem em forma de números. Cada vez mais, a sociedade em que vivemos está crescentemente sendo influenciada pelos artefatos digitais e visuais de comunicação. Portanto, o visual e a mídia desempenham papeis importantes na vida social, política e econômica. Eles se tornaram “fatos sociais” e não podem ser ignorados (Loizos, 2002). Neste estudo as fotografias foram produzidas por este pesquisador, evitando a identificação dos indivíduos, por vezes presentes. Portanto, também não houve a necessidade de autorização prévia para utilização científica das mesmas como fonte de dados. As fotos foram realizadas ao longo de três meses (setembro a novembro de 2021) e, depois selecionadas para posterior análise das imagens.

 

Jardim do Turia no século XXI: uma celebração à diversidade esportiva 

 

    As observações e registros de imagens realizados no segundo semestre de 2021 nos mostram um Rio Turia, contemporaneamente, tomado por atividades esportivas e recreativas, sendo um espaço de convívio social dos moradores e visitantes da cidade de Valência. O parque, como é chamado pelos habitantes, ou Jardim do Turia (nome oficial), reúne uma diversidade de modalidades desportivas. Tal condição fica mais bem exposta e descrita através de imagens do que com simples palavras. Nas sequência deste texto, relacionamos e relatamos o que encontramos neste estudo observatório e descritivo.

Dentro do Jardim do Turia, há um circuito de quase 6 km para Corrida, inaugurado em setembro de 2015. O circuito tem uma rota linear de 5.731 metros de layout específico para o corredor. Nesse sentido, o desenho da rota levou em consideração as dimensões e geometria do circuito com segurança e conforto para corredores profissionais ou amadores.

    Esta iniciativa se enmarca dentro del proyecto global Valencia Ciudad del “Running” liderado por la Fundación Trinidad Alfonso, que incluye el maratón y medio maratón de Valencia, recientemente galardonadas con el sello de oro de la IAAF (International Association of Athletics Federations). (Alcover et al., 2016, p. 28)

Figura 2. Placa indicativa do percurso de corrida no Jardim do Turia

Figura 2. Placa indicativa do percurso de corrida no Jardim do Turia

Fonte: Autor

 

    O Ciclismo é outra prática do cotidiano dos valencianos. Há uma extensa malha ciclo viária na cidade, utilizada tanto para o lazer e atividades físicas como para os próprios deslocamentos dos cidadãos, na qual o Jardim do Turia atua como eixo principal e norteador, apresentando pistas seguras e bem-sinalizadas em ambas as margens do parque. Portando, é rotineiro encontrar ciclistas profissionais, amadores, turistas que locam bicicletas para passeio e lazer, ou simples moradores da cidade que em alguns momentos do dia ou da semana realizam a prática desportiva ciclística no espaço público do Turia.

 

Figura 3. Ciclistas trafegam pela ciclovia do Jardim do Turia

Figura 3. Ciclistas trafegam pela ciclovia do Jardim do Turia

Fonte: Autor

 

    Grupos com ou sem instrutores de Ginástica, Ioga, Dança e demais atividades de alongamento também são frequentes no Jardim do Turia e, encontrados facilmente ao longo dos seus quase 12 quilômetros de extensão. Estas atividades, normalmente, se concentram na parte norte-oeste do parque, nas proximidades ou entre as estações do metrô Alameda e Turia. A partir das observações, é perceptível que alguns profissionais de Educação Física e Fisioterapia utilizam o Jardim do Turia como espaço laboral para o atendimento de seus alunos/clientes, o que caracteriza o parque também, em certa medida, como um local para o trabalho informal.

 

Figura 4. No sentido horário, grupo de atividades de ginástica e alongamento que se reúne diariamente, pessoas dançando abaixo da ponte de L’Exposició, e prática de Ioga no Jardim do Turia sob orientação de profissionais de Educação Física

Figura 4. No sentido horário, grupo de atividades de ginástica e alongamento que se reúne diariamente, pessoas dançando abaixo da ponte de L’Exposició, e prática de Ioga no Jardim do Turia sob orientação de profissionais de Educação Física

Fonte: Autor

 

    Há vários desportos que dentro do Jardim do Turia disfrutam de condições diferentes, provocando maior incidência na atividade daquelas nas quais já existem equipamentos urbanos destinados às mesmas. Ao longo do espaço público do parque há vários espaços pré-determinados para as práticas de modalidades como Tênis de Mesa, Skate, Futsal, Basquete, e Futebol Sete, por exemplo. enquanto outras modalidades são conduzidas de forma amadora e improvisada pelos seus adeptos, como Vôlei, Boxe e demais lutas.

 

Figura 5. No sentido horário, mesas de Tênis de Mesa disponíveis para cidadãos e turistas, espaço específico para a

prática do Skate, campo de futebol sete, e grupo de amadores jogando vôlei de forma improvisada no Jardim do Turia

Figura 5. No sentido horário, mesas de Tênis de Mesa disponíveis para cidadãos e turistas, espaço específico para a prática do Skate, campo de futebol sete, e grupo de amadores jogando vôlei de forma improvisada no Jardim do Turia

Fonte: Autor

 

Figura 6. Quadras de Basquete e Futsal

Figura 6. Quadras de Basquete e Futsal

Fonte: Autor

 

    Em contrapartida, há modalidades esportivas em condições ímpares no Jardim do Turia, pois além de possuírem equipamentos de alta qualidade, ainda estão organizadas em clubes e sob a tutela de federações. São os casos do atletismo, beisebol, rúgbi e futebol. O atletismo é praticado por crianças, jovens, adultos e idosos no Estádio do Turia de segundas-feiras às sextas-feiras das 8 às 24 horas e, nos sábados e domingos das 8 às 22 horas. O local também recebe, seguidamente, competições oficiais e conta com escolinhas de atletismo, coordenadas pelo poder público local, para crianças e jovens de várias idades.

 

    A prática do beisebol no Jardim do Turia é conduzida pelo Club de Béisbol Astros, fundado em maio de 2001, com uma clara vocação para a promoção do beisebol, em todos os níveis, na Comunidade Valenciana. Sua equipe sênior atualmente participa da Divisão de Honra da Liga Nacional de Beisebol, continuamente desde 2008. Há escolinhas para todos os níveis e gêneros, além de jogos aos finais de semana que podem ser acompanhados pelo público em geral de forma gratuita.

 

Figura 7. No sentido horário, Estádio do Turia, específico para a prática do atletismo. 

Club de Béisbol Astros, instalado dentro do Jardim do Turia, e Campo de Rúgbi

Figura 7. No sentido horário, Estádio do Turia, específico para a prática do atletismo. Club de Béisbol Astros, instalado dentro do Jardim do Turia, e Campo de Rúgbi

Fonte: Autor

 

    O rúgbi tem situação semelhante à do beisebol no Jardim do Turia. Há um estádio, recém reformado, para a prática da modalidade. O campo é feito de grama artificial, tem algumas arquibancadas para assistir aos jogos, e várias equipes o utilizam, como CAU Rugby Valencia, que jogam e treinam no local.

 

    Por fim, além dos vários espaços formais e informais para a prática do futebol -modalidade hegemônica na Espanha e na Comunidade Valenciana-, há vários clubes da modalidade instalados e com campos próprios dentro do parque público, no Jardim do Turia, entre eles os mais destacados são: CD Serranos, Atlético del Turia CF, e CD El Rumbo.

 

Figura 8. Alguns dos Clubes de futebol instalados no Jardim do Turia

Figura 8. Alguns dos Clubes de futebol instalados no Jardim do Turia

Fonte: Autor

 

    O Club Deportivo Serranos disputa atualmente a Primeira Regional da Comunidade Valenciana, no grupo 4, equivalente à sexta divisão do Campeonato Espanhol. A história da equipe começa em setembro de 1977, quando é fundada a escola de base, com equipes de futsal para meninos de 11 anos. Na temporada 1979-1980, o Serranos solicita à Federação Valenciana de Futebol um terreno no antigo leito do rio Turia para a construção de um campo de futebol. Em março de 1986, devido às obras do coletor norte, o Serranos teve que se mudar para outra instalação, construindo alguns estandes no antigo leito do rio Turia, sob as Torres de Serranos, terreno onde, até hoje, é o local de preparação e jogos.

 

    O Atlético del Turia Club de Fútbol, é um time amador voltado para a formação de crianças e jovens em categorias de base. O clube nasceu da fusão de duas equipes históricas do cenário futebolístico valenciano: Vallejo CF e CD San Pedro Pascual na temporada 2009/2010. Hoje o clube tem a concessão exclusiva de um campo com grama artificial (Camp de Futbol Pont de Fusta), localizado no antigo leito do rio Turia sob a antiga estação de madeira e, bastante próximo às instalações do CD Serranos.

 

    O Club Deportivo El Rumbo, também disputa atualmente a Primeira Regional da Comunidade Valenciana, no grupo 4 e, portanto, é adversário do CD Serranos nesta liga local. De acordo com os registros, no ano de 1972, um grupo de cidadãos, vendo que o bairro Olivereta abrangia uma ampla representação social e que as crianças brincavam sem nenhum controle nas ruas do mesmo, resolveu formar um time da categoria Infantil. Graças ao entusiasmo e ao trabalho pessoal daqueles vizinhos e amigos, começou a formação do El Rumbo, que hoje oferece escolas de futebol em diversas categorias e conta também como uma equipe semiprofissional.

 

Figura 9. No sentido horário, campos de futebol do CD Serranos, Atlético del Turia CF, e CD El Rumbo

Figura 9. No sentido horário, campos de futebol do CD Serranos, Atlético del Turia CF, e CD El Rumbo

Fonte: Autor

 

Conclusões 

 

    A partir deste levantamento inicial e superficial das atividades desportivas praticadas pelos cidadãos e visitantes da Comunidade Valenciana, em seu principal espaço público -que praticamente une os pontos Oeste e Leste-sul da cidade-, foi possível delinear as principais práticas corporais e esportivas desta população, além de apontar caminhos investigativos futuros na pesquisa pós-doutoral. Sobre este espaço urbano, há trabalhos acadêmicos recentes com indicativos de novas intervenções no Jardim do Turia, com vieses na arquitetura, engenharia e urbanismo (Valle Simón, 2020; Vaquer Gregori, 2021; Villar Blanco, 2021), ou que discutem a condição social do parque (Aparici Lozano, 2020; Serra Albert, 2019), conduzidos pela Universitat Politècnica de València.

 

    Especificamente para este pesquisador, interessa as práticas vinculadas ao futebol -sejam estas em espaços formais ou não formais- e a consequente pedagogia cultural que decorre da modalidade, provocando hábitos de comportamento e consumo, bem como as transformações identitárias entrelaçadas à modalidade. Neste aspecto é possível afirmar, inicialmente, que assim como o Brasil, a Espanha também está com sua sociedade em condição futebolizada (Koch, 2020), ou seja, sofrendo influências relacionadas aos grandes clubes do futebol do mundo, todos eles localizados na Europa e, neste momento temporal, tendo como referências os grandes clubes da Espanha, França, Inglaterra, Alemanha, e Itália.

 

    Os passos futuros dos caminhos investigativos e a produção científico-acadêmica deste pesquisador serão conduzidos pelo futebol e suas relações sociais, com olhares mais aguçados para a cidade de Valência e a Espanha. No entanto, fica aberta a agenda para o mesmo, bem como para outros pesquisadores, investigarem com maior profundidade as práticas desportivas que ocorrem diariamente no Jardim do Turia, mas não só nele e, que constituem parte importante da identidade valenciana na contemporaneidade.

 

Referências 

 

Alcover, EA, Almenara, MS, Ortiz, JFS, Peña, SG, Llavador, LM, Maestre, RM, Pastor, AO, y Gracia, CS (2016). “Circuit 5k Jardí del Túria” de Valencia. Un río de corredores. Revista de Biomecánica, 63, 27-32. https://dialnet.unirioja.es/servlet/articulo?codigo=6264122

 

Alvarez García, A. (2019). De “El Saler per al poble” a los “Salvem”. Nuevos movimientos ciudadanos en la Valencia de finales del siglo XX y principios del XXI (1974-2014). In: M. Moreno Seco (coord.), R. Fernández Sirvent, y R.A. Gutiérrez Lloret (eds.). Del siglo XIX al XXI. Tendencias y debates: XIV Congreso de la Asociación de Historia Contemporánea (pp. 1138-1152), Universidad de Alicante 20-22 de septiembre. Biblioteca Virtual Miguel de Cervantes.

 

Aparici Lozano, P. (2020). Camins Recorreguts, proposta personal del caminar com a pràctica artística [Trabajo de Grado en Bellas Artes. Departamento de Escultura, Universitat Politècnica de València]. http://hdl.handle.net/10251/149041

 

Azevedo, A.D.C. (2013). Do Rio ao Jardim: o exemplo do Turia – Valência [Dissertação de Mestrado. Faculdade de Arquitetura, Universidade do Porto]. https://sigarra.up.pt/fadeup/pt/pub_geral.pub_view?pi_pub_base_id=34662

 

Gil, A.C. (2008). Métodos e Técnicas de Pesquisa Social (6ª edição). Editora Atlas.

 

Koch, R. (2020). Futebolização: identidades torcedoras da juventude pós-moderna. Editora Trampolim.

 

Llopis, T. (2011). El cauce del Rio Turia a su paso por Valencia: historia visual de una conquista ciudadana (1880-1990). In: J. S. Monrabal, Valencia, 1957-2007: de la riada a la Copa del América. Universitat de València.

 

Loizos, P. (2002). Vídeo, filme e fotografias como documentos de pesquisa. In: M. Bauer, e G. Gaskell, Pesquisa qualitativa com texto, imagem e som: um manual prático. Tradução Pedrinho Guareschi. Editora Vozes.

 

Marconi, M.A., e Lakatos, E.M. (2003). Fundamentos de Metodologia Científica (5ª edição). Editora Atlas.

 

Serra Albert, N. (2019). El jardín del Turia en Valencia visto desde la perspectiva de género [Trabajo de Grado en Fundamentos de la Arquitectura. Universitat Politècnica de València]. http://hdl.handle.net/10251/134697

 

Valle Simón, M. (2020). Mobiliario urbano para el uso público: elemento de descanso multifuncional para el espacio del Jardín del Turia [Trabajo de Grado en Ingeniería en Diseño Industrial y Desarrollo de Productos. Universitat Politècnica de València]. http://hdl.handle.net/10251/151892

 

Vaquer Gregori, F. (2021). Connecta-t amb el Turia: Projecte de disseny urbà [Trabajo de Grado en Ingeniería en Diseño Industrial y Desarrollo de Productos. Universitat Politècnica de València]. http://hdl.handle.net/10251/163700

 

Villar Blanco, J. (2021). Diseño de instalación lúdica inclusiva para parque infantil [Trabajo de Grado en Ingeniería en Diseño Industrial y Desarrollo de Productos. Universitat Politècnica de València]. http://hdl.handle.net/10251/172460


Lecturas: Educación Física y Deportes, Vol. 27, Núm. 288, May. (2022)