efdeportes.com

Uma revisão sobre aterosclerose e exercício físico

Una revisión sobre aterosclerosis y ejercicio físico

 

Educadora Física, mestre em Ciência de Alimentos, professora do Centro Esportivo

Universitário da Universidade Federal de Minas Gerais e doutoranda em Ciências

Biológicas: Fisiologia na Universidade Federal de Minas Gerais. Belo Horizonte, MG

Tatiana Ramos Fonseca

tatifonseca6@gmail.com

(Brasil)

 

 

 

 

Resumo

          A doença cardiovascular é a principal causa de doença e morte no mundo desenvolvido. Dentre as doenças cardiovasculares, destaca-se a aterosclerose que tem como origem primária alterações no metabolismo de lipídeos e o estresse oxidativo. O exercício físico tem sido recomendado na prevenção de doenças cardiovasculares, visto que há evidências de que o mesmo reduz os fatores de risco associados ao desenvolvimento de tais doenças. Desse modo, o presente manuscrito buscou fazer uma revisão a respeito da aterosclerose e do efeito exercício físico sobre a mesma.

          Unitermos: Perfil lipídico. Estresse oxidativo. Aterosclerose. Exercício físico.

 

 
EFDeportes.com, Revista Digital. Buenos Aires - Año 17 - Nº 168 - Mayo de 2012. http://www.efdeportes.com/

1 / 1

Introdução

    A doença cardiovascular, incluindo ataque cardíaco, derrame e insuficiência cardíaca, é a principal causa de doença e morte no mundo desenvolvido (SCOTT, 2004). Entretanto, as mudanças que vêm ocorrendo nas sociedades dos países em desenvolvimento, dentre eles o Brasil, acompanham-se de modificações importantes no perfil de morbidade e de mortalidade. As doenças não transmissíveis representam, atualmente, importante problema de saúde pública nesses países (CASTRO et al., 2004).

    Dados brasileiros mostram que, em 2000, as doenças cardiovasculares foram responsáveis pela principal alocação de recursos públicos em hospitalizações e foram a terceira causa de permanência hospitalar prolongada (DIRETRIZES..., 2001; CASTRO et al., 2004).

    Dentre as doenças cardiovasculares, destaca-se a aterosclerose que tem como origem primária alterações no metabolismo de lipídeos e a consequente hiperlipidemia. Desde o surgimento da hipótese oxidativa para a aterosclerose, há aproximadamente 15 anos (STEINBERG et al., 1989; MEILHAC et al., 2001), experimentos in vitro, em modelos animais e com humanos mostram que os lipídeos oxidados exibem efeitos pró-aterogênicos (PARTHASARATHY et al., 1999; MEILHAC et al., 2001). Nos eventos iniciais da aterogênese a lipoproteína de baixa densidade oxidada (LDLox) é rapidamente internalizada e acumulada nos macrófagos, formando as células espumosas, que se depositam no espaço subendotelial (LIBBY, 2002). A LDLox é citotóxica para as células endoteliais, promovendo a expressão de citocinas e a proliferação celular, inibindo o relaxamento vascular induzido pelo óxido nítrico e desencadeando assim, uma cascata de respostas inflamatórias (SMITH, 2001).

    O exercício físico tem sido recomendado na prevenção de doenças cardiovasculares (BUSBY et al., 1985; ENSIGN et al., 2002), pois há evidências que o exercício físico aumenta a sensibilidade à insulina (ENSIGN et al., 2002) e a tolerância à glicose (THOMPSON et al., 2003), reduz a hipertensão arterial (ENSIGN et al., 2002, THOMPSON et al., 2003), aumenta o colesterol da fração lipoproteína de alta densidade (HDL) (THOMPSON et al., 2003), diminui as concentrações de triacilgliceróis (THOMPSON et al., 2003) e do colesterol da fração LDL (THOMPSON et al., 2003) e promove redução do peso corporal e do estresse emocional (BENÍTEZ et al., 2002; ENSIGN et al., 2002; SMITH, 2001).

    Desse modo, o presente trabalho buscou fazer uma revisão a respeito da aterosclerose, incluindo metabolismo lipídico e estresse oxidativo e, também, da influência do exercício físico sobre a aterosclerose.

Metabolismo de lipídeos e lipoproteínas

    Os lipídeos celulares são fundamentais não só como fonte de energia para a célula, mas também, como componentes estruturais da membrana celular, sendo os ácidos graxos, os triacilgliceróis, os fosfolipídeos e o colesterol esterificado e livre os principais para o ser humano (ALVAREZ-LEITE & PELUZIO, 2003).

    Os ácidos graxos são compostos por cadeias de carbono hidrocarboxiladas, podendo ser saturados ou insaturados (SCARTEZINI et al., 1997). Os triacilgliceróis são produzidos pela esterificação do glicerol com três moléculas de ácidos graxos. Os fosfolipídeos são formados por glicerol, ácido graxo, base nitrogenada e fosfato (GENEST, 2003). E o colesterol pode apresentar-se sob a forma livre (forma funcional, componente estrutural das membranas celulares e na superfície da lipoproteína) ou esterificada (forma de armazenamento, encontrada no interior das células ou no interior das lipoproteínas) (SCARTEZINI et al., 1997).

    Devido à sua natureza hidrofóbica, os lipídeos são transportados no plasma sob a forma de aglomerados denominados lipoproteínas, que são constituídas por uma capa hidrofílica composta por fosfolipídeos, colesterol livre e proteínas, envolvendo um núcleo hidrofóbico que contém triacilgliceróis, colesterol esterificado e algumas vitaminas lipossolúveis (GENEST, 2003). As lipoproteínas diferem-se quanto à densidade, origem, tamanho e conteúdo de apoproteínas e lipídeos, porém sua classificação se baseia na densidade no meio aquoso do plasma. As principais classes de lipoproteínas, quanto a esse quesito, são: quilomícrons (QM), lipoproteínas de muito baixa densidade (VLDL), lipoproteínas de densidade intermediária (IDL), lipoproteínas de baixa densidade (LDL) e lipoproteína de alta densidade (HDL) (RADER & WILSON, 1995; SCARTEZINI et al., 1997; GENEST, 2003). As apoproteínas (apo) são as proteínas presentes nessas partículas (GENEST, 2003) e exercem várias funções fisiológicas no seu metabolismo, dentre as quais: agir como cofatores para enzimas, ligar-se em receptores da superfície celular, contribuir para a solubilização dos lipídeos, além da função estrutural para a biossíntese das lipoproteínas (RADER & WILSON, 1995).

    No metabolismo das lipoproteínas os quilomícrons, que são constituídos por apo B-48, E, A-1 e C (sintetizadas pelos enterócitos), transportam os triacilgliceróis de origem alimentar que são formados no intestino a partir da digestão das gorduras alimentares. A composição, o número e o tamanho dos quilomícrons formados dependem do suprimento e das características da dieta. Uma vez sintetizados, os quilomícrons são lançados na linfa, atingindo a circulação sanguínea através do ducto torácico. Esses se tornam uma partícula de menor tamanho (quilomícron remanescente), pela retirada dos seus ácidos graxos, ao sofrerem hidrólise dos seus triglicérideos pela ação da enzima lipase lipoprotéica (LPL), que utiliza como cofator enzimático a apo C-II. Os remanescentes são removidos da circulação para o fígado devido a ligação da apo E com o receptor de remanescentes nesse órgão (GENEST, 2003).

    Os ácidos graxos provenientes do quilomícron juntamente com os sintetizados no fígado são “re-enpacotados” e secretados no sangue na forma de VLDL, lipoproteínas ricas em triacilgliceróis, cuja principal apoproteína é a apo B-100. Na circulação, as VLDL são hidrolisadas por LPL, originando as IDL que contêm apo B-100 e apo E na sua superfície. A IDL tem dois destinos: é captada da circulação pelo fígado, pela interação das apoproteínas com receptores hepáticos, ou é processada pela lipase hepática e se transforma em LDL (GENEST, 2003).

    A LDL é a principal condutora de colesterol na circulação humana, transporta ésteres de colesterol e vitamina E para os tecidos periféricos, cujas membranas apresentam os receptores B/E de LDL que reconhecem a apo-100. Além disso, significativa quantidade de LDL do plasma é eventualmente removida da circulação pelo fígado, também por interação apo B-100/receptor B/E. A entrada de LDL na célula é seguida por um ataque lisossômico, com consequente hidrólise da apo B-100 e do colesterol esterificado. O aumento da concentração intracelular de colesterol livre apresenta os seguintes efeitos regulatórios: inibição da enzima hidroximetilglutaril-CoA (HMG-CoA) redutase, impedindo a síntese de colesterol; inibição da síntese de receptores de LDL; estímulo da enzima acil-CoA colesterol aciltransferase (ACAT) para esterificação do colesterol citoplasmático (RADER & WILSON, 1995; ALVAREZ – LEITE et al., 2003).

    Não existe uma via de catabolismo de colesterol, sendo esse eliminado pelo fígado como ácidos biliares secretados na bile (RADER & WILSON, 1995; ALVAREZ – LEITE et al., 2003). De acordo com ECKARDSTEIN et al. (2001), a HDL é responsável pelo transporte reverso de colesterol, que consiste na remoção do excesso de colesterol livre dos tecidos periféricos e de lipoproteínas para o fígado e subseqüente depósito para excreção. As HDL nascentes são formadas por hepatócitos, pela mucosa intestinal e por remanescentes de lipoproteínas, cujas principais apoproteínas são apo A-I e apo A-II (ECKARDSTEIN et al., 2001). O colesterol livre, em contato com a HDL nascente, é substrato para a enzima plasmática lecitina-colesterol aciltransferase (LCAT) resultando na formação de ésteres de colesterol e aumento do tamanho da partícula de HDL. O colesterol esterificado pode ser transferido para as lipoproteínas que contêm apo B, pela proteína de transferência de éster de colesteril (CETP), e retornar para o fígado pelo receptor de LDL. A HDL ainda pode liberar colesterol diretamente para o fígado (RADER & WILSON, 1995; ALVAREZ – LEITE et al., 2003).

    As lipoproteínas podem ser aterogênicas ou anti-aterogênicas, dependendo da composição e das propriedades fisiológicas. O mais conhecido efeito protetor da HDL na aterosclerose é no transporte reverso de colesterol, citado anteriormente. Além disso, a HDL também desempenha importante papel como antioxidante e na função endotelial (LUSIS, 2000; ECKARDSTEIN et al., 2001; ASSMANN & GOTTO, 2004). Por sua vez, a LDL possui propriedades aterogênicas, visto que há evidente associação entre elevadas concentrações dessa lipoproteína e o aumento da aterosclerose (STEFFENS & MACH, 2004). Conforme já citado, a LDL funciona como fonte de colesterol para os tecidos extra-hepáticos.

Radicais livres e estresse oxidativo

Espécies reativas de oxigênio, estresse oxidativo e peroxidação lipídica

    O termo radical livre é freqüentemente usado para designar qualquer espécie química que contém um ou mais elétrons não pareados ocupando orbitais externos. Um elétron não pareado é aquele que ocupa um orbital atômico ou molecular isoladamente (STOKER & KEANEY, 2004).

    Existem, entretanto, outras moléculas que não são necessariamente radicais livres, mas são agentes oxidantes (OPARA, 2006). Essas substâncias são classificadas de maneira ampla como espécies reativas de oxigênio (ROS) ou espécies reativas de nitrogênio (RNS) (HALLIWELL, 1996).

    O oxigênio é considerado o principal fornecedor de espécies reativas (Leite & Sarni, 2003). Durante o metabolismo aeróbico mais de 95% do oxigênio consumido decorre da produção de energia nas mitocôndrias celulares; o restante, não sendo completamente reduzido à água, produz as espécies reativas de oxigênio numa seqüência de reações de oxi-redução (Leite & Sarni, 2003; URSO & CLARKSON, 2003).

    A completa redução do oxigênio à água requer quatro elétrons. A primeira redução do oxigênio molecular leva a formação do radical superóxido (O2 + e- → O2-) (GIORDANO, 2005; OPARA, 2006). Esse, logo após a sua formação, pode desencadear outras reações gerando os radicais hidroxilas, além de reagir com o óxido nítrico (NO), formando peroxinitrito (O2.- + NO → ONOO.-) que se apresenta como potente radical livre (YANG et al., 2004; OPARA, 2006). A adição do segundo elétron e de dois íons de hidrogênio ao ânion superóxido resulta no peróxido de hidrogênio (O2- + 2e- + 2H+→ H2O2) (OPARA, 2006). A adição do terceiro elétron, como ocorre na reação de Fenton, resulta na produção do radical hidroxila (H2O2 + Fe+2/Cu+→ OH. + OH- + Fe+3/Cu+2). E finalmente, a adição do quarto elétron produz água. E ainda, há a reação do ânion superóxido com o peróxido de hidrogênio formando radical hidroxila e oxigênio molecular pela reação de Haber-Weiss (H2O2 + O2.- → OH. + OH- + O2) (GIORDANO, 2005).

    As ROS podem ser formadas, também, por alguns mecanismos, como: produzidas pelas xantina oxidades, NAD(P)H oxidases, citocromo P450-oxidases, pela outo-oxidação de catecolaminas e lipoxigenases (MADAMANCHI et al., 2005; GIORDANO, 2005). Além disso, as ROS podem ser provenientes de fontes externas como dieta, poluentes do ar e cigarro (SCANDALIOS, 2005).

    Em alguns processos biológicos as ROS exercem importante papel, estando envolvidas em vias de sinalização intracelular para a diferenciação celular e apoptose, na imunidade e na defesa contra microorganismos (GIORDANO, 2005).

    No entanto, quando ocorre um desbalanço entre oxidantes e antioxidantes, em favor dos oxidantes, há o estresse oxidativo (STOKER & KEANEY, 2004). Nessa situação, as espécies reativas podem interagir com componentes celulares incluindo ácidos nucléicos, proteínas e lipídeos causando danos moleculares (SCANDALIOS, 2005).

    Acredita-se que a atividade das ROS na parede vascular pode contribuir com a formação da LDL oxidada, um importante fator para a patogênese da aterosclerose (GIORDANO, 2005). De acordo com MADAMANCHI et al. (2005), há evidências que células endoteliais, células musculares lisas e macrófagos são fontes de ROS que modificam fosfolipídeos e oxidam as LDL, além de estarem envolvidas na sinalização vascular para migração e proliferação celular durante a formação da lesão aterosclerótica.

    Os ácidos graxos poliinsaturados da membrana celular podem ser um alvo das ROS, desencadeando uma cadeia de reações químicas denominada peroxidação lipídica (URSO & CLARKSON, 2003).

    O processo de peroxidação lipídica se inicia quando espécies reativas abstraem um átomo de hidrogênio do grupo metileno das cadeias de ácidos graxos poliinsaturados (LH) das membranas ou de partículas de lipoproteínas, formando o radical lipídico (L.). Esse, por sua vez, sofre rearranjo molecular, formando um dieno conjugado que reage com oxigênio produzindo radical peroxil (LOO.), o qual na presença de um outro lipídeo (LH) ou outro doador de elétron, forma hidroperóxido lipídico (LOOH) e um outro radical lipídico (L.) (SJODIN et al., 1990; BLOKHINA et al., 2003; STOKER & KEANEY, 2004).

    O radical lipídico (L.) é reativo e pode iniciar a formação de novos radicais livres e assim, continuar a cascata de reações. E o hidroperóxido lipídico pode sofrer degradação catalisada por metais de transição e produzir ainda mais radicais reativos, como o radical peroxil (LOO.) ou o radical alcoxil (LO.) que irão continuar a reação em cadeia e produzir, como por exemplo, o malondialdeído – MDA, o pentano e o etano (SJODIN et al., 1990; BLOKHINA et al., 2003; STOKER & KEANEY, 2004).

    Os aldeídos insaturados, dentre esses o malondialdeído, são dotados de capacidade de se ligarem covalentemente a grupos nucleofílicos presentes em DNA (ácido desoxirribonucléico), peptídeos e proteínas, provocando alterações nas funções dessas moléculas, fato que tem sugerido a implicação desses compostos em vários processos degenerativos (Halliwell & Chirico, 1993). Assim, o malondialdeído tem sido, freqüentemente, utilizado como marcador de peroxidação lipídica nos tecidos (SJODIN et al., 1990).

    Há mecanismos celulares que contrabalançam a produção de ROS, incluindo vias enzimáticas e não-enzimáticas. As enzimas são, por exemplo, a catalase, a superóxido dismutase e a glutationa peroxidase, e os mecanismos antioxidantes não-enzimáticos, incluem vitaminas E e C, glutationa, ubiquinona e flavonóides (URSO & CLARKSON, 2003; GIORDANO, 2005).

Sistemas antioxidantes

    A superóxido dismutase (SOD) é uma enzima antioxidante que catalisa a dismutação do ânion superóxido a peróxido de hidrogênio num processo sucessivo de oxidação e redução dos metais de transição que compõem seu centro ativo (O2.- + O2.- + 2H+ → H2O2 + O2) (STOCKER & KEANEY, 2004).

    Outra enzima é a catalase que tem como principal função a decomposição do peróxido de hidrogênio que ocorre em uma taxa extremamente rápida (Cohen et al., 1996). A catalase reage com peróxido de hidrogênio para formar água e oxigênio molecular (2H2O2→2H2O + O2) (MATÉS & SÁNCHEZ-JIMÉNEZ, 1999).

    Já a glutationa peroxidade (GPX) reduz o peróxido de hidrogênio (H2O2 + 2GSH → GSSG + H2O) e peróxidos lipídicos (ROOH + 2 GSH → ROH + GSSG + H2O) à água e álcoois lipídicos, respectivamente (MATÉS & SÁNCHEZ-JIMÉNEZ, 1999).

Aterosclerose

    A aterosclerose consiste em uma complexa e crônica inflamação que ocorre nas artérias de médio e grande calibre (BERLINER et al., 1995; VANDERLAAN et al., 2004), associada a fatores de risco como, hiperlipidemia (BINDER et al., 2002; VANDERLAAN et al., 2004), hipertensão (KATZMARZYK et al., 2001; SMITH, 2001; BINDER et al., 2002), diabetes (BINDER et al., 2002), idade (BINDER et al., 2002), tabagismo (ROSS & GLOMSET, 1973; KATZMARZYK et al., 2001; BINDER et al., 2002), sedentarismo (KATZMARZYK et al., 2001), obesidade (KATZMARZYK et al., 2001; SMITH, 2001), dentre outros.

    De acordo com STEINBERG (2002) a inflamação é uma resposta a um agente que desestabiliza a homeostase do local envolvido. A hipótese oxidativa da aterosclerose, segundo WITZTUM (1993), sugere que o processo aterosclerótico possa ser iniciado por danos no endotélio vascular, produzido por modificações oxidativas da LDL. Essa injúria leva a alterações do endotélio que desencadeam interações celulares com monócitos, plaquetas, células musculares lisas e linfócitos, tendo-se início a lesão aterosclerótica (ROSS, 1999). De acordo com ROSS (1995 a e b) a lesão ocorre em três estágios: estria gordurosa, intermediária ou fibrogordurosa e placa fibrosa.

    Altas concentrações plasmáticas de LDL podem levar à infiltração e retenção da LDL na matriz subendotelial. As partículas de LDL difundem-se passivamente através das células endoteliais e sua retenção na parede do vaso envolve interações entre a apolipoproteína B, presente nessa lipoproteína, e os proteoglicanos da matriz subendotelial (LUSIS, 2000). A LDL nativa não é captada pelos macrófagos para iniciar o processo aterosclerótico. Entretanto, a LDL aprisionada na íntima pode ser oxidada por espécies reativas de oxigênio (ROS), produzidas por células endoteliais, macrófagos residentes e células musculares lisas (STEFFENS & MACH, 2004).

    A oxidação da LDL parece ocorrer em dois estágios: o primeiro ocorre antes que os monócitos sejam recrutados e resulta da oxidação dos lipídeos da LDL, com pequena alteração na apo B (BERLINER et al., 1995). Nesse estágio, a LDL apresenta-se minimamente oxidada (LDLmm) (GLASS & WITZUM, 2001) e exerce papel importante no aumento da aderência de leucócitos (como monócitos/macrófagos e linfócitos-T) para a parede vascular (STEFFENS & MACH, 2004), estimulando as células endoteliais a produzirem moléculas pró-inflamatórias, incluindo moléculas de adesão e fatores de crescimento, como o fator estimulador de colônia de macrófago (M-CSF) (LUSIS, 2000).

    O segundo estágio de oxidação da LDL, formando LDL oxidada, ocorre quando monócitos são recrutados para a lesão e convertidos em macrófagos, contribuindo com sua enorme capacidade oxidativa. Nessa fase, os lipídeos da LDL são adicionalmente oxidados e a parte protéica também é modificada, impedindo o reconhecimento da lipoproteína pelo receptor de LDL, tornando-a reconhecível apenas pelos receptores scavengers ou removedores presentes nos macrófagos e células musculares lisas (BERLINER et al., 1995).

    Os receptores scavengers, tais como SRA-I, SRA-II e CD36, estão presentes na superfície dos macrófagos e células musculares lisas da parede arterial e não sofrem regulação negativa, isso é, sua expressão não é regulada pelo conteúdo intracelular de colesterol (STEINBERG, 2002). Desse modo, a interação de LDL oxidada com os receptores scavengers resulta na rápida captação dessa lipoproteína pelos macrófagos. A LDLox é degradada intracelularmente, o colesterol livre é esterificado e em seguida armazenado nas gotas lipídicas, conferindo às células o aspecto de espuma (YANG et al., 1996; STEINBERG, 1997). O resultado é o grande acúmulo de colesterol e a formação de células espumosas, originando a primeira lesão da aterosclerose: a estria gordurosa - (MITCHINSON & BALL, 1987).

    A disfunção endotelial, provocada pela hipercolesterolemia, leva ao recrutamento focal de monócitos e linfócitos, uma das primeiras respostas vasculares detectáveis na formação da lesão aterosclerótica. Esse recrutamento é controlado pelas moléculas de adesão, que são expressas no endotélio e nas células de defesa, circulantes na corrente sanguínea (NAKASHIMA et al., 1998). Dentre as moléculas de adesão, as selectinas, como E-selectina e P-selectina, medeiam o rolamento inicial de células inflamatórias ao longo do endotélio (DONG et al., 1998). A adesão firme de monócitos e células T ao endotélio pode ser realizada pelas interações entre as integrinas LFA-1 e Mac-1 e moléculas-1 de adesão intercelular (ICAMs-1), e entre a integrina VLA-4 e a molécula-1 de adesão da célula vascular (VCAM-1) (CYBULSKY & GIMBRONE, 1991; ULBRICH et al., 2003).

    Embora o recrutamento de macrófago, induzido pelo fator de crescimento M-CSF, possa inicialmente servir como função protetora, por remover partículas de LDL oxidada ou células apoptóticas, o acúmulo progressivo e a ativação de macrófagos na parede do vaso são responsáveis por um importante passo para a formação da placa aterosclerótica (BERLINER et al., 1995; HANSSON, 2005). A ativação do macrófago promove a liberação de citocinas, quimiocinas, proteases e radicais de oxigênio, e irá provocar mais inflamação e dano ao tecido, contribuindo para o desenvolvimento da lesão (MILLER et al., 2003).

    A transição de estria gordurosa, relativamente simples, para lesão fibrogordura, é caracterizada pela migração de células musculares lisas da camada média da parede arterial para a íntima ou espaço subendotelial. Essas podem proliferar e captar lipoproteínas modificadas, contribuindo para a formação de células espumosas, além da capacidade de sintetizar proteínas da matriz extracelular, que leva a formação da capa fibrosa, particularmente colágeno (GLASS & WITZTUM, 2001) e ser fonte de mediadores inflamatórios, como MCP-1 (proteína quimiotática para monócitos) (NELKEN et al., 1991). A proliferação e a migração de células musculares lisas é provocada por fatores de crescimento e citocinas produzidos por macrófagos, células T, e células endoteliais (RAINES & ROSS, 1993). Essa fase de desenvolvimento da lesão é influenciada por interações entre monócitos/macrófagos e células T que resultam na aquisição de características de estado inflamatório crônico. Essas lesões desenvolvem um núcleo de material rico em lipídeos, sugerindo que elas representam um precursor para lesões mais avançadas, as placas fibrosas (ROSS, 1995 a e b).

    Placas maduras ou fibrosas apresentam uma estrutura mais complexa. No centro da placa, estão presentes células espumosas, lipídeos extracelulares e células necróticas, envolvidos por uma capa de células musculares lisas e fibras de colágeno. Outros tipos celulares que formam a placa são células dendríticas, mastócitos, poucas células B. Na interface da capa e do centro da placa, apresentam-se macrófagos e células T em abundância (HANSSON & LIBBY, 2006). Calcificações são encontradas próximas ao centro necrótico. A capa fibrosa pode variar de espessura, sendo mais delgada nas regiões laterais e margens da lesão. A formação de lesões avançadas é usualmente associada a uma contínua diminuição na espessura da camada média da artéria, resultante da migração de células musculares lisas para a camada íntima durante a progressão da doença (ROSS, 1995 a e b).

    A ruptura da placa aterosclerótica expõe material pró-trombótico ao sangue, podendo esse processo ser determinado pela estabilidade das mesmas. Lesões estáveis são mais resistentes e se caracterizam por células musculares lisas envoltas de densa matriz de colágeno, com baixo conteúdo de células inflamatórias e lipídeos no centro necrótico. Por outro lado, as regiões onde as lesões apresentam volumoso centro necrótico e um grande infiltrado de células inflamatórias, capa fibrosa frágil e fina, com pouca quantidade de colágeno, são mais susceptíveis à ruptura, caracterizando lesões instáveis (DAVIES et al., 1993; LEE & LIBBY, 1997).

Exercício físico

    Segundo SHEPHARD & BALADY (1999) e THOMPSON et al. (2003), a atividade física pode ser definida como um movimento físico produzido pelos músculos esqueléticos que resulta em gasto energético pelo organismo; e o exercício físico como uma atividade física estruturada e de repetição que visa a melhora ou manutenção dos condicionamento cardiorrespiratorio e físico, incluindo a força muscular, a composição corporal e a flexibilidade. A magnitude das respostas para o exercício físico depende da duração, da freqüência, do tipo e da intensidade do mesmo (SHEPHARD & BALADY, 1999; JONES & CARTER, 2000).

    De acordo com THOMPSON et al. (2003), os exercícios de intensidade moderada são aqueles cujo desempenho corresponde a 40-60% do VO2máx (volume máximo de oxigênio), que reflete a capacidade máxima individual de gasto energético aeróbico (JONES & CARTER, 2000), ou de 4 a 6 METs (equivalente metabólico), sendo que um MET é equivalente a taxa de consumo metabólico de aproximandamente 3,5 mL.O2.kg-1.min-1. Já os de intensidade vigorosa são os que o VO2máx é maior que 60% ou que a atividade represente mais de 6 METs.

    A fonte imediata de energia para a contração muscular é o trifosfato de adenosina (ATP), entretanto as células musculares armazenam quantidades limitadas dessa molécula (MCMAHON & JENKINS, 2002; SJODIN et al., 1990). Como o exercício físico requer um suprimento constante de ATP, existem vias metabólicas celulares com capacidade de produção rápida: formação de ATP pela degradação da creatina fosfato; da glicose ou do glicogênio (denominada glicólise) e formação oxidativa da ATP. Nos dois primeiros processos não há utilização de O2, sendo denominada via anaeróbica. Já na formação oxidativa o metabolismo é aeróbico (ASHE & KHAN et al., 2004).

    Em geral, quanto mais curta a atividade e de alta intensidade, maior a contribuição da produção anaeróbica de energia. Em contraste, as atividades prolongadas (maior que 10 minutos) de intensidade baixa a moderada utilizam a ATP proveniente de fontes aeróbicas (POWERS & HOWLEY, 2000; ASHE & KHAN et al., 2004).

    A duração de exercício recomendada pelo Colégio Americano de Medicina dos Esportes para prevenção de doenças cardiovasculares é de 20 a 60 minutos de atividade aeróbica contínua ou intermitente (sessões mínimas de 10 minutos acumuladas no transcorrer do dia), com frequência de execução de 3 a 5 dias por semana (BALADY et al., 2003) e de intensidade moderada (THOMPSON et al., 2003).

    O exercício físico, predominantemente aeróbico (LEON, 2000; NAPOLI et al., 2006) e de intensidade moderada (SMITH, 2001; NAPOLI et al., 2006), realizado regularmente (BENÍTEZ et al., 2002; PYNN et al., 2004; YANG & CHEN, 2003), pode promover adaptações fisiológicas e bioquímicas, prevenindo o desenvolvimento de doença cardiovascular, incluindo aterosclerose (SHEPHARD & BALADY, 1999; THOMPSON et al., 2003). Dentre essas alterações estão o aumento da sensibilidade à insulina e a tolerância à glicose (SMITH, 2001; THIRUNAVUKKARASU et al., 2003); a redução da pressão arterial (SMITH, 2001; BENÍTEZ et al., 2002), do peso corporal (SMITH, 2001) e de triacilgliceróis (LEAF, 2003); melhora do perfil de lipoproteínas (SMITH, 2001; BENÍTEZ et al., 2002), como o aumento das concentrações plasmáticas de HDL (SMITH, 2001; LEAF, 2003) e redução de VLDL (BENÍTEZ et al., 2002). Todavia, o mecanismo pelo qual o exercício promove a redução do risco para a aterogênese não está totalmente esclarecido (MEILHAC et al., 2001).

    Uma explicação para a redução de eventos coronarianos associados ao exercício físico crônico, diz respeito ao aumento do débito cardíaco que ocorre durante o exercício que aumentaria a força de cisalhamento (shear stress) sobre a parede vascular e assim, gerando o aumento da expressão de óxido nítrico pelo endotélio vascular (GREEN et al., 2004; PRIOR et al., 2004; MARSH & COOMBES, 2005).

    O endotélio atua na manutenção do tônus vascular através da liberação de endotelina, prostaglandinas e óxido nítrico. Esse último mantém a superfície dos vasos não trombogênica e não aderente às plaquetas e leucócitos, inibindo a aderência de células à parede arterial e a migração e proliferação de células musculares lisas, além de inibir a oxidação da LDL (SMITH, 2001; YANG & CHEN, 2003).

    Desse modo, o aumento de óxido nítrico com o exercício físico é benéfico para a redução de doenças cardiovasculares. Uma vez que, a redução na síntese ou na disponibilidade local de óxido nítrico tem sido frequentemente relacionada como a principal responsável pela disfunção endotelial, a qual caracteriza-se por ser um dos primeiros passos para o início da aterosclerose (GREEN et al. ,2004; PRIOR et al., 2004; MARSH & COOMBES, 2005).

    Em humanos saudáveis quatro semanas de treinamento físico melhoram o óxido nítrico basal relacionado com a função endotelial. Já em animais, pode melhorar com apenas sete dias de exercício físico (GREEN et al., 2004).

    O exercício físico de intensidade moderada, longa duração, regular e crônico também está associado ao aumento da geração de espécies reativas de oxigênio no metabolismo aeróbico, principalmente devido, ao aumento do consumo de oxigênio pelos tecidos ativos (MEILHAC et al., 2001, SMITH, 2001; COOPER et al., 2002). Além disso, durante o exercício a produção de radicais livres também pode estar relacionada ao aumento da liberação de catecolaminas e sua auto-oxidação e ao aumento do metabolismo das enzimas xantina oxidase e NADPH oxidades (COOPER et al., 2002; URSO & CLARKSON, 2003). Ocorrendo, desse modo, o estresse oxidativo (SHERN-BREWER et al., 1998; MEILHAC et al., 2001). No entanto, progressivas adaptações ao exercício podem diminuí-lo, como o aumento da atividade de enzimas antioxidantes em diferentes tecidos, como coração, fígado, sangue e músculo (MEILHAC et al., 2001; LAUFS et al., 2005).

Conclusão

    O exercício físico regular previne e/ou atenua a aterosclerose, visto que há evidências de que o mesmo reduz os fatores de risco associados ao desenvolvimento de tais doenças. Além disso, o exercício físico crônico promove redução do estresse oxidativo, por meio do aumento de enzimas antioxidantes, redução da disfunção endotelial e ainda melhora no perfil lipídico. Mais estudos são necessários para a compreensão de todos os mecanismos envolvidos nesse processo.

Referências bibliográficas

Outros artigos em Portugués

  www.efdeportes.com/
Búsqueda personalizada

EFDeportes.com, Revista Digital · Año 17 · N° 168 | Buenos Aires, Mayo de 2012  
© 1997-2012 Derechos reservados