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Interfaces da pesquisa no Ensino Superior: 

a iniciação científica e a pesquisa na relação ensino

Interfaces research in Higher Education: a scientific initiative and research on the teaching

Interfaces de la investigación en la Educación Superior: la investigación científica y la investigación en la enseñanza

 

*Mestre em Educação pela Universidade do Oeste de Santa Catarina – UNOESC

Doutorando em Educação nas Ciências pela

Universidade Regional do Noroeste

do Rio Grande Do Sul – UNIJUI

**Mestre em Educação pela Universidade do Oeste de Santa Catarina – UNOESC

Doutorando em Educação pela Universidade de Santa Cruz do Sul – UNISC

Grupo de Estudo e Pesquisa LINCE

Grupo Pesquisa e Estudos Poéticos, bolsista PROSUP/CAPES

Edinaldo Enoque da Silva Junior*

Nilton Cézar Rodrigues Menezes**

luzhinn@hotmail.com

(Brasil)

 

 

 

 

Resumo

          O presente trabalho teve como objetivo contribuir para o debate sobre a pesquisa no Ensino Superior. Com efeito, esta pesquisa está vinculada ao Grupo LINCE – Linguagens, Cultura e Educação e a Linha de Estudos Poéticos do Programa de Doutorado em Educação da Universidade de Santa Cruz do Sul – UNISC, bem como no Grupo e Linha de Pesquisa Educação Popular em Movimentos e Organizações Sociais do Programa de Doutorado em Educação nas Ciências da Universidade Regional do Noroeste do Rio Grande Do Sul – UNIJUI. Assim, a preocupação foi compreender como se dá a pesquisa, seja no cotidiano em sala de aula como práxis na relação com o ensino, seja mediante os espaços específicos como por meio de editais e bolsa. O presente trabalho partiu de dois pontos. O primeiro destaque está em relação aos professores. As entrevistas com os professores fazem parte de um trabalho articulado no qual abrangeu várias instituições de Ensino Superior desde o noroeste do Rio Grande do Sul até o Extremo Oeste de Santa Catarina. O estudo consistiu na produção de um banco de dados relacionados à Pesquisa, Ensino e Extensão do qual o presente trabalho é apenas um recorte, com maior ênfase na dimensão pesquisa. O segundo destaque está na relação com acadêmicos entrevistados. Ao longo do texto encontram-se várias intervenções provenientes de entrevistas com acadêmicos bolsistas. Os alunos entrevistados no presente trabalho são matriculados numa única instituição de Ensino Superior comunitária do Extremo Oeste de Santa Catarina. Nesse conjunto, entrevistamos professores e alunos com relação as suas queixas e dificuldades. Por fim, este trabalho não pretende encerrar o debate sobre a pesquisa em si, mas destacar sua importância como elemento de fundamental valor ao meio universitário e sua relação com as demais dimensões educacionais, (sobretudo ao ensino) sociais e individuais da contemporaneidade.

          Unitermos: Pesquisa. Ensino. Iniciação científica. Ensino Superior.

 

Abstract

          This study aimed to contribute to the debate on research in higher education. Indeed, this research is linked to LYNX Group - Languages, Education and Culture and Poetic Studies Line Doctoral Program in Education of the University of Santa Cruz do Soul - UNISC and the Group and Line Education Research People in Motion Social Organizations and the Doctoral Program in Education in Science Regional University of Rio Grande Do Soul Northwest - UNIJUI. Thus, the concern was to understand how is the research, whether in daily life in the classroom and practice in relation to teaching, either by specific spaces and through public notices and purse. This study was based on two points. The first highlight is in relation to teachers. Interviews with teachers is part of a coordinated work in which included several higher education institutions from the northwest of Rio Grande do Soul to the Far West of Santa Catharine. The study consisted in the production of a database related to Research, Education and Extension which this work is just a cut, with greater emphasis on research dimension. The second highlight is the relationship with academics interviewed. Throughout the text are several interventions from interviews with academic scholars. Students interviewed in this study are enrolled in a single institution of higher education community in the Far West of Santa Catharine. In this set, we interviewed teachers and students regarding their complaints and difficulties. Finally, this paper does not intend to wind up the debate on the research itself, but to highlight its importance as a fundamental value element to the university environment and its relationship with other educational dimensions (especially education) and social individual of contemporaneity.

          Keywords: Research. Education. Scientific research. Higher Education.

 

Recepção: 08/05/2016 - Aceitação: 12/09/2016

 

1ª Revisão: 27/08/2016 - 2ª Revisão: 09/09/2016

 

 
Lecturas: Educación Física y Deportes (EFDeportes.com), Revista Digital. Buenos Aires, Año 21, Nº 220, Septiembre de 2016. http://www.efdeportes.com/

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1.     Introdução

    Na universidade, os estudantes possuem a chance de desenvolver atividades em projetos de extensão e/ou de pesquisa como a Iniciação Científica (IC). Muitos estudantes de graduação desconhecem o que é uma Iniciação Científica e seus benefícios diretos e indiretos (Fechine; Nascimento, 2008; Schwartzman, 1987).

    Assim, a Iniciação Científica caracteriza-se como instrumento de apoio teórico e metodológico à realização de um projeto de pesquisa e constitui um canal adequado de auxílio para a formação de uma nova mentalidade no aluno. Em “síntese, pode ser definida como instrumento de formação” (Universidade de São Paulo, 2010).

    Dessa forma, os graduandos podem se aproximar do universo acadêmico e científico quando exercem atividades relacionadas à pesquisa científica e as bolsas de Iniciação Científica são uma oportunidade para essa aproximação; a partir daí o aluno também pode fazer a escolha quanto ao campo de atuação profissional após conclusão do curso de graduação.

    Nesse contexto, os programas universitários de incentivo à pesquisa trazem vantagens e também desvantagens para a formação acadêmica do graduando, bem como para a instituição de maneiras diversas. Uma das vantagens é que o estudante orientado geralmente apresenta menos reprovações por esse ser um critério para obtenção de bolsa de Iniciação Científica. As experiências como pesquisadores de Iniciação Científica também fazem muitos alunos refletirem e constatarem suas verdadeiras vocações, influenciando na decisão de mudança para outro curso. A dificuldade de conciliar as atividades da pesquisa com as disciplinas da graduação constitui-se uma desvantagem para a permanência do aluno no programa de Iniciação Científica.

    Também, a produção científica universitária feita por alunos de graduação é necessária para o crescimento da sociedade como um todo; por isso, quanto mais “cedo” os estudantes de graduação começam a produzir cientificamente, consequentemente poderão se tornar pesquisadores, “com o objetivo de solucionar os problemas que a sociedade enfrenta no seu cotidiano” (Santos et al., 2007 apud Santos e Silva, 2010). Assim, a produção científica universitária aumenta quando se faz pesquisa.

    Os programas de incentivo as pesquisas existentes nas universidades objetivam formar pesquisadores bem como despertar vocações e, são nesses programas, que os discentes tomam conhecimento de como atuam os docentes-pesquisadores. Com isso, as universidades podem contar com reservas renováveis de futuros candidatos aos cursos de mestrado e doutorado, bem como para os concursos de admissão de professores. Em outros casos, a não adaptação dos discentes a esses programas acarreta atraso no tempo de formação do graduando (Lampert, 2008).

    Ponto fundamental a ser abordado é que na a Universidade, a aprendizagem, a docência, a ensinagem, “só serão significativas se forem sustentadas por uma permanente atividade de construção do conhecimento. Tanto quanto o aluno, o professor precisa da pesquisa para bem conduzir um ensino eficaz” (Severino, 2008, p. 13).

    A pesquisa no Ensino Superior é fator determinante para que o aluno saia do espaço universitário mais preparado para a vida e o mercado de trabalho que o espera. Seja nas ciências humanas, naturais, exatas ou da terra, seja em qualquer área do saber, a produção científica é de suma importância para o desenvolvimento da ciência, do conhecimento científico:

    Segundo Bridi (2015, p. 350):

    A formação científica no ensino superior nunca deixou de ser uma questão defendida por estudiosos da universidade e essa defesa tem sido retomada por autores brasileiros. A pesquisa cientifica contribui para a formação docente, colaborando com o desenvolvimento, habilidades e competências e com o processo ensino aprendizagem.

    Com o propósito de compreender a partir dos professores mesmos, o que impede uma relação mais estreita com a pesquisa, desenvolvemos (alunos e professores do Doutorado em Educação nas Ciências da UNIJUI, turma 2015, na disciplina “Ensino Superior perspectiva da ação docente”) um questionário e aplicamos em algumas Universidades do Noroeste do Rio Grande Sul, Oeste e Extremo Oeste de Santa Catarina. Tal questionário pretendeu dentre outras coisas, compreender como se dá a pesquisa nas Universidades na sua relação estreita com o professor. Ou seja, como o professor universitário lida com a dimensão pesquisa em sua Universidade e Faculdade e, como o professor do Ensino Superior percebe a pesquisa em seu ambiente de trabalho.

    O que devemos problematizar no Brasil, é se o Ensino Superior possui recursos tecnológicos e humanos aptos a fazer da pesquisa um instrumento de ensino e produção de conhecimento de ponta. A pesquisa no Brasil esta prioritariamente ligada à iniciação científica, desse modo, somente uma pequena parcela do corpo discente tem a oportunidade de participar desse espaço de produção de conhecimento. Assim, o presente trabalho estará voltado principalmente para esse aspecto, ou seja, a dimensão pesquisa ligada a bolsa/editais como porta de entrada no universo da pesquisa. Entretanto, outros aspectos da pesquisa serão relacionados, mas com menor ênfase.

    A pesquisa e o ensino vivem de modo amplamente antípoda. Nesse sentindo, Segundo Severino (2008, p. 21), de modo algum o ensino deve estar separado da pesquisa:

    O envolvimento dos alunos ainda na fase de graduação em procedimentos sistemáticos de produção do conhecimento científico, familiarizando-os com as práticas teóricas e empíricas da pesquisa, é o caminho mais adequado inclusive para se alcançar os objetivos da própria aprendizagem.

    Levando em conta que os alunos são dependentes de menor ou maior grau de ajuda financeira para cobrir seus gastos pessoais e universitários, no que se refere a universidades comunitárias e privadas, a pesquisa não se dissocia da relação edital/bolsa. Posto isso, pensamos que a pesquisa deve ter outro âmbito para além da bolsa e de editais se quiser ter maior abrangência em relação aos alunos, ou seja, o único espaço para que pesquisa seja praticada de modo amplo no Ensino Superior é na sua relação com o ensino cotidiano. Ali todos os alunos, bolsista ou não terão contato com a pesquisa, desde que o professor faça da pesquisa instrumento também de ensino e aprendizagem.

    Outro dado importante é que a bolsa muitas vezes é insuficiente para cobrir tais despesas dificultando, assim o acesso do aluno ao universo da pesquisa acadêmica. Temos que levar em consideração que a pesquisa ligada a bolsa é apenas uma via de acesso à pesquisa, o voluntariado também é outro recurso que pode ser usado pelo acadêmico, mas a mais importante via de acesso à pesquisa seria a pesquisa como processo educativo na própria sala de aula envolvendo indistintamente todos os alunos.

    Se o aluno só depender da bolsa/pesquisa/editais para desenvolver pesquisa a pesquisa vai atingir alguns poucos alunos e a grande maioria deles será negada o acesso à pesquisa, logo a pesquisa atrelada pura e simplesmente a bolsa/editais é uma pesquisa excludente e elitizada. Temos que tomar o cuidado para não reduzir a pesquisa simplesmente ao acadêmico bolsista. Tendo em vista que a universidade é o espaço por excelência da pesquisa, essa deve estar sim, sobretudo ligada aos professores e estendê-la a seus alunos.

    A pesquisa segundo Severino (2008, p. 21) dever ser feita não por um, ou poucos membros, mas sim por um sujeito coletivo: “[...] o saber é resultante de uma construção histórica, realizada por um sujeito coletivo. Daí a importância da pesquisa, entendida como processo de construção dos objetos do conhecimento e a relevância que a ciência assume em nossa sociedade”.

    Outra questão importante que dificulta a produção da ciência na Universidade de modo amplo e coletivo é o conteudismo. Enquanto Universidades importantes da América do Norte, da Europa ou do Japão desenvolvem vertiginosamente a pesquisa tanto na relação ao ensino como isoladamente, as Universidades e Faculdades brasileiras são caracterizadas pelo ensino em detrimento da pesquisa.

    É o que afirma Ghelli (2015, p.02):

    A aprendizagem e a construção do conhecimento se fazem pelo esforço do pensar, do abrir espaços para a reflexão, do aprender a aprender, aprender a estudar, do estímulo à curiosidade intelectual e ao questionamento à dúvida, e não à fixação do conteúdo que é dado em aula pelo professor. Embora a universidade tenha como objetivo desenvolver conhecimentos e levar à construção de processos mentais, atualmente seu cotidiano pedagógico se caracteriza por procedimentos que trabalham com a transmissão do saber.

    O que encontramos, no entanto, muitas vezes no Ensino Superior é uma espécie de extensão do Ensino Médio e Fundamental, ou seja, a ideia de que o professor é quem detém todo saber e que esse saber deve ser “passado” ao aluno para que numa avaliação saiba reproduzir aquilo que foi-lhe ensinado. O conhecimento e seu avanço ficam assim limitados ao estímulo-resposta.

    Tal qual o Ensino Médio, a autonomia, a iniciativa, o espírito inventivo do aluno ficam muitas vezes cerceado por essas políticas educacionais. Políticas que impede ou limitam que alunos se desenvolvam de modo mais amplo em interação, com o que lhe é dado como saber pelo professor, com o que poderia ser produzido com o próprio professor, com a eventual produção individual ou coletiva com seus colegas de aula. “Esse entendimento deixa claro que a função da universidade vai além da formação profissional técnica e especializada e tem o compromisso com o desenvolvimento do espírito investigativo, com a produção de novos conhecimentos” (Bridi, 2015, p. 50).

    Importante frisar que no mundo complexo no qual vivemos todo manancial de saber produzido e adquirido é de suma importância para viver em sociedade nesse mundo globalizado. Novas técnicas, novos conceitos, novos modos de vida e interação entre os humanos e seus produtos científicos, exigem também um modo de conhecimento que possibilite o entendimento da contemporaneidade e suas diversas imbricações. Refletir sobre isso é pensar uma aula que possibilite o desenvolvimento de um pensamento complexo. A ensinagem e aprendizagem pura já não respondem às dificuldades de se viver em coletividade e em meio à efusão tecnológica que existe. Nesse sentido, um dos grandes desafios desta aula é a ruptura da prática pedagógica universal, reforçada por anos de didática prescritiva, consagrando o professor como um repassador, inclusive com boas habilidades de informações, enquanto para o aluno fica a perspectiva da memória e da reprodução fidedigna. A maioria dos professores não faz uma reflexão de suas práticas pedagógicas e tendem a repetir os mesmos rituais pedagógicos que viveram quando foi aluno (Ghelli, 2015, p. 03). 

    Assim, pensamos que para romper com o imperativo do repasse seguimos a vertente de pensadores que, como Severino (2008) acredita na pesquisa e sua relação com o ensino como portas para o desenvolvimento da ciência e do ser humano mais complexo. Esse trabalho pretende contribuir para compreender o que limita, dificulta, ajuda ou incentiva um professor a desenvolver pesquisa com seus acadêmicos. Por outro lado, o que a pesquisa de Iniciação Científica (IC) ajuda a contribuir para formação do acadêmico tanto para a pesquisa quanto para a vida.

2.     Iniciação Cientifica: vontade de muitos, realidade de poucos, alguns exemplos

    A (IC) é característica fundamental do Ensino Superior. Como um dos objetos mais importantes a ser levado em consideração quando se pensa em excelência acadêmica. Toda boa Universidade e Faculdade têm diversos projetos de (IC) em seus programas. Para desenvolver saber, a instituição de Ensino Superior representada no seu quadro de professores deve pesquisar e produzir conhecimento. Para que esse conhecimento gere novos conhecimentos e os cursos devem desenvolver projetos de pesquisa de modo contínuo e contundente.

    Para Lemos (2010, p.61):

    A Iniciação Científica é um instrumento que permite introduzir os alunos de graduação na pesquisa científica, sendo um instrumento de apoio teórico e metodológico à realização de um projeto que contribua na formação profissional do aluno. Tem a Finalidade de despertar vocação científica e incentivar talentos potenciais entre estudantes de graduação universitária, mediante participação em projeto de pesquisa, orientados por pesquisador qualificado.

    As dificuldades de se relacionar ensino e pesquisa no cotidiano universitário já o sabemos: excesso de carga horária destinada ao ensino, pouca remuneração, falta de incentivo e reconhecimento, falta de interesse de professores com o novo, descomprometimento com a instituição ou com seus alunos, dentre outros fatores, fazem da sala de aula um lugar do repasse puro e simples de conteúdo.

    Mas, o que dizer da (IC)? Esse espaço destinado à pesquisa e produção de conhecimento? Que sabemos sobre professores e alunos envolvidos nesses projetos?

    Para Bridi (2015, p. 350):

    A importância da iniciação à pesquisa dos estudantes de graduação é vista como o caminho para a autonomia intelectual. Por meio dela o estudante passa a ter a possibilidade real de exercer sua criatividade, de construir um raciocínio crítico, de articular os vários conhecimentos, de se constituir em um dos caminhos para a execução de projetos interdisciplinares que envolvam também a superação da dicotomia teoria e prática.

    Logo, acreditamos que o desenvolvimento do saber científico no Ensino Superior que se quer produtora de saber, autonomia e criatividade deve necessariamente passar pela (IC) como princípio educativo. Já que em sala de aula, a pesquisa é pouco praticada procuramos entender como ela é cuidada em seu “próprio meio” e na relação com as outras dimensões, ensino e extensão, em destaque a relação com o ensino.

    Em resultando de pesquisa sobre a Iniciação Científica na UNICAMP, Bridi, (2015, p. 359) destaca: “Os dados apresentados nos permitem considerar que a iniciação científica pode ser espaço onde se concretizem novas formas curriculares, sem a rigidez da disciplinarização, contribuindo assim para a formação do aluno”. Nesse sentido, a pesquisa no âmbito acadêmico aparece como porta de entrada para o surgimento de cientistas; acadêmicos que enxergam a pesquisa como parte de sua vida profissional e acadêmica. Importante lembrar que isso só é possível com a mediação de um professor.

    O Ensino Superior desenvolve cientistas à medida que oportuniza espaços de produção de saberes. No entanto, esses espaços são muitas vezes pequenos demais para que mais cientistas “nasçam” dentro das instituições. Por quê? A princípio, primeiro: a pesquisa não está ou muito pouco atrelada ao ensino. Segundo, os espaços de pesquisa são propiciados mediante editais limitados. Pode-se julgar que essa deficiência de espaços de pesquisa se dê principalmente pela maior importância dada à dimensão ensino do que a dimensão pesquisa. O ensino tradicional ainda tem muito mais espaço no Ensino Superior do que a pesquisa.

    Diante desse embate encontramos acadêmicos que não puderam desenvolver pesquisa. Dentre eles J.C. de 19 anos, (Utilizaremos somente as iniciais e a idade para identificar os alunos que como dissemos no início do texto irão contribuir para o debate) do segundo período do curso de direito. Segundo ele, tentou vários contatos com professores para desenvolver projeto de (IC), sem sucesso. A resposta mais encontrada dada a ele pelos professores é que a carga horária em sala de aula não oportuniza tempo para se ocupar de mais esse tipo de orientação.

    Outra orientação dada a J.C. foi que deveria esperar editais específicos na sua Universidade para submeter o projeto, mediante aprovação, o aluno poderia ganhar uma bolsa e desenvolver pesquisa. J.C. alega que gostaria de fazer pesquisa mesmo que fosse fora de edital, que pretende fazer um mestrado e gostaria de pesquisar a fim de estar mais apto para desenvolver sua dissertação.

    O que podemos compreender aqui são dois pontos importantes. O primeiro é a questão da carga horária do professor. J.C. procurou três professores para auxiliá-lo no desenvolvimento de uma pesquisa e os três alegaram que não haveria tempo para orientá-lo devido à carga horária no ensino. Podemos verificar nesse exemplo que a dimensão ensino teve mais importância do que a dimensão pesquisa. Outro ponto importante para destacarmos nesse exemplo é a ideia de editais. A pesquisa aqui atrelada à edital e remuneração via bolsa. O que J.C. descarta com a vontade de pesquisar independente de edital ou bolsa. Segundo Lemos (2010, p.61): 

    É um dever de toda Instituição de nível superior oferecer esse programa de Iniciação Científica mesmo sem a veiculação de bolsa de iniciação científica, já que esta é apenas um incentivo individual que serve como estratégia de seleção para os melhores alunos e/ou projetos. Essa bolsa pode ser um atrativo, ajudando o bolsista a não desistir do projeto por problemas financeiros, garantindo sua participação em todo o processo de pesquisa.

    No que se refere a bolsas, são basicamente vinculadas a editais. Seu número é muito pequeno levando em consideração Faculdades e Universidades que tem um corpo discente elevado. Editais são abertos em média uma ou duas vezes ao ano com a seleção de uma ou no máximo duas dezenas de alunos. Logo, uma Universidade de tamanho médio deixará inevitavelmente de atender um número significativo de acadêmicos interessados em iniciar-se na pesquisa. Como dissemos anteriormente o voluntariado é uma possibilidade de inserção na pesquisa, mas como também estamos argumentando, boa parte dos acadêmicos, principalmente os deste trabalho que trata de alunos de uma Universidade Comunitária, não teriam condições de arcar com as despesas da faculdade sem um trabalho formal.

    C.S., 18 anos, acadêmica de pedagogia, do sexto período, diz ter inscrito vários projetos de pesquisa sem sucesso. Diz que a quantidade de bolsas é muito reduzida e que há maior interesse em projetos nas áreas que dão mais retorno econômico, como as engenharias.

    Outra aluna, A.A., 19 anos, do curso de psicologia, quinto período, se diz descontente com o valor da bolsa. Que é muito baixa para ter que cumprir cinco períodos, que a bolsa é insuficiente para pagar sua mensalidade. Muitas dificuldades cercam alunos interessados em desenvolver pesquisa. Seja a de encontrar professores interessados, de conseguir ter seu projeto selecionado, ou de questão financeira. Por outro lado, podemos encontrar exemplos de acadêmicos que desenvolveram pesquisas e colheram bons frutos nesse investimento que requer muito tempo dedicado, dificuldades inclusive financeiras.

    Exemplo é F.B., doutorando de Sociologia e, C.B., doutoranda em Sociologia e V. M doutorando em Biomedicina. F.B. afirma que os projetos de (IC) mudaram completamente sua percepção de estudo. Alega que, o tempo que passou na Universidade desenvolvendo seus projetos foram de suma importância tanto para sua formação pessoal quanto para ser hoje um bolsista pesquisador no doutorado. Segundo F.B, as pesquisas, as orientações dedicadas de seu professor, bem como o conhecimento produzido, e o que é importante, divulgado, em seminários e artigos possibilitaram a abertura de espaços que sem a pesquisa não encontraria.

    Já para C.B., doutoranda em Sociologia, a pesquisa possibilitou um universo de ideias novas que encaminhavam novas pesquisas. “O universo da iniciação científica é como um universo da criança sendo alfabetizada é um universo de imaginação e criação que possibilita muitos novos saberes e aprenderes”.

    V. M., participou de cinco projetos de iniciação científica:

    “meu professor e eu durante meus quatro anos de faculdade de biomedicina pudemos produzir um bom material sobre a área estudada. Os projetos me ajudaram sobremaneira para que pudesse fazer o mestrado e o doutorado em andamento”.

    Para L. M., professor de história e bolsista de IC:

     “Acho que é fundamental pra corrigir a crescente liquefação do conhecimento científico, proporciona uma formação mais completa ao acadêmico e por consequência toda comunidade. E ponto negativo é a falta de oportunidade/disponibilidade de recurso. Nas particulares acho que poderia ter mais bolsa pra pesquisa. Bolsa gera oportunidade pra galera fazer pesquisa. Tem gente que não consegue fazer pesquisa se não tive apoio. Isso limita a oportunidade, entende. Mais bolsa, mais chance do pessoal fazer”.

     O que pudemos observar é que a pesquisa ao mesmo tempo em que abre espaço para o surgimento de futuros doutores e cientistas é elitizada dentro da Universidade. Muitos querem participar da pesquisa poucos conseguem. Devido ou a falta de bolsa para alunos que necessitam de recurso, seja pela falta de interesse ou tempo de professores dadores de aula que não dispõe de tempo para orientação e, muitos jovens não encontram a pesquisa nem em sala de aula, muito menos na (IC). Quem perde com isso é tanto o sujeito interessado na pesquisa quanto a sociedade que pode perder potenciais cientistas que poderiam ajudar no desenvolvimento do país e da região onde vivem com suas ideias e inventos. Em face disso, a iniciação científica é um instrumento que introduz “os estudantes de graduação na atividade de pesquisa. Essa experiência durante a graduação, afeta o perfil do estudante, e pode estar associada a um melhor desempenho profissional” (Araujo, 2013, p.11).

3.     Professor: problemas da relação pesquisa e ensino no dia a dia docente

    O professor universitário no Brasil centraliza seu trabalho na dimensão ensino. É o que afirma Demo (2014), incontáveis vezes, seja em seus livros ou artigos, seja em suas palestras. Segundo ele, a cultura do Brasil em relação à norte-americana ou a europeia (Alemanha, França, Inglaterra) é marcada pela dimensão ensino. Demo (2014) destaca que as universidades anglo-saxônicas tem a pesquisa mais desenvolvida na relação ensino do que as ibéricas. Demo (2014) destaca que isso se deve ao modo empregado pelos padres jesuítas nos séculos XV e XVI e que ficou premente tanto no ensino básico quanto no superior ao longo dos séculos.

    Como pudemos observar na sessão acima quando apresentamos alguns depoimentos de dificuldades e de realização em relação à pesquisa, mais objetivamente a de (IC), os alunos responsabilizaram em maior medida (para bem ou para mal) a pessoa do professor mais do que a instituição de ensino. Os alunos que não conseguiram fazer pesquisa alegam a falta de interesse de alguns professores, de tempo, entre outras coisas. Por outro lado, os alunos que fizeram se sentem agradecidos por tê-lo feito. Nesse sentido, o professor tem função importante para o desenvolvimento da pesquisa no Ensino Superior com seus alunos, seja com editais ou não.

    Mas ouvindo os professores, o que eles alegam em relação à prática da pesquisa em suas instituições? Acreditamos que pesquisa deve ser vinculada ao ensino. Que o professor deve no seu fazer docente relacionar de modo dialético a pesquisa e ensino de modo que o aluno não seja somente um repassador do que aprendeu em sala de aula, mas que sim, possa produzir conhecimento ou ao menos pensar com criticidade e curiosidade por meio da pesquisa. Acreditamos que a pesquisa ajuda o aluno a tornar-se academicamente mais maduro tanto no que se refere a tomadas de decisões pessoais e ou profissionais. “O desenvolvimento da pesquisa, no campo educacional, exerce um papel importante para a geração de novos conhecimentos, de novas tecnologias e para o aperfeiçoamento do espírito crítico e reflexivo na formação acadêmica” (Araujo, 2013, p. 16).

    Importante frisar que não falamos aqui de pesquisa de ponta, mas sim processos de iniciação científica, utilização da pesquisa como auxílio na aprendizagem e do amadurecimento intelectual. Por isso, no início do trabalho falamos de projetos de iniciação. Todavia, não podemos esquecer a ideia de que a pesquisa como princípio educativo dispensa editais e bolsas e abrange toda uma turma de acadêmicos. Mas como também observamos que a pesquisa como princípio educativo tem muito que avançar; a pesquisa de Iniciação mediante editais ainda nos parece uma chave importante de acesso à pesquisa.

    O que procuraremos refletir agora é sobre a posição do professor em relação à pesquisa no seu cotidiano educacional. A pergunta foi a seguinte: Como você compreende a atividade de pesquisa na sua atuação no Ensino Superior? Procuramos trazer aqui alguns pontos que pensamos importante na relação pesquisa/ensino/bolsa/editais. Professores não ou muito pouco desenvolvem pesquisa na relação ensino. Logo, percebemos que a dimensão pesquisa fica sufocada pelo “aulismo” pela supremacia do dar aulas, repassar conteúdos, do que muitas vezes articular tais conteúdos com o desenvolvimento de uma pesquisa. A crítica de Demo (2014, p. 03), sobre isso é pontual: “com isso, não se instala em tais instituições ambiente de estudo e pesquisa, em grande parte porque o professorado não pesquisa e elabora. Apenas dá aula. Autoria não é critério importante. Bastam título ou designação”.

    Muitas vezes alega-se que as universidades não podem pesquisar, porque seria atividade cara, superior, elitista, sem se alertar que pesquisa não significa apenas produção elitista de conhecimento, mas principalmente procedimento dos mais exitosos de boa aprendizagem. Pesquisa é princípio científico, mas igualmente princípio educativo. Autoria não é marca apenas do pesquisador supremo, mas de todos os docentes que produzem textos próprios, reconstroem conhecimento com alguma originalidade, aprendem a escudar-se na autoridade do argumento, não no argumento de autoridade.

    Segundo um professor (aqui chamado de 04): “Elas funcionam geralmente quando tem bolsista, fora isto, apenas artigos avulsos”. Aqui começamos a encontrar eco no que disse um dos alunos entrevistados quando procurou professores para fazer pesquisa e ouviu que deveria aguardar editais e bolsa de auxílio.

    O professor 11, em simbiose com o que acreditamos ser a relação importante com a pesquisa e ensino juntamente com alguns teóricos afirma:

    A pesquisa foi o que realmente me incentivou a atuar no Ensino Superior e é a minha maior motivação profissional. A pesquisa séria tem por objetivo desenvolver novas capacidades e tecnologias, tanto para aperfeiçoamento da técnica existente quanto no desfio de propor abordagens inovadoras a problemas reportados na comunidade científica. No processo de aprendizagem, a pesquisa permite aos estudantes um contato mais aprofundado com conhecimentos muitas vezes inviável de ser trabalhado em aula. Assim, a pesquisa também pode ser vista como uma oportunidade aos estudantes interessados para que extrapolem as fronteiras no conhecimento desenvolvido apenas em sala de aula para novos níveis. Ela habilita um processo de imersão em temas de interesse e traz aos grupos de pesquisa novos olhares, perspectivas e soluções.

    Nesse sentido, generalizar que todos os professores se preocupam somente com a pesquisa na relação bolsa/editais é um equívoco. Pensar a pesquisa na relação ensino e extensão é tão importante quanto dar aula, e o professor acima parece indicar esse tipo de preocupação.

    A pesquisa na docência é de fundamental importância para a formação do acadêmico, seja em qual área for. Possibilitar ao aluno dimensões outras de aprendizados do que somente a do ensino é ponto importante em qualquer instituição de Ensino Superior. Quando feita a pergunta que orienta essa parte do artigo, um professor, o chamado aqui de 12 respondeu:

    “As atividades de pesquisa merecem um olhar maior por parte da Universidade. Embora tenhamos bons investimentos, não tenho dúvidas de que eles precisam melhorar. O maior dilema que vivemos e que acredito, também seja o de outras instituições comunitárias é o fato de precisarmos que nossos professores desenvolvam pesquisa, mas também ensino. Muitos não conseguem fazer isso porque tem construído verdadeiras carreiras acadêmicas, dentro de laboratórios, fazendo Mestrado, Doutorado, Pós-doutorado e quando chegam à nossa instituição, estão muito preparados para a pesquisa e quase nada para a docência”.

    De certo modo, a passagem vai ao sentido inverso do que estamos até então refletindo, por isso a importância dessa passagem para questionar justamente generalizações. Nosso propósito não é generalizar a ideia de que o ensino é de bem mais importância do que a pesquisa ou sua relação com a pesquisa no ensino superior, muito embora seja exatamente isso que vem nos mostrando a pesquisa, tanto com aluno quanto com professores. Por isso trouxemos a passagem acima. Ela aponta para um sentido inverso, que há maior preocupação com a pesquisa nas Universidades Comunitárias do que com o ensino. Que professores nesse tipo de instituição teria outro “problema” o de se organizarem para docência não para a pesquisa, já que como pesquisadores que são por suas formações, teriam dificuldades em ensinar. Todavia, esse tipo de argumento não reflete a realidade. Não a da qual pesquisamos em campo e nem o que acredita pensadores como Demo (2014, p. 4). O ensino sobrepõe à pesquisa e o que caracteriza isso é o despreparo do professor: Um dos resultados mais catastróficos desta imperícia é a formação mal feita de nossos formadores: os docentes básicos não se entendem como autores, mas como simples transmissores de conteúdos, feitos através de aulas copiadas para serem copiadas. Instala-se, como procedimento regular, a apostila, um livro texto por vezes bem feito, mas oficializado como teoria compulsória. Em vez de conhecimento aberto para abrir as cabeças, oferece-se um pacote fechado que alinha escolas, professores e alunos, de modo reprodutivo tacanho.

    Dos professores pesquisados (sessenta), é unânime nas suas respostas a importância da pesquisa. Falar da pesquisa como dimensão de crescimento pessoal e profissional, da importância da pesquisa para amadurecimento do acadêmico epistemológica e cientificamente, da produção de conhecimento e resolução dos problemas da sociedade. Entretanto, quando se fala da pesquisa na sua prática, quando a fala é pra além da sua importância, mas da sua efetividade na prática docente, novamente poucos dizem ser pesquisadores em seu cotidiano de ensino e a grande maioria se esquiva, atrelando pesquisa a editais e bolsa.

    Segundo o professor 16: 

    Entendo que a pesquisa deva “andar” de forma simultânea com as atividades de ensino, visto ser a possibilidade real de novas descobertas e formação de novas teorias o que pode desenvolver a Ciência Contábil de maneira mais significativa do que simplesmente ficar no tecnicismo da repetição. As Universidades investem pouco nesta área visto que o valor de uma bolsa de pesquisa é insignificante em relação ao que o acadêmico pode ganhar no atual mercado de trabalho.

     E o professor 17:

    A pesquisa é um fazer que parte da construção de uma orientação que fomente o espírito investigativo tornando, no caso na iniciação científica, o (a) bolsista motivado para atingir os objetivos propostos pelo projeto. Vejo que minha prática ainda é um projeto em construção que traça os primeiros passos para a construção de experiências de pesquisa quanto à Iniciação científica. Na sala de aula procuro instigar os acadêmicos a pesquisa através de atividades que estimulem a escrita e busca dos saber através da objetivação da autonomia do saber dos mesmos. Na instituição como um todo, percebo um olhar diferenciado pela pesquisa nos últimos cinco anos tendo em vista, a fomentação de cursos de mestrado e iniciativas para doutoramento.

    Diversas questões podem ser levantadas. Em instituições comunitárias ou particulares não há, como em federais, por exemplo, disposição remunerada de tempo à pesquisa. Em universidades comunitárias ou particulares os professores não dispõem de tempo destinado à pesquisa a não ser que seja extraclasse, por conta própria, em sala com seus alunos na relação com ensino e extensão ou mediante editais. Porém, pensar a pesquisa extraclasse seria um problema para o professor “aulista” tendo em vista que sua prática docente é grandemente voltada ao ensino. Tirar seu tempo de folga, ou de preparação de aula parece pouco provável a um professor que não vê na pesquisa muito retorno, seja financeiro ou profissional, em instituições que não dispõem de tempo para a pesquisa. Nesse sentido, a pesquisa e o pesquisador não teriam o reconhecimento para incentivo e fomento.

    Outro aspecto que não pode ser imiscuído é a de que a grande parte dos alunos de instituições comunitárias e particulares são alunos que dividem seu tempo entre trabalho e estudo. Logo, por maior que seja o interesse de um aluno em fazer pesquisas de Iniciação Científica, sem uma bolsa de auxílio, tal empresa seria impossível. Logo, há muitas variáveis que devem ser levadas em conta para construir uma crítica contundente em relação à pesquisa no Ensino Superior. Criticar o professor que não faz pesquisa levianamente porque ele se preocupada somente com o ensino é não levar em conta que muitas universidades indisponibilizam tempo para tal e que a saída para esses professores é a de editais e bolsa. Para alunos que queiram fazer pesquisas nessas instituições pagas, é inviável fazer devido à mensalidade a ser paga no final do mês. Para os poucos que podem pesquisar sem preocupar-se com a questão financeira, esbarram na dificuldade de se fazer pesquisa sem incentivo das instituições.

    Consequentemente criticar por criticar, seja o professor aulista que não relaciona pesquisa a sua prática é tão leviano quanto criticar o aluno que só quer fazer pesquisa mediante auxílio de bolsa por não ter condições de fazê-lo de outro modo. Porém, em meio a dificuldades seja de professor ou de aluno, a pesquisa ainda continua para nós como sendo de fundamental importância para o desenvolvimento do próprio ensino. Negligenciar a pesquisa é negligenciar a construção do saber. Nesse sentido, pesquisa no Ensino Superior sofre críticas como essa do professor 19, que escreve: “A Pesquisa no ensino superior é rasa, superficial e cheia de lacunas. Pesquisar exige tempo, discernimento e competências. A atividade de pesquisa precisa ser valorizada e compreendida em sua totalidade”. Assim: 

    A consequência mais deletéria é relacionada a formadores mal formados, que, não sabendo aprender bem, não conseguem que seus alunos aprendam bem. Não se trata de culpa dos docentes, mas de decorrência da perversidade de um sistema voltado para o instrucionismo.

    Ou como o professor 21: 

    São poucas as chances de editais de fomento, especialmente, na área da Educação que não é prioridade. Pesquisa na graduação reduz-se a Iniciação Científica. O maior volume de produção se dá no Stricto Sensu. Há um longo caminho a ser percorrido no tocante a pesquisa.

    Infelizmente a pesquisa no Ensino Superior pressupõe editais e bolsas, principalmente nas pagas. Devidos aos fatores apresentados: baixo estimulo da instituição aos professores interessados, pouca ou nenhuma carga horária destinada à pesquisa, alunos que precisam da bolsa para pesquisa para poder pagar seu curso e a pouca ou nenhuma práxis entre pesquisa e ensino. Em decorrência disso foi comum entre os professores entrevistados à premissa pesquisa/bolsa/editais, como mais uma vez afirma o professor 29: “Entendo que ela é importante e que é praticada em nossa instituição. Por exemplo, por meio da participação dos acadêmicos em projetos de iniciação científica e em eventos científicos”. Ou essa do professor 31: “Muito importante, mas devido a conteúdismos fica relegado a segundo plano na relação sala de aula e prática de pesquisa”, que corrobora com a superioridade da dimensão ensino sobre as demais.

    Entretanto, ainda consideramos de sua importância à relação ensino-pesquisa em sala de aula. Independente se o aluno deve pagar ou não seu curso, se o professor recebe ou não para fazê-lo, o comprometimento com uma educação de qualidade, da formação de acadêmicos críticos e reflexivos, autônomos e inventivos reflete a importância do atrelamento da pesquisa ao ensino. Acreditamos que dificuldades para se desenvolverem a pesquisa são imensas, todavia, acreditamos também que uma nação que se quer desenvolvida deve necessariamente pensar com mais seriedade a pesquisa na práxis educativa. Assim posto, nossa explanação das faces e interfaces da pesquisa no Ensino Superior, seja a partir do que falam os alunos, seja a partir do que falam os professores, não poderíamos deixar de concordar com a fala dos professores 53 e 56: “A atividade de pesquisa deve complementar a atividade de ensino, contribuindo para o aumento da qualidade das aulas. Além disso, deve oportunizar aos alunos a ampliação do conhecimento científico, despertando o interesse em fazer pesquisa”.

    A universidade se constrói sobre o tripé ensino, pesquisa e extensão deste modo à pesquisa tem que estar presente no processo de formação superior, pois é somente através dela que conseguimos estimular o perfil crítico reflexivo dotado de saberes. Através da pesquisa estimulamos a curiosidade, o caráter investigativo e também possibilitamos o desenvolvimento de habilidades e competências, a partir de iniciativas e ousadias. Na minha atuação eu entendo necessário inserir a pesquisa vinculada a atividade de ensino. A universidade é muito importante na produção do conhecimento e isto se dá através da pesquisa.

    Podemos observar com o texto que o debate sobre a pesquisa no ensino superior ainda se estenderá por longa data, sem ao que parece, uma resolução que aponte para o desprestígio da importância da pesquisa na relação com o ensino. Todavia, procuramos com o presente trabalho compreender como a pesquisa está implicada a fatores externos, sobretudo, editais/bolsa que de certo modo desresponsabiliza as instituições e professores da importância da pesquisa atrelada ao ensino, empobrecendo o crescimento da relação ensino-aprendizagem e cerceando a possibilidade do aluno ter mais oportunidades de crescimento intelectual e consequentemente matando a chance do surgimento de cientistas importantes e do crescimento do país enquanto educação e produção de ciência.

4.     Considerações finais

    O presente trabalho procurou compreender como se dá a pesquisa no Ensino Superior, tanto do ponto de vista do aluno quanto do ponto de vista do professor. Percebemos que a pesquisa no Ensino Superior devido a sua importância ainda é muito incipiente, principalmente quando se trata de Universidades Comunitárias ou Particulares.

    A pesquisa como dimensão de ensino é muito pobre no dia a dia educacional. A supremacia do repasse de conteúdo apostilado é marca do ensino universitário. O professor, incapaz, por qual motivo for, não pesquisa com seus alunos. A Universidade se torna uma extensão do ensino médio quando se prolonga a imagem do professor como autoridade e repasse do saber.

    Os alunos não encontram nas instituições outro lugar para pesquisar. Não encontram professores dispostos a fazer pesquisas com seus alunos. Como vimos à carga horária destinada à preparação da aula e posterior ensino, pouco reconhecimento e imperícia fazem com que a aula se torne apenas repasse de conteúdo. Políticas educacionais existem editais de pesquisa no que se refere a iniciar acadêmicos no mundo da pesquisa também. No entanto, para que a pesquisa alcance espaço de importância maior e seus frutos colhidos se deve pensar mais a pesquisa quanto prática educativa ao invés de atrelá-la somente a bolsa/editais.

    Por conseguinte, o Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (CAPES), para avaliação e concessão de bolsas aos pesquisadores, poderiam ser avaliados, também, docentes apontados como orientador sem orientar, a falta de dedicação do orientador ao projeto de pesquisa, que em vez de somar, subtrai, uma vez que os indicadores da produção discente nos programas, como o tempo médio de titulação, quantidade de alunos por professores, percentuais de titulação e desistências são meramente quantitativos. Além disso, para Berndt (2003), os orientadores com competência e experiência são poucos diante da demanda contínua por orientação de trabalhos científicos.

    Os orientadores são personagens que mantêm relações de caráter científico, complexas e ricas em detalhes com os orientandos, e, desta convivência, podem resultar trabalhos como monografias, dissertações e teses que contribuem para a sistematização e consolidação do conhecimento científico em determinada área; mas, para que haja produção significativa do conhecimento é necessário que a relação orientador e orientando seja construtiva.

    A produtividade de “pessoas ou um grupo e sua eficiência estão estreitamente relacionadas não somente com a competência de seus membros, mas, sobretudo com a solidariedade de suas relações interpessoais” (Mailhiot 1976 apud Costa, 2004). Desta forma, supõe-se, quando estes fatores renunciam às suas funções, podem ocorrer rupturas no relacionamento que acabam por influenciar, de maneira negativa, o processo de construção e a qualidade dos trabalhos científicos. Não se pode exigir resultados de uma equipe se esta não tiver um mínimo de comodidade e de condições para realizar suas atividades básicas. Mas, “acredita-se que quanto melhor e mais bem atendidas estas necessidades, tanto melhor será o desempenho de uma equipe” (Pasqualotto e Ribas, 2008).

    É notório que as pessoas são produtos do meio em que vivem, têm emoções, sentimentos e agem de acordo com o conjunto que as cercam. O espaço físico ou social, a valorização do ser humano, a preocupação com sentimentos e emoções, e com a qualidade de vida são fatores que fazem a diferença. O trabalho é a forma como o homem, por um lado, interage e transforma o meio ambiente, assegurando a sobrevivência, e, “por outro, estabelece relações interpessoais, que teoricamente serviriam para reforçar a sua identidade e o senso de contribuição e desenvolver suas atividades com prazer e dedicação” (Bom Sucesso 1997, p. 36 apud Germano; Gimenes, 2010). Por fim, também, fomentar a pesquisa com recursos financeiros é uma parte importante. Outra, talvez a mais importante seja fomentar a formação de professores que pesquisem que desenvolvam saberes novos e instigue seus alunos no mesmo processo.

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EFDeportes.com, Revista Digital · Año 21 · N° 220 | Buenos Aires, Septiembre de 2016
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