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ISSN 1514-3465

 

Análise cinesiológica da remada no skate

suas aplicações na Educação Física escolar

Kinesiological Analysis of Pushing in Skateboard 

and its Applications in School Physical Education

Análisis kinesiológico de la remada en el skate 

y sus aplicaciones en la Educación Física escolar

 

Juliana Dias Breves*

julianadias963@hotmail.com

Pedro Paulo Deprá**

ppdepra@gmail.com

Giuliano Gomes de Assis Pimentel***

ggapimentel@uem.br

 

*Licenciada em Educação Física UEM

Mestranda no Programa de Pós Graduação em Educação UEM, na linha

de pesquisa Ensino, Aprendizagem e Desenvolvimento Humano

**Doutor em Educação Física pela Universidade Estadual de Campinas

Pós-doutor pela State University of Massachusetts, Amherst

Atualmente é Professor Associado do Departamento de Educação Física da UEM

Docente do Programa Associado UEM-UEL de Pós-graduação em Educação Física

Coordena o Laboratório de Biomecânica e Comportamento Motor – Labicom

***Docente do Programa Associado UEM-UEL de Pós-graduação em 

Educação Física Coordenador do Grupo de Estudos do Lazer (GEL)

(Brasil)

 

Recepção: 06/05/2021 - Aceitação: 14/08/2022

1ª Revisão: 23/07/2022 - 2ª Revisão: 12/08/2022

 

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Atribuição-NãoComercial-SemDerivações 4.0 Internacional (CC BY-NC-ND 4.0)

https://creativecommons.org/licenses/by-nc-nd/4.0/deed.pt

Citação sugerida: Breves, J.D., Deprá, P.P., e Pimentel, G.G. de A. (2022). Análise cinesiológica da remada no skate e suas aplicações na Educação Física escolar. Lecturas: Educación Física y Deportes, 27(293), 60-74. https://doi.org/10.46642/efd.v27i293.3014

 

Resumo

    O skate é uma prática corporal de aventura que constitui a cultura corporal do movimento. Na Literatura Esportiva, observa-se uma carência de investigações sobre seus movimentos básicos, principalmente em relação à remada que é sua técnica de deslocamento. O objetivo deste estudo foi descrever as fases da remada e propor um modelo de avaliação a ser utilizado nas aulas de Educação Física. A partir de uma análise cinesiológica dos movimentos de quinze voluntários realizando a remada, foi criado um checklist, que foi testado em uma Escola de Aplicação Pedagógica. Esse instrumento mostrou-se coadjuvante na prática pedagógica do professor de Educação Física.

    Unitermos: Práticas corporais de aventura. Avaliação. Técnicas do skate.

 

Abstract

    Skateboarding is an adventure body practice that constitutes the body culture of movement. In the Sports Literature, there is a lack of investigations about its basic movements, especially in relation to paddling, which is its displacement technique. The objective of this study was to describe the phases of paddling and propose an evaluation model to be used in Physical Education classes. From a kinesiological analysis of the movements of fifteen volunteers performing the rowing, an observation form was created and tested in a Pedagogical Application School. This instrument proved to be helpful in the pedagogical practice of the Physical Education teacher.

    Keywords: Adventure body practices. Evaluation. Skateboarding techniques.

 

Resumen

    El skateboarding es una práctica corporal de aventura que es parte de la cultura corporal del movimiento. En la Literatura Deportiva faltan investigaciones sobre sus movimientos básicos, especialmente en relación a la remada que es su técnica de desplazamiento. El objetivo de este estudio fue describir las fases de la remada y proponer un modelo de evaluación para ser utilizado en las clases de Educación Física. A partir de un análisis kinesiológico de los movimientos de quince voluntarios que realizaron la remada, se elaboró ​​una lista de cotejo, que fue probada en una Escuela de Aplicación Pedagógica. Este instrumento demostró ser un complemento en la práctica pedagógica del profesor de Educación Física.

    Palabras clave: Prácticas corporales de aventura. Evaluación. Técnicas de skate.

 

Lecturas: Educación Física y Deportes, Vol. 27, Núm. 293, Oct. (2022)


 

Introdução 

 

    A Base Nacional Comum Curricular – BNCC (Brasil, 2018), documento que determina os conteúdos fundamentais a serem trabalhados pelos professores na educação básica, traz como um dos componentes estruturantes da Educação Física, as práticas corporais de aventura (PCA). De acordo com Severino, Pereira, e Santos (2016), a introdução dessas práticas no âmbito escolar pode ampliar o conceito de cultura corporal de movimento.

 

    Entre as PCA urbanas o skate é a de maior destaque e de ascensão na sociedade (Beal, Atencio, Wright, e McClain, 2017). Na Educação Física escolar as teleologias a respeito do skate se estendem da ampliação cultural em termos de educação para o tempo livre (Corrêa, Badaró, Souza, e Pimentel, 2020) até a hibridação de suas literacias na área de linguagens (Shaver, 2020). A prática do skate, juntamente com o parkour, estão constantemente interagindo com a ordem urbana, sobretudo contra as convenções tradicionais de utilização dos espaços públicos. (Cortés, 2020)

 

    Conforme Brandão (2010), o skateboard é de origem norte-americana e possui relações com as subculturas surfista e juvenil. Em português, “skate” significa “patinar”, e, “board” significa “tábua”, sendo skateboard o ato de patinar sobre uma tábua. O skate teve sua origem enraizada na necessidade de os praticantes de surf terem uma opção de prática quando as condições climáticas não favoreciam a criação de ondas (Radikonyana, Prinsloo, e Pelser, 2017). Neste sentido, a atividade do skate simula o envolvimento do praticante com a forma natural de uma onda. Nesta interação simulada, a onda influencia o comportamento do “surfista” e o “surfista” influencia a superfície da onda com sua própria energia cinética (Glenney, e Mull, 2018). Porém, enquanto no surf a remada é feita com as mãos, para o praticante ganhar impulsão inicial no deslocamento, no skate o contato com a superfície é feito com os pés.

 

    Segundo as últimas pesquisas realizadas pelo Datafolha (2015), o número de praticantes de skate saltou de 3,9 milhões em 2009, para aproximadamente 8,5 milhões em 2015. Há ainda, uma ascensão expressiva de mulheres, que atualmente representam 19% desse público. Já em relação à idade, 62% dos praticantes são crianças e adolescentes, o que nos mobiliza a pensar o ensino de skate nessa faixa etária. Em acréscimo, cabe considerar que a inclusão do skate como esporte olímpico nos Jogos Tóquio 2021 impulsionou o número de praticantes e a divulgação midiática. (Fogliatto, e Marques, 2020)

 

    Frente a isso, considerando a BNCC, é imprescindível criar condições para que o skate seja ensinado dentro do conteúdo estruturante PCA. Armbrust, e Lauro (2010) destacam que, mesmo com a crescente popularização do skate, há pouca apropriação dentro das escolas pelos profissionais de Educação Física, que ainda não estão preparados para atender as atividades de aventura. Há a necessidade de aprimorar o conhecimento das técnicas de ensino e suas práticas, de forma mais segura e eficiente, ampliando a sua formulação teórica.

 

    Tendo em vista a importância de “conhecer” antes de “ensinar”, faz-se essencial o entendimento dos fatores que estão presentes no movimento para o processo de orientação das atividades. A avaliação do movimento humano deve ser precedida de medição, prescrição e análise, para contribuir com a evolução das técnicas esportivas. Em acréscimo, com intuito de promover a eficiência do gesto, a compreensão do movimento deve passar pelos diferentes segmentos do corpo: tronco, coluna, pelve, membros superiores, membros inferiores e suas interações. (Amadio, e Serrão, 2004; Deprá, 2004)

 

    A cinesiologia, num sentido estreito, trata do fenômeno do movimento e suas pré-condições, do aparelho de movimento e seu controle (Barbanti, 2003). A cinesiologia se torna ferramenta de intervenção para o profissional de Educação Física, que necessita conhecer qualitativamente o movimento e sua função muscular, como condição para ensinar e fazer as devidas intervenções para melhorar o desempenho do aluno. Neste trabalho, a cinesiologia foi utilizada como ferramenta de análise da ação dos músculos em um determinado movimento, seja ele genérico (postura, locomoção, manipulação) ou específico (esporte, exercício, ginástica, jogo e dança).

 

    Assim sendo, o principal objetivo deste estudo foi descrever cinesiologicamente a remada do skate e, a partir dessa caracterização, propor um modelo de avaliação da técnica do movimento, com vistas a subsidiar o docente nas aulas de educação física escolar.

 

Métodos 

 

Desenho do estudo 

 

    A pesquisa realizada possui natureza descritiva qualitativa. (Hay, e Reid, 1985)

 

Sujeitos do estudo 

 

    Participaram da pesquisa 15 voluntários adultos, sendo 10 homens e 5 mulheres, com no mínimo um ano de experiência no skateboard. O projeto foi apresentado aos skatistas, e os que aceitaram participar voluntariamente, foram convidados a assinarem o Termo de Consentimento Livre e Esclarecido (TCLE). Nos procedimentos metodológicos foram realizadas entrevistas, filmagens e descrições qualitativas e cinesiológicas do movimento da remada.

 

Aspectos éticos 

 

    Este estudo foi submetido ao Comitê de Ética da Universidade Estadual de Maringá e aprovado sob o número do parecer 3.072.960 (descrição do deslocamento por meio da remada em skatistas jovens e adultos) e parecer 3.909.639 (estudo-piloto com escolares para analisar a aplicabilidade do modelo de deslocamento em iniciantes crianças).

 

Instrumentos e procedimentos de coleta de dados 

 

    Cada voluntário foi submetido a uma sessão de filmagem na qual executou a remada no skate. A filmagem foi realizada por dois planos diferentes: frontal e sagital. Após, com uso de recursos de playback, os movimentos apresentados pelo executando foram descritos, levando-se em conta a terminologia padrão de referência anatômica.

 

    Posteriormente, foi produzida uma ficha que contém a caracterização da técnica do movimento, sendo 11 do terceiro e 04 do quarto ano. Os escolares receberam 7 aulas, com duração cada de 50 minutos por semana, durante o período curricular, no Colégio de Aplicação Pedagógica da Universidade Estadual de Maringá. Essas aulas estavam vinculadas à organização escolar na forma de um projeto de ensino-pesquisa-extensão denominado Escola de Aventuras, o qual visava a estruturação de um sistema de ensino de PCA na perspectiva da educação para/pelo lazer. (Corrêa et al., 2020)

 

Análise estatística 

 

    Para análise dos resultados foi utilizada estatística descritiva com a adoção de frequências e percentuais.

 

Resultados e discussão 

 

Fase 1. Caracterização do movimento 

 

    A análise foi baseada em um modelo empírico, com validade nativa na forma como se tipifica o deslocamento por meio da remada no skate (Sikana Brasil, 2017). Neste trabalho, a partir do método qualitativo, foram descritos os movimentos considerando a terminologia padrão de referência da cinesiologia, que inclui uma organização do corpo humano em planos, eixos e movimentos articulares. Esse movimento foi dividido em três fases: posicionamento, impulsão e deslize. Na fase de posicionamento, o sujeito se prepara para realizar a remada. Durante a fase de impulsão, avança e imprime velocidade. Por último, adquire estabilidade na fase de deslize.

 

    Na atividade de deslocamento, ocorre “a locomoção de um lugar para o outro, a manipulação com os pés sobre o skate e a estabilidade para se manter em equilíbrio durante o percurso” (Armbrust, e Lauro, 2010). A remada para Metal (2022) seria a impulsão dada pelo praticante com o pé que se posiciona na parte posterior do shape enquanto o posicionamento do pé à frente desempenha funções de equilíbrio e direção.

 

    O percentual dos movimentos realizados pelos sujeitos foi observado em cada fase da remada. Na fase de posicionamento, pôde-se notar que não houve variação dos movimentos realizados pelos sujeitos. Na fase de impulsão, houve variação somente nos segmentos tronco e ombro. Já na fase de deslize, houve a variação na maioria dos segmentos, sendo os ombros, cotovelos, joelho de apoio e joelho da remada. Em relação aos movimentos não-consensuais (<100%), foram presumíveis serem erros ou variações.

 

    Por segurança, foi adotado um critério arbitrário para realizar a análise, em função de evitar erros ocasionados por um número amostral pequeno. Frente a isso, foram excluídas as diferenças minoritárias e produzido um quadro com os movimentos predominantes em cada fase da remada, naquilo que, por ser recorrente, vem a se configurar como padrão (Quadro 1).

 

Quadro 1. Movimento padrão de cada fase da remada no skate realizado pelos sujeitos

Fase

1. Posicionamento

2. Impulsão

3. Deslize

Movimentos observados

Tronco:

posição anatômica
Ombros:

posição anatômica
Cotovelos:

posição anatômica
Joelho de apoio:

flexão
Joelho da remada:

posição anatômica
Tornozelo de apoio:

posição anatômica
Tornozelo da remada:

posição anatômica

Tronco:

Inclinação
Ombros:

abdução
Cotovelos:

flexão
Joelho de apoio:

flexão
Joelho da remada:

flexão
Tornozelo de apoio:

posição anatômica
Tornozelo da remada:

flexão plantar

Tronco:

posição anatômica
Ombros
:

abdução
Cotovelos
:

flexão
Joelho de apoio
:

posição anatômica
Joelho da remada
:

posição anatômica
Tornozelo de apoio
:

posição anatômica
Tornozelo da remada
:

posição anatômica

Fonte: Autores

 

    Após essa triagem e a observação de imagens veiculadas na internet, sugere-se a seguinte descrição qualitativa do padrão do movimento de remada nas três fases (Quadro 2).

 

Quadro 2. Descrição qualitativa do padrão do movimento de remada em cada fase

1. Posicionamento

2. Impulsão

3. Deslize

Todos os segmentos estão em posição anatômica, exceto o joelho de apoio, que se encontra flexionado sobre o shape.

O tronco está inclinado, os ombros abduzidos, os cotovelos, joelho de apoio e joelho da remada flexionados, o tornozelo de apoio em posição anatômica e o tornozelo da remada em flexão plantar.

Segmentos que encontram-se em posição anatômica: tronco, joelho de apoio, joelho da remada, tornozelo de apoio e tornozelo da remada. Ainda nessa fase, os ombros estão abduzidos e os cotovelos flexionados.

Fonte: Dados da pesquisa

 

    Na entrevista, subjetivamente, os participantes se expressaram quanto à vivência deles no skate. Em relação aos erros que eles mais notam nos iniciantes, estão: remar mongo (33% dos respondentes), pouca amplitude de quadril (20%), remar com o tronco reto (13%) e inclinar o tronco para trás (13%). Outras respostas, com um voluntário, foram: desequilibrar, remar com o pé de apoio no meio do shape e remar com o pé torto.

 

    Já em relação à parte do corpo mais exigida durante a execução do movimento, os membros inferiores são realçados, conforme a Tabela 1, na ordem decrescente de respostas.

 

Tabela 1. Identificação da parte corpo mais exigida na execução da remada

Respostas

Frequência

Percentual

Perna de apoio

5

33,3%

Tronco

4

26,7%

Perna da remada

3

20%

Coxa

2

13,3%

Quadril

1

6,7%

Fonte: Dados da pesquisa

 

    Conforme os resultados do estudo, é fundamental observar quadris e pernas na técnica do movimento, que geram efeitos diretos no sucesso ou fracasso da aprendizagem desse fundamento em aulas da PCA skate na educação básica. Entende-se que essa resposta dos praticantes realça a percepção subjetiva de que o padrão motor estabilizador, com contração isométrica, gera as demandas mais desgastantes na locomoção.

 

    Quando o pé está na função de apoio no skate e o corpo sofre o efeito do impulso dado pelo membro inferior da remada, existe a translação do sistema corpo-shape para frente. Este primeiro evento poderia ser caracterizado por ser uma cadeia cinética aberta, onde uma das extremidades do corpo está livre para se movimentar. As cadeias cinéticas abertas são caracterizadas por promoverem pouca estabilidade no movimento. Em seguida, quando a perna de apoio da remada é retirada do solo e é transferida para o shape, o evento passa a ser caracterizado por ser uma cadeira cinética fechada. Embora a cadeia cinética fechada promova mais estabilidade, qualquer erro postural da técnica, gerado pelo balanço da perna, promoverá uma inclinação exagerada do tronco, desequilibrando o corpo como um todo e, em alguns casos, causando a queda do executante.

 

Fase 2. Aplicação de um checklist para avaliação do deslocamento com o skate 

 

    A partir do material obtido nas três fases da coleta e em triangulação com orientações empíricas retiradas da Sikana Brasil (2017), foi proposto um Checklist a ser utilizada pelo(a) professor(a) ao avaliar o(a)s aluno(a)s (Quadro 3). Reitera-se que o processo de avaliação pode ser somativo, processual ou comparativo.

 

    O Cheklist facilita a observação sistemática do movimento, tal qual descrito acima, proporcionando agilidade de detecção característica essenciais da técnica para futura correção pedagógica. Em acréscimo, foram utilizados códigos numéricos para determinar a ausência (0) e/ou presença(1) de característica da técnica, respeitando-se as variações do estilo,dada a plasticidade do movimento.

 

Quadro 3. Checklist para análise qualitativa da remada no skate

Checklist para análise qualitativa da remada no skate

Verificação

0 (Ausência)

1 (Presença)

Preparação

01

Corpo reto com os pés paralelos ao skate

 

 

02

Pé de apoio sobre o shape, próximo as rodas dianteiras

 

 

03

Pé de remada no chão, próximo as rodas traseiras

 

 

04

Tronco inclinado para frente

 

 

Impulsão

05

Pernas flexionadas

 

 

06

Impulso do chão

 

 

07

Pé de remada volta ao shape por trás

 

 

Deslize

08

Posicionamento perpendicular ao skate

 

 

09

Joelhos flexionados

 

 

Fonte: Autores

 

    Esse instrumento, desde sua versão ora apresentada, vem sendo utilizado empiricamente no projeto Escola de Aventuras, o qual é campo de desenvolvimento de um sistema de ensino de PCA na escola (Corrêa et al., 2020). Em relação ao ensino do skate, a proposta está alicerçada na consideração socioeconômica do skate como meio de transporte não poluente e expressão cultural da juventude. Para acessar o conhecimento sobre skate, a metodologia de ensino pressupõe a vivência de outras formas de deslize, na forma de microaventuras, até a aprendizagem contextualizada dos fundamentos base, remada, freio e direção (Pimentel, 2020). Todavia, no sistema de ensino, faltava uma forma mais sistematizada de permitir que o processo avaliativo tocasse nas questões técnicas do deslocamento no skate.

 

    Atualmente, no ensino de Educação Física, a produção acadêmica brasileira situou os limites do tecnicismo como base para impor modelos de rendimento no processo educativo. Por outro lado, conforme Rodrigues, e Darido (2008), a técnica é um elemento importante na apreensão da cultura corporal de movimento, pois se trata de um acúmulo histórico do conhecimento e que cabe ao corpo docente a mediação para que discentes possam incorporar os movimentos mais eficientes na resolução dos problemas. No caso desse estudo, a proposição cinesiológica do movimento de remada, permitirá ao docente avaliar o deslocamento e proporcionar feedback mais preciso.

 

    Em acréscimo, na realidade da Educação Física escolar foram encontradas ainda poucas contribuições de ferramentas apropriadas à realidade da iniciação ao esporte. Freitas, e Lobo da Costa (2000) apontam que a biomecânica contribui para a estruturação dos conteúdos específicos da Educação Física dentro de uma proposta pedagógica para o ensino formal. Segundo os Parâmetros Curriculares Nacionais - Brasil (1997), os conhecimentos da biomecânica estão relacionados à percepção do corpo, “os alunos podem fazer análises simples, percebendo a própria postura e os movimentos em diferentes situações do cotidiano”, ou ainda “observação e análise do desempenho dos colegas, dos esportistas, de crianças mais velhas ou mais novas”.

 

    A Tabela 2 apresenta os resultados da aplicação do Checklist às turmas do terceiro e quarto anos. Os números 0 e 1, representam respectivamente, ausência e presença da técnica na fase do movimento.

 

Tabela 2. Checklist aplicado aos terceiro e quarto anos

Ano

Escolar

Identificação

da criança

Fases do Movimento

Preparação

Impulsão

Deslize

1

2

3

4

5

6

7

8

9

Terceiro

1

1

1

1

0

1

1

1

0

0

2

1

1

1

0

0

1

0

0

0

3

1

1

1

0

1

1

1

0

0

4

1

1

1

0

0

1

0

0

0

5

1

1

1

0

0

1

0

0

0

6

1

0

0

0

0

1

0

0

0

7

1

0

1

0

1

1

0

0

0

8

1

0

1

1

1

1

0

0

0

9

0

0

1

0

0

1

0

0

0

10

1

0

1

0

0

1

1

0

0

11

0

0

0

0

0

0

0

0

0

Quarto

1

1

1

1

1

1

1

1

1

0

2

1

0

1

0

0

1

0

0

0

3

1

1

1

1

1

1

1

1

1

4

1

1

1

1

1

1

1

0

0

Nota: 0 e 1 se referem, respectivamente, a ausência e a presença da técnica. Fonte: Dados da pesquisa

 

    Apesar do número pequeno de crianças observadas, as do quarto ano conseguiram, em geral, melhores resultados. Por outro lado, tanto para crianças do terceiro ano quanto para do quarto, houve ausência da técnica nos tópicos 8 (100% e 50%) e 9 (100% e 75%), respectivamente. Para crianças do 3º ano, também foram observadas dificuldades motoras nos tópicos 4 (90% de ausências) e 7 (73% de ausências).Sabendo que a aquisição de proficiência do deslocamento no skate é um processo contínuo-descontínuo, a identificação dessas inconsistências deve servir de alerta para o reforço das habilidades motoras fundamentais.

 

    É importante considerar que a remada no skate é uma forma especializada de deslocamento, mas, concordando com Martínez (2018), é fundamental propor estímulos e situações que permitam à criança aproveitar gradativamente os benefícios do amadurecimento e do crescimento, potencializados pela experiência e pelo aprendizado. A atividade de se deslocar com o skate para um determinado ponto é importante para o desenvolvimento motor da criança, pois envolve de forma combinada, os movimentos estabilizadores, movimentos locomotores e movimentos manipulativos propostos por Gallahue, e Ozmun (2001).

 

    Para tanto, saber diferenciar as características peculiares a cada uma das faixas etárias é necessário, para que se determine o tipo de atividade a ser utilizada, contribuindo para o desenvolvimento global da criança (Figueiredo, Dias, Silva, e Schwartz, 2018). Nessa perspectiva, observa-se que as dificuldades encontradas pelos alunos ao realizarem os itens 4 (Tronco inclinado para frente), 7 (Pé de remada volta ao shape por trás), 8 (Posicionamento perpendicular ao skate) e 9 (Joelhos flexionados), podem ser explicadas pela baixa maturação da estabilização. Assim, mesmo que a inclinação resulte em uma impulsão mais eficiente, a preocupação imediata da criança é não perder o equilíbrio no processo de iniciar o deslocamento.

 

    O centro de gravidade do corpo humano depende da configuração dos segmentos corporais. Por exemplo, quando uma pessoa está em pé, na posição anatômica, o centro de gravidade está a aproximadamente 55% da altura dela a partir do solo. Mas se essa pessoa levanta um braço, o centro de massa tende a se elevar também. Sendo assim, em relação ao item 4, infere-se que os alunos ficaram com o corpo mais ereto porque o centro de gravidade estava mais adequado com a projeção na sua base de sustentação. Isso significa que, para que os alunos mantivessem o equilíbrio, eles tenderam a projetar o centro de gravidade na base de sustentação.

 

    Como a base de sustentação do skate durante a remada (preparação e impulsão) é monopedal, basicamente o corpo se estende como um todo para se projetar sobre o pé, caso contrário, ele estaria totalmente em desequilíbrio, ainda mais um aprendiz. Pessoas mais experientes já projetam o tronco para fora da base de sustentação porque possuem coordenação motora para um retorno adequado, sem que haja um desequilíbrio seguido de queda. E, nesse caso, essa maior inclinação gera uma alavanca de força para aceleração da partida na fase inicial da remada. Por isso, a ficha, ao servir de instrumento pedagógico deve considerar o limite de servir a iniciantes, devendo o skate estar em inércia. Em outras condições de proficiência, gestos como o tronco inclinado à frente podem fazer parte de uma transição da fase de impulsão.

 

Conclusões 

 

    O movimento de remada, além de fundamento do deslocamento, é essencial para adquirir velocidade e realizar manobras no skate. Por isso, esta técnica deve estar presente no ensino de PCA na Educação Física curricular. Um dos elementos para verificar se o professor está alcançando seus objetivos educacionais é a avaliação. Para tanto, foram identificados quais movimentos articulares ocorrem na remada no skate e foi apresentado um modelo de checagem da proficiência das crianças nesse movimento.

 

    Os movimentos articulares identificados nos sujeitos foram: na “fase de preparação” - flexão do joelho de apoio; na “fase de impulsão” - inclinação do tronco, abdução dos ombros, flexão dos cotovelos, joelhos e flexão plantar do tornozelo da remada e na “fase de deslize” - abdução dos ombros e flexão dos cotovelos.

 

    Com a observação dos desdobramentos práticos da ficha, notou-se que ela se constituiu em uma ferramenta para avaliação do movimento de remada em aulas relativas ao conteúdo skate. Todavia, se limita ao fato de o modelo não ser específico para o movimento da remada isoladamente, pois foi considerado todo o deslocamento no skate, incluindo gestos pré e pós-remada. Em acréscimo, esta ficha é limitada aos dados gerados pela amostra desse estudo, demandando validação em pesquisas futuras.

 

    O estudo cumpriu seu objetivo que foi identificar os movimentos presentes na técnica da remada e propor um modelo de avaliação. A contribuição original é que, a partir de um conceito metodológico-científico, o checklist viabiliza uma relação entre os modelos teóricos, dedicados à descrição do movimento de forma técnica, e a análise do fenômeno por meio de instrumentação controlada.

 

    Pedagogicamente, em uma perspectiva dialógica de educação, considera-se que esse material ajudará o professor em identificar os aspectos a serem melhorados em sua aula e, no processo de autonomia, os alunos em criar mecanismos de autoavaliação por meio do instrumento.

 

Referências 

 

Amadio, A.C., e Serrão, J.C. (2004). Biomecânica: trajetória e consolidação de uma disciplina acadêmica. Revista Paulista de Educação Física, 18(esp), 45-54. https://repositorio.usp.br/item/001434529

 

Armbrust, I., e Lauro, F.A.A. (2010). O Skate e suas possibilidades educacionais. Motriz, Revista de Educação Física. UNESP, 16(3), 799-807. https://doi.org/10.5016/1980-6574.2010v16n3p799

 

Barbanti, J.V. (2003). Dicionário de Educação Física e Esporte (5ª ed.). Editora Manole.

 

Beal, B., Atencio, M., Wright, E.M., e McClain, Z. (2017). Skateboarding, community and urban politics: shifting practices and challenges. International journal of sport policy, 9(1), 11-23. http://dx.doi.org/10.1080/19406940.2016.1220406

 

Brandão, L. (2010). Esportes de ação: notas para uma pesquisa acadêmica. Revista Brasileira de Ciências do Esporte, 32(1), 59-73. https://doi.org/10.1590/S0101-32892010000400005

 

Brasil (1997). Parâmetros Curriculares Nacionais: Educação Física. Secretaria de Educação Fundamental. MEC/SEF. http://portal.mec.gov.br/seb/arquivos/pdf/livro07.pdf

 

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Lecturas: Educación Física y Deportes, Vol. 27, Núm. 293, Oct. (2022)