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Atribuições de causalidade para o sucesso e
fracasso em diferentes modalidades esportivas

   
* Mestrado em Ciências da Saúde pela Universidade de Brasília - UnB
resumo apresentado no Congresso de Psicologia do Esporte 2002.
**Doutor em Psicologia. Psicólogo do Esporte -
Pesquisador Associado da Universidade de Brasília
Professor do UNICEUB.
 
 
Rossana Travassos Benck*
Hiram Mario Valdes Casal**

rbenck@aip.com.br
(Brasil)
 

 

 

 

 
Resumo
    A atribuição de causalidade a um desempenho considerado como sucesso ou fracasso tem influência decisiva na performance esportiva futura de atletas. Essas diferentes atribuições afetam seus comportamentos motivados, por meio das medições das expectativas futuras e reações afetivas, provocadas pelas próprias atribuições. Nesta pesquisa procurou-se realizar um estudo exploratório das possíveis diferenças quanto à atribuição de causas ao desempenho desportivo em termos de sucesso e fracasso entre atletas de ambos sexos com idades entre 12 e 17 anos (Média = 14,7), representantes de quatro esportes olímpicos: ginástica olímpica e ginástica rítmica, natação, judô e basquete. Foi aplicada a 201 atletas a CDS II - Escala de Dimensão Causal II - traduzida ao português e validada no país (BENCK, 2002). Foram realizadas análises de variância múltipla - MANOVA - entre as variáveis independentes: modalidade, percepção de sucesso e fracasso, faixas etárias e gênero. Não foram encontradas diferenças significativas na atribuição de causalidade nas diferentes modalidades esportivas. As dimensões analisadas se mantiveram estáveis e coerentes com a Teoria Atribucional de Weiner (1979, 1985), isto é, os atletas tendem a atribuir as causas de seus sucessos a fatores internos e estáveis, independente das diferenças e das características específicas de cada modalidade.
    Unitermos: Motivação no esporte. Atribuições de causalidade. Sucesso e fracasso desportivo.
 
Resumen
    La atribución de causas a un resultado evaluado como éxito o fracaso tiene una influencia decisiva en el rendimiento deportivo de los atletas. Las diferentes atribuciones afectan los comportamientos motivados mediante las expectativas futuras y las reacciones afectivas provocadas por las propias atribuciones. En esta investigación se realizó un estudio exploratorio de las posibles diferencias en relación con la atribución de causas a los resultados deportivos evaluados como éxitos o fracasos entre atletas de ambos sexos con edades entre 12 y 17 años (Media = 14,7), representantes de cuatro deportes olímpicos: gimnasia (artística y rítmica), natación, judo y baloncesto. Fue aplicada a 201 atletas la Escala de Dimensión Causal - CDS II, traducida al portugués y validada en Brasil (BENCK, 2002). Fueron realizados análisis de varianza múltiple - MANOVA - entre las siguientes variables independientes: modalidad deportiva, percepción de éxito y fracaso, rango de edades y sexo. No fueron encontradas diferencias significativas en la atribución de causas entre las diferentes modalidades deportivas. Las dimensiones analizadas se mantuvieron estables y coherentes con la Teoría Atribucional de Weiner (1979,1985), esto es, los atletas tienden a atribuir causas de sus éxitos y fracasos a factores internos estables, independientemente de las diferencias y de las características específicas de cada modalidad.
    Palabras clave: Motivación deportiva. Atribuciones de causas. Exito y fracaso deportivo.
 
Abstract
    Causal attributions for a outcome evaluate as success or failure have a large and decisive influence in athletes performance. The differential dimensions of causal attributions affect the motivation behavior through future expectations and emotions reacts induced by the own attributions. This study presents an investigation of the factors underlying the attribution of causes for sports performances made by young athletes of both sexes with ages between 12 and 17 years old (Mean = 14,7) from different sport modalities, representing four Olympic sports: Artistic Gymnastics and Rhythm Gymnastics, Swimming, Judo and Basketball. The Causal Dimension Scale II - CDS II, translated and validated in Brazil (BENCK, 2002), was applied for two hundred and one athletes. Further Multiple Variance Analysis - MANOVA - showed no significant differences among the means of the factor scores for independent variables: sport modalities, success and failure perception, ages class and gender. The results of this study confirm the dimensions proposed by Attribution Theory of Weiner (1979, 1985) and showed that the athletes with greater perception of success attributed the causes of their successful performances to a greater personal control than the athletes with a perception of failure. In general, the athletes who perceive themselves as successful tend to attribute the causes for their success to internal and stable factors, regardless of their sport modality.
    Keywords: Sport motivation. Causal attribution. Success and failure in sport.
 

 
http://www.efdeportes.com/ Revista Digital - Buenos Aires - Año 10 - N° 92 - Enero de 2006

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Introdução

    A motivação no esporte e na atividade física é importante para a compreensão da aprendizagem e do desempenho de habilidades motoras devido ao seu papel na iniciação, manutenção e intensidade do comportamento (MAGILL, 1984).

    Inspirados principalmente na Teoria Atribucional de Weiner, (1972, 1985), os resultados de inúmeros estudos dos processos motivacionais parecem indicar que as atribuições de causalidade - definido como um processo cognitivo, mediante o qual se busca uma causa para um evento, uma conduta ou uma performance observada - constituem um fator importante na determinação do desempenho esportivo bem sucedido.

    O estudo de atribuições de causalidade para a vitória e derrota em competições esportivas possui um grande potencial para o entendimento do comportamento motivado no esporte e na educação física. O processo atribucional tem significativas implicações para situações esportivas, pois envolvem o processo social de comparação inerente ao esporte e a interação entre resultado e dificuldade da tarefa que irá determinar fortemente as inferências de habilidade.

    Os ambientes desportivos, repletos de situações de sucesso e fracasso, fornecem grandes oportunidades para a testagem da teoria de atribuição.

    Para Weiner (1985, 1992), a atribuição causal pode ser classificada de acordo com uma taxonomia ortogonal de 2x2x2, de três dimensões, com dois pólos: Locus de causalidade (causalidade interna versus causalidade externa), Estabilidade (causa estável versus causa instável) e Controlabilidade (causa controlável versus causa incontrolável) (VALLERAND e RICHER, 1988). O efeito dessas dimensões causais sobre o comportamento ocorre através da mediação das expectativas futuras e reações afetivas decorrentes.

    Nesse processo de orientação e motivação, o indivíduo tenta satisfazer suas necessidades a partir de generalizações baseadas nos sucessos e fracassos anteriores, adotando certos objetivos e rejeitando outros. Desta forma, os indivíduos, para os quais a situação foi satisfatória e recompensadora no passado, tenderão a abordar uma nova situação com a expectativa de que essa também será uma experiência satisfatória. Por outro lado, se a experiência for frustrante e estranha, tenderão a buscar satisfação em outro lugar, empregando seu esforço e sua engenhosidade em atividades que pareçam prometer maiores recompensas.

    A confiança ou falta de confiança desenvolvida pelo indivíduo no passado afetará a avaliação de suas possibilidades de realização no presente quase tanto quanto a sua capacidade ou a dificuldade real da tarefa (KLEIN e SCHOENFELD, 1941 apud PENTEADO, 1986). A falta de disposição para tentar, entendida aqui como desmotivação, é um modo que o indivíduo encontra para demonstrar e expressar seu baixo nível de aspiração e sua alta expectativa de fracasso. Por isso há necessidade de que os objetivos, expectativas e aspirações sejam realistas e coerentes com as condições individuais, pois é fundamental reconhecer que os sentimentos de sucesso e fracasso de cada pessoa dependem de quão bem ela atinge o que estava tentando fazer.

    Porém, sucesso e fracasso são estados psicológicos baseados na percepção individual subjetiva das implicações e das realizações de certas qualidades pessoais desejáveis. "Uma derrota não será sempre considerada como um fracasso por um indivíduo e uma vitória não será sempre um sucesso" (MAEHRS e NICHOLLS, 1980 apud ROBERTS, 2001).

    Indivíduos envolvidos no esporte fazem atribuições baseadas no resultado da atividade. Muitos pesquisadores (BUKOWISKI e MOORE, 1980; SPINK e ROBERTS, 1980; SINNOTT e BIDDLE, 1998; BIDDLE, 1999) investigaram o processo atribucional em atletas, chegando geralmente às seguintes conclusões: a vitória é atribuída a fatores internos (habilidade e esforço), enquanto a derrota é atribuída a fatores externos (sorte e dificuldade da tarefa). De acordo com a perspectiva de Heider (1958 apud DELA COLETA, 1982) ou a posição inicial de Weiner (1972), o conceito de sorte, esforço, dificuldade e habilidade têm a função de guiar as interpretações pessoais de seus resultados imediatos.

    Algumas evidências nos estudos desses autores sugerem que as atribuições feitas à derrota ou à vitória afetam a motivação e subseqüente performance dos atletas. Nesses estudos, indivíduos em situações esportivas que consistentemente venceram ou perderam, atribuíram os resultados a dimensões estáveis, particularmente habilidade. Experiências de sucesso podem levar o indivíduo a associar o resultado da atividade com uma atribuição interna e estável (habilidade), fazendo com que ele se motive para melhorar ainda mais o nível de performance. Por outro lado, o fracasso consistente pode levar os indivíduos a acreditar que têm pouca habilidade e eles poderão exercer pouco esforço em situações similares futuras e até evitar ou abandonar a atividade. A inferência de habilidade está fortemente relacionada à percepção de habilidade, ou seja, vencedores freqüentes atribuem alta habilidade como causa ou, quando a tarefa é considerada mais difícil, por exemplo, derrotar um adversário fácil, não propicia uma alta percepção de habilidade.

    As pesquisas sobre atribuição de causalidade cresceram tanto em interesse quanto em volume. Esses trabalhos têm sido reportados em recentes artigos (BRAWLEY e ROBERTS, 1984; VLACHOPOULOS, BIDDLE e FOX, 1997; SINNOTT e BIDDLE, 1998; DEWCK, 1999; SINGER, HAUSENBLAS e JANELLE, 2001 e ECLES e WIGFIELF, 2002). Especificamente no âmbito esportivo, Roberts e Pascuzzi (1979) sugerem, no entanto, que os quatro elementos identificados por Weiner (1972, 1992) - capacidade, esforço, dificuldade da tarefa e acaso - devem ser considerados com mais cautela no esporte e na atividade física; alertam também para que se faça uma diferenciação na natureza da tarefa tanto quanto no resultado, e que se dê mais atenção às dimensões de estabilidade e controlabilidade nas pesquisas com esportistas. Grove, Hanrahan e McInman (1991) sugerem que o esporte competitivo possa ser único em situação de pressão para internalização das causas. Em outros domínios da atividade, as pressões são bastante diferentes, e isso possivelmente faz com que o clássico viés de sucesso / fracasso seja mais evidente neste contexto.

    A atividade desportiva e seus diferentes tipos exigem dos desportistas um alto desenvolvimento de suas funções, qualidades e estados psíquicos, os quais estão presentes em todas as facetas da atividade exercida pelo atleta no processo de preparação e competição. No entanto, este desenvolvimento não é generalizado, deve-se levar em consideração a especificidade de cada tipo de esporte em separado.

    As principais diferenças se concentram na forma de avaliação, no conhecimento de resultado e no feedback que o atleta recebe ao final da atividade esportiva ou da competição. A percepção de sucesso também exerce influência decisiva na atribuição de causalidade, pois muitos esportes possuem uma forma clara e objetiva de vencer e perder, enquanto que em esportes como a patinação artística, a ginástica rítmica e a ginástica olímpica, vencer e perder são menos definidos e bem menos objetivos. Os ginastas, por exemplo, podem perceber sucesso e fracasso não em termos de primeiro ou último na classificação, mas em termos de realização pessoal, nível de excelência e contribuição para o resultado da equipe. Segundo Rudik (1973), os esportes podem ser classificados e descritos da seguinte forma:

Esporte de Combate - Neste grupo se incluem a luta livre, a esgrima, o judô, boxe e karatê. Nesses esportes, uma das particularidades mais importantes é que o desportista tem de enfrentar diretamente um adversário com o qual atua praticamente corpo a corpo. De modo que o atleta tem de superar não só a força física do adversário, mas também a tática que o mesmo utiliza.

    Tendo em vista que nos esportes de combate, as ações se realizam com grande rapidez e dinamismo, em períodos de tempo e espaço delimitados, com movimentos muito precisos e ajustados às situações de competição, estes esportes requerem um desenvolvimento altamente especializado das percepções que permitem a execução satisfatória de cada um dos movimentos técnicos e das ações táticas do desportista. Isso faz com que o atleta do judô tenha uma percepção imediata do seu desempenho, podendo assim fazer uma clara atribuição de causalidade da sua atuação, sendo que esta normalmente está isenta da influência do resultado anunciado pelo juiz.

  • Esporte de tempo e marca - Neste grupo temos esportes como: as provas de atletismo (corridas), o ciclismo e a natação. A característica mais relevante que distingue esses esportes é a capacidade de resistência. Estes atletas devem manter uma alta motivação que lhes dá a possibilidade de enfrentar a monotonia e os estados desfavoráveis do treinamento; devem também possuir um alto nível de aspiração ao rendimento, uma auto-estima adequada que lhes permita enfrentar e vencer qualquer obstáculo ou dificuldade que se apresente durante a realização das tarefas.

    Na natação, o atleta não tem contato direto com o adversário, seu confronto maior é com o cronômetro, pois tem como referência para sua percepção de resultado o tempo e não sofre, por sua vez, uma forte influência do julgamento externo. Portanto, fica evidente a importância da autovaloração de suas possibilidades e potencialidades.

  • Esporte de apreciação - Neste grupo se incorporam os esportes onde primam fundamentalmente as capacidades coordenativas e as expressões artísticas dos atletas, tais como a patinação artística, a ginástica rítmica desportiva, o nado sincronizado, os saltos ornamentais e a ginástica olímpica. Aos esportes de apreciação estão inerentes fortes vivências emocionais, pois estes estão associados à valorização estética durante suas execuções elegantes, virtuosas, complexas e dinâmicas. As apresentações provocam alegria e satisfação aos espectadores bem como ativam um mecanismo de feedback que permite reforçar e ativar comportamento do atleta, criando uma atmosfera de confiança e segurança em suas próximas atuações.

    A avaliação dos esportes de apreciação é determinada pela atividade do árbitro, ou seja, a obtenção de bons resultados competitivos possui um diferencial bem grande em relação aos outros esportes; o atleta tem que atuar em consonância direta com as expectativas e com as possíveis pontuações atribuídas pelos árbitros.

    No entanto, em pesquisa realizada por McAuley (1985), foram encontrados indícios de que a percepção de sucesso na ginástica olímpica está significativamente influenciada por como os ginastas percebem as causas de sua performance. As notas finais para a apresentação não parecem ter grande influência na determinação das explicações causais, mas sim a percepção de sucesso. Como os ginastas percebem a sua própria performance em termos de sucesso, pode ser uma função de características pessoais e contexto da situação. A consistência e estabilidade são fatores que mais afetam a atribuição de causalidade.

  • Esportes coletivos de contato - Neste grupo se incorporam os esportes tais como o futebol, pólo aquático e o basquetebol. Sabendo-se que estas modalidades exigem do atleta uma velocidade de interpretação e reação às diferentes situações de jogo, faz-se imprescindível que eles desenvolvam uma grande imaginação criadora, bem com um pensamento tático de caráter operacional. As inter-relações e interdependências entre os jogadores e toda equipe técnica devem estar em harmonia, ou seja, possuir um alto grau de compatibilidade psicológica.

    Segundo Carron, (1993 apud CRUZ, 1996), "uma equipe esportiva é um conjunto de indivíduos que possuem uma identidade coletiva, têm metas e objetivos comuns, partilham um destino comum, exibem interdependência pessoal e de tarefa e consideram-se como sendo um grupo".

    Ou seja, os membros de uma equipe se comunicam em relação aos assuntos de ordem social e da dificuldade da tarefa, estabelecem objetivos coletivos e pessoais, experimentam sucessos e insucessos elaborando atribuições causais e desenvolvem confiança pessoal e coletiva. No basquetebol o atleta se envolve em confronto direto com o adversário, exige um controle emocional maior. Suas avaliações e atribuições de causalidades podem estar mais sujeitas às interpretações e julgamentos do árbitro, técnico e companheiros de equipe.

    Levando em consideração as características abordadas acima e a faixa etária, este estudo busca determinar as atribuições de causas ao sucesso e ao fracasso nos jovens atletas e estabelecer as possíveis diferenças entre as modalidades pesquisadas.


Método

Amostra

    Participaram 201 atletas de ambos sexos, com idades entre 12 e 17 anos (Média = 14,7 e DP = 1,5), federados, atuantes e representantes de quatro esportes olímpicos. Os atletas participantes do estudo apresentam a seguinte distribuição nas diferentes características de avaliação de performance nos esportes: (1) Judô, 49 atletas, 24,4% da amostra (esporte individual de combate); (2) Natação, 50 atletas, 24,9% da amostra (esporte individual de tempo e marca); (3) Basquetebol, 51 atletas, 25,4% da amostra (esporte coletivo) e (4) Ginástica Olímpica e Ginástica Rítmica, 51 atletas, 25,4% (esportes individuais de apreciação). A distribuição estatística por modalidade e gênero pode ser observada na Tabela 1.

Tabela 1
Número de atletas participantes de acordo com o gênero e modalidade esportiva


Instrumento

    A versão brasileira da Escala de Dimensão Causal II (CDS II) foi desenvolvida com a tradução para o português do original de McAuley, Duncan e Russell (1992), a qual foi entregue para cinco juízes bilíngües que realizaram a tradução reversa para o inglês. A comparação das duas versões não revelou diferenças significativas na interpretação dos itens da CDS II.

    A CDS II em português é idêntica à escala original sendo uma escala onde o atleta avalia seu desempenho geral na sua modalidade esportiva, atribui uma causa para este desempenho e avalia as possíveis razões para esta causa, respondendo doze escalas de nove pontos ancoradas em seus extremos por expressões bipolares que refletem quatro dimensões da atribuição de causalidade.

    Cada atleta responde inicialmente a uma questão na qual se solicita que avalie seu desempenho geral em uma escala de sucesso e fracasso de sete pontos sendo 1 = fracasso absoluto e 7 = sucesso absoluto. Em seguida, faz uma atribuição causal de sua atuação respondendo uma pergunta aberta: "Na sua opinião quais são as causas dos seus resultados esportivos?" O atleta é, então, solicitado a pensar sobre a razão ou razões que apresentou na questão anterior e responder doze escalas de nove pontos ancoradas nos seus extremos por sentenças opostas representativas de quatro tipos de causas: três escalas para locus de causalidade (p. ex., "está relacionada a você versus está relacionada aos outros"), três escalas para controle pessoal (p. ex., "é gerenciável por você versus não é gerenciável por você"), três escalas para controle externo (p. ex., "está sob o poder de outras pessoas versus não está sob o poder de outras pessoas") e três escalas para estabilidade (p. ex., "é permanente versus é temporária").


Procedimentos

    Após a informação sobre os objetivos do estudo, a obtenção por escrito do termo de consentimento livre e esclarecido (preenchido pelos responsáveis no caso dos menores de idade) e a garantia do caráter voluntário da participação, os atletas foram orientados quanto ao preenchimento do instrumento. Os atletas do judô foram abordados em um único encontro realizado pela Federação Metropolitana de Judô para treinamento dos melhores judocas da cidade. Os atletas da ginástica olímpica e da ginástica rítmica foram abordados durante a realização dos V Jogos da Juventude realizados em Recife-PE, onde foi possível reunir os melhores ginastas do país nas categorias infantil e juvenil. Os atletas do basquetebol e da natação foram entrevistados em seus próprios clubes de atuação durante os treinamentos (Brasília, DF).


Resultados e discussão

    A solução fatorial revelou três fatores (explicando 57,14% da variância total) com 11 itens, (apenas itens com cargas fatoriais superiores a 0,30 foram incluídos, PASQUALI, 2001), o item 6 da escala CDS II original ("está dentro de você" versus "está fora de você") foi eliminado da versão brasileira por ser um item complexo apresentando cargas fatoriais em mais de um fator.

    Os fatores encontrados na escala validada por Benck (2002), foram: Fator 1, Controle Pessoal (alpha de Cronbach = 0,76), que ficou constituído por cinco itens representativos da causalidade e controlabilidade interna (é gerenciável por você, você pode regular, está relacionada a você e é algo sobre a qual você tem o poder); o Fator 2, Controle Externo (alpha de Cronbach = 0,63), ficou constituído por três itens (é algo sobre a qual os outros têm o controle, está sob o poder de outras pessoas e é algo que os outros podem regular) e o Fator 3, Estabilidade (alpha = 0,69), ficou com três itens (é permanente, é estável no tempo e não é modificável) (Tabela 2).

    Os resultados da análise mostram que 73,60% dos atletas apresentam uma percepção de sucesso; 6,0% possuem uma percepção de fracasso e 20,4% tem sua percepção indefinida (Tabela 3). Esta percepção de sucesso é uma fonte vital de informação para ajudar o atleta a persistir no treinamento. Segundo Magill (1984), o atleta precisa sentir se está melhorando e o quanto está melhorando para perceber e definir sua atuação em termos de sucesso e fracasso.

    Foram realizadas análises de variância múltipla - MANOVA - entre as variáveis independentes: modalidade, percepção de sucesso e fracasso, duas faixas etárias (igual ou acima de 15 anos e igual ou abaixo de 14 anos) e gênero.

    Os resultados da análise indicaram que os atletas com maior percepção de sucesso, em relação aos atletas com maior percepção de fracasso nos seus desempenhos gerais, consideram como mais estáveis as causas de seus resultados e as atribuíram a um maior controle pessoal (causa interna). Estes dados são coerentes com os apontados por Vlachopoulos, Biddle e Fox (1997); Biddle (1999) e Roberts (2001), os quais afirmam que atletas tomam como base os seus resultados para fazer as atribuições de causas e revelam que quanto maior a percepção de sucesso mais internas e estáveis são as causas das suas performances.

    Não foram encontradas diferenças significativas na atribuição de causalidade nestas diferentes modalidades esportivas. As três dimensões analisadas se mantiveram estáveis e coerentes com a Teoria Atribucional de Weiner (1972, 1992).

    Constatou-se que no Fator 1 - controle pessoal, obteve-se valores médios de 6,91, enquanto que no Fator 2 - controle externo, os valores médios encontrados foram 4,34 e no Fator 3 - estabilidade, os valores médios foram de 5,40. Isto significa que, em todas estas modalidades estudadas, os atletas tendem a atribuir as causas de seus sucessos a fatores internos e estáveis, independente das diferenças e das características específicas de cada esporte (Tabela 2).

    De forma geral, as variáveis independentes, nível de competição e faixa etária, não apresentaram diferenças significativas no âmbito das atribuições de causalidade. Resultados compatíveis com pesquisas descritas por Cruz (1996), que salientou a inexistência de diferenças atribucionais entre atletas de diferentes idades.

    No entanto foram encontradas interações significativas entre a variável gênero e as quatro modalidades, isto é, as ginastas percebem as causas de suas performances como mais internas (Fator 1 - controle pessoal = 7,47) e mais estáveis (Fator 3 - estabilidade = 6,36) do que os ginastas (F1 = 5,95 e F3 = 4,42).

    Nas modalidades judô, natação e basquete não ocorreram diferenças na atribuição de internalidade (controle pessoal) entre homens e mulheres.

    No fator estabilidade, os homens atribuem maior estabilidade do que as mulheres às causas de seus desempenhos quando praticam judô e basquete. Nessas duas modalidades os resultados coincidem com o estudo de Carron (1980, 1984 apud CRUZ, 1996), no qual os homens parecem considerar as causas de suas performances como mais estáveis do que as mulheres. Algumas evidências nos estudos de Bukowiski e Moore (1980) sugerem que indivíduos em situações esportivas que consistentemente venceram ou perderam, atribuíram os resultados a dimensões estáveis, particularmente habilidade.

Tabela 2
Valores Médios, número de itens, percentual de variância explicada e índices de consistência interna dos fatores que compõem a CDS II
(apenas itens com cargas fatoriais superiores a 0,30 foram incluídos).

Tabela 3
Freqüência por Percepção de Sucesso e Fracasso de acordo com a escala Likert da CDS II


Conclusão

    Os resultados estão de acordo com os obtidos por Bukowski e Moore, 1980 Spink e Roberts, 1980; Vlachopoulos, Biddle e Fox, 1997; Sinnott e Biddle, 1998; Biddle, 1999 e Roberts, 2001. De acordo com a teoria, os dados obtidos - 73,6% da amostra apresenta percepção de sucesso - confirmam as afirmações de que os indivíduos envolvidos no esporte fazem atribuições baseadas no resultado da atividade, de maneira que os sujeitos com maior percepção de sucesso atribuem as causas aos fatores mais internos e estáveis.

    Os dados desta pesquisa revelam que os atletas com maior percepção de sucesso, independente da modalidade esportiva, atribuíram as causas de seus resultados a um maior controle pessoal em relação aos atletas com percepção de fracasso, confirmando assim as pesquisas de Weiner (1974), com atletas vencedores e perdedores e suas atribuições.

    Supõe-se que estes resultados demonstram que a preparação destes atletas está adequada, pois experiências de sucesso podem levar o indivíduo a associar o resultado da atividade com uma atribuição interna e estável, fazendo com que o atleta se motive para melhorar ainda mais o nível de performance e garanta a persistência nos treinamentos.

    Embora algumas das análises tenham fornecido indicativos positivos de validade e fidedignidade da versão brasileira da CDS II, deve-se considerar com cautela a estrutura fatorial encontrada. Primeiro, a maioria dos atletas investigados considerou suas carreiras como bem sucedidas. Foi baixo o índice que apresentou uma percepção de fracasso. Segundo, a faixa etária dos atletas ficou restrita a jovens atletas.

    Em resumo, a pesquisa de atribuição abriu caminhos significativos na investigação e constitui um dos mais importantes ingredientes de qualquer teoria de motivação, mas não constitui uma teoria em si mesma. A teoria está focada sobre o porquê as pessoas têm uma expectativa de sucesso, mas não no porquê querem ter a expectativa de sucesso.

    O estudo demonstra a importância da atribuição causal numa perspectiva desportiva de sucesso e fracasso, mostra-se fundamental para viabilizar futuras pesquisas nesta área, bem como, sugere um contínuo esforço para investigar sobre atribuição causal e os fundamentos teóricos que estão por trás dela e tentar confirmar o papel atribuído às dimensões causais em diversos processos cognitivos, motivacionais e comportamentais.

    Essa abordagem mostra o efeito das atribuições de causalidade de fracasso e sucesso sobre a motivação e conseqüente comportamento e desempenho dos atletas e deixa claras as implicações da investigação do comportamento atribucional para técnicos e professores de educação física.


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