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Relação entre ansiedade competitiva e 

experiência em atletas de jiu-jítsu e surfe

Relación entre ansiedad competitiva y experiencia en deportistas de jiu-jitsu y surf

Relation between competitive anxiety and experiences in athletes of jiu-jitsu and surfing

 

Universidade Estadual de Santa Cruz. Ilhéus, BA

Grupo de Pesquisa em Desempenho Humano, GPED

(Brasil)

Marcos Gimenes Fernandes*

Luiz Henrique da Silva**

gimenes@uesc.br

 

 

 

 

Resumo

          A ansiedade competitiva pode estar relacionada a diversos fatores. A idade e a experiência em competições podem ser variáveis que se relacionam com ansiedade competitiva. Dessa forma, o objetivo do presente estudo é verificar a relação entre ansiedade pré-competitiva e a variável experiência em atletas de jiu-jítsu e surfe. A amostra foi composta de 151 atletas de jiu-jítsu e 110 de surfe (n=261). A ansiedade competitiva foi acessada através do CSAI-2 que é composto por três sub-escalas: ansiedade cognitiva, ansiedade somática e autoconfiança. Esse instrumento foi aplicado 1 hora antes das competições, juntamente com uma ficha de dados pessoais que acessou idade e tempo de competição como indicativos de experiência. Os resultados demonstraram que idade e tempo em competição nos atletas de jiu-jítsu tiveram uma correlação significativa com ansiedade cognitiva e autoconfiança. Diferentemente, nos atletas de surfe, apenas tempo de competição teve correlação com ansiedade cognitiva, enquanto não se observou nenhuma correlação significativa entre idade do atleta e as sub-escalas do CSAI-2. Nas duas modalidades estudadas ansiedade somática não demonstrou correlação com idade e tempo em competições. Considerando-se a peculiaridade de cada esporte, conclui-se que a ansiedade competitiva em atletas de jiu-jítsu e de surfe pode estar relacionada com a experiência do atleta. Entretanto estudos com outras modalidades esportivas utilizando o CSAI-2 validado no Brasil são necessários para que a relação entre ansiedade competitiva e experiência dos atletas seja melhor entendida.

          Unitermos: Ansiedade competitiva. CSAI-2. Experiência em competições.

 

Abstract

          Competitive anxiety can be related to diverse factors. Age and experience in competitions seem to be related to competitive anxiety. The objective of the present study is to verify the relation between competitive anxiety and experience in athletes of jiu-jitsu and surf. The sample was composed by 151 athletes of jiu-jitsu and 110 of surf (n=261). The competitive anxiety was accessed through of CSAI-2 that has three sub-scales: cognitive anxiety, somatic anxiety and self-confidence. This instrument was applied one hour before the competitions, together with measures of personal data related to age and time of experience in competition. The results showed that age and time in competition of the athletes of jiu-jitsu had a significant correlation with anxiety cognitive and self-confidence. Differently, among the athletes of surf, only time of competition had correlation with anxiety cognitive, while it was observed no significant correlation between age of the athlete and the dimensions evaluated in the CSAI-2. In the two modalities somatic anxiety did not show correlation with age and time in competitions. Considering the peculiarities of each sport, it is concluded that the competitive anxiety in athletes of jiu-jitsu and surf can be related to experience of the athlete. However, more studies on several sport modalities are suggested with the CSAI-2 validated in Brazil, so that the relation between competitive anxiety and experience of the athletes can be better understood.

          Keywords: Competitive anxiety. CSAI-2. Experience in competitions.

 

 
http://www.efdeportes.com/ Revista Digital - Buenos Aires - Año 15 - Nº 145 - Junio de 2010

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Introdução

    Ansiedade competitiva (AC) pode ser compreendida como um estado emocional negativo caracterizado por nervosismo, preocupação e apreensão associado com ativação e agitação do corpo (Weinberg & Gould, 2001). Esse estado emocional pode ser explicado pela Teoria Multidimensional da Ansiedade Competitiva (TMAC) (Martens et al, 1990).

    De acordo com a TMAC tal estado emocional envolve as dimensões cognitiva, somática e autoconfiança. A primeira diz respeito às expectativas negativas, por parte do atleta, acerca de seu desempenho, enquanto a segunda se refere aos aspectos fisiológicos da experiência de sentir-se ansioso, os quais provocam diretamente alteração da função autonômica (aumento da freqüência cardíaca, sudorese, dilatação da pupila, etc.) e a última reflete a confiança que o atleta tem no seu desempenho. O medo de uma derrota diante um combate pode aumentar a ansiedade do lutador, provocando uma queda na motivação, deixando-o mais suscetível ao fracasso (Franchini, 2001). Este aumento da ansiedade pré-competitiva pode ocorrer em decorrência das constantes pressões por parte de técnicos e familiares (Lavoura, Botura e Machado, 2006). Entretanto, o estado pré-competitivo deve ser controlado de uma maneira que se consiga alcançar o estado ideal de ativação para que o lutador possa entrar em combate com os níveis emocionais adequados (Weineck, 2005).


    A TMAC deu origem a um instrumento específico para verificar a AC em esportes, o Competittive State Anxiety Inventory-2 (CSAI-2) (Martens et. al; 1990). Empregando o referido instrumento, diversos autores estudaram a relação entre AC e a experiência no esporte ou compararam escores de atletas experientes e inexperientes, como veremos a seguir. Martens et. al. (1990) relatam que experiência é preditora de ansiedade cognitiva, mas não é preditora de ansiedade somática, sugerindo que atletas experientes controlam sua preocupação.

    Em estudo realizado por Mellalieu, Hanton e O’Brien (2004), comparou-se os escores do CSAI-2 entre atletas experientes e inexperientes em e golfe. Os resultados corroboram com os achados dos demais estudos que demonstraram que atletas experientes tendem a apresentar menores escores de ansiedade cognitiva e somática comparados a atletas inexperientes. Da mesma forma, atletas experientes demonstram escores mais elevados em autoconfiança comparados aos atletas inexperientes.

    Um fato interessante no estudo de Mellalieu et. al. (2004), citado acima, é a investigação de atletas de duas modalidades distintas, sendo que o rugby é um esporte de intenso contato corporal e o golfe é uma modalidade de precisão sem a característica dos esportes de contato. O rugby chama a atenção pela característica de forte contato físico, criando um ambiente emocional semelhante ao ambiente das lutas. Isto se explica pelo fato de que, tanto no rugby quanto nas lutas, existe uma situação eminente de confronto, exigindo um vigoroso contato corporal, requisitando dos atletas alta preparação física e psicológica para enfrentar e superar o desafio. Essa característica singular dos esportes de combate faz dessas modalidades esportivas um ambiente rico para diversos estudos (Lane, 2006).

    Dentre as diversas modalidades de lutas, escolhemos o jiu-jítsu para representar a atividade de combate com forte contato físico em nosso estudo. O jiu-jítsu é uma arte marcial de origem japonesa, disseminado e aperfeiçoado pela família Gracie no Brasil e no mundo. Classificada na categoria das lutas agarradas, utiliza técnicas de projeção, imobilização, inversão, chaves de articulação e estrangulamento.

    Por outro lado, o surfe foi escolhido como a atividade esportiva que na sua prática, as exigências físicas e emocionais, não são derivadas de contato pessoal com outros atletas, ou seja, não há situação de combate propriamente dita. Outra diferença marcante entre os dois esportes é o tempo de duração das atividades em situação de competição. No jiu-jítsu, os campeonatos são realizados em um único dia, sendo que os confrontos podem durar poucos segundos a 10 minutos por round. O round pode terminar a qualquer momento em decorrência de alguma finalização (chave de articulação ou estrangulamento), caso contrário a luta é decidida por pontos e tendo a duração total prevista (10 minutos para faixa preta). Atletas de alto nível podem realizar 5 rounds em média por campeonato. Diante disso, as lutas de jiu-jítsu exigem um estado de alerta geral do organismo, que pode ser traduzido em termos de ansiedade somática e cognitiva, pois tanto a derrota quanto a vitória podem acontecer a qualquer momento durante o combate.

    Em contraposição, os campeonatos de surf podem durar dias, constituídos de baterias que se sucedem com duração em torno de vinte a trinta minutos. Os atletas de surf, assim como no jiu-jítsu, necessitam regular seus estados emocionais para alcançarem um bom desempenho. Entretanto, supõe-se que os surfistas dispõem de maior tempo e menor pressão para regular seus estados emocionais em níveis ótimos em comparação aos atletas de jiu-jítsu. Apesar da grande relevância do controle dos estados emocionais em situação de competição em ambas as modalidades, há uma carência significativa de estudos de acordo com extensa revisão bibliográfica. Dessa maneira, o presente estudo é destinado a investigar níveis de ansiedade competitiva em dois esportes com características psicológicas peculiarmente distintas. Como objetivos específicos temos: a) Verificar a correlação entre a idade dos atletas nas duas modalidades e as sub-escalas do CSAI-2, b) Verificar a correlação entre as sub-escalas do CSAI-2 e c) Verificar a correlação entre tempo de competição dos atletas nas duas modalidades e as sub-escalas do CSAI-2.

Metodologia

Amostra

    Fizeram parte desse estudo, como voluntários, 110 praticantes de jiu-jítsu e 151 praticantes de surfe. O critério de inclusão foram atletas masculinos que participavam das competições. Como critério de exclusão utilizou-se o analfabetismo. Todos os sujeitos assinaram um termo de consentimento livre e esclarecido e foram informados de que poderiam desistir de colaborar com o estudo a qualquer momento.

Instrumento

    A ansiedade competitiva foi acessada através do CSAI-2 (Martens et al., 1990). O instrumento é composto de três sub-escalas do tipo Likert que englobam as dimensões: ansiedade cognitiva, ansiedade somática e autoconfiança, totalizando 27 itens. As respostas variam de um a quatro pontos (nada a completamente), somando uma pontuação que pode variar entre nove a 36. O inventario foi traduzido para o português pelo método de “back-translation” e alcançou índices aceitáveis de confiabilidade das sub-escalas através do coeficiente de alpha de Cronback variando entre a 0,73 a 0,81.

Procedimento

    O inventário CSAI-2 foi administrado uma hora antes das competições, juntamente com uma ficha para dados pessoais que acessou idade, peso, faixa (no caso do jiu-jítsu), anos de treinamento e anos de competição. As instruções acerca do procedimento de coleta dos dados foram dadas de acordo com as normas de aplicação do instrumento.

    A coleta de dados foi realizada em 4 competições de jiu-jítsu: Campeonato Nacional (Rio de janeiro, maio/2006) e 3 Campeonatos Municipais (Ilhéus, novembro de 2006, julho e outubro de 2007); e em 5 competições de surf: Campeonato Nordestino (Ilhéus, novembro de 2006) e 4 Campeonatos Municipais (Ilhéus: março, junho, setembro e novembro de 2007).

    Houve necessidade de adaptar algumas perguntas do CSAI-2 às particularidades de cada esporte. A modificação restringiu-se a substituir as palavras jogo e jogar por luta e lutar, no caso do jiu-jítsu, e competir e competição, no caso do surf.

Análise estatística

    Na análise descritiva dos dados foi empregada a média (como medida central das tendências das respostas, com seu Desvio Padrão), ao passo que para a análise relacional dos dados, em função da distribuição não-normal dos dados, obtida através do teste de Shapiro, foi empregado o teste não-paramétrico de Spearman para verificar a correlação entre as varáveis relativas à experiência do atleta (tempo de competição e a idade) e as variáveis do CSAI-2. O nível de significância adotado foi de p<0,05. O programa SPSS 14 (Statistical Package for the Social Sciences, versão 14) foi usado para essas analises.

Resultados

    Todos os participantes (n=260) são do sexo masculino, com média de idade de 21 anos e 11 meses. Entretanto, os atletas praticantes de jiu-jítsu são em média mais velhos (23 anos e 5 meses; DP= 5 anos e 8 meses) do que os que praticam surfe (18 anos e 10 meses, DP = 5 anos e 10 meses). Observa-se um grande desvio padrão nos dois grupos, o que torna as amostras heterogêneas em termos de idade entre os atletas de jiu-jítsu (idade máxima de 29 anos e um mês e idade mínima de 17 anos e 11 meses e os de surfe (idade máxima de 24 anos e 8 meses e idade mínima de 13 anos).

    Nas duas modalidades esportivas, os atletas reportaram estarem competindo há menos de cinco anos em média (Média no Surfe= 5 anos e 2 meses; DP= 4 anos e 7 meses e Média no jiu-jítsu= 4 anos e 3 meses; DP= 4 anos e 10 meses). Da mesma forma, observa-se heterogeneidade em termos de tempo de competição nos dois grupos. Entre os praticantes de jiu-jítsu, o tempo de competição máximo reportado foi de nove anos e um mês, enquanto que o mínimo foi de apenas dois meses. Entre os atletas de surfe, o tempo máximo de competição reportado foi de nove anos e 9 meses, ao passo que o mínimo foi de seis meses.

    A heterogeneidade da amostra em termos de idade e tempo de competição permite-nos detectar com precisão de que forma as variáveis relacionadas à experiência e idade dos atletas se correlacionam com as sub-escalas do CSAI-2.

    A tabela 1 mostra as correlações encontradas na amostra de atletas de jiu-jítsu. Ao analisarmos a tabela, podemos observar que a variável idade apresentou correlação significativa (p<0,01) e de força média com todas as dimensões analisadas (autoconfiança, ansiedade cognitiva e autoconfiança), com exceção da ansiedade somática. Aliás, ansiedade somática não apareceu correlacionada significativamente com as variáveis psicológicas investigadas, com exceção a ansiedade cognitiva, nem com as variáveis relacionadas ao tempo de competição. Entretanto, a natureza da relação entre idade e ansiedade cognitiva é negativa (quanto maior a idade do atleta, menor os escores de ansiedade cognitiva), enquanto da relação entre idade e autoconfiança é positiva (quanto maior a idade, maior os escores de autoconfiança reportados).

    Anos em competição, indicador de experiência em competições nesse estudo, também esteve correlacionado significativamente (p<0,01), e com uma força moderada, com ansiedade cognitiva e essa relação foi de natureza também inversa ou negativa. Ou seja, quanto maior os escores de ansiedade cognitiva, menos experiência em competições os atletas reportaram. Chama à atenção a força da correlação (p<0,01) entre tempo de competição e autoconfiança dos atletas dessa modalidade esportiva. Atletas com maior experiência também reportam maiores níveis de autoconfiança.

Tabela 1. Correlação entre as variáveis nos atletas de jiu-jítsu

 

1

2

3

4

5

1. Ansiedade cognitiva

1

0,415**

-0,611**

-0,321**

-0,349**

2. Ansiedade somática

0,415**

1

-0,131

-0,016

0,187

3. Autoconfiança

-0,611**

-0,131

1

0,304**

0,530**

4. Idade

-0,321**

-0,016

0,304**

1

0,368**

5. Anos em competições

-0,349**

0,187

0,530**

0,368**

1

**Correlação significativa p<0,01

    A seguir, a tabela 2 apresenta as correlações obtidas na amostra de atletas de surfe. Desta vez, a variável idade apresentou correlação negativa e fraca apenas com ansiedade cognitiva a um nível de significância menor que 0,05, enquanto tempo de treino esteve correlacionado significativamente (p<0,01) com todas as dimensões investigadas pelo CSAI-2. Isto é, a variável idade nessa amostra não se mostrou muito útil para detectar variações nas variáveis psicológicas. Por outro lado, quanto mais anos de competição os atletas reportaram, menores foram os escores de ansiedade cognitiva e somática e quanto mais anos de competição, menor a autoconfiança reportada.

Tabela 2. Correlação entre as variáveis nos atletas de surfe

 

1

2

3

4

5

1. Ansiedade cognitiva

1

0,521**

-0,547**

-0,193*

-0,311**

2. Ansiedade somática

0,521**

1

-0,398**

-0,108

-0,214**

3. Autoconfiança

-0,547**

-0,398**

1

0,137

0,211**

4. Idade

-0,193*

-0,108

0,137

1

0,623**

5. Anos em competições

-0,311**

-0,214**

0,211**

0,623**

1

**Correlação significativa p < 0,01

*Correlação significativa p < 0,05

    Alem disso, nessa amostra, diferentemente dos atletas de jiu-jítsu, a ansiedade somática apresentou-se significativamente correlacionada (p<0,01) com ansiedade cognitiva (correlação positiva e forte), autoconfiança (correlação negativa e moderada) e anos de competição (negativa e moderada). A autoconfiança, a exemplo da amostra anterior, também se comportou com uma variável explicativa importante nessa amostra, demonstrando correlação significativa (p<0,01) com ansiedade cognitiva, ansiedade somática e anos em competições.

Discussão

    Existem na literatura específica alguns estudos com o propósito de investigar experiência no esporte (ou tempo de competição) e ansiedade competitiva em diferentes modalidades esportivas e, diferentes designs são desenvolvidos para atender a esses propósitos como citados na introdução do artigo. Esses estudos podem ser correlacionais, os quais verificaram a direção e a força da correlação entre experiência no esporte e ansiedade competitiva, ou estudos comparativos que buscaram comparar as médias de escores de ansiedade entre atletas experientes e atletas e inexperientes. Encontramos ainda estudos cujos designs mais sofisticados, permitem aos pesquisadores aferir o valor preditivo da experiência do atleta sobre os níveis de ansiedade cognitiva, ansiedade somática e autoconfiança.

    O presente artigo teve como objetivo divulgar os resultados de um estudo correlacional que pretendeu investigar características relacionadas à experiência do atleta (idade e tempo de competição) e variáveis que compõe o CSAI-2 (Martens et al., 1990) em duas modalidade esportivas individuais que apresentam características peculiarmente distintas.

    Em função dessas diferenças, hipotetizou-se que no jiu-jítsu, dada a exigência do confronto homem-a-homem, o aumento na fase pré-competitiva dos níveis de ansiedade seriam desejáveis, até mesmo naqueles atletas mais maduros e com larga experiência em competições. Já nos atletas de surfe, dadas suas particularidades técnicas esperava-se resultados diferentes dos de jiu-jítsu, mas dado o fato de inexistirem estudos nessa modalidade esportiva, não se sabia que direção e força essa diferença assumiria. Portanto, buscou-se apenas explorar as possíveis correlações existentes entre as variáveis do CSAI-2 e características relacionadas à experiência do atleta nessa modalidade esportiva.

    Nas duas modalidades esportivas hipotetizou-se que entre as variáveis que compõem o CSAI-2 (instrumento original) seriam mantidos os resultados que validaram a escala: ou seja, quanto, menores são os escores de ansiedade cognitiva e somática, maior é o de autoconfiança. Os resultados confirmaram algumas hipóteses inicialmente lançadas, mas refutaram outras, reiteradamente confirmadas em outros estudos, fato que merece uma análise mais pormenorizada e elucidativa.

    Conforme o esperado, a ansiedade cognitiva parece estar relacionada com a experiência do atleta, independente das características do esporte, confirmando as conclusões do estudo de Melalliue et. al., (2004), ou seja, atletas experientes tendem a ter uma percepção positiva da competição, exibindo escores menores de ansiedade cognitiva verificado pelo CSAI-2 do que atletas iniciantes.

    Entretanto, apenas nos atletas de jiu-jítsu, a variável idade apresentou-se inversamente relacionada com ansiedade cognitiva, não apresentando nenhuma relação significativa com os escores fornecidos pelos nos atletas de surfe. Essa disparidade de resultados pode ser compreendida se levarmos em conta as características específicas desse esporte e de seus atletas que, por exemplo, podem, apesar da pouca idade, ter muitos anos de competição. Isso pode ser observado na comparação das idades médias entre os dois grupos de atletas, bem com o seu tempo de experiência em termos de tempo de competição. Enquanto a idade média dos atletas de surf foi de 18 anos e 10 meses e a dos atletas de jiu-jítsu foi de 23 anos e cinco meses, o tempo médio de competição foi virtualmente igual nos dois grupos (Média no Surfe = cinco anos e dois meses e Média no jiu-jítsu = quatro anos e três meses). Nesse caso, a pouca representatividade de atletas mais velhos de surfe e a equivalência do tempo de competição nos dois grupos podem ter mascarado os efeitos da variável idade na ansiedade competitiva. Vale ressaltar que o tempo de competição pode de fato ser uma medida mais adequada para se avaliar as variações de escores de ansiedade cognitiva, como sugerido por Jones e Swaian (1995), Terry (1995).

    As relações entre autoconfiança e ansiedade cognitiva, por sua vez, foram mais uma vez confirmadas com esse estudo, o que não é de fato uma surpresa, dada as repetidas confirmações em outros estudos com outras modalidades esportivas (Martens et al, 1990). Isso nos permitiria supor que nos atletas das duas modalidades estudadas a percepção negativa e as alterações fisiológicas podem ser minimizadas até alcançar os níveis mais desejáveis para cada tipo de esporte, com estratégias que visem a potencializar a autoconfiança.

    Entretanto, contrariando o estudo de construção do CSAI-2 (Martens et. al.,1990) a ansiedade somática, na modalidade jiu-jítsu, não foi significativamente correlacionada com nenhuma das variáveis (ansiedade cognitiva e autoconfiança). No mesmo sentido, a ansiedade somática não demonstrou correlação significativa com as variáveis relacionadas à experiência em ambas as modalidades (idade e tempo de competição). Portanto, a hipótese de que em esportes de combate, algum nível de ansiedade somática poderia estar presente, mesmo em atletas experientes, não se confirmou. A ausência de correlações significativas dessa variável com experiência do atleta pode ser compreendida se considerarmos os seguintes fatores: a) no momento do atleta responder às questões do CSAI-2, as alterações fisiológicas ainda não tinham sido desencadeadas b) a sub-escala ansiedade somática do CSAI-2 não foi capaz, nessa amostra, de verificar as alterações autonômicas em decorrência das situações específicas dessas competições; c) o CSAI-2 é um instrumento de autorelato, possibilitando manipulação das respostas pelo atleta, ou seja, é possível que os atletas tenham percebido que as questões referentes ao fator “perceber-se nervoso ou ansioso” como evidência de “pouco preparo ou insegurança emocional”, levando-os a não registrar os níveis reais de ansiedade somática percebidos; ou d) o instrumento empregado é a versão traduzida para o português, e apesar dos cuidados empreendidos quanto a essa versão, podemos lembrar a importância de estudos futuros com o objetivo de validar o CSAI-2 para atletas brasileiros.

Conclusão

    No caminho percorrido para chegar às conclusões surgiram novas dúvidas com relação ao estudo da ansiedade competitiva e sua relação com diversas variáveis, especialmente com a experiência do atleta. Existe, nessa área, um vasto campo científico para várias investigações com o objetivo de entender o papel da ansiedade competitiva no desempenho esportivo. Portanto, é necessária a validação brasileira do CSAI-2 por Modelo de Equação Estrutural através de Análise Fatorial Confirmatória. Essa metodologia foi utilizada em diversos países, como por exemplo, na Grécia (Tsorbatzoudis, Barkoukis, Sideridis & Grouios, 2002), nos Estados Unidos (Cox, Martens & Russell, 2003), na Suíça (Hassmén e Lundqvist, 2005), na Estônia (Kais & Raudsepp, 2008), em Portugal (Coelho, Vasconcelos-Raposo & Fernandes, 2007), na Espanha (Fernández, Rio & Fernádez, 2007), na França (Martinent, Ferrand, Guillet & Gautheur, 2010). Assim, estudos utilizando o referido instrumento validado com o propósito de verificar níveis de ansiedade competitiva e sua relação com experiência e o desempenho são realidades promissoras que poderão mudar o panorama de pesquisa e auxiliar os profissionais que atuam diretamente com desempenho esportivo.

Referencias bibliográficas

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  • Weinberg, R. & Gould D. (2001) Fundamentos da psicologia do esporte e do exercício. Porto Alegre: Artmed Editora.

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