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Para uma teoria e metodologia científica do treinamento esportivo.
A crise da concepção da periodização do treinamento no esporte de alto nível
Yuri Verkoshanskij

http://www.efdeportes.com/ Revista Digital - Buenos Aires - Año 6 - N° 32 - Marzo de 2001

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    Não é difícil entender que tal posição representa uma das causas principais da crise da CPT de Matveev.


Por que parou o relógio da CPT ?

    Atualmente não vale a pena analisar os defeitos teóricos e os evidentes absurdos metódicos da CPT. Em vez disso, ocorre voltar a nossa atenção sobretudo para a inconsistência cientifica e metódica desta concepção para evitar esta situação no futuro.


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    O mais importante defeito da CPT, que a priva de valor teórico e prático, consiste no fato de que esta ignora os conhecimentos da biologia e os progressos da biologia do esporte.

    Atualmente não é necessário convencer sobre a necessidade de desenvolver a componente biológica da teoria do treinamento esportivo (6, 7), muitas vezes salientada por vários especialistas (10, 38, 47, 48, 57, 60, 67, 85, 90, 110, 111, 113). Porém, o autor da CPT não esconde a sua posição negativa em relação às noções da biologia e afirma que as leis biológicas não determinam a macro estrutura do treinamento que, segundo ele, é determinada geralmente pelas leis que controlam a forma esportiva (27). Além de tudo, parece que dramatiza todas as tentativas de analisar o processo de melhora do atleta do ponto de vista da teoria da adaptação e de reconhecer a prioridade da componente biológica na teoria de treinamento esportivo. Segundo Matveev, a teoria da adaptação é interpretada por todos de modo simplificado, e isto leva a uma interpretação errada das idéias sobre o desenvolvimento da forma desportiva e representa a biologização e a desumanização da teoria do esporte (28, 29)

    Devemos dizer, porém, que Matveev às vezes se inclina diante da teoria da adaptação, admitindo que as leis dos processos de adaptação têm um determinado papel nas transformações do organismo produzidas pela atividade esportiva. Porém, afirma imediatamente que a adaptação é só uma pequena parte do caminho do atleta em direção ao sucesso.

    Segundo ele, a teoria da adaptação deve ser somente um acessório da teoria do treinamento e provar de modo argumentado os seus princípios (30). Diz ainda que : "o papel prioritário na interpretação do processo de aperfeiçoamento esportivo e dos fenômenos a esse ligados deve ser protagonizado não pela teoria da adaptação, mas sim pela teoria do desenvolvimento" (27).


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    Uma conseqüência (e ao mesmo tempo uma confirmação) da escassa consistência metodológica e cientifica da CPT consiste na confusão conceptual entre lei, princípios, conceitos principais, características naturais, etc... Isto é uma confusão devida a uma tentativa singular e privada de perspectiva de conseguir obter leis da experiência da organização do treinamento esportivo (26, 28).

    Segundo Matveev, os princípios do treinamento esportivo representam "a generalização do grande material empírico acumulado no esporte e espelham as leis biológicas da adaptação e do treinamento esportivo" (30). Trata-se de uma afirmação estranha porque o processo de treinamento é organizado ainda com base em idéias subjetivas sobre os conteúdos, a estrutura e sobre a sucessão no seu desenvolvimento . E aqui não existe alguma "lei" (no senso científico da palavra). No melhor dos casos, pode-se falar somente de algumas regras metódicas da organização do processo de treinamento formuladas com base em processos empíricos, mas que têm uma origem subjetiva. As leis têm caráter objetivo, e, é necessário procurá-las em uma outra esfera de fenômeno e processos (que é ignorada pela CPT) em cuja base existem fatores e ligações objetivas que determinam os mecanismos do seu desenvolvimento, por exemplo: na esfera da adaptação do organismo a uma atividade intensa, ou naquela do processo de especialização morfo - funcional do organismo durante a preparação pluri-anual (4, 5, 6, 9, 48, 113).

    O caráter lógico e especulativo das idéias sobre a atividade esportiva privada de objetividade, tem levado a CPT a afirmar que uma das leis fundamentais do treinamento esportivo consiste nos laços indissolúveis entre preparação geral e especial do atleta (28). Entre estas leis fundamentais se enumeram outras formuladas sem se levantar da escrivaninha (sic) por exemplo, a lei da continuidade e da ciclicidade do processo de treinamento, aquela da unidade entre gradualidade e a tendência às cargas máximas, aquela da dinâmica à ondas das cargas, etc...(26, 30). Em contraposição a estas , sabemos que no esporte de alto rendimento, a evolução dos resultados é fruto de leis mais profundas a respeito daquelas formuladas pelas CPT (4, 9, 18, 32, 38, 47, 67, 81, 110, 113).

    É muito natural que esta confusão, sem princípios, entre leis,. tenha provocado uma outra entre os princípios do treinamento esportivo. Assim, a análise de dezessete manuais de diversas disciplinas esportivas dos institutos de educação física da URSS, demonstraram que os seus autores não veem as diferenças na variedade de princípios existentes, isto é, as diferenças entre os princípios do sistema soviético de educação física, os princípios pedagógicos gerais e os princípios especiais do treinamento esportivo, reduzindo-os todos a um grupo de princípios deste último (14).

    Portanto, na falta de uma sólida base cientifica da CPT, os seus conceitos são caracterizados por contradições internas e resultam, notavelmente, artificiosos e pseudo-científicos e não só não podem representar e servir de instrumento de trabalho eficaz, mas representam, sobretudo, o fator que limita o desenvolvimento das idéias sobre este mesmo processo, destorcendo os princípios práticos da sua organização e oferecendo um péssimo serviço à preparação dos treinadores (!7, 37, 46, 54, 58, 62, 64, 73, 120, 123).


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    A base especulativa da CPT parte das, assim denominadas, fases de formação da forma esportiva (24, 27). O conceito de dinâmica da forma esportiva foi mudado pelos trabalhos de Leutunov (22) e de Prokop (95), que foram os primeiros a formular a idéia de que à base do aumento do nível de treinamento do atleta existiriam as leis biológicas que determinam o desenvolvimento do processo de adaptação às condições da atividade esportiva. Estes autores individualizam três fases deste processo:

    LEUTNOV

  • fase do aumento do nível de treinamento;

  • fase da forma desportiva;

  • fase da diminuição do nível de treinamento.

    PROKOP

  • fase de adaptação esportiva

  • fase de máxima capacidade de trabalho;

  • fase de readaptação.

    Porém, nos parece que, sem conseguir entender e a desenvolver o profundo conteúdo biológico das idéias de Prokop e Leutunov, o autor da CPT não foi em grau de ir além de uma interpretação pedagógica do treinamento (26, 27, 29), limitando-se a discursos, não fundamentados seriamente, sobre as leis da formação esportiva, modificando somente os nomes das fases (24, 26, 27) e, assim afirmou que: "O primeiro pressuposto natural da periodização do processo de treinamento consiste no desenvolvimento (andamento) por fases da forma esportiva". Formação, manutenção e perda temporânea da forma são determinadas por efeitos de treinamento bem determinado, cujo caráter regular muda de modo natural de acordo com a fase de desenvolvimento da forma esportiva"(26). A forma esportiva que se adquire nesse ou naquele nível do processo de aperfeiçoamento representa o estado ótimo somente por um dado nível de preparação esportiva (e somente para este). Para continuar progredindo ocorre que desapareça a velha forma e que se conquiste uma nova (26).

    É fácil notar que esta idéia sobre a natureza do treinamento baseada sobre a dinâmica da forma esportiva fornece somente uma imagem superficial de um fenômeno pluri dimensional. Idéias semelhantes que, nos anos 60, podiam passar por descobertas científicas, atualmente, é evidente, parecem bastante ingênuas ( 17, 54, 110, 113, 120). Hoje, é claro que a aquisição da forma esportiva ofuscou por muito tempo a principal condição para o progresso da maestria esportiva, isto é, a necessidade de aumento contínuo das possibilidades funcionais do organismo do atleta (5). Por exemplo, se de ano em ano o atleta atinge a sua forma esportiva e depois, a perde sem pensar no aumento do nível de capacidade específica do trabalho, não se poderá falar de algum progresso ( 4, 5, 9, 34, 40).

    Ao mesmo tempo, Matveev continua a ignorar tenazmente os inúmeros trabalhos sobre a adaptação do ser humano a uma atividade muscular intensa, típica do esporte (9, 10, 18, 31, 47, 48, 113), os resultados do estudo das leis do processo de formação da maestria esportiva e da especialização morfo funcional no processo pluri-anual do treinamento (4, 5), das tendências da dinâmica do estado funcional do atleta em função à carga de treinamento estabelecida ( 8, 13, 35, 39, 44, 45); isto é, os trabalhos em que são analisadas as essências objetivas, as origens, as dinâmicas e as características quantitativas do desenvolvimento do processo de melhoramento da capacidade específica de trabalho do atleta.

    Apesar disto, o conceito de forma esportiva foi transformado em dogma, em uma espécie de coisa que se resolve em si mesmo, porque mesmo com os discursos infinitos sobre a dinâmica, sobre as fases de formação, sobre as leis de desenvolvimento, sobre a diminuição da forma esportiva, etc..., em nenhuma parte se encontra uma explicação compreensível da natureza biológica de todos estes misteriosos atributos. Por causa desta teorização o autor da CPT reduziu a proposição de Letunov e de Prokop, muito avançada para o seu tempo, a uma formal concepção da teoria da periodização de treinamento sem qualquer base cientifica e perspectiva de desenvolvimento ( 17, 37, 75, 110, 120). Portanto Matveev não só prefere continuar nos anos 50-60, mas, exaltando os valores do conceito de forma esportiva (25,27), procura transportar para o passado passado remoto os especialistas modernos.


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    Como já dissemos anteriormente, a inconsistência prática e teórica da CPT e dos fundamentos da teoria de treinamento baseado sobre esta, foi determinada por ignorar desde o início os conhecimentos biológicos e da aspiração de torná-la uma pedagogia geral (26, 30). Sem dúvida, esta tem relação com a teoria do treinamento esportivo, porém não tendo fundamentos nas ciências da natureza, nem critérios quantitativos objetivos sobre o seu objeto, nem um método científico certo, não pode absolutamente representar o fundamento teórico-metodológico da teoria do treinamento esportivo. Porém, o assim dito "modus" pedagógico da teoria de treinamento esportivo liberou Matveev da exigência da impecabilidade e da não contrariedade do corpo conceptual, da preparação de um exame minucioso da literatura que diz respeito aos problemas científicos da concepção e da pesquisa e da utilização de dados qualitativos exatos e, sobretudo lhe deu, amplas possibilidades de teorização, através de discursos infundados e construções especulativas.

    É importante notar que em vez de conceitos de desenvolvimento e de melhoramento das capacidades motoras, que são utilizados normalmente, Matveev escreve ( e seriamente) sobre educação da força ou da resistência, sobre educação da rapidez dos movimentos e da flexibilidade, etc... Porém não se trata de um evidente não senso, mas de um artifício destinado a aumentar o "senso pedagógico" a CPT.


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    O método da CPT e dos "Os fundamentos do treinamento esportivo" é bastante primitivo. Este método compreende as chamadas observações pedagógicas, o registro de dados em algumas disciplinas, o princípio analítico-sintético superado há muito, e, enfim: "a generalização das experiências da prática esportiva que são parcialmente confirmadas pelo material (pelos dados) experimentais e são completadas através de reflexões teóricas" (25, 26).

    Para vestir estes métodos de uma forma pseudo-científica afirma-se, por exemplo, que, para superar idéias subjetivas sobre a forma esportiva e para formar idéias corretas sobre a mesma, baseadas em dados dos resultados esportivo, são necessários uma análise acurada quantitativa, bem como uma análise lógico-conceitual (27).

    Esta análise se expressa em calcular um limite inferior, muito rigoroso, da zona que representa o critério da forma em resultados esportivos que não devem ser inferiores ao 1,5 a 2% de desvio dos records individuais nos esportes cíclicos e de 3 a 5% nos esportes acíclicos (esporte de força rápida). Aqui, Matveev , como sempre, não dá uma palavra sobre como é definida a forma esportiva nos jogos esportivos e em outros esportes nos quais não existe um método objetivo de avaliação do resultado esportivo. Isto quer dizer que se o atleta realiza resultados que são inferiores a esta zona, não atingiu a forma esportiva.

    No que toca à dinâmica da forma esportiva, o cálculo analítico consiste em traçar uma curva que reúne os melhores resultados expressos em percentual do resultado máximo (26, 27). Este método é ilustrado com curvas que são como se fossem traçadas a mão, como devem ser, para tirar as leis da dinâmica a ondas da forma esportiva (27)(figura 1). Porém Matveev prefere não observar o fato que no momento da máxima forma esportiva a maior parte dos resultados se encontra abaixo do limite da zona por ele estabelecida.

    Não creio que atualmente valha a pena afirmar que orientar-se sobre o fato esportivo e sobre a dinâmica da forma esportiva que se esconde no seu andamento a ondas, possa ser considerado seriamente como método de estudo das leis do treinamento esportivo ( 8, 17, 54). E mesmo se Matveev (e nisto lhe deve ser dado o mérito) fala da importância do estudo das relações entre a entidade da carga de treinamento e o nível de transformação de adaptação que se processam no organismo (30), em nenhuma das suas publicações, mostra algum exemplo de maior validez, apesar de existirem inúmeros, basta somente consultar livros e revistas. Ao mesmo tempo é evidente que dar juízos sobre as causas do andamento a ondas dos resultados esportivos e, portanto, da forma esportiva, sem ter informações sobre os conteúdos e a organização da carga correspondente de treinamento e sobre a importância que tem para o atleta esta ou aquela competição, e mais ainda, deduzir de tudo isto determinadas leis, é ao menos, ingenuidade. Ainda mais ingênuo é buscar a confirmação dos denominados picos de forma esportiva em só dois exemplos e de atletas de meio-fundo Clark e Rono (27).


Figura 1

     Sabemos muito pouco sobre a organização dos seus treinamentos. E além disso, estes atletas não tinham conhecimento de periodização do treinamento e das "leis do controle da dinâmica da forma esportiva" (46, 77, 101, 108)


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    Outro ponto débil do método de Matveev é devido ao fato de que os dados sobre os quais se baseavam as generalizações e a formulação dos princípios e das "leis" era caracterizado por um valor científico, por um nível informativo e por uma fidedignidade escassa. Trata-se sobretudo da análise dos dados sobre o volume e sobre a dinâmica das cargas de treinamento utilizados por atletas, extraídos não se sabe como. Esta forma simples de análise de dados empíricos, isto é, a generalização da experiência prática, produziu um gênero de trabalhos que tem desenvolvido sem dúvida, um papel importante, seja para um posterior desenvolvimento dos princípios empíricos e da metodologia do treinamento, seja para a solicitação do pensamento criativo dos treinadores. Mas quando com base nestes dados se quis formular "leis" da organização do treinamento (26, 28), o valor científico dos princípios e dos conselhos (baseados nestes) é muito diminuído (4).

    Portanto, atualmente devemos constatar, infelizmente, que não obstante inúmeras afirmações "sobre uma ampla argumentação baseada em fatos e na concretização tecnológica em forma de sistemas metodológicos e de regras com caráter aplicativo" (24, 26, 28) que se afirma serem contidas na CPT, esta não tinha, e não dispõe, de um método objetivo, e de uma base experimental séria. Por isso, idealizada como meio para ajudar o treinamento no esporte de alto nível (24), foi transformada, em uma disciplina escolar (26) que tem separado o seu autor da ciência e da prática esportiva que continuam a andar avante. Por esse motivo, os sucessivos trabalhos de Matveev (27, 30) destinados a convencer um leitor pouco esperto da excepcionalidade e universalidade das suas idéias não trouxeram nenhuma modificação à idéia original.

    A argumentação de Matveev é muito simples: visto que o aperfeiçoamento esportivo não pode acontecer fora da sucessão das fases de aquisição, da manutenção e da perda momentânea da forma esportiva, o processo de treinamento deve ser organizado de modo (tal) a poder garantir o controle ótimo do desenvolvimento destas. Em conseqüência, no treinamento são individualizados os seguintes períodos: preparatório, o de competição e o de transição; enquanto a organização dos macrociclos de treinamento, em definitivo, são determinadas pelas leis do controle do desenvolvimento da forma esportiva (25, 26).


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