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Suplícios de um fenômeno: um estudo
de caso sobre a vida privada do atleta

   
Centro Universitário Positivo - UnicenP
(Brasil)
 
 
Vinícius Bettz Bailo
leomaiola@yahoo.com.br

 

 

 

 

 
Resumo
    Esse relato é uma tentativa de comparar passagens da vida de uma pessoa pública com os conceitos do livro "Vigiar e Punir" do filósofo francês Michel Foucault, onde o principal objetivo do estudo foi tentar compreender o quanto é complexo o cotidiano de uma pessoa pública, porque a vigilância da sua vida profissional e pessoal é muito intensa, a punição vem como conseqüência desse "assédio" e essas penas nem sempre são justas. Os fatos descritos nesse artigo são eventos ocorridos na carreira e na vida particular do jogador Ronaldo, considerado por muitos como um "Fenômeno".
    Unitermos: Vigiar e Punir. Vigilância. Punição. Ronaldo.

Trabalho apresentado à disciplina História da Educação Física e Esportes. Prof. André Mendes Capraro

 
 
http://www.efdeportes.com/ Revista Digital - Buenos Aires - Año 9 - N° 67 - Diciembre de 2003

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É proibido assistir aos Desfiles de Carnaval

    O fato ocorreu no carnaval de 2002, mais precisamente nos dias 11 e 12 de fevereiro de 2002. O jogador estava no Brasil passando pela fase final da recuperação da segunda operação realizada no seu joelho direito com o fisioterapeuta "Filé". Foram tiradas fotos do Ronaldo no sambódromo do Rio de Janeiro e essas fotos repercutiram mal na Itália. Mesmo estando longe de Milão o jogador foi observado e vigiado como se estivesse na cidade italiana. Ele estava no Brasil apenas assistindo aos desfiles na Sapucaí, local onde o contingente de pessoas da imprensa e de paparazzi era muito grande. No outro dia saíram várias matérias na mídia italiana que afirmavam que essas duas noites no sambódromo poderiam estar afetando sua recuperação, porque na Itália suas seções de fisioterapia estavam sendo feitas duas vezes por dia: de manhã e de tarde.

    Foi publicado que devido a essas noites "mal dormidas", Ronaldo teria feito seu tratamento de fisioterapia somente de tarde. A direção da Internazionale de Milão tomou atitudes contraditórias como podemos ver nas reportagens do dia 12 e 13 de fevereiro de 2002.

"...Ronaldo trabalha duas vezes por dia em sua recuperação. Sobre as fotos publicadas, é apenas um momento de relaxamento..."
(UOL ESPORTES - 12/02/2002)

    Já no dia 13 de fevereiro, saiu outra nota da mesma diretoria que dizia:

"...Ronaldo tem compromissos que deve respeitar. A Inter aceitou, ainda que com pouco entusiasmo, a decisão dele de prolongar sua permanência no Brasil. Mas agora é o jogador que não deve tomar decisões erradas, não deixando que os problemas cheguem a um ponto de ruptura..."
(REDAÇÃO TERRA ESPORTES - 13/02/2002)

    De acordo com as fontes, essas duas frases foram ditas pelo presidente da Internazionale de Milão, Massimo Moratti. Até o médico do clube veio ao Brasil para conversar com o jogador.

    De acordo, portanto, com a afirmativa de que "a justiça se fará à distância, com o objetivo mais elevado" (Foucault, 2000). Ronaldo estava no Rio de Janeiro, distante da Itália e como foi visto na segunda nota apresentada pelo site, a diretoria deixa claro uma conotação de ameaça, pois citam até o desligamento do jogador como meio de punição.


É proibido ter "carrão" importado

    Outro fato que pode ser analisado segundo o viés foucaultiano é o episódio da compra de sua Ferrari aqui no Brasil. Quando ele apareceu com o carro recém tirado da loja, todos o "puniram" com comentários negativos, dizendo que ele mostrava sinais de ostentação de sua riqueza. O ato da compra e passeios com seu "carrão" vermelho reluzente, ocuparam espaços generosos nos diversos meios de comunicação do país.

    Isso abalou o jogador, pois chegou-se a comentar que em um país pobre como o Brasil, Ronaldo poderia ter doado o dinheiro do valioso carro para a caridade.

"...três dias depois já estava arrependido. Não de ter feito a compra do carro, mas da forma como deixei o assunto ser tratado, pois acabou ficando a imagem de uma grande extravagância..."
(ESTADÃO - 18/07/1999)

    Segundo o autor do livro "Vigiar e Punir", "o castigo passou de uma arte de sensações insuportáveis a uma economia dos direitos suspensos" (Foucault, 2000), ou seja, penas isentas de dor física, mas com conotações psicológicas muito fortes. Os autores dessas críticas, por exemplo, não fizeram menção ao fato de que Ronaldo mantém uma Instituição, a chamada de R9, na capital carioca, cujo objetivo principal é afastar as crianças da marginalidade através do esporte.


É proibido ultrapassar o número de gols de Pelé

    Mais uma passagem que pode ser pensada de acordo com nessa teoria, foi quando Ronaldo pediu a recontagem de gols de Pelé na Seleção Brasileira. O "Fenômeno" foi criticado por vários ex-jogadores que acharam muita pretensão do atacante pedir isso para a CBF, achando que Pelé é rei e que ninguém conseguiria ultrapassá-lo nessa contagem.

"...o Ronaldo devia se pôr no seu lugar, levantar as mãos para o Céu e falar que está muito bom, porque só perde para o Pelé..."
(O DIA - 10/08/2003)

    Essas palavras foram do capitão do Tri, Carlos Alberto Torres, que, junto com a de vários outros ex-jogadores, engrossou o coro de que Ronaldo foi muito pretensioso ao querer quebrar a marca do "Atleta do Século".


É proibido trocar de agremiação

    Outro acontecimento que relata bem a punição isenta de dor que o jogador recebeu por sua ação, foi quando ele se transferiu da Internazionale de Milão para o Real Madrid.

    Na época, torcedores do clube italiano o chamaram de traidor como mostra a reportagem:

"...nas últimas mensagens publicadas pela imprensa italiana os torcedores acusam Ronaldo de 'traição', lembram que o jogador sempre foi bem tratado nos quatro anos em que esteve na Itália..."
(TERRA ESPORTES - 05/05/2002)

    Ronaldo foi acusado de "traição" pelos torcedores sem os mesmos saberem o que estava acontecendo com o jogador no Clube. Somente após três meses de sua saída da Internazionale é que Ronaldo resolveu quebrar o silêncio sobre o assunto e explicar o verdadeiro motivo sobre a troca do clube milanês pelo clube madrileno. O motivo era o então técnico da Inter, o argentino Héctor Cúper.

"...sei que com ele (Cúper) pus em risco minha carreira..."
(ESTADO DE SÃO PAULO - 27/09/2002)

    Nessa matéria publicada no Estado de São Paulo, o jogador afirma que o técnico agiu de má fé na fase final de sua recuperação chegando até a não seguir ordens médicas.


Considerações finais

    Observamos que a relação "Vigiar e Punir" enquadra-se não somente a atos de delinqüência como também, no dia-a-dia de qualquer pessoa comum ou famosa, dependendo de como seu comportamento ou ações possam implicar na sociedade em que vive. E quanto mais publica esta personalidade for, maior será a vigilância, pois qualquer cidadão pode se tornar um vigilante, e assim ocorrerá uma punição de cobrança social, muitas vezes mais eficiente do que o sistema carcerário.


Referências bibliográficas

  • Estadão - RONALDO faz mea-culpa e quer privacidade.. 18 de julho de 1999;

  • Estado de São Paulo RONALDO detona Cúper.. 27 de agosto de 2002;

  • FOUCAULT, Michel. Vigiar e Punir: nascimento da prisão. 23ª ed. Petrópolis. Vozes; 2000;

  • O Dia - CUIDADO, Ronaldo. Ele ainda é Rei.. 10 de agosto de 2003;

  • Redação Terra - TORCIDA da Inter detona Ronaldo.. 05 de agosto de 2002;

  • Redação Terra - INTER se irrita com folia e ameaça chutar Ronaldo. 13 de fevereiro de 2002;

  • UOL Esportes - CARNAVAL de Ronaldo repercute na Itália.. 12 de fevereiro de 2002;

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