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Ato contra o Pan Rio '07, organizada no dia da abertura.
22 anos em 37 minutos.
Eu vou andar de trem... Você também...?

   
Estudante de Educação Física
(Brasil)
 
 
Gabriel Rodrigues Daumas Marques
info@efdeportes.com
 

 

 

 

 
Na estação do Engenho de Dentro, pude "apreciar" as obras sendo feitas às pressas, passarelas sendo montadas, paredes sendo pintadas, guindastes sendo erguidos para que o famoso "Engenhão" fique pronto para os "nossos" Jogos Pan-Americanos. O nome do estádio? Será João Havelange! Quem o construiu? Centenas de trabalhadores, que não estarão dentro do espaço que construíram durante as festividades e os jogos, pois, além de estarem realizando o trabalho pesado enquanto outros compravam seus ingressos pela internet, dificilmente poderiam usar o suado dinheiro de seu sustento para tal fim.
 

 
http://www.efdeportes.com/ Revista Digital - Buenos Aires - Año 12 - N° 110 - Julio de 2007

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    22 era o número de anos que completava na última quarta-feira dia 30 de maio. Mas 37 foram os minutos que levei sobre os trilhos do Engenho de Dentro até Nova Iguaçu, município onde em breve estarei lecionando Educação Física. Além de estar comemorando meu aniversário, estava ansioso para resolver as pendências de minha convocação após aprovação no concurso público.


    Apesar de pouco mais de meia hora, esse período fez-me refletir e entender que esse foi um dos aniversários mais interessantes e instigantes de minha vida. Na estação do Engenho de Dentro, pude "apreciar" as obras sendo feitas às pressas, passarelas sendo montadas, paredes sendo pintadas, guindastes sendo erguidos para que o famoso "Engenhão" fique pronto para os "nossos" Jogos Pan-Americanos. O nome do estádio? Será João Havelange! Quem o construiu? Centenas de trabalhadores, que não estarão dentro do espaço que construíram durante as festividades e os jogos, pois, além de estarem realizando o trabalho pesado enquanto outros compravam seus ingressos pela internet, dificilmente poderiam usar o suado dinheiro de seu sustento para tal fim.


    Já não faltava pagar a passagem, mas veio o velho trem! E velho mesmo, bem cacareco, apesar dos R$2 que nos cobraram. Nos 8 vagões, para cada pessoa sentada, havia 2 ou 3 em pé, que também pagaram passagem. Nesse trem obsoleto, fiquei imaginando quando a SuperVia lucrava às nossas custas duas vezes: através dos impostos revertidos em obras e novos trens (e nós no velho trem...) pagos pelo Governo do Estado do RJ e da passagem que acabamos de pagar. Parte desse dinheiro é usada para a contratação de capitães do mato, seguranças que expulsam, expropriam, ameaçam e até violentam os que chamarei de mercadores ambulantes.



    O trem caminha... E lá vêm: BANANADA 10 CENTAVOS! 3 AMENDOINS POR 1 REAL! Cotonetes, balas, utensílios domésticos etc. eram vendidos nos diversos vagões! Até os piratas Piratas do Caribe 3 me foram oferecidos! Como o brasileiro é criativo; esse é o povo do futuro. E tentam nos vender essa idéia, pois nós nos viramos diante das dificuldades. Esses mercadores ambulantes não entram para as estatísticas do desemprego. Silêncio!!!!! Próxima estação. E de vagões eles trocam, prestando atenção e escondendo suas especiarias para que os capitães do mato não realizem a sua repressão.



    Ouço uma música se aproximando, sons advindos de um belo acordeão. Que agradável e bacana - ingenuamente pensei: os R$2 me reservam o direito de ouvir música! Um senhor idoso e cego se equilibrava com o trem em movimento tocando o acordeão, solicitando humildemente alguns trocados e invocando a bênção de Deus para quem o ajudasse. Será que esse Deus de quem falamos nos deixaria chegar à situação calamitosa em que nos encontramos? Ao mesmo tempo, vejo nos olhos de um pai o amor fluindo, se segurando com uma das mãos e com a outra protegendo o filho de aproximadamente 5 anos de idade, que, de tanto insistir, ganhou um pé-de-moleque.


    Decidi olhar um pouco para fora do trem e me distrair com a paisagem. Distração? Boa ou má, deixo que opinem acerca de minha opção: casas, casebres e barracos construídos a poucos metros da linha do trem e junto a um rio que se transformou em puro esgoto! Não, não tinham peidado no vagão; o cheiro horrível vinha do lado de fora. Crianças brincavam com as pedrinhas dos trilhos e em ambientes asquerosos e adultos conseguiram ocupar alguns terrenos para criar um lar(?), uma moradia para não ficarem pelas ruas, avenidas ou embaixo de pontes.


    Uma lágrima escorreu. O trem parou e estava na estação onde devia descer. Percebi meus 22 anos passarem durante esses 37 minutos e consegui não apenas me solidarizar, mas me identificar na pele dos operários do "Engenhão", do senhor cego que tocava acordeão, do pai com um brilho nos olhos e o amor lançado ao filho, das dezenas de mercadores ambulantes que conseguem seu mísero sustento vagando de trem em trem durante horas de seus dias, das crianças que brincavam próximas aos trilhos e ao horrível cheiro de esgoto...


    Nesses 22 anos, pude ratificar o sentido que quero dar à minha vida, que não é individual, mas social. Eu quero estar ao lado dos que sofrem, das vítimas da fome e da miséria, dos que são oprimidos e explorados, assim como eu e a maior parte de vocês. É uma escolha de vida, um projeto de sociedade, pois é com essas pessoas que unirei forças para reverter essa situação e modificar os rumos dos trilhos. É no trem da contramão que eu quero andar. Vem no vagão comigo?

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revista digital · Año 12 · N° 110 | Buenos Aires, Julio 2007  
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