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Sistematização do conhecimento a partir 

das aulas de Educação Física Escolar

Sistematización de conocimientos a partir de las clases de Educación Física Escolar

Systematization of knowledge in Physical Education classes

 

Especialista em Metodologia em Educação Física e Esporte/UNEB

Mestrando em Educação/UFBA

(Brasil)

Alan de Aquino Rocha

alanaquino@hotmail.com

 

 

 

Resumo

          Este texto apresenta e analisa as possíveis contribuições das abordagens propositivas das décadas de 1980 e 1990, na perspectiva da sistematização do conhecimento nas aulas de Educação Física Escolar. A principal contribuição deste trabalho foi a constatação que, embora ainda não se constitua hegemonicamente, a busca por novos caminhos para a sistematização do conhecimento em Educação Física na escola é uma realidade; mesmo havendo discordâncias e distanciamentos entre as abordagens, elas surgem no intuito de enriquecer o debate acerca da Educação Física Escolar, apontando caminhos possíveis de serem seguidos por qualquer professor de Educação Física.

          Unitermos: Sistematização. Conhecimento. Escola. Educação Física

 

Abstract

          This paper presents and analyses the possible contributions of the propositive approaches as a perspective of knowledge systematization in Physical Education classes during the decades of 1980 and 1990. Nonetheless not hegemonically, new trends in systematizing physical education knowledge in school are nowadays a reality. Our agenda brings to the scene discrepancies amongst scholars, but at the same time it comes out with possibilities to be taken in consideration by the physical education teacher.

          Keywords: Systematization. Knowledge. School. Physical Education

 
http://www.efdeportes.com/ Revista Digital - Buenos Aires - Año 14 - Nº 138 - Noviembre de 2009

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Introdução

    A intensa vivência no cotidiano da escola e o nosso entendimento acerca das contribuições e do lugar da Educação Física neste contexto nos levou a importantes indagações: que conhecimentos eram produzidos e sistematizados a partir das nossas aulas? O que os alunos ao serem perguntados pelos outros quanto ao que faziam nas aulas de Educação Física responderiam? O que concretamente eles guardariam como sendo produzido nas aulas de Educação Física? Estes questionamentos abriram caminho para uma valiosa crise, pois nos mobilizou a voltar aos estudos, sistematizar idéias e buscar outros colegas professores que seguiam um caminho parecido.

    A partir da parceria estabelecida com a coordenação pedagógica, começamos a elaborar planejamentos anuais, grades curriculares, projetos, cronogramas e diferenciadas intervenções. A instituição sempre atribuiu à Educação Física a mesma importância dispensada às demais áreas do conhecimento, permitindo o acesso aos mesmos momentos de estudo e formação. Após algumas boas intervenções realizadas com os alunos da quinta série do ensino fundamental até o terceiro ano do ensino médio, um tema específico necessitava ser melhor estudado – a sistematização do conhecimento em Educação Física Escolar. A forma como a Educação Física passou a ser valorizada na escola, nos atentou para a importância desta discussão, pois, ao contrário da década de 1980, a década de 1990 foi marcada por novas abordagens propositivas para a Educação Física Escolar (CASTELLANI FILHO, 1998).

    A partir dessas inquietações e reflexões, surgem algumas indagações, que após sistematizadas, apresentam-se como o problema que originou e norteou este estudo que se caracteriza com a seguinte pergunta: de que forma as abordagens propositivas da educação física, do final da década de 80 e década de 90, tem contribuído para o processo de sistematização do conhecimento nas aulas de educação física escolar? A partir da questão norteadora, este estudo teve como objetivo: identificar e analisar possíveis contribuições das abordagens propositivas na perspectiva da sistematização do conhecimento nas aulas de Educação Física escolar.

Educação Física e construção do conhecimento

    A Educação Física na escola trouxe em seu bojo, um leque de conhecimentos que, mesmo sem a devida sistematização, disseminou-se lhe atribuindo reputação de disciplina curricular. Para Vago (1995, p. 21), a Educação Física sempre teve o que ensinar, afirmando que:

    De maneira geral, portanto, nunca faltou à Educação Física o que ensinar. Até porque se tivesse lhe faltado o que ensinar, certamente o seu destino seria a extinção! E se não foi extinta do currículo escolar, certamente, é porque dela sempre esperou-se que ensinasse algo.

    Entretanto fazem-se necessárias algumas considerações que dêem conta de nos situar quanto ao entendimento do que é a escola, de que conhecimentos precisam ser veiculados por ela e ainda, qual o papel da Educação Física no contexto escolar, sem perder de vista toda a sua construção histórica, no intuito de apontar caminhos que anunciem mudanças significativas na realidade atual e ainda hegemônica.

    Sabemos que a escola é o espaço reservado para a democratização do saber. Nela, os saberes são divididos em disciplinas de acordo com as várias áreas de conhecimento. Libâneo (1990, p. 92) afirma que o processo de ensino, efetivado pelo trabalho docente, constitui-se de um sistema articulado dos seguintes componentes: objetivos, conteúdos, métodos (incluindo meios e formas organizativas) e condições. Por meio destes componentes o professor tem a tarefa de efetivar o trabalho de ensino, ou seja, garantir uma cultura de base aos alunos.

    Nesse sentido, a articulação entre objetivos, conteúdos e métodos deveria estar presente em todo trabalho docente e em todas as disciplinas que compõem o currículo escolar, para que os objetivos educacionais possam ser alcançados. Cada um destes componentes tem um papel diferente no planejamento de ensino, mas, articulados, devem convergir para o mesmo fim. É nos conteúdos que está a base de informações do processo educativo. Nele estarão de forma mais explícita os saberes que o professor trata em sua disciplina. Libâneo (1990, p. 92) afirma que os conteúdos de ensino compreendem as matérias nas quais são sistematizados os conhecimentos, formando a base para a concretização de objetivos. Os conteúdos englobam uma série de fatores:

    Conteúdos de ensino são o conjunto de conhecimentos, habilidades, hábitos, modos valorativos e atitudinais de atuação social, organizados pedagógica e didaticamente, tendo em vista a assimilação ativa e aplicação pelos alunos na sua prática de vida. Englobam, portanto: conceitos, idéias, fatos, processos, princípios, leis científicas, regras, habilidades cognoscitivas, modos de atividade, métodos de compreensão e aplicação, hábitos de estudo, de trabalho e de convivência social; valores, convicções, atitudes. São expressos nos programas oficiais, nos livros didáticos, nos planos de ensino e de aula, nas aulas, nas atitudes e convicções do professor, nos exercícios, nos métodos e formas de organização do ensino (LIBÂNEO, 1990, p.128).

    Trazendo à tona o pensamento de Vago (1995, p. 21) “(...) nunca faltou à Educação Física o que ensinar”, daí concluirmos que a Educação Física cumpriu bem o seu papel em um determinado momento histórico, entretanto, não mais se pode aceitar passivamente que as perspectivas hegemônicas e subsidiárias de práticas pedagógicas ultrapassadas que não mais dão conta de explicar e apontar caminhos para a escola e para a Educação Física Escolar, se perpetuem sem efetivamente trazerem contribuições significativas no tocante à produção e sistematização de conhecimento, objeto deste nosso estudo.

    Além de conhecer as teorias científicas e seu conteúdo, o professor precisa também conhecer o processo de produção das teorias, aprimorando assim o trabalho educativo. Acreditamos que o amplo debate, envolvendo questões relacionadas à natureza do conhecimento científico, possa contribuir para questionarmos também a Educação Física. O entendimento que o professor de Educação Física possui de ciência pode influenciar sua prática pedagógica. Assim, discutir a construção científica da Educação Física, isto é, a teoria da Educação Física e suas implicações para a prática pedagógica, torna-se fundamental para se conseguir a educação crítica que almejamos.

    A questão do objeto e da especificidade da área tem sido abordada pelo menos de duas maneiras: considerada como uma ciência autônoma ou relativamente autônoma e considerada como uma prática pedagógica. Nesse sentido o problema da especificidade e do objeto da Educação Física se manifesta também no âmbito escolar. Se por um lado existe a dúvida se a Educação Física veicula ou não, por meio da escola, um conhecimento de relevância para a vida do aluno, por outro, existem várias correntes que elegem alguns conhecimentos e negam outros que tentam concorrer para a especificidade e objeto da área. Parece haver na Educação Física a preocupação em buscar a homogeneidade, um traço comum que possa ser inteligível a todos. Dessa forma, acaba deixando de lado, e, até criando certo preconceito, em relação a outras possibilidades de ser da aula de Educação Física.

    Oliveira (1997) comenta que a Educação Física tem criado estratégias e encaminhamentos metodológicos diversificados, mas alerta para alguns fatores que impedem que novas tendências educacionais e abordagens de conteúdos sejam colocadas em prática dentro da escola:

    (...) falta de preparo que têm os professores para o enfrentamento de novas estratégias metodológicas, a falta de interesse em vivenciar novas abordagens metodológicas, comodismo, a condição de refratário do conhecimento que os docentes assumem no ensino, o medo da instabilidade frente a novos conteúdos e estratégias metodológicas, pois seria um risco assumir a dúvida frente ao aluno, quando no entendimento tradicional o professor tem de saber e o aluno apenas aprender (1997, p.22).

    Para além dos fatores citados por Oliveira, estamos convictos de que a dificuldade de novas tendências e abordagens serem postas em prática pode estar atrelada à dinâmica e à tradição que segue a prática escolar. Não podemos atribuir a culpa pelo imobilismo da Educação Física Escolar somente aos professores, mas ao conjunto de fatores que regem o cotidiano da escola e condicionam a prática, no qual estão inseridos os professores, os alunos, as hierarquias presentes na estrutura escolar e a tradição que a área seguiu ao longo do tempo, dentre outros.

    Acreditamos que a Educação Física se constitui como prática pedagógica, já que ela se apropria dos métodos pedagógicos para o ensino dos conteúdos específicos da área. Fato que ocorre tanto na escola, onde o princípio norteador da prática é o ensino, com objetivos educacionais, quanto em outros campos de intervenção, como academias, clubes, escolinhas esportivas, entre outros, nos quais, apesar do objetivo do ensino não ser o mesmo que tem a educação escolar, os aspectos pedagógicos estão inegavelmente presentes.

    Com o crescimento da produção de conhecimento na Educação Física, as propostas teóricas formuladas para solucionar os problemas pedagógicos da área aumentaram consideravelmente, a ponto de se tornar impossível conhecer todas as proposições acadêmicas acerca do ensino da Educação Física Escolar. Nas Universidades, os professores se dividem em áreas do conhecimento e estas áreas ainda são divididas por linhas de pesquisa. Em cada uma destas podem ser encontradas diferentes abordagens, ou seja, diversas formas de tratar o real. Se na academia, lugar onde trabalham os especialistas, o conhecimento alcançou uma fragmentação como nunca se viu, como é tratado o conhecimento nas escolas, onde trabalham os professores, trabalhadores da educação, cuja tarefa é ensinar uma ampla gama de conhecimentos? Se na academia os pesquisadores se dividem entre as áreas das ciências da natureza e das ciências sociais e dentro destas divisões ainda há outras, como por exemplo, a História, a Sociologia, a Antropologia, a Bioquímica, a Fisiologia, e a Biomecânica, como chega ao professor de Educação Física Escolar o saber que ele deve ensinar?

    O debate em torno da identidade da Educação Física e a diversidade de proposições acerca de sua metodologia de ensino demonstra a riqueza e o avanço nas discussões epistemológicas da área. No debate acadêmico temos formulações consistentes, idéias claras e bem fundamentadas, a partir de diferentes referenciais teóricos e podemos observar que estas formulações geralmente apresentam uma coerência interna. Na prática pedagógica, ao contrário, parece haver outra lógica, na qual a complexidade, o senso comum, as ideologias, desejos e necessidades dos professores, alunos e gestores escolares, impedem a aplicação literal de uma determinada proposta teórica na realidade concreta.

Abordagens propositivas da Educação Física Escolar

    Com o intuito de se opor a uma vertente mais tecnicista, esportivista e biologicista da Educação Física Escolar, surgem novos movimentos, principalmente no final da década de 70, inspirados no momento histórico e social por que passou o Brasil, a Educação de uma maneira geral e a Educação Física, mais especificamente.

    A partir da década de 80, surgem calorosas discussões sobre a Educação Física e, em especial, a Educação Física Escolar. Tais discussões abordaram questões referentes às concepções de Educação Física no tocante ao trato do conhecimento no âmbito escolar. A partir daí, a formação do professor também passou a ser discutida, bem como sua concepção filosófica, o tipo de sociedade que desejava e sua metodologia de ensino. Este cenário, revelador de uma crise conceitual, impulsionou uma aproximação com as ciências sociais, como também a ampliação dos espaços de produção científica, onde o modelo de Educação Física Escolar, juntamente com seus conteúdos, metodologia e objetivos a serem alcançados, poderiam ser repensados e superados. Taffarel (1999:21) faz esta análise afirmando:

    A crise não é só da identidade da Educação Física, ou de consciência como discutimos no final dos anos 70 e início dos anos 80. Não é somente epistemológica a crise dos paradigmas científicos e educacionais como discutimos em meados dos anos 80 e início dos 90. (...) é uma crise profunda de decomposição do capitalismo imperialista senil, ou como alguns preferem crise societal, colapso, exaustão das possibilidades civilizatórias do capitalismo.

    A partir de então, os modelos e métodos utilizados passaram a ser criticados por não mais atenderem aos propósitos da escola, visto que as discussões teóricas daquele momento histórico demandavam o surgimento de novas formas, métodos, propostas metodológicas e conteúdos da Educação Física Escolar. Ou seja, as novas tendências passam a buscar um olhar crítico e um objeto de estudo na Educação Física, no intuito de compreender o homem em sua totalidade. Verdadeiramente, o que existiu nas décadas de 80 e 90 foi uma efervescência da teoria da Educação Física, em que várias correntes de pensamento estruturaram suas bases teóricas a partir de um viés epistemológico. Desta forma, as teorias serão analisadas a partir de um modelo de sociedade e de homem que irão defender, definindo os objetivos da Educação Física no processo de formação dos indivíduos.

    Neste estudo, utilizamos o esquema montado por Castellani Filho (1998:65) quando relaciona as concepções propositivas sistematizadas e não sistematizadas da Educação Física, afirmando:

    As idéias contidas neste texto fundamentam-se em livros e artigos publicados, em sua maioria, a partir da segunda metade dos anos 80, quando passamos a viver no interior da Educação Física, um momento de anunciação do novo, daquele que surge não pela pura e simples eliminação do velho, mas sim pela sua apreensão e subseqüente superação.

Abordagens propositivas não sistematizadas

Abordagens propositivas sistematizadas

Desenvolvimentista

Aptidão física/saúde

Construtivista

Aulas abertas

Crítico-superadora

Crítico-emancipatória

Plural

Das propostas à materialização: experiências e produções na busca da sistematização

    Conforme discutido anteriormente e com base na literatura, é correto afirmar que muito do conhecimento que está sendo produzido nas Universidades e Faculdades acerca da Educação Física Escolar, ainda não chega nem às salas de aula, nem às quadras, ou seja, o que se configura como hegemônico, são práticas pedagógicas ultrapassadas e descontextualizadas das principais discussões da Educação Física e da Educação Física Escolar, mais especificamente, e da Educação de forma geral. Ademais, muitos professores já com significativa experiência profissional, ignoram a existência de abordagens que proponham caminhos para a Educação Física Escolar e sequer sabem em qual delas sua prática estaria enquadrada. Com isso, seguem com suas aulas atendendo (ou não) às demandas que lhes são impostas.

    É com base neste quadro apresentado, que julgamos importante trazer a este trabalho, proposições que não se configuram como hegemônicas, mas que apontam para caminhos possíveis de serem percorridos. Foram descritas neste estudo cinco experiências de professores de Educação Física, estudiosos da área, que buscam em sua prática cotidiana, ir além do conhecimento acadêmico, procurando desfazer ou, pelo menos, diminuir o hiato existente entre a produção acadêmica e as aulas de Educação Física na escola.

    São experiências enquadradas em diversas abordagens propositivas, sistematizadas ou não, reveladoras do interesse em construir conhecimento a partir dos seus próprios referenciais, sem perder de vista em momento algum, a possibilidade de avançar em busca de novos conhecimentos.

    Diante do que foi apresentado em cada relato, percebemos que existem pontos de proximidade e de distanciamento entre eles. Proximidade no que diz respeito à importância da Educação Física como disciplina curricular, que precisa estar atrelada ao projeto político pedagógico da escola; em reconhecer a importância da execução de ações planejadas juntamente com demias profissionais que compõem a comunidade escolar –professores de Educação Física, professores de outros componentes curriculares, coordenação, dentre outros; em garantir que o aluno tenha acesso à diversidade de elementos que compõem a cultura corporal, garantindo, portanto, a socialização do conhecimento produzido pela humanidade.

    Contudo, existem outros pontos que estabelecem diferenciações entre os cinco relatos apresentados. Em três destes relatos, fica clara a importância dada ao registro por parte do professor e do aluno, entendendo este como um instrumento fundamental para análise do trabalho, garantindo a documentação dos saberes sistematizados; o entendimento de que a escola é um espaço fundamental no processo de formação de cada indivíduo em sua criticidade, autonomia, sensibilidade e cidadania, e de que a Educação Física pode contribuir decisivamente neste processo; a defesa por uma ação diretiva do professor, sem desconsiderar a participação dos alunos na construção das aulas.

    No tocante à avaliação, destacam-se os relatos de dois professores. Tais relatos se aproximam quanto à importância dada à mesma, e se distanciam quanto aos objetivos a ela atribuídos. Em um destes relatos, a avaliação tem um caráter formativo, onde não apenas são levantados dados, mas estes contribuem diretamente na análise do percurso dos alunos e também do professor, tendo o processo como fio condutor e não simplesmente na busca pelo resultado. Já no outro relato, a avaliação tem, meramente, uma função de coleta de dados numéricos, que pouco ou nada acrescentam à formação crítica e cidadã dos alunos.

    Concluímos, portanto, com base nos relatos apresentados, que cada professor se encontra num processo de entendimento da Educação Física Escolar, de sua importância e inserção na sociedade. Acreditamos serem profissionais comprometidos com esta área do conhecimento que percebem, na sua prática, a possibilidade de seguir aprendendo, construindo uma Educação Física que cumpra a sua função social, contribuindo na formação do indivíduo e na construção de uma sociedade mais justa, na qual o conhecimento não seja privilégio, mas sim direito de todos.

Considerações finais

    Vimos que no âmbito da Educação Física Escolar, coexistem várias concepções que buscam romper com modelos anteriores. Estas abordagens são resultantes da comunicação entre diversas teorias psicológicas, sociológicas e concepções filosóficas, que têm ampliado as reflexões na área, bem como sua prática, aproximando a Educação Física das ciências humanas. Apesar de enfocarem a Educação Física de forma diversa, e muitas vezes divergente, é inegável o fato de que buscam agregar à sua prática uma articulação das múltiplas dimensões do ser humano.

    No tocante à sistematização do conhecimento, ao estudarmos cada abordagem, podemos verificar que cada uma contribui, dentro da sua especificidade, para que este processo se estabeleça. Várias são as contribuições, embora, neste estudo, destacaremos aquelas que nos pareceram mais evidentes na análise das abordagens.

    A primeira contribuição que destacamos se dá no plano da socialização do conhecimento produzido pela humanidade. Entender a Educação Física como espaço para socializar o conhecimento produzido no campo na Cultura Corporal se constitui em um avanço significativo, quando nos reportamos à época anterior à década de 80, quando sequer se podia entender esta disciplina como integrante, de fato, do currículo escolar. A Educação Física, em muitas escolas, ainda é vista como um apêndice, um setor desconectado dos propósitos e projetos que envolvem o ambiente escolar. Portanto, faz-se necessário entender a escola como espaço fundamental para que a produção e a sistematização do conhecimento aconteçam, partindo da socialização do conhecimento já produzido até aquele momento histórico, buscando entender criticamente de que maneira esta produção aconteceu.

    É fundamental a compreensão de que o conhecimento é patrimônio da humanidade, não uma aquisição exclusiva de determinado grupo da sociedade. Pertence a todos e deve estar a serviço da coletividade, não de interesses particulares. Este propósito de socializar amplamente o conhecimento acerca da cultura corporal está presente em abordagens como a Plural e, especialmente, a Crítico-Superadora. Também podemos destacar a contribuição das abordagens Construtivista e Crítico-emancipatória, que apresentam uma ampliação do conteúdo a ser abordado nas aulas de Educação Física, constituindo-se em um avanço significativo quando comparado ao preconizado nas abordagens Desenvolvimentista e da Aptidão Física e Saúde, que limitam o conhecimento ao desenvolvimento de habilidades motoras ou da aptidão física.

    Uma segunda contribuição refere-se ao estabelecimento de um objeto de estudo claro. Ainda que algumas concepções não se aprofundem quanto à sistemática das aulas, ou sugiram abordagens práticas para atingir aquilo que propõem, identificamos neste estudo, que cada uma delas sinaliza um determinado caminho conceitual. A Crítico-Superadora e a Plural, partem da cultura corporal para estabelecer os seus conteúdos, enquanto que a Construtivista foca o jogo como principal conteúdo/estratégia e a Crítico-Emancipatória centra-se na discussão do esporte. A concepção da Aptidão Física e Saúde propõe a organização de programas de atividade física na escola. Ainda que identifique significativas limitações desta abordagem, entendemos que a mesma estabelece um objeto de estudo claro – a aptidão física. Esta abordagem foi bastante evidenciada em um dos relatos, no qual um grupo de professores de Educação Física, criou um programa de vigilância nutricional dos alunos, entendendo que, com este trabalho, trariam boas contribuições para a comunidade escolar.

    O entendimento de que a Educação Física está inserida na escola, tem sua função específica e contribui para a concretização do Projeto Político Pedagógico, também, na nossa análise, se configura como uma terceira contribuição das abordagens propositivas.

    Todas as abordagens apresentadas neste estudo surgem no intuito de romper com modelos ultrapassados e retrógrados de Educação Física Escolar, os quais pouco contribuíram para a sua legitimação, ou melhor, contribuíram sobremaneira para a sua marginalização curricular e o distanciamento das demais áreas do conhecimento, fato este comprovado, com o surgimento dos departamentos de Educação Física das escolas, local onde ficavam guardados os materiais esportivos e seus professores.

    As abordagens propositivas dão uma importante contribuição quanto à mudança do olhar para a Educação Física na escola. Não se trata mais de um olhar limitado somente a formação de um corpo obediente, mas avança, entendendo o aluno como um ser humano, vivo, histórico, ator social e produtor de cultura.

    Uma quarta contribuição é que as abordagens apontam caminhos metodológicos para que o conhecimento seja produzido e sistematizado. Seja através da solução de problemas (DESENVOLVIMENTISTA), da motivação e incentivo (APTIDÃO FÍSICA E SAÚDE), do resgate do conhecimento do aluno (CONSTRUTIVISTA), dos temas geradores (AULAS ABERTAS) ou da tematização da cultura corporal (PLURAL e CRÍTICO-SUPERADORA). O que a literatura nos informa sobre o histórico da Educação Física antes dos anos 80, deixa evidente o quanto estas abordagens promovem um salto qualitativo, propondo caminhos metodológicos que vão além das práticas de adestramento físico, atribuindo à Educação Física, um sentido para existir na escola.

    Entendemos que a introdução destas abordagens, enriquecem sobremaneira o debate da Educação Física e ampliam a visão da área, tanto no que diz respeito à sua natureza, quanto no que se refere aos seus pressupostos pedagógicos de ensino e aprendizagem. As dimensões psicológicas, sociais, cognitivas, afetivas e políticas foram reavaliadas e enfatizadas, concebendo o aluno como ser humano integral. Os objetivos educacionais foram ampliados, indo para além da lapidação de um corpo que pudesse sustentar a atividade intelectual.

    As abordagens discutidas neste trabalho, concretizadas nos relatos de cinco professores, foram formuladas especialmente para criticar o modelo esportivista e biologicista que dominou (e ainda domina) a Educação Física na escola.

    Ao concluir este estudo, à luz da literatura e das experiências práticas aqui descritas, reconhecemos o longo caminho que temos a percorrer na busca das aproximações necessárias entre estas e outras abordagens que por ventura venham a surgir, pelas quais somos todos responsáveis.

Referências

  • CASTELLANI FILHO, L. Política educacional e Educação Física. Campinas: Autores Associados, 1998.

  • COLETIVO DE AUTORES. Metodologia do ensino da Educação Física. São Paulo: Cortez, 1992.

  • LIBÂNEO, J. C. Didática. São Paulo: Cortez, 1990.

  • OLIVEIRA, A. A.B. Metodologias emergentes no ensino da Educação Física. Revista de Educação Física da UEM, v.8, n.1, p.21-27, 1997.

  • TAFFAREL, C. N. Z. . Entrevista com Celi Taffarel: Políticas Públicas e Educação Física & Esportes no Brasil: reformas ou ruptura?. Pensar a Prática, Goiânia- GO, v. 02, p. 01 - 23, 30 jun. 1999

  • VAGO, T.M. Educação Física escolar: temos o que ensinar? Revista Paulista de Educação Física, p. 20-26, 1995. Suplemento 1.

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