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O exercício profissional em Educação Física
aos olhos históricos e filosóficos da ética

   
Especialista em Fisiologia do Exercício
e Avaliação Morfofuncional
 
 
Michel Santos Silva
michellsantos@uol.com.br
(Brasil)
 

 

 

 

 
    A ética ilumina a consciência humana, sustenta e dirige as ações do homem, norteando a conduta individual e social. É um produto histórico-cultural e, como tal, define o que é virtude, o que é bom ou mal, certo ou errado, permitido ou proibido, para cada cultura e sociedade. A ética tem sido o principal regulador do desenvolvimento histórico-cultural da humanidade. Sem ética, ou seja, sem a referência a princípios humanitários fundamentais comuns a todos os povos, nações, religiões etc, a humanidade já teria se despedaçado até à autodestruição. No Brasil assistimos a uma degradação moral acelerada, principalmente na política. O tipo de desenvolvimento econômico vigente no Brasil tem gerado estruturalmente e sistematicamente situações práticas contrárias aos princípios éticos: gera desigualdades crescentes, gera injustiças, rompe laços de solidariedade, reduz ou extingue direitos, lança populações inteiras a condições de vida cada vez mais indignas. A atitude ética, ao contrário, é includente, tolerante e solidária: não apenas aceita, mas também valoriza e reforça a pluralidade e a diversidade, porque plural e diversa é a condição humana. A ética profissional estudaria e regularia o relacionamento do profissional com sua clientela, visando a dignidade humana e a construção do bem-estar no contexto sócio-cultural onde exerce sua profissão.Ela atinge todas as profissões e quando falamos de ética profissional estamos nos referindo ao caráter normativo e até jurídico que regulamenta determinada profissão a partir de estatutos e códigos específicos. A expressão ética e exercício profissional põe em relação à análise crítica dos valores morais que orientam os comportamentos - representada pela ética - com uma praxis humana especializada, ou profissão, que é a competência humana em agir sobre o mundo das coisas e dos seres vivos, de uma determinada maneira e com determinados instrumentos específicos, em vista de transformá-los para atingir determinados objetivos. Promover a saúde e a boa forma planejando e adequando exercícios ao perfil de cada pessoa, para exercer suas atividades na área, o profissional dominará as dimensões política e profissional constantes de sua formação acadêmica, assim como terá competência técnica e habilidade necessárias à elaboração, execução e avaliação de programas de atividades físicas adequadas aos vários segmentos de ensino formal, não formal, bem como programas atividades esportivas educativas, lúdicas, de lazer e competitivas. Deverá ser um profissional com visão crítica da história e das questões sociais brasileiras e, sobre tudo, identificar o processo de crescimento e desenvolvimento do ser humano e sua relação com as questões de ensino-aprendizagem. Assim, a nossa profissão é feita pelo amor e a vontade de tornarmos fortes e ocuparmos o nosso verdadeiro espaço em uma sociedade leal e digna de nosso empenho no que diz respeito ao crescimento físico, moral e intelectual dos cidadãos que ajudamos a formar.
 

 
http://www.efdeportes.com/ Revista Digital - Buenos Aires - Año 10 - N° 72 - Mayo de 2004

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Introdução

    A ética ilumina a consciência humana, sustenta e dirige as ações do homem, norteando a conduta individual e social. É um produto histórico-cultural e, como tal, define o que é virtude, o que é bom ou mal, certo ou errado, permitido ou proibido, para cada cultura e sociedade.

    Dessa maneira, a ética é universal, enquanto estabelece um código de condutas morais válidos para todos os membros de uma determinada sociedade e, ao mesmo tempo, tal código é relativo ao contexto sócio-político-econômico e cultural onde vivem os sujeitos éticos e onde realizam sua ações morais.


Ethos, ética, em grego designa a morada humana

    O ser humano separa uma parte do mundo para, moldando-a ao seu jeito, construir um abrigo protetor e permanente.

    A ética, como morada humana, não é algo pronto e construído de uma só vez.

    O ser humano está sempre tornando habitável a casa que construiu para si.

    Ético significa, portanto, tudo aquilo que ajuda a tornar melhor o ambiente para que seja uma moradia saudável: materialmente sustentável, psicologicamente integrada e espiritualmente fecunda.

    A ética não se confunde com a moral. A moral é a regulação dos valores e comportamentos considerados legítimos por uma determinada sociedade, um povo, uma religião, uma certa tradição cultural etc. Há morais específicas, também, em grupos sociais mais restritos: uma instituição, um partido político. Há, portanto, muitas e diversas morais. Isto significa dizer que uma moral é um fenômeno social particular, que não tem compromisso com a universalidade, isto é, com o que é válido e de direito para todos os homens. Exceto quando atacada: justifica-se se dizendo universal, supostamente válida para todos.

    A ética pode e deve ser incorporada pelos indivíduos, sob a forma de uma atitude diante da vida cotidiana, capaz de julgar criticamente os apelos a-críticos da moral vigente. Mas a ética, tanto quanto a moral, não é um conjunto de verdades fixas, imutáveis. A ética se move, historicamente, se amplia e se adensa. Para entendermos como isso acontece na história da humanidade, basta lembrarmos que, um dia, a escravidão foi considerada natural, ou que a Educação Física foi alvo de uma emenda parlamentar para ser banida dos currículos escolares.

    A ética é uma reflexão crítica sobre a moralidade. Mas ela não é puramente teoria. A ética é um conjunto de princípios e disposições voltados para a ação, historicamente produzidos, cujo objetivo é balizar as ações humanas. A ética existe como uma referência para os seres humanos em sociedade, de modo tal que a sociedade possa se tornar cada vez mais humana.


A Ética e a História

    A ética tem sido o principal regulador do desenvolvimento histórico-cultural da humanidade. Sem ética, ou seja, sem a referência a princípios humanitários fundamentais comuns a todos os povos, nações, religiões etc, a humanidade já teria se despedaçado até à autodestruição.

    O estudo da ética está bem descrita nos trabalhos dos filósofos gregos, como Aristóteles e Platão. O pensamento coletivo atual sobre ética pode ser encontrado em Aristóteles: "para o homem não existe maior felicidade que a virtude e a razão", isto é: a prática do bem, obtida através do exercício da virtude, é a felicidade e que ela deva ser praticada como ideal e como ato consciente.

    Alguns filósofos apresentam a ética como uma conduta volvida à realidade de cada época, portanto mutável. De qualquer modo, ao longo da história, o homem tem mudado a sua forma de pensar, estabelecida pelo que chamamos de PARADIGMAS.

    O paradigma muda devido às limitações do mesmo. Para isto, devemos fazer uma revisão histórica na história da ciência:

1. Na história da ciência, podem-se observar caminhos tortuosos de antecipações, rompimentos e retomadas de antigas concepções. Podem existir em uma mesma época, diferentes paradigmas, de modo que prevalecerá aquele que tiver melhores condições de explicar o objeto de análise. Por exemplo:

  • Concepções atomistas (Aristóteles) e sistêmicas (Anaximandro) na Grécia Antiga.

  • Concepções empiristas (Bacon) e racionalistas (Descartes), no século XVII.

  • Concepções newtonianas e holísticas, na atualidade.

2. Muitas das visões de mundo de cientistas e filósofos de determinadas épocas históricas sofreram influências bem mais antigas. Por exemplo, Arquimedes exerceu enorme influência sobre Da Vinci e Galileu. Este último que forneceu as bases para a sistematização da mecânica de Newton, o qual contribuiu para a formulação da Teoria da Relatividade. Da mesma forma, Copérnico recebeu influência de Ptolomeu, Plutarco e Aristarco, para a elaboração da teoria Heliocêntrica. Sobre este assunto, Popper declara no seu livro Conjecturas e Refutações (3ª edição, Ed. UnB, pág. 56) "o conhecimento não parte do nada, como também não nasce da observação. Seu progresso consiste nas modificação do conhecimento precedente"

3. os avanços da ciência, embora sejam contínuos, apresentam momentos de ruptura de paradigma, como na seqüência histórica abaixo:

  • Newton nasceu na Inglaterra em 1642 (ano da morte de Galileu Galilei). Galileu contribuiu para o desenvolvimento da dinâmica, do conceito de atrito e do conceito de inércia. Newton estabeleceu as leis da mecânica, relacionando-as com os movimentos dos corpos celestes, desenvolveu a teoria da gravitação e confirmou as leis de Kepler, desenvolveu o cálculo diferencial, bem como suas contribuições para a física óptica.

  • No século XVIII, destacaram-se Laplace, Voltaire, Lagrange e Lavoisier, que reforçaram as concepções deterministas e materialistas da ciência. Houve muitos avanços científicos como o desenvolvimento das ciências da vida (fisiologia, imunologia, botânica, zoologia, microbiologia, etc.). No âmbito tecnológico, Newcomen inventou a máquina a vapor, aperfeiçoada por Watt em 1777, revolucionando a indústria e os transportes.

  • No século XIX, pode-se destacar o seguinte: o desenvolvimento da eletricidade e do magnetismo onde se destacaram Faraday e Maxwell, propiciando muitas inovações tecnológicas, como o dínamo, o telégrafo, o rádio e o radar. A termodinâmica teve grande destaque, trazendo novos conceitos, como o princípio da conservação de energia, entropia, zero absoluto, calor, bem como o desenvolvimento das máquinas térmicas por Sadi Carnot. A Teoria da Evolução da vida, proposta por Darwin em 1859 foi outro marco de extrema importância na ciência.

  • O século XX foi o período mais fértil da história da humanidade, tendo gerado mais da metade de todo o acervo de conhecimento em ciência e tecnologia. Destacaram-se a Teoria da Relatividade de Einstein, a mecânica quântica, a cibernética (John Von Neumann e Norbert Wiener), o domínio da energia nuclear, as tecnologias de informação, as tecnologias aeroespaciais e a engenharia genética. Importantes avanços foram registrados na eletrônica, com a invenção da válvula termiônica e do efeito transistor. Neste período as atividades de C&T passam a ser coletivas, dependendo menos da genialidade e da inspiração de indivíduos isolados.

4. Nos últimos três séculos, o paradigma científico estabelecido foi o newtoniano, porém com o advento de uma série de novas teorias durante o século XIX e XX, como a Teoria da relatividade, a termodinâmica probabilística de Gibbs, a teoria da evolução de Darwin, o avanço da matemática (Poincarè, Mandelbrot, etc.), bem como pela existência de fenômenos complexos, até então inexplicáveis, está ocorrendo uma mudança de paradigma. Fenômenos como a desordem da atmosfera, as variações da população, crescimento econômico das nações, dinâmica de ecossistemas, todos altamente não-lineares, eram evitados pelos cientistas. Surgiu a Teoria do Caos, que trata dos processos, das relações e das lógicas dos sistemas, sob o aspecto do todo e suas conexões, evitando o reducionismo clássico. O estudo do caos tem sido integrador do conhecimento científico, antes organizado em disciplinas isoladas.


Ética no Brasil

    No Brasil assistimos a uma degradação moral acelerada, principalmente na política. O tipo de desenvolvimento econômico vigente no Brasil tem gerado estruturalmente e sistematicamente situações práticas contrárias aos princípios éticos: gera desigualdades crescentes, gera injustiças, rompe laços de solidariedade, reduz ou extingue direitos, lança populações inteiras a condições de vida cada vez mais indignas. E tudo isso convive com situações escandalosas, como o enriquecimento ilícito de alguns, a impunidade de outros, a prosperidade da hipocrisia política de muitos.

    A falta de ética mais prejudica a quem tem menos poder (menos poder econômico, menos poder cultural, menos poder político). A transgressão aos princípios éticos acontece sempre que há desigualdade e injustiças na forma de exercer o poder. Isso acentua ainda mais a desigualdade e a injustiça. A falta ou a quebra da ética significa a vitória da injustiça, da desigualdade, da indignidade, da discriminação. Os mais prejudicados são os mais pobres, os excluídos.

    A falta de ética prejudica o doente que compra remédios caros e falsos; prejudica a mulher, o idoso, o negro, o índio, recusados no mercado de trabalho ou nas oportunidades culturais; prejudica o trabalhador que tentar a vida política; prejudica os analfabetos no acesso aos bens econômicos e culturais; prejudica as pessoas com necessidades especiais (físicas ou mentais) a usufruir a vida social; prejudica com a discriminação e a humilhação os que não fazem a opção sexual esperada e induzida pela moral dominante etc.

    A atitude ética, ao contrário, é includente, tolerante e solidária: não apenas aceita, mas também valoriza e reforça a pluralidade e a diversidade, porque plural e diversa é a condição humana. A falta de ética instaura um estado de guerra e de desagregação, pela exclusão. A falta de ética ameaça à humanidade.

    Do outro lado, uma vida política saudável, transparente, representativa, responsável, verdadeiramente democrática, ou seja, ética, tem o poder de alavancar a autoconfiança de um povo e reerguer um país alquebrado e ameaçado pela desagregação.


Ética Profissional

    A ética profissional é um conjunto de normas de conduta que deverão ser postas em prática no exercício de qualquer profissão. Seria a ação "reguladora" da ética agindo no desempenho das profissões, fazendo com que o profissional respeite seu semelhante quando no exercício da sua profissão.

    A ética profissional estudaria e regularia o relacionamento do profissional com sua clientela, visando a dignidade humana e a construção do bem-estar no contexto sócio-cultural onde exerce sua profissão.

    Ela atinge todas as profissões e quando falamos de ética profissional estamos nos referindo ao caráter normativo e até jurídico que regulamenta determinada profissão a partir de estatutos e códigos específicos. Assim temos a ética médica, do advogado, do biólogo, etc.

    Acontece que, em geral, as profissões apresentam a ética firmada em questões muito relevantes que ultrapassam o campo profissional em si. Questões como o aborto, pena de morte, seqüestros, eutanásia, AIDS, por exemplo, são questões morais que se apresentam como problemas éticos - porque pedem uma reflexão profunda - e, um profissional, ao se debruçar sobre elas, não o faz apenas como tal, mas como um pensador, um "filósofo da ciência", ou seja, da profissão que exerce. Desta forma, a reflexão ética entra na moralidade de qualquer atividade profissional humana.

    Sendo a ética inerente à vida humana, sua importância é bastante evidenciada na vida profissional, porque cada profissional tem responsabilidades individuais e responsabilidades sociais, pois envolvem pessoas que dela se beneficiam.

     A ética é ainda indispensável ao profissional, porque na ação humana "o fazer" e "o agir" estão interligados. O fazer diz respeito à competência, à eficiência que todo profissional deve possuir para exercer bem a sua profissão. O agir se refere à conduta do profissional, ao conjunto de atitudes que deve assumir no desempenho de sua profissão.

    A Ética baseia-se em uma filosofia de valores compatíveis com a natureza e o fim de todo ser humano, por isso, "o agir" da pessoa humana está condicionado a duas premissas consideradas básicas pela Ética: "o que é" o homem e "para que vive", logo toda capacitação científica ou técnica precisa estar em conexão com os princípios essenciais da Ética.

    Constata-se então o forte conteúdo ético presente no exercício profissional e sua importância na formação de recursos humanos.

    Parece ser uma tendência do ser humano, como tem sido objeto de referências de muitos estudiosos, a de defender, em primeiro lugar, seus interesses próprios e, quando esses interesses são de natureza pouco recomendável, ocorrem sérios problemas.

    O valor ético do esforço humano é variável em função de seu alcance em face da comunidade. Se o trabalho executado é só para auferir renda, em geral, tem seu valor restrito. Por outro lado, nos serviços realizados com amor, visando ao benefício de terceiros, dentro de vasto raio de ação, com consciência do bem comum, passa a existir a expressão social do mesmo.


Ética e Exercício Profissional

    Uma classe profissional caracteriza-se pela homogeneidade do trabalho executado, pela natureza do conhecimento exigido preferencialmente para tal execução e pela identidade de habilitação para o exercício da mesma. A classe profissional é, pois, um grupo dentro da sociedade, específico, definido por sua especialidade de desempenho de tarefa.

    A questão, pois, dos grupamentos específicos, sem dúvida, decorre de uma especialização, motivada por seleção natural ou habilidade própria, e hoje se constitui em inequívoca força dentro das sociedades.

    A formação das classes profissionais decorreu de forma natural, há milênios, e se dividiram cada vez mais. Historicamente, atribui-se à Idade Média a organização das classes trabalhadoras, notadamente as de artesãos, que se reuniram em corporações.

    A divisão do trabalho é antiga, ligada que está à vocação e cada um para determinadas tarefas e às circunstâncias que obrigam, às vezes, a assumir esse ou aquele trabalho; ficou prático para o homem, em comunidade, transferir tarefas e executar a sua.

    A união dos que realizam o mesmo trabalho foi uma evolução natural e hoje se acha não só regulada por lei, mas consolidada em instituições fortíssimas de classe.

    A expressão ética e exercício profissional põe em relação à análise crítica dos valores morais que orientam os comportamentos - representada pela ética - com uma praxis humana especializada, ou profissão, que é a competência humana em agir sobre o mundo das coisas e dos seres vivos, de uma determinada maneira e com determinados instrumentos específicos, em vista de transformá-los para atingir determinados objetivos.

    Os objetos privilegiados da ética atualmente são aqueles da ética aplicada, em particular, da bioética, que trata dos dilemas morais que surgem com a saúde reprodutiva, a fecundação artificial e o aborto; os doentes terminais, a obstinação terapêutica e a eutanásia; dos doentes crônicos, dos transplantes e comércio de órgãos; dos cortes orçamentais dos Estados, da alocação dos recursos escassos e da equidade nas políticas públicas; do desenvolvimento das biotecnologias, da clonagem e da utilização da engenharia genética em campo biomédico; da poluição ambiental e das políticas de desenvolvimento; da pesquisa com seres humanos, etc. É nestes casos que surge a maioria dos dilemas morais contemporâneos.


Responsabilidade Ética

    Quando se fala, hoje em dia, de ética da responsabilidade, pensa-se habitualmente em Hans Jonas, pois é graças a ele que a expressão ética da responsabilidade se tornou mundialmente conhecida e debatida, fazendo dela uma tentativa de fundar uma moral universal, embasada num princípio mor, chamado princípio de responsabilidade, norteador de nosso agir na era da civilização tecnocientífica e biotecnocientífica. Mas, quem conhece também a obra de Max Weber, sabe que foi este autor a propor uma "ética da responsabilidade" pela primeira vez.

    O termo ética, como vimos, indica a análise crítica das normas e valores vigentes na moral do senso comum; o termo exercício, por sua vez, remete a praxis, ao agir transformador; e, por fim, profissional implica, a saber, uma ocupação competente e a vocação.

    Em suma, para Weber "o destino de nossos tempos é caracterizado pela racionalização e intelectualização e, acima de tudo, pelo 'desencantamento do mundo' pois precisamente os valores últimos e mais sublimes retiraram-se da vida pública, seja para o reino transcendental da vida mística, seja para a fraternidade das relações humanas diretas e pessoais".


Ética Profissional e Educação Física

    Promover a saúde e a boa forma planejando e adequando exercícios ao perfil de cada pessoa. Este é o principal objetivo do profissional de Educação Física, que também se preocupa em corrigir a postura e melhorar o desempenho cardiorrespiratório e muscular dos indivíduos. Para exercer suas atividades na área, o profissional dominará as dimensões política e profissional constantes de sua formação acadêmica, assim como terá competência técnica e habilidade necessárias à elaboração, execução e avaliação de programas de atividades físicas adequadas aos vários segmentos de ensino formal, não formal, bem como programas atividades esportivas educativas, lúdicas, de lazer e competitivas. Deverá ser um profissional com visão crítica da história e das questões sociais brasileiras e, sobre tudo, identificar o processo de crescimento e desenvolvimento do ser humano e sua relação com as questões de ensino-aprendizagem.

    A conquista e manutenção de uma boa saúde para uma melhor qualidade de vida são objetivos principais de todos em nossa sociedade, e a prática regular de atividades físicas e esportivas é fundamental neste processo. O acompanhamento e orientação de um profissional de Educação Física é reconhecidamente indispensável para a eficiência e segurança em todas atividades. O aumento constante desta prática em academias, clubes, parques, condomínios e até em casa, demonstra o crescente mercado de atuação para o profissional.

    A humanização da atividade física deve ser uma das preocupações deste profissional. Seu trabalho envolve a execução, orientação e assessoria do esporte e da atividade física, bem como a participação em projetos de saúde e educação para a comunidade. Assim, a adoção de uma postura ética e de cidadania é indispensável.

    No Brasil o profissional de educação física sempre foi um ser atuante ao longo da história do país, apesar de sua aprovação como profissão regulamentada só ter ocorrido ao final do século XX durante o governo do então presidente Fernando Henrique Cardoso. Porém, sua atuação começou a ser valorizada já no final do século XIX quando Rui Barbosa, no ano de 1882, solicitava a inclusão da ginástica nos programas escolares assim como também a equiparação dos seus professores aos de outras disciplinas.

    Partindo deste momento histórico ocorreu toda a evolução histórica do educador físico no Brasil até chegar ao ano de 1998 quando, finalmente, foi regulamentada a profissão de educação física no país. A justificativa para a realização de um artigo com este assunto reside no fato de acharmos importante que todos os profissionais de educação física tenham o conhecimento do desenvolvimento de sua profissão ao longo de diversos momentos históricos do país assim como também das pessoas que lutaram para que nossa atuação fosse cada vez mais valorizada perante a sociedade em que vivemos.

    Após a contribuição de Rui Barbosa na valorização do educador físico houve uma estabilização no processo de desenvolvimento da profissão, estabilização esta que durou até 1937 quando, no então governo Vargas, a nova constituição brasileira tornava obrigatória nas escolas primárias, normais e secundárias a prática da educação física. No ano de 1940 a educação física passou a ser obrigatória para a infância e juventude de todo o país e tal medida adotada pelo governo Vargas visava o fortalecimento do corpo, da saúde e do espírito patriótico, influenciado pela formação alemã e italiana. Em 1946, os professores Inezil Penna Marinho e Manoel Monteiro Soares iniciaram um movimento de propagação no sentido de haver a criação de uma "ordem" ou "conselho" para os professores de educação física, movimento este que não resultou em grandes transformações, mas que foi o ponta-pé inicial para o processo de regulamentação da profissão.

    Após isto quase trinta anos se passaram sem que ocorressem grandes contribuições ou mudanças em relação ao profissional de educação física até que, em 1972, durante o III encontro de professores de educação física realizado no Rio de janeiro, foi aprovado o interesse dos titulados em educação física em propor a criação dos conselhos federal e regionais reguladores da profissão assim como também o respectivo código de ética profissional. Nos anos seguintes a esta proposição ocorreram várias discussões a respeito da regulamentação da profissão, principalmente devido ao fato de que muitos achavam o termo "professor de educação física" pejorativo e profissionalmente estigmatizado. No final das contas tal discussão acabou não dando em nada e ainda veio a contribuir para um atraso na busca pelo processo de regulamentação da profissão. Em 1975, durante o governo militar, a educação física passou por profundas transformações em sua estrutura visto que com a aprovação da lei n. 6251/75 (institui normas sobre a educação física e desportos) a educação física e a prática esportiva passaram a ser vistos como instrumentos para atender aos interesses do governo, interesses estes que visavam o aprimoramento da aptidão física da população, a elevação do nível do desporto em todas as áreas, implantação e intensificação da prática do desporto de massa, elevação do nível técnico-desportivo dos representantes nacionais e a difusão dos desportos como forma de utilização do tempo de lazer. Desta forma buscava-se passar a imagem de que o Brasil era um país de pessoas vencedoras com habitantes de corpos atléticos e esbeltos e, assim, mascarar a verdadeira realidade observada na época, em que a ditadura reinava e a fome e a pobreza estavam sempre presentes.

    Passada a turbulenta época da ditadura militar pôde-se, em 1984, iniciar a primeira tentativa concreta para legalizar formalmente a regulamentação da profissão, proposta esta que foi aprovada no congresso nacional no ano de 1989, sendo, porém, vetada pelo presidente da época. Seis anos se passaram até que em 1995, durante o X congresso da federação internacional de educação física realizado na cidade de Foz do Iguaçu, foi lançado o movimento pela regulamentação da profissão de educador físico o qual tinha como objetivo arregimentar esforços junto aos segmentos da sociedade organizada com o intuito de finalmente regulamentar a profissão. Apesar de bater de frente com algumas resistências, este movimento finalmente se concretizou quando o deputado Eduardo Mascarenhas, também no ano de 1995, apresentou o projeto da lei n. 330/95 justificado pelos seguintes argumentos: é preciso que haja uma normatização e controle específico para o exercício da profissão de modo a frear a invasão do mercado de trabalho por pessoas não qualificadas e assim garantir a segurança de toda a sociedade praticante de atividades físicas; se faz necessária a participação do profissional de Educação física na elaboração de políticas públicas de desportos e; também se faz necessária à criação de um conselho ético profissional que normatize, oriente, discipline e fiscalize o mercado de trabalho e os profissionais nele inseridos. Tal lei foi aprovada em 01 de setembro de 1998 e seu conteúdo fala sobre a regulamentação da profissão de educador físico assim como também cria os respectivos conselho federal e conselhos regionais de educação física.


Conclusão

    Na Conferência Geral da Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura, celebrada em Paris, em sua 20a. reunião, no dia 21 de novembro de 1978, foi proclamada a "CARTA INTERNACIONAL DA EDUCAÇÃO FÍSICA E DO DESPORTO", onde em seu artigo primeiro destaca que "a prática da Educação Física e do Desporto é um direito fundamental para todos" e em seu inciso terceiro assinala que "se deverão oferecer oportunidades especiais aos jovens em idade pré-escolar, e as pessoas de idade avançada e aos deficientes, a fim de fazer possível o desenvolvimento integral de sua personalidade graças aos programas de Educação física e Desporto adaptados as suas necessidades".

    A Educação Física é uma profissão essencialmente multidisciplinar e, por isto, pode ser encarada com ênfases bem diversas. Uma simples olhada no passado da Educação Física mostra que ela já passou por várias destas ênfases e, no presente encontra-se, talvez, na busca de algo que melhor a identifique e justifique.

    Pode-se observar várias instâncias nas quais a Educação Física se afasta do processo educacional, como quando, por exemplo, priorizam-se os objetivos do desporto competitivo, preocupando-se com a performance e esquecendo-se dos objetivos de formar indivíduos e cidadãos, ou quando se ignoram diferenças individuais e da própria sociedade e se age como se existisse uma Educação Física única, adequada a todos, ou ainda quando se usa a Educação Física para moldar as pessoas e torná-las ajustadas à sociedade existente quando a finalidade da educação é preparar os homens para serem donos de seus destinos: cada um é que deve decidir se concorda ou não com a sociedade em que vive, se quer mantê-la ou mudá-la. Poder-se-ia citar ainda muitos outros desvios da Educação Física, mas estes são alguns dos mais comuns.

    A Educação Física se encontra quando tem como norte principal os da própria educação: atender a toda população naquilo em que ela é carente, procurar o desenvolvimento de indivíduos capazes, críticos e autônomos, partícipes responsáveis da sociedade, compromissados com os ideais democráticos.

    Deve-se observar que seja qual for o tipo de Educação Física ela sempre se fundamenta nas mesmas disciplinas. O que difere é o peso que estes conhecimentos têm e que provocam os enfoques tão diversos.

    Na visão educacional o ponto de partida é a realidade: onde vive o aluno e o próprio aluno. A meta é o indivíduo capaz, autônomo, a sociedade justa e o cidadão que é necessário para que esta sociedade venha a se instalar. O que está no meio do caminho entre a partida e a meta, é meio para se alcançar este fim e meios devem sempre ser subordinados aos fins.

    Buscar uma nova identificação epistemológica à Educação Física enquanto disciplina e profissão, parece ser um alvo importante das discussões nos últimos anos, tanto nos congressos acadêmicos quanto nas disciplinas de pós-graduação.

    Com a regulamentação da profissão e seu reconhecimento legal perante a sociedade, acreditamos que é necessário uma discussão mais apurada frente ao tema, haja vista que o nome de Educação Física, adotado para designar o profissional que atua na área de atividade física, não contempla todos os campos de atuação que estão à mercê do poder fiscalizador dos Conselhos Regionais.

    Entendemos ser imprescindível, antes de definirmos uma nova nomenclatura a ser adotada, deixarmos claro o campo de conhecimento e seus limites disciplinares. Sem um reconhecimento dos limites do campo de conhecimento nada adiantaria.

    Por fim, parece-nos estar claro que a delimitação de um campo de conhecimento específico para a Educação Física carecem de mais discussões. Enfatizando a necessidade de um envolvimento mais presente dos profissionais da área, fortalecendo este tipo de reflexão no âmbito acadêmico-científico. Não sejamos omissos, nem tomemos partido por conveniência, pois assumir uma postura político-profissional e agir em seu favor, é no mínimo uma questão de compromisso com a profissão. Uni-vos, profissionais de Educação Física, pois a nossa profissão é feita pelo amor e a vontade de tornarmos fortes e ocuparmos o nosso verdadeiro espaço em uma sociedade leal e digna de nosso empenho no que diz respeito ao crescimento físico, moral e intelectual dos cidadãos que ajudamos a formar.


Bibliografia

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  • BRACHT, Valter. Educação física e aprendizagem social. Porto Alegre: Magister, 1992.

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Outro artigos em Portugués

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