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A prática pedagógica dos professores de Educação Física de 

escolas públicas e privadas de Visconde do Rio Branco, MG

La práctica pedagógica de los profesores de Educación Física de escuelas públicas y privadas de Visconde do Rio Branco, MG

Physical Education teacher’s educational practice of public and private schools in Visconde do Rio Branco, MG

 

*Universidade Presidente Antônio Carlos (UNIPAC)

Faculdade de Educação Física, Ubá (MG)

Coordenadora e docente do Curso de Educação Física da UNIPAC Campus II- Ubá (MG)

Doutoranda em Ciência e Tecnologia de Alimentos

pela Universidade Federal de Viçosa (MG)

Mestre em Ciência da Nutrição pela Universidade Federal de Viçosa (MG)

Especialista em Treinamento Desportivo e Fisiologia do Exercício

pelo Centro Educacional de Volta Redonda

Graduada em Educação Física pela Universidade Federal de Juiz de Fora (MG)

**Instituto Federal do Sudeste de Minas Gerais, Barbacena (MG), Brasil.

Docente do Curso de Educação Física

do Instituto Federal do Sudeste de Minas Gerais, Barbacena (MG)

Mestre em Educação Física pela Universidade Federal de Viçosa (MG)

Graduado em Educação Física pela Universidade Federal de Juiz de Fora (MG)

Graduado em Nutrição pela Universidade Presidente Antônio Carlos de Juiz de Fora (MG)

***Universidade Presidente Antônio Carlos (UNIPAC), Faculdade de Educação Física, Ubá (MG)

Graduado em Educação Física pela Universidade Presidente Antônio Carlos

****Universidade Presidente Antônio Carlos (UNIPAC)

Faculdade de Educação Física, Ubá (MG)

Docente do Curso de Educação Física da UNIPAC Campus II- Ubá (MG)

Mestre em Ciências Sociais pela Universidade Federal de Juiz de Fora (MG)

Graduada em Educação Física pela Universidade Federal de Juiz de Fora (MG)

Ana Paula Muniz Guttierres*

Silvio Anderson Toledo Fernandes**

Fernando da Silva Júnior***

Luciana Ferreira da Silva****

paulagutti@gmail.com

(Brasil)

 

 

 

 

Resumo

          A prática pedagógica de muitos professores de educação física vem sendo pautada por um modelo tradicional de ensino que privilegia o ensinamento das técnicas esportivas. A falta de conhecimentos e a estrutura precária dos espaços físicos e materiais são apontados como fatores limitantes para um trabalho com qualidade na educação física escolar. O objetivo do presente estudo foi verificar e comparar as práticas pedagógicas adotadas nas aulas de Educação Física escolar em escolas públicas e privadas do município de Visconde do Rio Branco (MG) e sugerir alternativas para a construção de uma prática pedagógica voltada para uma formação humana crítica e autônoma. Foram realizadas três perguntas em forma de entrevista para oito professores de educação física relacionadas às suas respectivas práticas. Os resultados mostraram que a maioria dos professores das escolas públicas está insatisfeita com o espaço físico e os materiais disponíveis para as aulas. Os professores das escolas públicas conduzem seu trabalho predominantemente numa perspectiva emancipatória de formação, enquanto os das escolas particulares adotam as abordagens desenvolvimentista e crítico-superadora. O modelo das aulas tem privilegiado o esporte como conteúdo principal, restringindo as possibilidades de aprendizagem e/ou vivências das demais práticas.

          Unitermos: Concepções metodológicas. Esporte. Rede de ensino. Cultura corporal. Habilidade motora.

 

Abstract
          The pedagogical practice of many physical education teachers has been guided by a traditional model of education that focuses on teaching sports techniques. The lack of knowledge and the precarious structure of physical space and materials are pointed out as limiting factors for a quality job on education. The aim of this study was to evaluate and compare teaching approaches used in the classes of Physical Education in public and private schools in the city of Visconde do Rio Branco (MG) and suggest alternatives for building a pedagogical practice to a critical human development and autonomous. Three questions was administered in interview format to eight physical education teachers with questions relating to their respective practices. The results showed that the majority of public school teachers are dissatisfied with the physical space and materials available for classes. The public school teachers conduct their work in a predominantly emancipatory vision of education, while the private schools are adopting approaches to developmental and critical-surpassing. The model school has privileged the sport as the main content, restricting the possibilities of learning and / or experiences of other practices.

          Keywords: Methodological conceptions. Sports. Educational system. Culture body. Motor skill.

 

 
EFDeportes.com, Revista Digital. Buenos Aires - Año 16 - Nº 157 - Junio de 2011. http://www.efdeportes.com/

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Introdução

    A Educação Física Escolar vem numa constante busca de romper com os modelos tradicionais que permearam esta área de estudo em meados dos anos de 1980. Darido (2003) destaca que é nesse momento que a Educação Física passa por um período de valorização. A influência das novas tendências em Educação Física tem contribuído para uma formação mais crítica dos profissionais, porém o que se vê na prática são aplicações de um método não coerente com a criticidade proposta (COLETIVO DE AUTORES et al., 1992). Dentro dessas abordagens há vários discursos tentando justificar a importância da Educação Física na escola, outros se apoiando em áreas diversas como a Antropologia, a Psicologia, a Sociologia e também a Biologia. Embora com embasamentos teóricos diferentes, todas as abordagens apresentam significativas contribuições para a educação física escolar (FERNANDES, 2008).

    Até então, várias reflexões e proposições foram realizadas na área visando estabelecer uma identidade própria de tal disciplina. Para Betti (1991) as aulas de Educação Física Escolar, são baseadas nos modelos esportivista e recreacionista, nos quais o professor desenvolve os quatro esportes tradicionais (futebol, voleibol, handebol e basquete) ou, no segundo caso, entrega a bola aos alunos e não promove o ato educativo e, nem mesmo busca desenvolver uma autonomia pedagógica. Dentro desta perspectiva, vários estudiosos desenvolveram abordagens que tentam explicar a sua linha de pensamento e propor a Educação Física na escola, como também explicam a referida busca pela autonomia nas diversas manifestações corporais. Embora cada um dos autores citados parta de pressupostos teóricos diferentes, discutam e enfatizem a busca pela autonomia de acordo com suas proposições um tanto quanto diferentes, vale refletir se as intenções da conquista da autonomia não estão ficando restritas às argumentações teóricas, pois nos parece claro, que embora tenha uma base teórica reformulada, a educação física na escola ainda sofre algumas influências da escola tradicional (FERNANDES, 2008).

    A monocultura esportiva sexista que muitas vezes restringe, por exemplo, o futebol para os meninos e o jogo de queimada para as meninas é a realidade da pratica pedagógica de muitos professores. Nesta concepção, alguns conteúdos importantes da área do conhecimento da Educação Física não são ministrados, como a dança, a ginástica e as lutas. Além de não abordar todos os conteúdos, a maioria dos professores optam pela pedagogia tecnicista o que contempla a realidade de poucos alunos que possuem habilidades especificas para a prática dos esportes (COLETIVO DE AUTORES et al., 1992). Em muitos casos também, estes conteúdos são distribuídos sem nenhuma sistematização e são apresentados de forma desordenada ou aleatória, ou seja, estes são organizados ou seqüenciados sem critérios mais consistentes. Não bastasse este fato, é muito comum que estes conteúdos esportivos sejam transmitidos superficialmente, apenas na ótica do saber fazer. O que acaba ocasionando a falta de aprofundamento dos conteúdos propostos para a Educação Física na escola (DARIDO, 2001).

    Os motivos que justificam essa conjuntura são os mais variados. Segundo Daolio (1995) muitos professores de educação física se limitam a ministrar somente os conteúdos que eles dominam. Entende-se aqui dominar como a capacidade de executar as habilidades motoras características do esporte. Aspectos sociais, culturais e afetivos que envolvem os conteúdos não são considerados. Além da falta de conhecimento dos professores, ou melhor, falta de capacidades físicas e motoras para executar determinados esportes, a falta de material, espaço adequado e apoio da direção da escola são também fatores que influenciam negativamente sua prática pedagógica (DAOLIO, 1995).

    Os estudos preocupados com as questões da Educação Física Escolar cresceram bastante nas últimas décadas. Observa-se que o modelo tradicional de ensino tem privilegiado o esporte como conteúdo principal das aulas restringindo as possibilidades de aprendizagem dos demais conteúdos como os jogos e brincadeiras, danças, ginástica, lutas e capoeira (DAOLIO, 1995; ASSIS, 2001; KUNZ, 2000).

    O termo "conteúdo" normalmente foi utilizado para expressar aquilo que se deve aprender em relação quase exclusiva aos conhecimentos das matérias ou disciplinas Como podemos observar os conhecimentos curriculares não se restringem apenas a fatos e conceitos, mas a uma série de formas e saberes culturais essenciais para que se produza o desenvolvimento e socialização do educando (ZABALA, 1999).

    Segundo Ayoub (2003) a educação física escolar não deveria focar o desenvolvimento de habilidades e capacidades físicas ou de condutas motoras tidas como universais ou, ainda, na busca do rendimento esportivo. A organização do conhecimento deveria ter como foco o estudo de diferentes temas da cultura corporal, objetivando aprofundar o entendimento da configuração dos gestos humanos de forma histórica, na qual cada sociedade cria suas técnicas corporais.

    Segundo Bracht (2003), o esporte foi escolarizado devido a alguns interesses. Primeiramente, atender o interesse do sistema esportivo conquistando consumidores e ajudando na produção de futuros atletas. Outro grande interessado é o poder público que ressalta a importância do esporte ser bem representado em competições internacionais e para isso as aulas de educação física seria um ótimo momento para o ensino do esporte o mais próximo possível do esporte de rendimento. Kunz (2000) diz que o descaso que acontece nas aulas de Educação Física é ocasionado pelo próprio discurso acadêmico dos profissionais da área que se esqueceu de apresentar propostas para o ensino e pela falta de políticas públicas que facilitassem o trabalho do professor.

    Diante da situação apresentado, o objetivo do presente estudo foi verificar as práticas pedagógicas adotadas nas aulas de educação Física escolar em instituições públicas e privadas da cidade de Visconde do Rio Branco (MG). Pretende-se identificar qual a abordagem pedagógica adotada, quais conteúdos são ministrados e como é a condição física e material para o desenvolvimento das aulas. Hipotetiza-se que a prática pedagógica destes professores acontecem em um ambiente que predomina a escassez de materiais e espaço e, estarão baseadas na abordagem tecnicista (Abordagem Desenvolvimentista, TANI et al., 1998) nas quais o ensinamento das técnicas dentro de padrões de movimentos pré-estabelecidos são privilegiados.

Procedimentos e métodos

    O estudo foi desenvolvido em seis escolas do município de Visconde do Rio Branco (MG). Quatro são da rede pública e duas são da rede privada. A amostra foi constituída por oito professores de Educação Física de ambos os sexos, idades entre 28 e 47 anos e todos formados em Licenciatura Plena em Educação Física. A amostra do presente estudo representa todos os professores de educação física da cidade onde o estudo foi realizado. Exercem a profissão desde a conclusão do curso sendo que o ano de formação variou de 1990 a 2006. Quatro atuam em instituições públicas e quatro em instituições privadas. A metodologia utilizada foi de natureza qualitativa e descritiva.

    Primeiramente foram realizados os contatos com as direções das escolas e com os professores de educação física para apresentação e explicação da pesquisa. A partir da autorização dos mesmos, foi assinado um termo de consentimento livre e esclarecido resguardando os indivíduos sobre a não exposição de sua identidade bem como relatando os objetivos da pesquisa e a importância de sua respectiva participação. Após esta etapa, foram realizadas três perguntas criadas pelo próprio autor em forma de entrevista contendo perguntas relacionadas às suas respectivas práticas no que diz respeito aos conteúdos ministrados, a abordagem pedagógica aplicada e às condições físicas e materiais para o desenvolvimento das aulas.

    As questões pertinentes às práticas pedagógicas dos professores estão apresentadas abaixo:

  1. O espaço físico e os materiais disponíveis são adequados e satisfatórios? Sim ou não?

  2. Qual é a abordagem pedagógica aplicada por você em suas aulas?

  3. Dentre os conteúdos da cultura corporal jogos e brincadeiras, dança, lutas, esporte e ginástica, qual ou quais você aborda em suas aulas?

    O presente trabalho foi submetido ao Comitê de Ética em Pesquisas da Universidade Presidente Antonio Carlos - MG, Brasil e respeitou todos os procedimentos bioéticos propostos pela resolução do governo brasileiro (no 196/96).

Resultados e discussão

    A educação física é um importante componente curricular escolar que apesar de seu contexto histórico descaracterizado de uma prática educativa de formação integral dos educandos vem buscando seu espaço dentro do âmbito educacional. Diante do desafio de reconstruir o papel da disciplina na escola e contribuir ativamente com o projeto mais amplo da Educação Escolar, a atuação do professor de educação física abarca grande responsabilidade, pois sua prática pedagógica deve ser coerente com os objetivos da escola, que giram em torno da aprendizagem relevante dos alunos nos seus mais variados campos de saberes do conhecimento (ILHA E KRUG, 2008). Assim, é importante destacar que o professor ao se comprometer com o seu trabalho na perspectiva de promover um ensino significativo para seus alunos, também está contribuindo com a sua formação, porém a prática pedagógica da maioria dos professores de Educação Física parece não ser condizente com os objetivos propostos pela educação básica. Na Tabela 1 abaixo seguem as características das práticas pedagógicas adotadas pelos professores das duas redes de ensino:

Tabela 1. As práticas pedagógicas dos professores de educação física das redes de ensino pública e privada da cidade de Visconde do Rio Branco (MG)

    A falta de espaço físico e materiais adequados é um dos pontos que os professores apontam como fator limitante para o exercício de seu trabalho pedagógico em outros estudos (DAOLIO, 1995 ; BETTI,1995; BETTI & BETTI, 1996; AYOUB, 2007). Os dados do presente mostraram diferença na freqüência das respostas entre os docentes das escolas publicas e privadas. A maioria dos professores das escolas particulares (75%) está satisfeita com a disponibilidade de material e espaço para o desenvolvimento de suas aulas. No entanto, os professores da rede pública (75%) acham que os materiais e o espaço são precários para o desenvolvimento das aulas. É necessário que os professores lutem para conseguir da direção da escola e dos órgãos públicos materiais oficiais para o desenvolvimento das aulas. Mas medidas provisórias devem ser tomadas para a resolução imediata do problema. Adaptar o espaço e construir materiais alternativos para contemplar os diversos conteúdos da cultura corporal é uma atitude viável ao invés do comodismo que tende predominar. Esses materiais podem ser criados com a ajuda dos próprios alunos e de toda comunidade escolar envolvendo todos no processo educativo.

    Em relação a abordagem pedagógica adotada pelos professores observa-se que todos os professores da rede pública relataram adotar a abordagem crítico-emancipatória (KUNZ, 1994). Já na instituição privada os professores ficaram divididos entre a abordagem crítico superadora (COLETIVO DE AUTORES et al.,1992) e desenvolvimentista (TANI et al.,1998).

    A abordagem crítico-emancipatória valoriza a compreensão crítica do mundo da sociedade e de suas relações sem a pretensão de transformar esses elementos por meio escolar. Segundo Kunz (1994, p.115-116), a abordagem Crítico - Emancipatória enfatiza que o ensino nesta concepção:

    “deve ser um ensino de libertação de falsas ilusões, de falsos interesses, e desejos que são construídos nos alunos a partir de conhecimentos colocados à disposição pelo contexto sociocultural onde vivem visão esta originária de um mundo regido pelo consumo, pelo melhor, mais bonito e correto. Assim o ensino deve confrontar-se pela libertação destas falsas visões de mundo, libertar-se da coerção imposta por parte do professor e do conteúdo que se ensina. Essa libertação no sistema escolar deve ser pelo esclarecimento e pelo desenvolvimento de competências como a autoreflexão, que possibilita uma libertação livre da coerção.”

    Didaticamente o professor deve confrontar o aluno com a realidade de ensino pretendendo desenvolver a criticidade e autonomia do aluno para uma libertação da condição coercitiva imposta pelo sistema social. Os conteúdos abordados nesta abordagem são o jogo, o esporte, a ginástica, a dança e a capoeira. Kunz defende uma educação critica capaz de romper com as estruturas autoritárias encaminhando para uma emancipação do educando (DARIDO e RANGEL, 2005). Desta forma, os professores da rede pública pretendem uma formação crítica que possibilite ao educando a desenvolver sua autonomia sobre o objeto de estudo da educação física.

    A abordagem crítico-superadora desenvolvida por um Coletivo de Autores enfatiza que:

    “os temas da cultura corporal (o jogo, o esporte, a ginástica e a dança), devem compor um programa de Educação Física, com os grandes problemas sóciopolíticos atuais como: ecologia, papéis sexuais, saúde pública, relações sociais do trabalho, preconceito urbano, distribuição de renda, dívida externa e outros (SOARES et al.. 1992, p.102).”

    Esta abordagem utiliza o discurso de justiça social baseada no marxismo e no neo-marxismo. Valoriza a contextualização dos fatos e o resgate histórico. Compreende a produção humana de forma dinâmica e que sofre modificações através do tempo. Os conteúdos abordados devem ser selecionados a partir de alguns princípios como sua relevância social, contemporaneidade e adequação às característica cognoscitivas dos alunos. Trata de um conhecimento denominado cultura corporal cujos temas (ginástica, jogo, esporte, capoeira e dança) devem ser abordados de forma lúdica e criativa buscando desenvolver a compreensão critica da realidade pelo aluno (DARIDO e RANGEL, 2005).

    A abordagem desenvolvimentista busca nos processos de aprendizagem e de desenvolvimento motor uma fundamentação para a educação física escolar. Ao mencionar o posicionamento dessa abordagem na Educação Física Escolar, o autor nos afirma que:

    “se a Educação Física pretende atender as reais necessidades e expectativas da criança, ela necessita, antes de mais nada, compreender as suas características em termos de crescimento, desenvolvimento e aprendizagem, visto que a não observância destas características conduz frequentemente ao estabelecimento de objetivos, métodos e conteúdos de ensino inapropriados (TANI et al, 1988, p.135).

    Nesta proposta o movimento é o principal meio e fim da educação física. Os conteúdos são desenvolvidos segundo uma ordem de habilidades básicas e específicas. Uma grande limitação da abordagem é a pouca importância dada ao contexto sócio-cultural para a aquisição das habilidades (DARIDO e RANGEL, 2005).

    Acreditamos que prática pedagógica adotada pelo professor está diretamente relacionada com o tipo de formação humana pretendida. As abordagens críticas da educação física (crítico-superadora e crítico-emancipatória) pretende uma formação humana voltada para emancipação humana, diferentemente das abordagens de cunho tecnicista, como a abordagem desenvolvimentista, que visa a acomodação do individuo, uma vez que valoriza a lógica do sistema capitalista como a divisão dos indivíduos por classe (aptos ou inaptos para a tarefa motora). Aqueles alunos que possuem dificuldade de executar a habilidade motora dentro de padrões específicos de acordo com a faixa etária são excluídos do processo educativo. Acreditamos que uma proposta metodológica para a educação física escolar seja na rede pública e privada deve priorizar as tendências críticas buscando mostrar o dinamismo e a complexidade dos conteúdos da cultura corporal (COLETIVO DE AUTORES, 1992) historicamente construídos e culturalmente modificados pelo homem. Permitir diferentes vivências corporais se faz necessário nas concepções críticas nas quais o movimentar ganha sentido e significados próprios de acordo com a prática social de cada aluno.

    Se a educação física tem suas funções na escola, parece que fica claro que uma das principais é tornar o aluno autônomo nas diversas manifestações corporais. Para que isso ocorra, as aulas não podem ser repetições mecânicas de movimentos, nem o professor como o centralizador do conhecimento, onde os alunos são reprodutores de seus ensinamentos. Nessas situações não há espaço para criação, não há situações problemas, não há discordância, não existe o diálogo como forma de mediar conflitos, enfim só existem situações padrões a serem reproduzidas (FERNANDES, 2008).

    Em relação aos conteúdos abordados observa-se que na rede pública há uma predominância dos conteúdos esportivos e os jogos e na rede privada, além desses, aparece o conteúdo dança. Segundo Betti (1995) até os jogos virarão jogos pré-desportivos. Os sentidos expressivo, criativo, comunicativo que se manifestam não são explorados devido a esportivização dos conteúdos. Os dados de Daolio (1995) corroboram com o presente estudo no qual mostra que professores de educação física de escolas públicas acreditam que a importância da educação física na educação básica seja ensinar as técnicas esportivas. Acreditam que por meio do ensinamento dos esportes além do aprendizado do padrão de movimento técnico, da tática e das regras os alunos aprenderão valores sociais considerados importantes para toda a vida. Mas que valores são esses? São valores necessários para a adaptação do aluno ao sistema capitalista ou valores que lhe possibilitaram constatar a realidade e transformá-la segundo seus interesses? Através dos signos esportivos (técnica perfeita, rendimento máximo, comparação, vitória) o professor estará contribuindo para uma formação acrítica, ahistórica, submissa onde o aluno não se compreende como ser ativo e sim como um ser adaptável às regras sociais impostas pela classe dominante.

    Assis (2001) coloca que o esporte na escola necessita de uma reinvenção de seu sentido e significado. Para isso, é necessária a compreensão que o esporte é produto de homens e mulheres e que sua realidade e possibilidades estão inseridas na aventura humana. Defende-se uma educação física escolar que aborde todos os conteúdos da cultura corporal em seus aspectos motores, sociais, culturais e afetivos. Sendo assim, algumas iniciativas poderiam diferenciar a prática pedagógica do professor de Educação Física. Existe o desejo de iniciar um novo processo de formação, seja na formação inicial (graduação) seja em ações de formação continuada. A intenção é que estas ações forneçam subsídios que possam estimular novas ações pedagógicas dos professores, mas também possam auxiliar na valorização e legitimação da própria educação física na escola, tornando-a “legal” muito além do sentido jurídico (COSTA & NASCIMENTO, 2009).

    A seleção de poucos conteúdos, como relatado pelos professores do presente estudo, para serem contemplados na aula de educação física escolar constitui uma falha no processo de formação humana. É direito do educando ter acesso a todas as práticas corporais que durante a história o homem vem criando e modificando. Mas é necessário que o professor seja comprometido com o processo de formação de seus alunos, tenha boa vontade e criatividade, que busque uma qualificação constante para compensar qualquer lacuna no conhecimento para transpor as dificuldades e que tenha, sobretudo, um bom planejamento. O planejamento tomado como referência, e não como verdade absoluta; atualizados constantemente, construídos e debatidos com os próprios alunos, relacionado com o projeto escolar, enfim, dinâmicos e mutantes, considerando os contextos onde serão aplicados (DAOLIO, 2002).

Considerações finais

    A prática pedagógica dos professores de educação física apresentou características que já foram apresentadas em outros estudos. A falta de materiais específicos necessários a prática dos diferentes conteúdos da cultura corporal é um fator que limita o professor a trabalhar pautado na diversidade de movimento, de forma lúdica e prazerosa. No entanto, nem nas escolas particulares, onde a maioria dos professores estão satisfeitos com a estrutura física e materiais, foi possível observar a abordagem de todos os conteúdos que compõem o campo de conhecimento da educação física. Acreditamos que o problema esteja além dos aspectos físicos e materiais da escola. A falta de conhecimento sobre os diversos conteúdos, a falta de planejamento, comprometimento e boa vontade parecem ser fatores que levam os professores apresentarem aos alunos uma pobre cultura de movimento, comprometendo o processo de formação dos alunos. As abordagens pedagógicas relatadas pela maioria dos professores sugerem uma formação voltada para a emancipação do individuo. Mas como formar um sujeito crítico e atuante na sociedade sem apresentar a ele todos os conteúdos da cultura corporal? Acreditamos que sua forma de ação no mundo será limitada, sem o domínio amplo de todos os elementos corporais historicamente criados e socialmente desenvolvidos pelo homem.

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