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Vivência da equipe de enfermagem frente ao
processo de morte e morrer de uma criança hospitalizada

Vivencia del equipo de enfermería frente al proceso de la muerte y el morir de un niño hospitalizado

 

*Enfermeiro pelas FIP-MOC. Pós-Graduando em Saúde da Família

pela UNIMONTES. Atua na Estratégia Saúde da Família de Espinosa, MG

**Enfermeira pela USS-RJ. Especialista em Saúde da Família pela FUNORTE

***Enfermeiro pela UNIMONTES. Especialista em Saúde da Família pela FUNORTE

Docente da FUNORTE. Atua na Estratégia Saúde da Família de Montes Claros, MG

****Enfermeira pela UNIMONTES. Especialista em Enfermagem

do Trabalho pela UNINTER. Docente da FUNORTE

*****Enfermeira pelas FIP-MOC. Pós-Graduanda em Vigilância e Controle

de infecção nos Serviços de Saúde pela UNIMONTES. Atua no SCIH

do Hospital Dilson de Quadros Godinho de Montes Claros, MG

Patrick Leonardo Nogueira da Silva*

Ludmila Pereira Macedo**

José Ronivon Fonseca***

Valessa Gizele Ramos de Oliveira****

Anna Paula Santos Freire*****

patrick_mocesp70@hotmail.com

(Brasil)

 

 

 

 

Resumo

          Este trabalho objetiva conhecer a vivência da equipe de enfermagem no processo de morte/morrer da criança hospitalizada. Caracteriza-se por uma pesquisa de campo de caráter qualitativo e exploratório. Para obtenção dos dados foi realizada uma entrevista utilizando um roteiro semi-estruturado composto por 06 questões objetivas. Foram abordados 16 profissionais de enfermagem, sendo 09 técnicos de enfermagem, 06 auxiliares de enfermagem e 01 profissional de enfermagem graduado. Os dados foram analisados por meio de uma discussão. Foi revelado pelos resultados da pesquisa que os profissionais de enfermagem não foram preparados durante sua formação para lidar com o processo de morte e morrer. Os mecanismos de superação utilizados pelos profissionais diante de tal processo é o diálogo com os colegas de trabalho ou com um membro de sua família e a busca de conforto espiritual, como por exemplo, a religião. Quanto à vivência dos profissionais de enfermagem com o processo de morte de uma criança a pesquisa apontou que esta é caracterizada pela presença de muitos sentimentos como, a tristeza, o sentimento de perda e impotência.

          Unitermos: Morte. Enfermagem pediátrica. Saúde da criança. Acontecimentos que mudam a vida.

 

 
EFDeportes.com, Revista Digital. Buenos Aires, Año 17, Nº 173, Octubre de 2012. http://www.efdeportes.com/

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Introdução

    A nossa sociedade entende a morte como sendo um tabu, um tema interditado e sinônimo de fracasso profissional para quem trabalha na área da saúde. Observa-se que a morte não está presente no dia-a-dia do mundo familiar, uma vez que foi transferida para os hospitais e as crianças são impedidas, pelos adultos, de participarem dos cerimoniais de despedidas (COSTA & LIMA, 2005).

    A morte é vista como um processo ou um fenômeno progressivo e não como um momento ou evento. A morte não é somente um fato biológico, mas um processo construído socialmente, que não se distingue das outras dimensões do universo das relações sociais. Logo, a morte está presente em nosso cotidiano e, independente de suas causas ou formas, seu grande palco continua sendo os hospitais e instituições (BRÊTAS, OLIVEIRA & YAMAGUTI, 2006).

    O sentimento que a maioria dos profissionais se depara diante da morte é o de sentir-se inútil ou impotente, pois, além de ser uma preocupação pessoal, esse fato, faz parte do seu cotidiano. Muitos deles relatam sua impotência e frustração perante a imprevisibilidade do processo da morte. É como se nesses momentos estivessem diante da fragilidade de sua existência, recordando-se de seus limites e da possibilidade de viver a mesma situação de seus pacientes e de suas famílias (ALENCAR, LACERDA & CENTA, 2005).

    O sentimento de impotência diante do óbito de um cliente pode provocar sofrimento no trabalhador de enfermagem, levantando questões do que poderia ter sido feito para recuperar aquele cliente, além de impulsionar conflitos entre a vida e a morte (SILVA et al., 2009).

    Embora a morte e o morrer sejam aspectos inevitáveis à nossa condição humana, percebe-se que esta possibilidade é mais dolorosa, quando se estende à população infantil. Admitir a morte de uma criança ou adolescente parece retirar a esperança, colocando-nos diante do fim prematuro de uma existência. Diante das limitações e confrontos de nosso próprio fim e a dos outros fica evidente a necessidade de cuidado ao cuidador, seja este o profissional ou o familiar que acompanha o desenlace (SILVA et al., 2006).

    A morte da criança e do adolescente é interpretada como interrupção no seu ciclo biológico e isso provoca na equipe de enfermagem sentimentos de impotência, frustração, tristeza, dor, sofrimento e angústia (COSTA & LIMA, 2005).

    Diante da relevância de tal temática esse estudo possui o objetivo de conhecer a vivência da equipe de enfermagem no processo de morte morrer da criança hospitalizada, já que a morte, em especial com crianças e adolescentes, chama a atenção por ser menos aceitável, uma vez que é considerada uma interrupção do ciclo natural da vida. Essa quebra de expectativa causa dor e desequilíbrio emocional, não só para a família, mas também para o profissional.

Material e métodos

    Trata-se de uma pesquisa de campo, com abordagem qualitativa e caráter exploratório.

    Este estudo foi realizado pediatria do Hospital Irmandade Nossa Senhora das Mercês de Montes Claros/MG (Hospital Santa Casa de Montes Claros).

    Os dados relacionados ao estudo foram obtidos mediante as informações fornecidas pelos profissionais de saúde que trabalham no setor ao qual a pesquisa foi realizada.

    A coleta de dados foi direcionada para dezesseis profissionais de enfermagem, sendo nove técnicos de enfermagem, seis auxiliares de enfermagem e um enfermeiro, que enquadravam nos critérios de inclusão e exclusão.

    A partir destes, foi realizado uma entrevista utilizando um roteiro semi-estruturado, composto por seis questões objetivas na qual norteou a realização da pesquisa e, conseqüentemente, favoreceu a obtenção dos dados relativos ao estudo.

    A busca pelos dados teve início no período de 15 a 17 de Outubro de 2009 na qual a coleta fora realizada pelos pesquisadores responsáveis. Esta etapa da pesquisa foi feita através da abordagem dos acadêmicos de enfermagem das Faculdades Integradas Pitágoras de Montes Claros aos profissionais de enfermagem do respectivo setor, na qual os mesmos aceitaram participar da pesquisa e responder as questões propostas.

    A mesma respeitou e obedeceu aos princípios éticos definidos na Resolução 196/96 do Conselho Nacional de Saúde – CNS para pesquisa envolvendo seres humanos, sendo elaborado um termo de autorização institucional e um termo de consentimento livre e esclarecido.

Resultados e discussão

    Quanto à preparação do profissional de enfermagem durante o período de formação para lidar com o processo de morte em seu cotidiano

    Foi relatado pela maioria dos profissionais de enfermagem entrevistados que, durante o período de formação esses não receberam preparação para lidar com o processo de morte e morrer, embora alguns mencionaram que tiveram algum conhecimento teórico sobre essa temática durante o curso de formação.

    “Não. Eu não tive preparação, eu me emociono ainda como o primeiro caso de morte que eu enfrentei [...]” (Profissional A).

    “Não. Eu não tive preparação para a morte, é muito difícil [...]” (Profissional C).

    “Não fui preparada, é na tora mesmo” (Profissional I).

    “Sim fui preparada. O tema morte em geral” (Profissional K).

    “Fui preparada pelo curso, que foi de um ano e seis meses. Foi onde eu tive conhecimento teórico sobre a morte [...]” (Profissional E).

    A ausência para preparação da morte está se tornando um problema de saúde pública, dado o grande número de pessoas que adoecem em função de uma carga excessiva de sofrimento sem possibilidade de que este seja elaborado. Esse mal afeta os profissionais de saúde que trabalham no que hoje se configura como a casa da morte: o hospital. Às vezes são esses profissionais que cuidam do sofrimento alheio fazendo com que não sobre espaço para cuidar da sua dor, levando-os ao adoecimento (LIMA & BUYS, 2008).

    Nos dias de hoje, o que mais ouvimos nas instituições de saúde e educação é que os seus profissionais não foram preparados para lidar com a morte e a autora ainda questiona como é possível que os cursos da área da saúde não tenham disciplinas de abordagem no tema sobre morte (KOVÁCS, 2005).

    Essa situação apela à necessidade dos profissionais enfermeiros possuírem uma preparação especial, não apenas nas questões teórico-científico, uma vez que, além dos aspectos técnicos, das habilidades e dos conhecimentos, existem também as relações humanas do cuidar, que não podem ser improvisados. Aliviar o sofrimento ou ajudar uma pessoa a morrer é um dos ofícios mais difíceis para o profissional. Não poder curar não significa fracasso, mas sim um reconhecimento dos próprios limites da técnica. Assim, um enfermeiro necessita saber lidar saudavelmente com os inevitáveis problemas relacionados com a última fase da vida (MERCÊS, 2005).

    As instituições de ensino dão ao tema morte, uma visão errônea, ou seja, grande parte das faculdades, devido a uma distorção curricular, está unicamente preocupada em qualificar pessoas aptas para curar, tratar e prolongar a vida, entretanto, vai ser profissional pouco apto para assistir psicológica e humanamente pacientes que não vão se recuperar (ALENCAR, LACERDA & CENTA, 2005).

    Resolução (KOVASC familiares, provocando um estress de dificil acientefissionais treinados para manipulaEste convívio com a dor, perda e morte traz ao enfermeiro a vivência dos seus próprios processos internos, de sua fragilidade, vulnerabilidade, medos e incertezas. Todas essas situações podem levar a uma sobrecarga física e emocional, conhecida como “Síndrome de Burnout” (KOVÁCS, 2003).

    A Síndrome de “Burnout” é entendida como uma sobrecarga física e emocional que pode levar a pessoa a um colapso, na qual se manifesta os sintomas físicos e psíquicos e, em circunstâncias graves, conduz ao adoecimento e a incapacitação para o trabalho. Pode ser entendida também como uma reação a tensão emocional e crônica de pessoas que cuidam de uma maneira muito intensa de outras (SHIMIZU, 2007).

Quanto à realização de atividades pela equipe de enfermagem para superar a convivência com a morte em seu cotidiano

    Os profissionais de enfermagem entrevistados relataram que, não há atividades que ajudam a vivenciar o processo de morte/morrer, observa-se que esses profissionais utilizam do diálogo para lidar com essa situação.

    “Não. Quando morre uma criança eu ainda me emociono, não tem como não se emocionar o que agente tenta fazer é conversar [...]” (Profissional A)

    “Não. Quando acontece um caso de morte nos tentamos é conversar uma com a outra, [...] eu busco força também na religião.” (Profissional B).

    “Não. Quando alguma criança morre procuramos é, conversar uma com a outra [...]” (Profissional C).

    “Não [...] a gente comenta com os colegas” (Profissional E).

    “Não, vivendo no dia-a-dia se aprende, mas algo pra ajudar não tem” (Profissional L).

    É necessário investir em uma formação continuada, em criação de grupos de apoio aos profissionais da enfermagem para favorecer as despedidas, prepará-los para o processo de separação, comunicação e suporte, estimulando assim os participantes a falar sobre os problemas, as dificuldades e angústias que surgem no cuidado de clientes terminais, suas famílias e seus sentimentos. O apoio encontrado geralmente vem de outro profissional, mais uma vez indicando a necessidade de grupos de suporte, de um espaço de escuta, de troca de experiências e inclusive do conhecimento sobre os processos de morte. Logo, vale ressaltar a importância de pensar no cuidado com cuidadores, mediante a possibilidade de reflexão perante as questões emocionais diante da morte de um cliente, de modo a se preparar melhor para lidar com um indivíduo morrendo (SILVA et al., 2009).

Procedimentos realizados pela equipe de enfermagem após a morte do paciente e os sentimentos envolvidos

    Observa-se nas respostas dos profissionais de enfermagem que esses seguem um processo padrão após a morte de uma criança, sendo comunicar a supervisão da morte ocorrida, remover acessos ou sondas, tamponar, identificar e cobrir o corpo e levar até o necrotério, além de dar suporte emocional para a família do paciente. No que se refere aos sentimentos envolvidos os profissionais afirmam se sentirem muito tristes diante da situação.

    “Cuidado com o corpo e tentar confortar a mãe a família se tiver e infelizmente encaminhar a funerária. Me sinto triste porque você tá lidando com vidas [...]” (Profissional O).

    “Se tiver intubada, tiver com equipamentos, a gente vai liberando os equipamentos da criança. Né? E aí a gente vai arrumando a criança pra poder descer pra funerária junto com a mãe, se a mãe tiver, aí desce com a mãe pra funerária [...] é horrível. Né? Porque a gente ta perdendo uma criança” (Profissional F).

    “É pegar a criancinha, tirar todos os aparelhos e avisar a funerária [...]. Depois agente conforta a mãe [...]. O sentimento é péssimo, é como se fosse o primeiro óbito, pra mim é sempre assim, como se fosse o primeiro” (Profissional N).

    “Tira os aparelhos, comunica a funerária, prepara o corpo, a gente enrola no lençol. O sentimento é de perda” (Profissional M).

    “Tira a aparelhagem toda, os pais pedem para colocar a roupa, prepara o pacote e chama a funerária ou o pai leva no colo” (Profissional I).

    Quando o cliente que está na fase terminal internado numa unidade hospitalar morre, seu corpo é submetido ao preparo, que é uma mistura de ritual com seguimento de uma rotina e rigor técnico. Este preparo, em sua totalidade, é realizado pela equipe de enfermagem (RIBEIRO et al., 1998).

    Cabe a equipe de enfermagem executar o processo técnico após a morte, além de comunicar a supervisão da morte ocorrida. As ações desenvolvidas pela equipe de enfermagem envolvem o tamponamento, afixam o maxilar, os membros superiores e inferiores, identificam, cobrem o corpo e levam-no até o necrotério. Para essas atividades rotineiras de trabalho, o profissional requer o distanciamento, pois está lidando com um ex-paciente. O distanciamento ocorre para manter a postura profissional e a possibilidade de realização da técnica (SILVA et al., 2009).

    Os profissionais da equipe de enfermagem ficam envolvidos com seus procedimentos técnicos durante o preparo do corpo pós-morte, sendo tocados por sentimentos e emoções variadas, onde o vínculo com o paciente e o tempo de atuação profissional foram indicados como mediadores dessa emoção vivenciada (RIBEIRO et al., 1998).

Quanto à notificação dos óbitos das crianças e sua importância para o serviço

    Nos relatos dos profissionais de enfermagem percebeu-se que há notificação de óbitos no serviço e esses acreditam ser de grande relevância que os óbitos sejam notificados.

    “A notificação é feita em caso de agravo, segue aquele protocolo normal que vai pra secretaria de saúde e com certeza é importante” (Profissional O).

    “Quando é um óbito, por exemplo, pra notificar tem que ter, por exemplo, uma infecção bem grave, tipo assim, por exemplo, um sarampo, uma catapora, uma rubéola, meningite. Né? Aí tem a pessoa da Secretaria pra fazer a notificação, encaminha para a Secretaria [...]” (Profissional D).

    “Sim, os óbitos são notificados” (Profissional B).

    “Notifica sim. São importantes os dados da criança, estatísticas para pesquisas” (Profissional H).

    É necessário, todavia, esforço especial e mobilização dos gestores e das equipes de saúde para a identificação do óbito infantil e fetal, qualificação das informações e incorporação da avaliação dos serviços de saúde para melhoria da assistência. A responsabilização e o compromisso dos serviços de saúde sobre a população de sua área de abrangência e, neste caso, sobre a morte de uma criança, devem fazer parte do cotidiano dos serviços de saúde, com o propósito de se identificar os problemas, as estratégias e medidas de prevenção de óbitos evitáveis, de modo que o Brasil diminua as desigualdades nas taxas de mortalidade e alcance melhores níveis de sobrevivência infantil (BRASIL, 2009).

    A declaração de óbito (DO) é o documento padrão do Sistema de Informação sobre Mortalidade na qual tem por finalidade o cumprimento das exigências legais de registro de óbitos, atender aos princípios de cidadania e servir como fonte de dados para as estatísticas de saúde (BRASIL, 2009).

Mecanismos de superação utilizados pelo profissional de enfermagem para lidar com a morte de uma criança/adolescente internada

    Em seu relato os profissionais de enfermagem mencionaram que usa de mecanismos de superação o diálogo como forma de expor experiências vividas com a morte, além de recorrerem também a sua religião como fonte de força espiritual.

    “Eu procuro conversar com as minhas colegas de trabalho, ai vamos uma dando forças ás outras. Na religião também [...]” (Profissional A).

    “Agente tenta conversar uma com a outra [...] Busco força também na religião [...]” (Profissional C).

    “Ah, é muito triste. Né? Assim... quando a criança ta lá morrendo, eu peço mais a Deus. Peço força [...]” (Profissional D).

    “Busco ajuda na oração, meditação. Só Deus pra dar forças.” (Profissional L).

    “Só força Divina [...]” (Profissional O).

    O papel da religião é em parte o de socializar e encaminhar os ritos de morte como forma de encarar o terror. A religião parece funcionar como um ansiolítico diante da morte e do morrer. Torna a morte um fato, de certa forma mais aceitável, por que inteligível e, portanto, explicáveis (BRÊTAS, OLIVEIRA & YAMAGUTI, 2006).

    A Crença enquanto elemento interveniente mostra a interferência da variável crença, uma convicção íntima em que a fé religiosa influencia na capacidade de enfrentamento de situações que envolvem a morte e o morrer. A morte como limite nos impulsiona a crescer, mas a morte vivenciada como limite, também é dor, perda da função, do corpo, do afeto (BRÊTAS, OLIVEIRA & YAMAGUTI, 2006).

    A busca de conhecimento sobre a morte, aliada à experiência de acompanhar pessoas morrendo e à utilização da religiosidade, foram elencadas pelos enfermeiros como formas de enfrentamento da morte, no intuito de entendê-la como parte do processo de viver. Assim, falar sobre morte contribui para compreender o seu significado e, consequentemente, aceitá-la com menos sofrimento (SULZBACHER et al., 2009).

    Em conformidade à idéia supracitada, a religião resolve o problema da morte, que nenhum dos indivíduos vivos pode resolver, não importa como seja apoiada, só a religião dá esperança, porque mantém aberta a dimensão do desconhecido e do desconhecível (BECKER, 2007).

Vivência do profissional de enfermagem no processo de morte/morrer de uma criança/adolescente

    Os profissionais de enfermagem abordados relataram que, no que diz respeito a sua vivência com o processo de morte há muitos sentimentos envolvidos como, a tristeza, o sentimento de perda, sentimento de impotência e que o tempo de trabalho não ameniza essa dor. Muitos profissionais ainda relataram que, para melhor vivenciar esse processo procuram não manter um vínculo com o paciente terminal e sua família.

    “Quando a criança vai a óbito a gente se senti assim, como se não tivesse feito nada. A gente usa toda medicação, usa todos os processos que tem e aquela criança ainda vai a óbito. A gente se senti uma pessoa impotente como se a gente não tivesse feito nada, que a gente deixou morrer, mesmo que a gente lutou e sabia que essa criança ia a óbito...” (Profissional F).

    “Ah! é muito difícil ainda para mim, eu ainda me emociono, não tem jeito [...]” (Profissional A).

    “É muito difícil, apesar do tempo que eu trabalho aqui ainda é muito difícil me acostumar com a morte de criança [...]” (Profissional B).

    “Procuro não me apegar à criança e a família quando vejo que a criança é grave” (Profissional H).

    “É difícil, quando não sou eu que estou atendendo aquela criança eu procuro nem ficar entrando no quarto,só entro quando não tem jeito mesmo [...]” (Profissional C).

    A resistência ao tema morte parece ter ligado a si o sentimento de angústia e desamparo diante da idéia do fim da existência e do desconhecido. Ao falar da morte, simultaneamente se fala da vida e nem sempre o ser humano se sente preparado para se deparar com suas verdades, seus sentimentos. Pensar sobre esse tema é doloroso, angustiante, e toca profundamente no medo, na dor e na impotência diante da morte (SILVA et al., 2009).

    Quando a equipe trabalha com adolescentes e principalmente crianças corre o risco da construção de um vinculo afetivo; e quando essa proximidade é interrompida na presença da morte, provoca sofrimento e sentimento de perda, ou seja, provoca o luto que é uma resposta esperada frente á separação (COSTA & LIMA, 2005).

    Para enfrentarem o sofrimento causado pela morte dos pacientes, os trabalhadores de enfermagem utilizam algumas estratégias e mecanismos de defesas individuais e coletivos, como a negação, a repressão, racionalização, a naturalização e a criação de rotinas. Certamente esses recursos ajudam os trabalhadores a minimizarem o grau de sofrimento diante da morte dos pacientes de quem cuidam (SHIMIZU, 2007).

Considerações finais

    A percepção da morte como um fenômeno natural, difícil de ser abordado e vivido, está presente cotidianamente na vida dos sujeitos desta pesquisa. Vale ressaltar que toda situação de perda gera sofrimento e transtornos ao profissional de saúde, independentemente do cuidado prestado à pessoa.

    O profissional de enfermagem compreende que o seu pesar está relacionado com o vínculo afetivo. Em seus depoimentos identificamos expressões que descreveram a perda como sendo algo difícil de aceitar porque eles tinham um contato importante com a criança e a família.

    As propostas de melhora devem estar voltadas para as instituições de formação. Isso implica repensar o processo de formação, com ênfase na articulação de conteúdos das ciências humanas e conteúdos clínicos, bem como na articulação teórico-prático que favoreça transformações compartilhadas, envolvendo novas relações entre professores, alunos e trabalhadores.

    Para educar sobre a morte e o morrer, não basta criar novas disciplinas ou incorporar conteúdos sobre o tema. É preciso refletir sobre o sentido da vida e do cuidar e, nesse sentido, questionar o processo ensino/aprendizagem. Faz-se necessário possibilitar que docentes e discentes compreendam a existência humana não só na singularidade, mas também na pluralidade.

    Ampliar o conhecimento sobre o conteúdo tanático não permitirá que o indivíduo compreenda a morte em toda a sua complexidade. Contudo, possibilitará uma melhor atitude diante dela, proporcionando um agir "profissional" mais ético, mais filosófico, mais atentivo, mais humano.

    Nesse contexto, dentre outros aspectos, é imprescindível que os docentes, como participantes significativos do processo ensino-aprendizagem, busquem formas de contribuir para a construção de uma formação humana e ética, valorizando a sua responsabilidade de educador.

    Conclui-se que ficou evidenciada a necessidade de conversar, compartilhar sentimentos e discussões em relação ao processo de morte e morrer para, em seguida, assumir o cuidar do ser morrendo junto ao profissional de enfermagem.

Referências

  • ALENCAR, S. C. S.; LACERDA, M. R.; CENTA, M. L. Finitude Humana e Enfermagem: Reflexões Sobre o (Des)Cuidado Integral e Humanizado ao Paciente e Seus Familiares Durante o Processo de Morrer. Família, Saúde e Desenvolvimento, Curitiba; n. 7, v. 2, p. 171-180, 2005.

  • BECKER, E. A negação da morte: uma abordagem psicológica sobre a finitude humana. 3ª edição. Rio de Janeiro: Record, 2007.

  • BRASIL. Ministério da Saúde. Secretaria de Vigilância em Saúde. Departamento de Análise de Situação de Saúde. Manual de Vigilância do Óbito Infantil e Fetal. Secretaria de Vigilância em Saúde. Coordenação Geral de Informação e Análise Epidemiológica. Brasília: Editora do Ministério da Saúde, 2009.

  • BRÊTAS, J. R. S.; OLIVEIRA, J. R.; YAMAGUTI, L. Reflexões de estudantes de enfermagem sobre morte e o morrer. Revista da Escola de Enfermagem da USP, São Paulo, n. 40, v. 4, p. 477-483, 2006.

  • COSTA, J. C.; LIMA, R. A. G. Luto da equipe: revelações dos profissionais de enfermagem sobre o cuidado à criança/adolescente no processo de morte e morrer. Revista Latino-Americana de Enfermagem, n. 2, v. 13, p. 151-157, 2005.

  • KOVÁCS, M. J. Educação para a morte: desafio na formação de profissionais de saúde e educação. São Paulo: Casa do psicólogo/FAPESP, 2003.

  • KOVÁCS, M. J. Educação para morte. Psicologia, Ciência e Profissão, n. 25, v. 3, p. 484-497, 2005.

  • LIMA, V. R.; BUYS, R. Educação para a morte na formação de profissionais de Saúde. Arquivos Brasileiros de Psicologia, n. 60, v. 3, 2008.

  • MERCÊS, N. N. A. O Significado da Morte para Acadêmicos de Enfermagem. 57º Congresso Brasileiro de Enfermagem, Goiânia, novembro, 2005.

  • SHIMIZU, H. E. Como os trabalhadores de enfermagem enfrentam o processo de morrer. Revista brasileira de enfermagem, Brasília, n. 3, v. 60, p. 257-262, maio/junho, 2007.

  • SILVA, L. C. et al. Hospitalização e morte na infância: desafios das famílias. Família, Saúde e Desenvolvimento, Curitiba, n. 8, v. 1, p. 73-79, janeiro/abril, 2006.

  • SILVA, L. S. et al. A Morte no Contexto Hospitalar: A Visão de Uma Equipe de Enfermagem. 2009.

  • SULZBACHER, M. et al. O enfermeiro em Unidade de Tratamento Intensivo vivenciando e enfrentando situações de morte e morrer. Scientia Médica, Porto Alegre, n. 19, v. 1, p. 11-16, janeiro/março, 2009.

  • RIBEIRO, M. C. et al. A percepção da equipe de enfermagem em situação de morte: ritual do preparo do corpo "pós-morte". Revista da Escola de Enfermagem da USP, n. 32, v. 2, p. 117-123, Agosto, 1998.

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