Deficiência mental e
a atividade física

Jônatas de França Barros*
Odiel Aranha Cavalcante**
e Ricardo Jacó de Oliveira***

paty91@persocom.com.br
rjaco@zaz.com.br
(Brasil)

*Professor da Faculdade de Educação Física e do Programa de pós-Graduação Stricto-Sensu em Ciências da Saúde da FS/UnB.
**Fundação Educacional do Distrito Federal e Faculdade de Educação Física da Universidade de Brasília.
***Professor e Coordenador do Programa de Pós-Graduação Stricto-Sensu em Educação Física da Universidade Católica de Brasília/UCB.

http://www.efdeportes.com/ Revista Digital - Buenos Aires - Año 5 - N° 23 - Julio 2000

     Os portadores de deficiência mental são, provavelmente, as pessoas que mais são prejudicadas, em decorrência da supervalorização das habilidades intelectuais pela sociedade (TELFORD, 1984; GLAT,1989). Enquanto os portadores de deficiência física e os portadores de deficiência sensorial estão se integrando gradativamente à vida comunitária, ainda persistem, em grau mais elevado, preconceitos em relação àquelas que possuem uma deficiência mental (MARTINS, 1996).

     Porém, com o processo de sensibilização e conscientização da sociedade, hoje com o princípio da inclusão liderado principalmente pela proposta da ONU, (resolução 45/91 da Assembléia Geral de 1990) visando construir “uma sociedade para todos” SASSAKI (1998) e pelo movimento “inclusion international”, GLAT (1988), as pessoas com necessidades educativas especiais vêm alcançando seu espaço na sociedade.

     Portanto, considerando o movimento de construção de uma sociedade inclusiva, propomos este artigo como meio de facilitar a compreensão do princípios básicos que devem ser considerados na pratica de atividade física para pessoas com necessidades educativas especiais, desmistificando alguns preceitos de atividade física para portadores de deficiência mental.

     De muitas maneiras, o corpo humano pode ser comparado a uma máquina que converte uma forma de energia em outra na execução de um trabalho. Com isto, o funcionamento do corpo é mantido por um equilíbrio dinâmico que necessita de atividades para funcionar normalmente. A quebra deste equilíbrio, causada, por exemplo, por hábitos alimentares errôneos ou pela vida sedentária, pode resultar em doenças crônico-degenerativas e desordens emocionais (BARBANTI, 1990).

     ROSADA (1986) considera que sem um programa de atividade física cientificamente elaborado, crianças deficientes ou não, estarão totalmente sujeitas aos problemas da civilização moderna regida pelo sedentarismo.

     Para GUIMARÃES (1993), nossa cultura oferece diversas oportunidades para os indivíduos fazerem algum tipo de atividade física que requeira gasto energético acima dos valores do metabolismo basal. De essa forma a prática regular de atividades físicas, seja através do desporto ou aula de educação física, tem sido considerada fator de proteção contra os processos degenerativos do organismo, atuando como um agente promotor de saúde.

     Algumas características físicas e fisiológicas nos portadores da Síndrome de Down, precisam ser lembrados no planejamento das atividades físicas: atraso no desenvolvimento pré e pós-natal, normalmente baixo peso e estatura, as anomalias congênitas do coração (riscos de cardiopatias), dificuldade de maturação neurohormonal (reduzida e limitada), pré-disposição á hipoventilação respiratória, hipotonia generalizada (hiperflexibilidade das articulações, frouxidão ligamentar, instabilidade atlanto-axial e fraqueza muscular), obesidade (compulsão alimentar), braquicefalia, cavidade nasal achatada, mãos curtas e atarracadas, espaço grande entre o primeiro e segundo artelhos, além do grau de comprometimento cognitivo variado, que pode servir como orientador na aquisição ou desenvolvimento de habilidades e aptidão para certas atividades físicas. Essas características demonstram que indivíduos com Síndrome de Down têm menor capacidade física quando comparados com indivíduos normais (CULLUM, 1969; ANDREW, 1979).

     Em outro estudo (PITETTI, 1993) comenta que estas pessoas vivem sob restrições e limitações que devem ser superadas. Devido as diferenças em determinadas áreas, muitos deficientes mentais, ainda são subestimados, principalmente em relação aos esportes, e por falta de estímulos culturais e ambientais, que todas as crinças deveriam receber, se tornam pessoas inativas e sedentárias, e passam a serem vista dessa forma pela sociedade.

     Estudos porém, nos apontam também influências sócio-culturais no estabelecimento desta baixa capacidade física.

     No entanto, pessoas com deficiência mental já mais velhas, mostram que houve maior incidência de doenças cardiovasculares precocemente adquiridas nesta população. Os autores entendem que uma das causas são os fatores ambientais: estilo de vida sedentária, e consideram os exercícios físicos como uma forma de profilaxia (COOPER,1976). Estudos variados já comprovaram rendimento nos níveis de aptidão cardiorespiratória dos deficientes mentais depois de treinamentos (NORDGREN,1971; BEASLAY,1982).

     Outras investigações têm indicado que indivíduos com deficiência mental possuem freqüência cardíaca máxima de 8 a 30% abaixo do esperado, limitando o trabalho cardíaco (BEASLAY,1982, FERNHALL,1988, PITETTI,1991). Esses resultados obtidos são primeiramente causados por estilo de vida sedentária combinado com alto índice de gordura corporal, se tornando mais um fator de desenvolvimento prematuro das doenças cardíacas nessa população (PITETTI & CAMPBELL,1991). Um estudo prova que após 23 semanas de treino, a média do peso corporal dos deficientes mentais caiu 3,6kg, e houve melhora no VO2máximo. E quando combinados a perda de peso e a melhoria no VO2máximo - houve uma melhora de 43% no VO2máximo expresso em ml/kg/min (SCHURRER & WELTMAN,1985).

     A avaliação da aptidão cardiorrespiratória em pessoas portadoras de deficiência mental tem sido investigada desde a década de 40 (CLIMSTEIN et al., 1993). A deficiência mental leva ao aumento da prevalência de doenças cardiovasculares e diminuição da expectativa de vida (FERNHALL, 1993; HASSON, 1994), que possivelmente está relacionada com alterações diversas observadas nesta população, como a elevada incidência de obesidade, baixos níveis de aptidão cardiorrespiratória (EDERHARD & ETERREDOSI, 1990; Bar-Or, 1994) e fraqueza muscular (FERNHALL, 1993; HASSON, 1994).

     Para MOREHOUSE & MILLER (1978), os exercícios físicos produzem modificações adequadas e de forma harmônica em todo o organismo (sistema nervoso e muscular, circulação e respiração, e nas vias metabólicas). Além de ser uma atividade prazerosa, o exercício mantém a agilidade corporal e exerce uma influência psicológica e social profunda, prevenindo a obesidade e afecções.

     Um fato importante que deve ser levado em consideração quanto às diferenças desta população, é a falta de força muscular nos membros inferiores que demonstra estar relacionada diretamente com o VO2máximo alcançado nos testes aeróbios. Esta relação já foi comprovada por FLEG (1988). Aumentos significativos no VO2máximo já foi encontrado depois de doze semanas de treinamento de força, envolvendo exercícios na mesa flexora e extensora com membros inferiores (GETTMAN,1978). Além disso, estudos mostram que ao longo dos anos ocorre uma queda no VO2máximo nos indivíduos em geral, devido à perda de massa muscular (EDWARD, 1988). Sendo assim, comprova-se que os os indivíduos com Sindrome de Down se encontram em desvantagens, uma vez que possuem hipotonia muscular. Estudos ainda demonstram que adultos com deficiência mental possuem aptidão cardiovascular e força muscular inferiores à média (BASSEY,1988).

     WATSON (1986) descreve que o desempenho físico resulta de um conjunto de todas as características físicas e mentais do indivíduo. Para que haja um resultado efetivo, devemos conhecer quais os fatores que influenciam o processo de crescimento, maturação e aprendizagem.

     A capacidade de realizar trabalho e exercício físico depende da integridade do sistema respiratório, cardiovascular e musculoesquelético. No caso de incapacidade de qualquer destes sistemas haverá uma diminuição da tolerância ao exercício (WASSERMAN et al., 1987; BAR-OR, 1994; HASSON, 1994).

     Muitos estudos realizados mostram que pessoas com deficiência mental costumam ter baixos níveis de algumas variáveis metabólicas como: VO2máximo, freqüência cardíaca, e tendências a serem mais obesos que pessoas normais (BURKETT,1983, CAMPBELL,1974, CORDER,1966, FOX,1982). Embora muitos estudos tem mostrado que essa tendência pode ser resultado de uma vida sedentária, devido a falta de programas de atividades físicas adequadas a essa população (REID et. al.,1985 , PITETTI et. al., 1989). Um estudo feito com Sindrome de Down dos EUA e Brasil comprovou que os dois grupos possuíam similares valores de VO2máximo e freqüência cardíaca máxima, mostrando que independente das culturas, esta população está abaixo da média na questão cardiovascular (PITETTI,1989), precisando assim, ser elaborados padrões de referências nos testes de aptidão física, para que se trabalhe com esta população visando uma melhor qualidade de vida.

     Para iniciar programas de atividade física, WATSON (1986) mostrou que o aquecimento adequado normalmente melhora o desempenho físico, aumentando: (1) a mobilidade e a flexibilidade articulares; (2) a produção de potência disponível dos músculos; (3) a coordenação e (4) a energia disponível do metabolismo aeróbio no início da atividade, de maneira que menos energia é gerada a partir da produção de ácido láctico. ARAÚJO (1986), DURNIN et al., (1960); POLLOCK et al., (1975); WILMORE et al., (1975). revelam que devem ser programados exercícios dinâmicos de grandes grupos musculares, nos quais são desejáveis exercícios como, o caminhar, trotar, correr, saltar, ciclismo, natação, calistenia, squash, dançar e pedalar. Estes tipos de exercícios melhoram todo o sistema de transporte de oxigênio do organismo.

     Dessa forma, o exercício físico se torna essencial para a saúde, longevidade e produtividade na vida dessa população (FERNHALL,1989).

     WATSON (1986) analisa que os efeitos sobre o sistema cardiovascular no adolescente, que deseja melhorar sua condição física geral, devem, seguir um programa de atividade física, podendo qualquer tipo de exercício dinâmico ser utilizado, desde que envolva grandes grupos musculares e produza uma freqüência cardíaca na faixa de 130 bpm a 170 bpm. O COLÉGIO AMERICANO DE MEDICINA ESPORTIVA (1987) Sugere, ainda, que estas atividades sejam realizadas de 3 a 5 dias por semana.

     MURPHY & HARDMAN (1998) comenta que recentemente, estudiosos perceberam que a associação de atividade física e saúde não necessita de horas e horas de exercícios intensivos. Pequenas sessões de trinta minutos por dia, na maior parte dos dias da semana, desenvolvidos continuamente ou mesmo em períodos cumulativos de 10 a 15 minutos, em moderada intensidade, podem representar o limiar para população em geral adquirir o “Passaporte para Saúde”.

     Quando da realização de um exercício isotônico, o consumo de oxigênio aumenta proporcionalmente ao débito cardíaco e à diferença artériovenosa de oxigênio (BARROS NETO, 1996). Nessa condição, o aumento do débito cardíaco deve ser acompanhado por um mecanismo eficiente de redistribuição de fluxo sangüíneo, visto que, nas estruturas musculares solicitadas, ocorre uma maior atividade metabólica (WHIPP, 1994). O aumento do débito cardíaco é resultante do aumento da freqüência cardíaca e do volume de ejeção sistólico (BARROS NETO, 1996).

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