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ISSN 1514-3465

 

Das margens das ferrovias para um modelo de 

gestão vitorioso: o Operário Ferroviário Esporte Clube

From the Banks of Railways for a Winning Management Model: the Operario Ferroviario Esporte Clube

De los márgenes de los ferrocarriles a un modelo de gestión exitoso: el Operario Ferroviario Esporte Clube

 

Thiago Savio Ingles da Luz*

inglesthiago@hotmail.com

Miguel Archanjo de Freitas Júnior**

mfreitasjr@uepg.br

Edilson de Oliveira***

edilsonde.oliveira@outlook.com

 

*Graduação em Educação Física

Universidade Estadual de Ponta Grossa, UEPG, Ponta Grossa

Bolsista da Fundação Araucária de Apoio

ao Desenvolvimento Científico e Tecnológico

**Doutorado em História

Universidade Federal do Paraná (UFPR)

Mestrado em Ciências Sociais Aplicadas (UEPG)

Especialização em Pedagogia do Esporte (UEPG)

Especialização em Licenciatura Em Educação Física (UEPG)

Graduado em Licenciatura em Educação Física (UEPG)

***Doutor em Ciências Sociais Aplicadas (UEPG)

Mestre em Ciências Sociais Aplicadas (UEPG)

Especialização em Educação Física Escolar (UEPG)

Graduado em Licenciatura Educação Física (UEPG)

Bolsista do Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico

(Brasil)

 

Recepção: 16/06/2021 - Aceitação: 27/09/2021

1ª Revisão: 27/07/2021 - 2ª Revisão: 10/09/2021

 

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Citação sugerida: Luz, T.S.I. da, Freitas Júnior, M.A. de, e Oliveira, E. de (2021). Das margens das ferrovias para um modelo de gestão vitorioso: o Operário Ferroviário Esporte Clube. Lecturas: Educación Física y Deportes, 26(283), 31-46. https://doi.org/10.46642/efd.v26i283.3073

 

Resumo

    O objetivo desta pesquisa foi analisar se as medidas adotadas pela gestão do Operário Ferroviário Esporte Clube (O.F.E.C.), no período de 2014 a 2019, contribuíram com suas conquistas competitivas. Para tanto, delineou-se um estudo de caso básico, exploratório, bibliográfico e qualitativo. Visando a criação de linhas convergentes no processo investigativo, utilizou-se a triangulação metodológica como método analítico. Subsidiado pela Teoria dos Campos de Pierre Bourdieu, constatou-se que o planejamento empresarial e o marketing foram estratégias que levaram a aquisição de capital simbólico e econômico, permitindo aos gestores obter as condições necessárias para a realização de investimentos em infraestrutura e contratação de novos jogadores, fatores considerados fundamentais para as conquistas dentro de campo. Como o inédito título estadual e os triunfos nacionais consecutivos das séries D e C. Verificou-se ainda que fora de campo o clube quitou suas dívidas, lançou sua loja oficial e estruturou um sólido programa de sócios torcedores. Fatos que nos permitem inferir que a gestão do clube influenciou para obtenção de resultados positivos fora e dentro de campo.

    Unitermos: Gestão. Clube empresa. Administração. Futebol.

 

Abstract

    The objective of this research was to analyze whether the measures adopted by the management of Operario Ferroviario Esporte Clube (O.F.E.C.), in the period from 2014 to 2019, contributed to its competitive achievements. Therefore, a basic, exploratory, bibliographical and qualitative case study was designed. Aiming at creating convergent lines in the investigative process, methodological triangulation was used as an analytical method. Subsidized by Pierre Bourdieu's Theory of Fields, it was found that business planning and marketing were strategies that led to the acquisition of symbolic and economic capital, allowing managers to obtain the necessary conditions for making investments in infrastructure and hiring new players, factors considered fundamental for achievements on the field. As the unprecedented state title and the consecutive national triumphs of the D and C series. It was verified that off the field, the club paid off its debts, launched its official store and structured a solid program of supporting members. Facts that allow us to infer that the club's management influenced the achievement of positive results on and off the field.

    Keywords: Management. Company club. Administration. Soccer.

 

Resumen

    El objetivo de esta investigación fue analizar si las medidas adoptadas por la conducción del Operario Ferroviario Esporte Clube (O.F.E.C.), en el período de 2014 a 2019, contribuyeron a sus logros competitivos. Por lo tanto, se diseñó un estudio de caso básico, exploratorio, bibliográfico y cualitativo. Con el objetivo de crear líneas convergentes en el proceso de investigación, se utilizó la triangulación metodológica como método analítico. Apoyada por la Teoría de Campos de Pierre Bourdieu, se encontró que la planificación y el marketing de negocios eran estrategias que conducían a la adquisición de capital simbólico y económico, permitiendo a los gerentes obtener las condiciones necesarias para realizar inversiones en infraestructura y contratar nuevos jugadores, factores considerados fundamentales para lograr triunfos dentro de la cancha. Como la obtención de un título estatal sin precedentes y los consecutivos triunfos nacionales de las series D y C. Se comprobó que fuera de la cancha, el club saldó sus deudas, creó su tienda oficial y estructuró un sólido programa de socios hinchas. Hechos que permiten inferir que la gestión del club influyó en la consecución de resultados positivos dentro y fuera del campo de juego.

    Palabras clave: Gestión. Club empresa. Administración. Fútbol.

 

Lecturas: Educación Física y Deportes, Vol. 26, Núm. 283, Dic. (2021)


 

Introdução 

 

    A narrativa predominante no ambiente acadêmico acerca da introdução e disseminação do futebol brasileiro presente em estudos como Santos (2002), Massarini, e Abrucio (2004), Duarte (2005) apresentam a versão de que Charles Miller foi o precursor deste esporte no Brasil. Porém, existem estudos como Buchmann (2002) e Guterman (2009) que complementam a história tradicional, mas destacam que a disseminação do futebol no Brasil não foi exclusividade dos clubes ligados a elite, mas ocorreu concomitantemente em diferentes espaços sociais.

 

    As margens das estradas de ferro foi um destes espaços pelo qual o futebol se difundiu a partir do final do século XIX e início do século XX, quando a Inglaterra, país em que o futebol já estava instaurado, despontava como potência econômica mundial e intercambiava profissionais atuantes em diversas áreas (Ferreira, 2005), dentre elas engenheiros e outros profissionais ligados a construção das ferrovias.

 

    Naquele contexto, os ingleses praticavam o futebol como forma de manutenção da cultura e de entretenimento. Em seu tempo livre os operários brasileiros integraram as práticas (Buchmann, 2002). Observando o passatempo dos funcionários, alguns gestores das ferrovias organizaram práticas sistemáticas que originaram vários times ferroviários, que contribuíram substancialmente com a expansão do futebol no país. Buchmann (2002, p. 189) enuncia que “nem um outro segmento da sociedade brasileira criou tantos clubes, em tantos lugares.... Mais que os ferroviários, não houve”. O autor ainda ressalta que no Brasil a classe ferroviária deu origem a mais de cem clubes, em vinte e um estados.

 

    Os ferroviários também exerceram papel importante em outros países da América Latina, fato enfatizado por Stédile (2013) ao citar a criação de clubes tradicionais do continente, decorrentes da influência das estradas de ferro: na Argentina,o Central Argentine Railway Club (1889), atualmente Rosário Central e no Uruguai, o Central Uruguay Railways Cricket Club (1891), atualmente Peñarol.

 

    A partir da obra de Buchmann (2002) foi possível identificar os clubes brasileiros que possuem gênese relacionada diretamente ou indiretamente aos ferroviários. A partir disto optou-se em criar uma tabela apresentando as equipes que ainda permanecem ativas profissionalmente dentro do futebol brasileiro.

 

Tabela 1. Clubes ferroviários brasileiros em atividade profissional 

disputando seus respectivos campeonatos estaduais no ano de 2020

Nome

UF

Fundação

Sport Clube Rio Grande

RS

1900

Sport Clube São Paulo

RS

1908

Paulista Futebol Clube

SP

1909

Esporte Clube Noroeste

SP

1910

Riograndense Futebol Clube

RS

1912

Operário Ferroviário Esporte Clube

PR

1912

Botafogo Futebol Clube

SP

1918

Nacional Atlético Clube

SP

1919

Ferroviário Atlético Clube

CE

1933

Valeriodoce

MG

1942

América Futebol Clube

SP

1946

Ituano Futebol Clube

SP

1947

Associação Ferroviária de Esportes

SP

1950

Associação Sportiva Arapiraquense

AL

1952

Ferroviário Esporte Clube

PE

1961

Paraná Esporte Clube

PR

1989

Fonte: Os autores

 

    Entre os clubes oriundos da classe ferroviária que ainda atuam profissionalmente destaca-se o Operário Ferroviário Esporte Clube (OFEC), uma instituição de 109 anos, fundada em 1° maio de 1912 na cidade paranaense de Ponta Grossa.1

 

    Analisando sua história nos aspectos competitivos e gerenciais sumarizada em Freitas (2000), constata-se que por diferentes motivos o clube conviveu com momentos de sucessos e fracassos muito próximos, acarretando dois períodos licenciado das atividades profissionais, em 1978 e 1994. Nesse cenário, observa-se que apesar da longevidade da equipe,o seu lapso mais vitorioso ocorreu após o ano de 2014. Neste tempo destacado como de sucesso, a instituição obteve os seguintes resultados.

 

Tabela 2. Retrospecto competitivo do OFEC. Ano: 2015-2019

Ano

Competição

Resultado

2015

Campeonato estadual 1ª divisão

Campeão inédito

2015

Quarta divisão nacional

Eliminado na terceira fase

2016

Campeonato estadual 1ª divisão

Rebaixado

2016

Copa do Brasil

Eliminado na segunda fase

2016

Taça estadual (sub-23)

Campeão (vaga na série D)

2017

Campeonato estadual 2ª divisão

Eliminado na segunda fase

2017

Quarta divisão nacional

Campeão

2018

Campeonato estadual 2ª divisão

Campeão

2018

Terceira divisão nacional

Campeão

2019

Campeonato estadual 1ª divisão

Permanência

2019

Segunda divisão nacional

Permanência

Fonte: Os autores

 

    Entre títulos e acessos evidencia-se a ascensão estadual e nacional do clube no período estudado. Nesse cenário, entende-se que o objetivo dos clubes de futebol, bem como do OFEC, é de fato o sucesso competitivo, mas paralelo a isso almejam a continuidade operacional e, portanto, necessitam de um equilíbrio financeiro que os permitam manter-se em atividade interrupta.

 

    Nessa conexão entre desempenho financeiro e esportivo, a gestão assume um papel relevante frente aos objetivos e as conquistas dos clubes de futebol. Portanto, definiu-se a seguinte questão problema para esta pesquisa: “A gestão do OFEC contribuiu para as principais conquistas do time?”.

 

    Diante disso, este estudo objetivou analisar se as medidas adotadas pela gestão do OFEC (2014-2019) contribuíram para as recentes conquistas competitivas e de que forma isso pode ter ocorrido, levando em consideração que a gestão possui papel contribuinte no sucesso das equipes de futebol, mesmo ponderando que o futebol é composto por tarefas motoras abertas, portanto, marcado pela imprevisibilidade. (Gallahue, 2002)

 

    Como justificativa para realização desta pesquisa destaca-se a intenção de contribuir com a literatura acadêmica acerca da produção científica sobre a conexão entre aspectos administrativos e desempenho esportivo, já que pesquisas como Dantas, Machado, e Macedo (2015) e Ferri, Macchioni, Maffei, e Zampella (2017) convergem para essa conexão, enquanto Gollu (2012) e Benin (2017) afirmam não ser possível estabelecer relação. Portanto, essa falta de consenso aponta para a necessidade de mais estudos acerca da temática.

 

    Não obstante, busca-se demonstrar que a pesquisa social pode contribuir com o desenvolvimento do esporte profissional, sobretudo o futebol, produzindo estudos acerca de aspectos administrativos considerando também a realidade dos clubes externos ao eixo Rio – São Paulo, ainda hoje considerados os principais centros futebolísticos do país.

 

Métodos 

 

    A baliza temporal de 2014 a 2019 foi assim estabelecida pois corresponde ao período em que o OFEC, administrado por um grupo gestor, obteve as maiores conquistas competitivas da sua história.

 

    Seguindo os preceitos de Gil (2008) esta pesquisa define-se exploratória e bibliográfica, pois esclarece e modifica conceitos utilizando materiais já publicados acerca do assunto. Classifica-se como básica, pois visa aumentar o domínio científico acerca do assunto e de abordagem qualitativa, que de acordo com o autor é a principal estratégia utilizada para abordagem do problema em estudos de casos.

 

    Destarte, optou-se pelo desenvolvimento de um estudo de caso, que é uma investigação empírica qual visa averiguar um fenômeno existente na contemporaneidade dentro de um contexto real (Yin, 2005). Nesse cenário, buscamos analisar o fenômeno gerencial do futebol em um clube específico, durante um período considerado vitorioso quando comparado ao passado histórico.

 

    Como ferramenta auxiliar ao estudo de caso utilizou-se a triangulação metodológica entre métodos descrita por Flick (2009), que é uma estratégia de combinação de informações presentes em variadas fontes de pesquisa. Yin (2005) defende esta estratégia a fim de criar linhas convergentes no processo investigativo, contribuindo com a fidedignidade do estudo. Tais informações e fontes confrontadas foram as localizadas na literatura acadêmica, ou seja, nas pesquisas já publicadas sobre o tema.

 

Resultados e discussão 

 

    O OFEC passou por momentos intrincados em alguns períodos históricos, marcados por instabilidades competitivas e administrativas aliadas ao enfraquecimento da Rede Ferroviária, migração de pessoas que já possuíam suas crenças esportivas para cidade de Ponta Grossa e os constantes problemas administrativos por conta de transações pouco transparentes. (Freitas, 2000). Tais fatos levaram o clube a se licenciar das atividades profissionais em dois períodos, em 1978 e 1994. (Freitas et al., 2020).

 

    Após retornar à primeira divisão profissional do seu estado no ano de 2009, não obteve resultados competitivos relevantes até o ano de 2014, ano em que quase acabou rebaixado para a divisão de acesso do campeonato. Destarte, Freitas et al. (2020), com base nos relatos dos gestores do OFEC, sumarizam dados sobre a trajetória da gestão do clube. Nesta fonte, constata-se que em 2014, visando uma temporada competitiva em 2015, alterou-se a gestão responsável pelo departamento de futebol profissional do clube. Foi neste momento, que o grupo gestor chamado “Amigos do Operário”, presidido por José Álvaro Góes Filho, incumbiu-se das responsabilidades desta atividade junto ao clube.

 

    De acordo com Freitas et al. (2020) inicialmente a estratégia traçada pela gestão com a intenção de profissionalizá-la foi de administrar como empresa, no sentido de equilibrar as contas do clube, pois acreditavam que livres de dívidas, ações trabalhistas e impostos atrasados, proporcionariam um ambiente plácido para alçar bons objetivos competitivos. Em seguida, buscou-se angariar recursos financeiros com o apoio dos empresários da cidade de Ponta Grossa (PR) que integravam o grupo que geria o futebol profissional do OFEC. Nesse sentido, cada empresário contribuía com dois mil reais ao mês para contribuir com as custas do clube durante a temporada. Diante disso, infere-se que o papel do empresariado era apenas contribuinte, não financiador ou patrocinador. (Freitas et al., 2020)

 

    Nesse sentido, identificamos na literatura acadêmica estudos que demonstram a importância da utilização de princípios empresariais na gestão do futebol, com destaque para Nazi, e Drews (2017) que desenvolveram um estudo comparativo por meio de entrevista semiestruturada com os gerentes de futebol de Brasil e Pelotas, clubes residentes da cidade de Pelotas do estado brasileiro do Rio Grande do Sul, em que ambos reconheceram que a qualificação da gestão influi no sucesso competitivo, mesmo que não possua uma relação de causa e efeito devido as imprevisibilidades do esporte. Os autores mostram que o Brasil teve um planejamento sólido e contínuo que contribuiu com a ascensão da equipe nacionalmente, já o Pelotas sofreu com problemas políticos, gerenciais e posteriormente descensos estaduais e nacionais. Portanto infere-se positivamente acera da estratégia de profissionalização traçada pelo grupo gestor do OFEC, no sentido de anexar princípios empresariais a ela.

 

    Nesse sentido, Suzuki, em 1999, escreveu para o Caderno de Esportes da Folha de São Paulo informações relevantes à época e ao mesmo tempo relacionada as discussões contemporâneas sobre a temática. Na ocasião, o autor escreveu que quando se refere aos clubes quanto empresa, não necessariamente se diz respeito a modalidades de patrocínios ou até mesmo sociedade com capital aberto na bolsa de valores. Na verdade, é importante uma gestão profissional e moderna que insira o futebol na indústria do entretenimento, visando captar recursos e financiar as atividades do clube.

 

    A partir desses estudos identificamos demonstrações de variáveis importantes para uma gestão madura. Entende-se que as administrações dos clubes de futebol devem almejar uma incessante busca pelo capital financeiro, para que assim possa estabelecer um planejamento de médio a longo prazo. Para tanto, devem apoderar-se de estratégias e possibilidades que garantam a viabilidade financeira da instituição. Dessa forma vale destacar que a busca pelo capital é possível se o futebol for compreendido e gerido como um agente da indústria do entretenimento, cultivando e zelando os seus clientes que neste contexto correspondem aos seus torcedores.

 

    Acerca da comercialização do futebol, Fleury, Alejandro, e Feldmann (2014) enfatizam que o esporte profissional transcende o jogo ou apenas a atividade física, é, realmente, um entretenimento e por isso considerado um negócio, que possui o espetáculo esportivo como principal produto a ser ofertado. Barros (2016) destaca que o esporte se distingue de outras modalidades de entretém pois na maioria dos casos o público procura uma ação, como por exemplo a alegria ao assistir um filme de comédia ou num filme de terror a experiência assustadora, porém, no caso do passatempo esportivo, o que atrai o público é a incerteza. Portanto, entende-se que o esporte possui peculiaridades intrínsecas e por isso diferencia-se de outros segmentos dessa indústria.

 

    Porém, vale a ressalva que o esporte sofre a concorrência de diversas formas de entretém, como parques, shoppings e cinema. Por isso, Cardoso, e Silveira (2014) consideram que os clubes devem se preocupar em tornar-se uma marca forte, atrativa e capaz de fidelizar os seus clientes/torcedores. Corroborando com esta crença, Cunha et al. (2015) diz que as receitas dos clubes podem ser potencializadas ampliando suas ações em relação aos seus consumidores, que neste caso, são os torcedores. Segundo os autores, esta relação é favorecida por meio da fidelidade já existente com a marca.

Para tanto, as administrações dos clubes de futebol, como do OFEC, se apoderam de princípios que envolvem o marketing esportivo. Diante disso, ressalta-se que o objetivo geral do marketing é:

    Centrar-se no compromisso com o cliente, consumidor e público-alvo no sentido de oferecer benefícios e atributos que superem expectativas. A responsabilidade que a organização tem em traçar e mensurar necessidades, desejos e interesses do público-alvo/consumidor e em conquistar a satisfação efetiva e eficiente buscando o bem-estar não somente do consumidor, mas como da sociedade, faz com que o marketing transforme-se de um simples conceito a um elemento de suma importância no processo estratégico das organizações. (Malagrino, 2011, p. 29)

    Cunha et al. (2015) destaca que o marketing esportivo é a empregabilidade do marketing tradicional no segmento esportivo. Além disso, enfatiza que deve ser usado em prol do consumidor do esporte, pois este frequenta jogos, gasta diretamente no clube e/ou em empresas parceiras. Entretanto a relação não pode ser estabelecida de forma franca, uma vez que deve se considerar a relativa autonomia dos campos e o cuidado com o que Bourdieu (2001) chama de “falácia escolástica”, ou seja, tomar a teoria como verdade efetiva. O que se criam são perspectivas a partir de uma particularidade desse campo, que é comercialização a partir dos sentimentos, identidade e pertencimento, por exemplo.

 

    Nesse sentido, as estratégias elaboradas pelas administrações dos clubes de futebol, em boa parte dos casos, obtêm eficiência. Isso pode ser justificado a partir do estudo de Malagrino (2011) que coloca o futebol em uma posição privilegiada, com relação a marca, em comparação aos demais segmentos de mercado, pois parte do seu público-alvo já possui significativa fidelidade. O autor faz uma analogia as empresas, que durante anos investem milhões para tentar fidelizar seus clientes, mas não possuem a mesma eficiência dos clubes de futebol. Novamente, ressalta-se que o campo esportivo possui suas peculiaridades intrínsecas, sobretudo o sentimento e as emoções.

 

    Diante disso, a literatura aponta para conceitos centrais que podem ser identificados quando analisamos a gestão do OFEC. Isso se materializa, ao observarmos Martins, e Casas (2017), onde os autores destacam que apesar do torcedor já possuir vínculo afetivo, necessita de mais fatores que garantam sua fidelidade, citando o programa de sócios torcedores como estratégia eficiente.

 

    Freitas et al. (2020) relatam que o OFEC passou a explorar esta possibilidade no ano de 2014, visando a temporada 2015, que segundo seus gestores representava uma modernização do futebol da instituição no sentido da diversificação de fontes de receitas, já que na época o clube possuía apenas o campeonato estadual para disputar e o seu período de realização era a única geração de renda na temporada (ingressos, patrocínios e cotas de transmissão), o que não permitia um planejamento consolidado visando uma ou mais temporadas completas.

 

    A partir desse cenário, levando em consideração que o programa de sócios se consolidou atingindo nove mil associados em 2019, a nova forma de captação de recursos alterou os planejamentos nas temporadas subsequentes. Como a associação dos torcedores é realizada por meio de um contrato anual, sua consolidação proporcionou uma certa previsibilidade financeira que permitia a instituição planejar suas ações visando uma maior baliza temporal, reduzindo margem para erros.

 

    Outra estratégia que ganhou destaque na gestão estudada, foi a criação da loja oficial de produtos do clube. De acordo com o site oficial do OFEC: “A Loja do Fantasma foi inaugurada em março de 2017 para melhor atender os torcedores operarianos”, a qual oferece um leque de opções de produtos aos torcedores. Neste mesmo sentido, o estudo de Newell, e Swan (1995) destacam a importância dos clubes buscarem a potencialização do público nos dias de jogos, estratégia que reside em transcender a receita somente com a venda de ingressos, mas, diversificando a ofertada e desta forma potencializando as receitas por meio da comercialização de produtos oficiais dentro do estádio. Este fato pode ser considerado primordial para buscar e explorar o sentimento de pertencimento dos seus torcedores, a identificação com produtos do clube e comodidade dos associados, estimulando adesões e assim fortalecendo esta estratégia de busca incessante pelo capital.

 

Imagem 1. Loja do Fantasma (O.F.E.C.)

Imagem 1. Loja do Fantasma (O.F.E.C.)

Fonte: https://www.operarioferroviario.com.br/loja-do-fantasma

 

    Ressalta-se que o clube prosseguiu com suas fontes de receitas tradicionais, tais como ingressos, cotas de TV e patrocínios, somente buscou a diversificação dos ganhos por meio de outras estratégias. Destarte, podemos refletir acerca das receitas tradicionais que podem ser quantitativamente melhor exploradas por meio de estratégias inovadoras, como modernização dos estádios. Meneses Neto, e Martins (2020) expõe o caso do Palmeiras que potencializou seus ganhos através do programa de sócios torcedores e ingressos após a construção do seu próprio estádio: o Allianz Parque Arena. Seguindo esta linha de raciocínio, observamos esta estratégia na gestão analisada, quando em 2019 a diretoria anunciou a construção de camarotes no Estádio Germano Kruger, oferecendo vantagens, como privacidade e gastronomia, visando receber um público de maior patamar financeiro, com potencial de gasto com a marca. (Freitas et al., 2020)

 

Imagem 2. Estádio Germano Kruger

Imagem 2. Estádio Germano Kruger

Fonte: https://www.operarioferroviario.com.br/sede

 

    Ainda, compreende-se que outro fator capaz de atrair o público é a comercialização do espetáculo esportivo, isto é, também, os jogos decisivos, capazes de alterar a homeostase emocional do torcedor. Diante disso, destaca-se que durante a baliza temporal estudada o OFEC disputou cinco finais2 no Estádio Germano Kruger, além dos jogos eliminatórios, recebendo públicos próximos a lotação máxima.

 

    Ferreira, Marques, e Macedo (2018) apresentam o que chamam, com conotação positiva, de círculo vicioso: 1) resultado financeiro, 2) investir em jogadores de qualidade formando um elenco competitivo, 3) obtenção de bons resultados competitivos, reiniciando o processo. Nessa perspectiva, infere-se que quanto mais a instituição potencializar seus ganhos, potencializará também as suas perspectivas para o sucesso competitivo.

 

    A partir disso, identificam-se princípios próximos na trajetória analisada do OFEC. A gestão buscou elevar suas receitas por meio do seu programa de sócios torcedores e da loja oficial do clube, investindo na formação de elencos competitivos que desencadearam nos títulos e ascensão estadual e nacional. Por conseguinte, atingindo um patamar financeiro superior, o processo reinicia.

 

    Nesse cenário gerencial, considerando o planejamento empresarial e o marketing, infere-se que foram estratégias que levaram a aquisição de capital simbólico e econômico (Bourdieu, 1983, 1996, 2002), condicionando os gestores a decidirem acerca da realização de investimentos em infraestrutura e contratação de novos jogadores.

 

Conclusões 

 

    As decisões perante investimentos em estrutura e atletas foram consideradas fundamentais para as conquistas do clube entre 2015 e 2019. Tal premissa se constitui com as conquistas dentro de campo, como o inédito campeonato estadual e os triunfos nacionais consecutivos das séries D e C, bem como em fatores externos ao campo de jogo, visto que o clube quitou e evitou dívidas, lançou sua loja oficial e o programa de sócios torcedores.

 

    No período estudado a gestão denominada “Amigos do Operário”, presidida por José Álvaro Góes Filho, partiu de um planejamento base em que 45 empresários contribuíam com uma quantia mensal a fim de conservar a saúde financeira do clube, isto é, arcar com todos os custos e evitar dívidas.

 

    A partir disso, visando mais investimentos no departamento de futebol profissional, lançou estratégias duas principais estratégias de marketing: o programa de sócios torcedores e a loja oficial de produtos do clube. As conquistas de títulos potencializaram estas estratégias de marketing e consequentemente as receitas do OFEC.

 

    Não obstante, investimentos em infraestrutura, principalmente na construção de novos camarotes, miraram a atração e obtenção de um público de maior patamar financeiro, fato que além de aumentar, acaba diversificando as fontes de receitas. Acumulando capital e investindo em jogadores o OFEC disputou diversos jogos decisivos, eliminatórios e finais, estaduais e nacionais de 2015 a 2019, como supra exposto na Tabela 2 desta pesquisa. Desta forma, comercializou os jogos como espetáculo, potencializando esta fonte de receita tradicional.

 

    De maneira geral acaba constatado que as estratégias exploradas pelo OFEC convergem num fator comum: o dinheiro. Na prática, a busca pelo capital financeiro é a tentativa de garantia de renda em médio a longo prazo que permita um planejamento eficiente e coerente, capaz de garantir a viabilidade de investimentos contínuos no departamento do futebol profissional.

 

    Diante disso, é importante ressaltar que os fatores supracitados, estudados e discutidos que foram apropriados pela administração do OFEC possuem papel colaborativo com o sucesso competitivo, uma vez que devemos considerar as imprevisibilidades que circundam o esporte, sobretudo uma modalidade de habilidades abertas como o futebol e, portanto, não estabelecer relações de causa e efeito entre administração e sucesso competitivo.

 

    Ressalta-se a necessidade de mais estudos sobre gestão, administração e marketing no futebol, refletindo acerca dos caminhos que as instituições do futebol podem traçar para que criem perspectivas capazes de se aproximarem dos bons resultados financeiros e competitivos. Não obstante, surgem possibilidades de estudos acerca dos demais clubes ferroviários latinos. Dos que não mais estão ativos, entender o que pode ter influenciado para o fim das atividades profissionais. Em relação aos clubes que ainda sobrevivem, compreender seus modelos de gestão, estratégias e meios explorados para permanecer em operação.

 

Notas 

  1. Ponta Grossa é uma das maiores cidades do Paraná com mais de 300.000 habitantes e está localizada há cerca de trezentos quilômetros da capital Curitiba. Ainda, é considerada o berço do futebol do estado, pois em 1909 nela realizou-se o primeiro jogo oficial da história do Paraná, numa partida entre conterrâneos de Ponta Grossa e curitibanos. (Defino, 2012)

  2. Campeonato Estadual (2015), Taça Estadual (2016), Série D do Campeonato Brasileiro (2017), Campeonato Estadual 2ª divisão (2018), Série C do Campeonato Brasileiro (2018).

Referências 

 

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Lecturas: Educación Física y Deportes, Vol. 26, Núm. 283, Dic. (2021)