efdeportes.com
Da crítica a educação física escolar
à educação física escolar crítica

   
Universidade Federal de Santa Catarina
(Brasil)
 
 
Prof. Ms. Fábio Machado Pinto
fabiobage@terra.com.br  
Profa. Mariana Lisboa Mendonça  
Profa. Amanda Jacobs
 

 

 

 

 
Resumo
    Este trabalho busca investigar o impacto da proposta pedagógica Crítico-superadora na Educação Física brasileira no período de 1992 a 2002. A proposta estudada foi elabora pelo Coletivo de Autores, através do livro Metodologia do Ensino de Educação Física, publicado no contexto das proposições pedagógicas Críticas. O livro aborda uma concepção de sociedade dividida em classes, e onde a pedagogia é a teoria e método que constrói discursos, explicações sobre a prática social e sobre a ação dos homens na sociedade. Discute uma proposta curricular que busca ordenar a reflexão pedagógica do aluno. Com base na psicologia soviética, propõe uma estrutura curricular em ciclos de escolaridade. Pretende, por meio da reflexão sobre a cultura corporal, potencializar a luta pela transformação educacional e democrática do país. Esta pesquisa trabalha com quatro fontes de investigação: a análise dos anais e revistas do CBCE; entrevistas e depoimentos dos autores; experiências de ensino correspondentes à proposta pedagógica; e a análise das principais obras que sustentam a proposta, divididas em três tópicos interligados. Este estudo busca oferecer uma síntese do empenho teórico-metodológico da área decorrente das últimas décadas, bem como oferecer subsídios para a consolidação de uma prática educativa em permanente exercício da crítica.
    Unitermos: Educação Física Escolar. Metodologia de Ensino. Marxismo.
 

Ponencia presentada en el IV Encuentro Deporte y Ciencias Sociales,
Buenos Aires, noviembre de 2002

 
 
http://www.efdeportes.com/ Revista Digital - Buenos Aires - Año 9 - N° 60 - Mayo de 2003

1 / 1

1. Introdução

    Esta pesquisa busca realizar um esforço reflexivo de síntese sobre uma das principais propostas pedagógicas da Educação Física Escolar, surgidas no final da década de oitenta e sistematizada pelo Coletivo de Autores1 , através do livro METODOLOGIA DO ENSINO DA EDUCAÇÃO FÍSICA, publicado no âmbito da coleção Magistério 20 GRAU - Série Formação de Professores. 2

    Segundo o próprio Coletivo (1992), o primeiro encontro do grupo ocorreu em agosto de 1990, em Campinas3 . Após meses de reflexão, estudos e debates, foram realizados pelo menos três seminários orientados mais fortemente pelas experiências de governos das Frentes Populares em municípios dos estados de São Paulo e Pernambuco4 .

    Além disso, a década de oitenta foi palco de um intenso debate acadêmico5 sobre o ensino da Educação Física Escolar, contextualizando-o no sistema educacional, e este, na sociedade capitalista brasileira. A crítica recaiu sobretudo nas práticas educativas corporais que priorizavam o desenvolvimento da aptidão física e de habilidades motoras relacionadas ao esporte competitivo e a caserna. Na maioria das vezes partindo de um referencial teórico de orientação marxista, exercitaram a crítica contundente e a partir de diferentes abordagens ampliaram a reflexão sobre a Educação Física e sua interação com a sociedade.

    Estávamos em plena abertura democrática6 , e em curso as primeiras experiências de governos no campo da esquerda. Em Recife, tivemos um intenso movimento de elaboração de uma proposta para Educação Física. Esta proposta foi a base teórico metodológica de sustentação do que depois se denominou Pedagogia Crítico Superadora.

    Hoje, após dez anos de diálogo com a comunidade acadêmica podemos perceber o quanto a Educação Física ampliou suas fronteiras, sendo o Coletivo de Autores uma das suas principais referências. Para além, das abordagens técnico-biologizantes muito se produziu no campo das ciências humanas e sociais. O corpo passou a ser abordado pela antropologia, sociologia, filosofia e história, entre outras. Enfim, a Educação Física consolidou-se enquanto um campo acadêmico extremamente rico no que tange a necessidade de articulação com as mais diferentes áreas do conhecimento, resultando por exemplo, em novas propostas teórico/metodológicas para o ensino da Educação Física Escolar.


2. Um passeio pela crítica à Educação Física

    Em 1983, com A Educação Física cuida do corpo e... mente, Medina chama a atenção para que a educação não se realizam de forma neutra e independente. Não se tornam práticas educativas se distantes dos costumes, das classes sociais, da política, de uma ética, de uma estética e, enfim, do contexto existencial mais amplo que as envolvem. (P. 32) Para além de propor uma classificação relacionada as perspectivas da época, propõe um projeto de libertação onde a saída seria pela revolução, capaz de mudar consciências e buscar subsídios novos para a transformação de nossas ações práticas, utilizando-se de uma metodologia questionadora, crítica, combativa.

    Em 1985, com Educação Física: competência técnica e consciência política em busca de um movimento simétrico, Carmo vêm entender a Educação Física como uma atividade transformadora (...) onde o professor pode encontrar a sua identidade social a luz de uma visão histórico-cultural de classe e, no interior de sua prática desportiva e/ou educativa, a emolução do espírito crítico, da denúncia, do conflito, da contra-educação... p.45

    Em 1986, com Concepções Abertas no Ensino da Educação Física, Hildebrant & Laging apresentam uma metodologia bastante ousada para o ensino da Educação Física. Pautados na experiência alemã, na crítica ao modelo conservador/opressor das práticas corporais adestradoras, invertem o processo colocando o aluno como centro do processo pedagógico. Buscam, desta forma, capacitar os alunos para tratar de tal modo os conteúdos esportivos nas mais diversas condições, dentro e fora da escola, que estejam em condições de criar, no presente ou no futuro, sozinhos ou em conjunto, situações desportivas de modo crítico, determinadas autonomamente ou em conjunto. (p. 05) O Modelo de aula aberta prevê ainda uma metodologia direcionada a ampliar o grau de possibilidades de co-decisão com os alunos, onde o planejamento do professor dá lugar a uma orientação dos desejos e interesses dos estudantes, como forma de ampliar a sua inserção nas aulas, na sociedade e, sendo assim, no mundo.

    Em 1991, os Grupos de Trabalho Pedagógico7 reúnem-se para elaborar uma proposta tendo como base a teoria de aula de Educação Física aberta às experiências dos alunos sob perspectiva didático-pedagógica, humana e política e social. Assim, partem do diálogo com o pensamento pedagógico geral no Brasil, representados pelos trabalhos de Freire (1983 a, b) Pedagogia do Oprimido, educação como prática da liberdade, Gadotti (1984), Diálogo e conflito, Saviani (1985) Democratização da escola e Libâneo (1986), Democratização da Escola Pública. Buscam, sobretudo, uma formação para a ação, segundo Hildebrandt (1985), apud GTP UFSM/UFPE (1991) pessoas que possam atuar em diversos setores da sociedade, mas que, ao mesmo tempo, estejam interessadas no desenvolvimento de uma sociedade democrática e que sejam capazes de participar racionalmente na mudança desta sociedade.

    É neste mesmo sentido, que Kunz publica em 1992 Educação Física: ensino e mudanças. Elabora uma síntese da sua pesquisa8 sobre práticas educativas, refletidas a partir dos conceitos de mundo vivido e de mundo de movimento humano relacionados às identidades culturais e às implicações políticas e sociais da atuação educativa. Partindo da crítica à Invasão cultural, as domesticações tecnológicas, feitas originalmente por Freire (1970), e que vieram ampliar a crítica ao adestramento do corpo humano, o autor busca formular algumas perspectivas para a Educação Física e suas transformações práticas. (P. 15). Este trabalho, vai se consolidar ao longo da década de 90, servindo de leitura obrigatória para nos cursos de formação de professores, até a publicação de transformação didático-pedagógica do esporte, em 1994. Mais uma vez, presta grande contribuição a área ao apresentar uma proposta didático-pedagógico centrada no ensino dos esportes.

    Neste trabalho, aprofunda o vínculo com a Teoria Crítica da Sociedade, da Escola de Frankfurt. Trata-se de aceitar e entender o "pessimismo teórico" presente nos trabalhos de tendência crítica em Educação Física hoje, para se alcançar um "otimismo prático" com reais possibilidades de mudanças na prática pedagógica da mesma. (p. 08) A pedagogia Crítico-emancipatória busca articular uma prática do esporte condicionada a sua transformação crítica no interior da escola. Para isso, lança mão de uma pedagogia crítica vinculada a uma didática comunicativa. Segundo Kunz (1994), o aluno enquanto sujeito do processo de ensino deve ser capacitado para a sua participação na vida social, cultural e esportiva, o que significa não somente a aquisição de uma capacidade de ação funcional, mas a capacidade de conhecer, reconhecer e problematizar sentidos e significados nesta vida, através da reflexão crítica. (p. 31)


3. Primeiros passos para uma Educação Física crítica

    É neste contexto que o Coletivo de Autores publicam em 1992, a obra Metodologia de Ensino da Educação Física. Reportando-se a questões teórico-metodológicas da Educação Física Escolar apresentam um consistente debate entre duas possibilidades no campo pedagógico, a Reflexão sobre a Cultura Corporal ou Desenvolvimento da Aptidão Física.

    Para tanto, os autores contextualizam já no primeiro capítulo a concepção de sociedade e educação9 que irá nortear todo o trabalho. Entendendo a sociedade dividida em classes, antagônicas e em permanente contradição, apresentam os interesses imediatos e históricos que cada uma busca. Articulados a estes, surge a concepção de educação, enquanto teoria e método que constrói discursos, explicações sobre a prática social e sobre a ação dos homens na sociedade, onde se dá a educação. Neste sentido, a reflexão pedagógica será Diagnóstica, Judicativa e Teleológica. Ou seja, parte da observação da realidade social concreta e contraditória, naquilo que ela tem de singular ao universal - os alunos, a escola, a comunidade, a sociedade - para então, interpretar, compreender, sintetizar e sistematizar cada situação, a fim de encaminhar o processo pedagógico na direção dos seus interesses de classe.

    Enfatiza ainda, que a Educação Física é uma prática educativa inserida no contexto escolar, portanto deve ser pensada no contexto do currículo. Pois estes têm a função social de ordenar a reflexão pedagógica do aluno de forma a pensar a realidade social desenvolvendo determinada lógica. Tendo como pressuposto um contexto curricular ampliado, onde a lógica norteadora atende aos princípios da dialética - totalidade, movimento, mudança qualitativa e contradição - propõe uma dinâmica a fim de criar as condições para que se dêem a assimilação e a transmissão do saber escolar.

    Esta dinâmica curricular procura observar o trato com o conhecimento; a organização escolar: do tempo e do espaço pedagógico, bem como a normatização escolar: o sistema de normas, padrões, registros, etc. Com destaque para os Princípios Curriculares no Trato com o Conhecimento, quais sejam: a relevância social dos conteúdos; contemporaneidade dos conteúdos; adequação as possibilidades sócio-cognoscitivas dos alunos; simultaneidade dos conteúdos enquanto dados da realidade; espiralidade da incorporação das referências do pensamento; e a provisoriedade do conhecimento.

    Outra reflexão importante, busca a superação do currículo fragmentado em séries de ensino, para uma proposta de ensino por ciclos de aprendizagem. Com base na Psicologia Soviética10 , apresentam quatro ciclos de escolarização: educação infantil a 3a série o ciclo de organização e identidade dos dados da realidade; 4a a 6a série, o ciclo da iniciação a sistematização dos dados da realidade; da 7a a 8a série, o ciclo da ampliação da sistematização do conhecimento; e o ensino médio, o ciclo de aprofundamento da sistematização do conhecimento.

    Partindo destes pressupostos, os Autores buscam a superação da Perspectiva para Educação Física Escolar, que historicamente vêm investindo no desenvolvimento da aptidão física. Argumentam, que esta perspectiva encontra-se na defesa dos interesses da classe no poder, mantendo a estrutura da sociedade capitalista. Busca, por sua vez, educar o homem forte, ágil, apto, emprendedor, que disputa uma situação social privilegiada na sociedade capitalista. Enquanto que a perspectiva da Reflexão sobre a cultura corporal busca contribuir para a firmação dos interesses das classes populares, desenvolvendo uma reflexão pedagógica sobre o acervo de formas de representação do mundo que o homem tem produzido no decorrer da história, exteriorizadas pela expressão corporal. E ainda, está orientada de forma a articular a Luta pela transformação educacional, democracia do país e Prática transformadora.

    A segunda parte do livro dedica-se a elaborar uma síntese histórica11 apontando tendências dominantes na Educação Física brasileira. Mostra, por exemplo, como diferentes concepções apresentam diferentes respostas para pergunta: o que é a Educação Física? Para o Coletivo de Autores, Educação Física é uma prática pedagógica, que no âmbito escolar, tematiza formas de atividades expressivas corporais como: jogo, esporte, dança, ginástica, formas estas que configuram uma área de conhecimento que podemos chamar de cultura corporal.

    A terceira e quarta parte do livro dedicam-se a apresentar uma proposta teórico/metodológica para o ensino e avaliação na Educação Física escolar. Os elementos principais deste programa apontam para o conhecimento de que trata a disciplina; o tempo pedagogicamente necessário para o seu processo de apropriação; e os procedimentos didático-metodológicos para ensina-los.

    Tendo como princípio a democratização do conhecimento historicamente acumulado, a pedagogia crítico-superadora aponta para a historicização dos conteúdos, bem como para a tematização enquanto instrumento didático.12 A crítica as práticas avaliativas e seus processos metodológicos são o objeto da quarta e última parte. Para o Coletivo, a ênfase na busca do talento esportivo e no aprimoramento da aptidão física vem condicionando, em parte, a aula e o processo avaliativo. Considerando a avaliação como um dos aspectos essenciais do projeto pedagógico, buscam encontrar nesta uma referência para a análise da aproximação ou distanciamento do eixo curricular que norteia o projeto pedagógico na escola.13

    Desde então, a obra Metodologia do Ensino da Educação Física passa a ser leitura obrigatório nos cursos de formação de professores de Educação Física. Inúmeras experiências pedagógicas acontecem simultaneamente em diferentes estados do Brasil. O próprio estado de Pernambuco, passa de orientador a orientado pela nova proposta. 14 Uma análise prévia dos anais do Congresso Brasileiro de Ciências do Esporte, dos anos de 1993 a 2001, evidenciou a utilização da obra como referência bibliográfica em grande parte dos textos apresentados e publicados.

    Na década de noventa o debate sobre o ensino da Educação Física escolar é partilhado com inúmeras outras polêmicas. Pergunta-se, por exemplo sobre qual o estatuto epistemológico da Educação Física? Educação Física é ciência? Buscando articular estas questões, entre outros que possam surgir no percurso desta pesquisa, partiremos da análise e reflexão sobre o impacto desta obra, de grande circulação acadêmica, seja no âmbito da produção do conhecimento, ou ainda no trabalho pedagógico de professores de Educação Física. Ao mesmo tempo em que nos propomos a um esforço de revisão das suas três principais orientações teóricas, quais sejam: aspectos da Filosofia Marxista, da Pedagogia Histórico Crítica e da Psicologia Soviética.

    Gostaríamos ainda de proporcionar um reencontro dos autores com a sua obra. A fim de provocar um diálogo que nos ajudasse a entender o contexto da elaboração do texto. Respondendo, por exemplo, quais foram as principais polêmicas? Quais questões ficaram de fora e quais sobreviveram ao intenso debate? Quais foram os critérios definidores da escolha dos autores? Outras questões referentes ao período que sucede a sua publicação: como acompanharam a apropriação da proposta pela comunidade acadêmica? Quais experiências se destacaram neste período? E ainda, questões relativas a nossa conjuntura: depois de dez anos qual a atualidade da obra? O que pode ser feito deste importante trabalho no presente momento histórico?

    Após dez anos, a Pedagogia auto-denominada crítico-superadora nos proporciona elementos para a reflexão sobre: concepção de homem/sociedade, currículo/ciência, educação - teórico/metodológica problematizadas pelo Coletivo de Autores. Em que pesem os anos da sua publicação, seja no campo da pesquisa ou ainda intervenção pedagógica ainda estamos dando os primeiros passos. Vale ressaltar que o debate sobre as teorias pedagógicas da Educação Física ainda apresenta muitas lacunas, que só poderão ser preenchidas à medida que aprofundemos o estudo sobre cada uma das proposições, explicitando seus limites e seus projetos para a Educação e a Educação Física brasileira.


4. Intenções metodológicas de pesquisa

    Esta pesquisa engendra o projeto acadêmico do Núcleo de Estudos e Pesquisa Corpo Educação e Sociedade - NUPECES / MEN / CED / UFSC. Nossa intenção ao desenvolver este trabalho é a de trazer novos elementos para pensar uma teoria sobre a educação do corpo em ambientes educacionais, em específico os relacionados com a Escola Pública brasileira. Para isso, buscamos uma articulação com o grupo de pesquisa da Universidade Estadual de Pernambuco, os quais vêm desenvolvendo pesquisas sobre a proposta Crítico-superadora. Assim, inscreve-se na mesma perspectiva da obra estudada, que dez anos atrás buscou articular estudiosos de diferentes estados brasileiros para pensar uma Educação Física voltada aos interesses da sociedade brasileira, em específico dos trabalhadores e seus filhos, na maioria freqüentadores das escolas públicas brasileiras.

    Nosso objetivo é investigar e refletir sobre a obra Metodologia de Ensino da Educação Física, proposta pelo Coletivo de Autores, em 1992, bem como seu impacto na área de Educação Física nos dez anos que seguem a sua publicação. Assim, buscaremos nos próximos meses: identificar e refletir sobre os pressupostos teóricos utilizados pelo Coletivo de Autores, com ênfase nas polêmicas ocorridas que desdobraram em questões presentes e ausentes na obra; identificar na fala dos sujeitos do Coletivo de Autores, aspectos da história, do contexto social, político e do debate acadêmico no período que vai da sua publicação até os nossos dias; verificar e Analisar o conjunto de publicações - anais de congressos e periódicos - que tenham como referência ou dialoguem com a proposta do Coletivo de Autores e; observar, Analisar e refletir trabalhos pedagógicos implementados no âmbito dos estados, municípios e/ou escolas públicas brasileiras que tenham como referência principal a pedagogia crítico-superadora. Esta pesquisa insere-se no contexto de uma proposta investigativa que tem como orientação, por um lado a Pesquisa Matricial relacionada ao estudo das Práticas Corporais e Cuidados com o corpo em Ambientes Educacionais, do Núcleo de Pesquisa e Estudos Corpo, Educação e Sociedade / MEN /CED /UFSC, e por outro lado, busca uma articulação com o grupo de pesquisa da Universidade Estadual de Pernambuco.

    Assim, tomamos como princípio teórico-metodológico a obra Crítica da Razão Dialética, mais especificamente Questões de Método15 . Para Sartre (2002:33) "O princípio que preside a pesquisa é o de procurar o conjunto sintético, cada fato, uma vez estabelecido, é interrogado e decifrado como parte de um todo; é sobre ele, pelo estudo de suas carências e de suas sobre-significações que se determina, a título de hipótese, a totalidade no seio da qual voltará a encontrar a sua verdade".

    Procuramos através da revisão da literatura da obra pesquisada, refletir sobre a articulação de três abordagens citadas: a filosóficas, a psicológica e a pedagógica. Sendo referências teóricas, no campo filosófico alguns aspectos abordados por Marx e posteriormente, em Gramsci; no campo psicológico, algumas contribuições da escola soviética, através do trabalho central de Vigotski, mas também de Davydov, Lúria, e Leontiev; e no campo pedagógico, as teses desenvolvidas por Saviani, Libâneo e Freitas, entre outros, como Enguita, Pistrak e Snyders.

    Destas abordagens podemos antecipar algumas possíveis categorias de análise: sobre a concepção de homem / sociedade: refletir, por exemplo, o processo de delimitação da concepção, o debate interno, as incertezas, as tensões, as sínteses possíveis, frente a consideração dos mesmos por estudos e intervenções posteriores que tiveram como base a proposta. Refletir a coerência teórica dos trabalhos realizados e os possíveis distanciamentos e aproximações da relação teoria e prática. Sobre a concepção currículo / ciência: refletir, por exemplo, as possíveis tentativas de implementação da proposta, e suas diferentes manifestações: desde as formas desarticuladas / desintegradas da totalidade do projeto educacional ou não. Sobre a concepção de trabalho pedagógico: refletir, por exemplo, as limitações da proposta que não dão conta de aprofundar aspectos relacionados a historicização e tematização dos conteúdos, os princípios curriculares no trato com o conhecimento - em específico a relação entre a cultura primeira e o conhecimento científico - bem como das práticas avaliativas. O encontro dos autores com sua obra busca alimentar o debate em torno da construção de uma teoria pedagógica para Educação Física. Os principais instrumentos metodológicos à serem utilizados nesta atividade seria a entrevista semi-estruturada, aplicada na forma de seminário aberto a participação pública, registrado em vídeo, bem como a análise histórica e teórica do debate realizado.

    Já a pesquisa sobre os trabalhos realizados pós Coletivo de Autores, tendo como referência o mesmo, concentra-se nas publicações dos anais dos Conbraces de 1993 a 2001 e nas revistas do RBCE. Visto que grande parte dos trabalhos de mestrado e doutorado tem vazão neste importante evento acadêmico. A metodologia utilizada na análise das publicações obedece a um roteiro semi-estruturado - identificação, caracterização e opção teórico metodológica do texto - com análise vinculada as categorias extraídas do processo investigativo.

    Por fim, a Investigação sobre os principais trabalhos pedagógicos em desenvolvimento que tenham como referência a obra, utilizará os instrumentos metodológicos elaborados pelos professores do NUPECES, ao longo dos últimos anos, na realização de projetos de ensino vinculados a disciplina Prática de Ensino de Educação Física escolar, bem como a Pesquisa Intitulada Cuidados com Corpo em Ambientes Educacionais.


Notas:

  1. Carmem Lúcia Soares, Celi Nelza Zülke Taffarel, Elizabeth Varjal, Lino Castellani Filho, Micheli Ortega Escobar e Valter Bracht.

  2. A Coleção magistério - 20 grau proposta e desenvolvida nos anos 1985-88, pela Coordenadoria para Articulação com Estados e Municípios do Ministério da Educação com apoio da PUC/SP e do Conselho de Reitores das Universidades Brasileiras. Os 25 livros didáticos da Coleção, abrangem disciplinas do núcleo comum e da habilitação Magistério, contribuindo significativamente na formação do professor do ensino fundamental ao médio, oferecendo material didático com conteúdo pautado pelo seu caráter científico e sistemático, em estreita ligação com exigências metodológicas do ensino e da aprendizagem.

  3. Destacamos aqui a articulação coordenada por Lino Castellani Filho ao propor incorporação ao seu documento Diretrizes Gerais para o Ensino de 20 grau: núcleo comum, Educação Física, elaborado em 1988, de toda experiência acumulada ao longo do tempo de sua exposição as críticas dos especialistas da área.

  4. Uma das contribuições vêm do estado de Pernambuco, com a publicação em 1989 do livro Contribuições ao debate do currículo em Educação Física: uma proposta para a escola pública, organizado por Michele Ortega Escobar na companhia de professores da rede estadual e da universidade do estado e de outras localidades.

  5. Medina (1983, 1986), Oliveira (1983, 1984), Cavalcanti (1984), Taffarel (1985), Bracht (1986), Hildebrant, R & Laging, R. (1986), Castellani Filho (1988), Tani (1988) e Kunz (1991).

  6. Movimento iniciado durante o regime militar, a partir de 1974 e sob a presidência de Ernesto Geisel e que se fortalece no início da década de 80 com o crescimento dos movimentos populares. Busca-se o fim da ditadura militar, da repressão e pela redemocratização do país. Na Educação Física, surge por exemplo o Colégio Brasileiro de Ciências do Esporte e ainda, o Encontro Nacional de Estudantes de Educação Física.

  7. Trata-se do grupo da UFPE - professores Celi Nelza Z. Taffarel, Eliane de Abreu Moraes, Merca do Carmo Andrade, Michele Ortega Escobar, Vera Luis Lins Costa e, do grupo da UFSM - professores Amauri ª Bassóli de Oliveira, Carlos Luiz Cardoso (org), Dr. Reiner Hildebrandt e Wenceslau Virgílio C. L. Filho.

  8. Este trabalho resulta da tese de doutorado realizado na República Federal da Alemanha, na Universidade de Hannover, concluído em 1987.

  9. Neste sentido, a concepção de sociedade e educação predominante na obra fundamenta-se em autores que buscam uma orientação no marxismo, como PISTRAK (2002), GRAMSCI (1984), ENGUITA (1989), SNYDERS (SD), e outros como, LIBÂNEO (1985), FREITAS (1987) e SAVIANI (1991).

  10. A Psicologia soviética, também auto-denominada de Histórico-Cultural, cuja principal referência é a obra de L. S. VYGOTSKY (1988), é ainda resultado de inúmeros trabalhos de autores como LEONTIEV (1981), DAVYDOV (1981), entre outros.

  11. Foram referências para o estudo da história da Educação Física, os trabalhos de ESCOBAR (1989), HOBSBAWN, (1981), SOARES (1990), MEDINA (1983), GHIRALDELLI JÚNIOR (1988), CASTELLANI FILHO (1991) e BETTI (1991).

  12. Aqui encontramos traços das propostas de TAFAREL (1985), HILDEBRANDT e LAGING (1996), ESCOBAR (1989), GTP - UFPE/UFSM (1991), KUNZ (1991), entre outros.

  13. Foram referência para o estudo das práticas avaliativas SOUZA (1986), MEDIANO E LUDKE (1989), LUCKESI (1986), WAISELFISZ (1990), entre outros.

  14. Informação concedida por Marcílio Souza Júnior, professor da Universidade Estadual de Pernambuco, que se dedica atualmente à uma revisão do texto após dez anos da sua publicação.

  15. Obra escrita por Jean Paul Sartre, em 1960, com o título original de Critique la raison dialectique precede de Questions de Méthode, e traduzida em 2002, por Guilherme João de Freitas.


Bibliografía

  • APPLE, Michael W. (1989) Educação e poder. Porto Alegre: Artes Médicas.

  • BETTI, Mauro. (1991) Educação Física e Sociedade. São Paulo: Movimento.

  • CASTELLANI FILHO, Lino. (1991) Educação Física no Brasil: História que não se conta. Campinas: Papirus.

  • CAVALCANTI, KÁTIA B. (1984) Esporte para todos; um discurso ideológico. São Paulo, Ibrasa.

  • CARMO, Apolônio Abádio do. (1985) Educação Física: competência técnica e consciência política em busca de um movimento simétrico.

  • CEDES, Cadernos. (1991) Currículos e programas: como vê-los hoje? 4 ed., No 13, Campinas.

  • COLETIVO DE AUTORES (1992) Metodologia do Ensino da Educação Física. São Paulo: Cortez.

  • CURY, Carlos Jamil. (1985) Educação e contradição. São Paulo: Cortez / Autores Associados.

  • BRACHT, Valter. (1986) A criança que pratica esporte respeita as regras do jogo... capitalista. In: Revista Brasileira de Ciências de Esportes7(2); p.62-80.

  • ________. (1989) Educação Física: a busca de autonomia pedagógica. In: Revista Brasileira de Ciências do Esporte. Vol. 1, n0 0, p28-34.

  • DAVIDOV, V. V. (1981) Tipos de generalización en la enseñanza. Habana/Cuba: Pueblo e educación.

  • DUARTE, Newton. (1999) Educação escolar, teoria do cotidiano e a escola de vigotski. 2a ed. Campinas: Autores Associados. (Coleção Polêmicas do Nosso Tempo, vol 55)

  • ENGUITA, M. F. (1989) A face oculta da escola. Porto Alegre: Artes Médicas.

  • ESCOBAR, Michele Ortega. (1989) Contribuições ao debate do currículo em Educação Física: uma proposta para a escola pública, Pernambuco: Secretaria de Educação de Pernambuco.

  • FREIRE, Paulo. (1983) Pedagogia do Oprimido. Rio de janeiro: Paz e Terra.

  • __________. (1983) Educação como Prática da Liberdade. Rio de Janeiro: Paz e Terra. (1970)

  • FREITAG, Bárbara. (1980) Escola, estado e sociedade. São Paulo: Cortez / Autores Associados.

  • FREITAS, Luis Carlos. (1987) Projeto Histórico: ciência pedagógica "didática'. In: educação e sociedade, no 27, pp. 122-40.

  • GADOTI, Moacir. (1985) Diálogo e Conflito. São Paulo: Cortez

  • GHIRALDELLI JÚNIOR (1988) Educação Física Progressista. A pedagogia crítico-social dos conteúdos e a Educação Física brasileira. São Paulo: Loyola.

  • GIROUX, Henri. (1986) Teoria Crítica e resistência em educação. Petrópolis: Vozes.

  • GRAMSCI, Antônio. (1984) Concepção dialética da história. Rio de janeiro: Civilização Brasileira.

  • GRUPO DE TRABALHO PEDAGÓGICO UFP/UFSM. (1991) Visão Didática da Educação Física: análise críticas e exemplos práticos de aula. Rio de Janeiro: ao livro técnico

  • HILDEBRANT, R & LAGING, R. (1986) Concepções Abertas no Ensino da Educação Física. Rio de Janeiro: Ao Livro Técnico.

  • HOBSBAWN, Eric. (1981) A era das revoluções. 3a ed. Rio de Janeiro: paz e terra.

  • KUNZ, Elenor. (1991) Educação Física: Ensino & Mudanças. Ijuí: Unijuí.

  • ________. (1994). Transformação didático-pedagógica do esporte. Ijuí: Unijuí.

  • LEONTIEV, Alexei N. (1981) Actividad, conciencia e personalid. Habana/Cuba: Pueblo e educación.

  • LIBÂNEO, José Carlos. (1985) Democratização da Escola Pública - a pedagogia crítico social dos conteúdos. São Paulo: Loyola.

  • LINO, Castellani Filho. (1988) Educação Física no Brasil: a história que não se conta. Campinas: Papirus.

  • LUCKESI, Cipriano. (1986) Avaliação educacional escolar: para além do autoritarismo. In: Revista da educação AEC. V. 15, n0 60, p. 23-27.

  • MEDIANO, Zélia e LUDKE, Hermengarda. (1989) O processo de avaliação dentro da escola. Relatório de pesquisa. Rio de janeiro, PUC, mimeo.

  • MEDINA, João Paulo S. (1983) A Educação Física cuida do corpo... e "mente". Campinas: Papirus.

  • MOREIRA, Antonio Flávio. (1990) Currículos e programas no Brasil. Campinas: Papirus.

  • OLIVEIRA, Vitor Marinho de. (1983) O que é Educação Física. São Paulo: Brasiliense.

  • _________. (1984) Educação Física Humanista. Rio de Janeiro: Ao Livro Técnico.

  • PINAR, William. (1978) The reconceptualization of curriculum studies. In: Journal of Curriculum Studies, 10(3): 205 - 214.

  • PISTRAK, M. (2002) Fundamentos da Escola do Trabalho. 2a ed. São Paulo: Expressão Popular.

  • SARTRE, Jean Paul. (2002) Crítica da Razão Dialética - precedido por Questões de Método; Texto estabelecido e anotado por Arlette Elkaïm-Sartre, tradução de Guilherme João de Freitas Tradução. Rio de Janeiro: DP&A.

  • SAUL, Ana Maria. (1988) Avaliação emancipatória: desafio à teoria e à prática de avaliação e reformulação de currículo. São Paulo: Mimeo

  • SAVIANI, Demerval. (1985) Escola e Democracia. São Paul: Cortez.

  • _________. (1985) educação - do senso comum a consciência filosófica. São Paulo: Cortez.

  • _________. (1991) Pedagogia Histórico-Crítica. Primeiras Aproximações. São Paulo: Cortez / Autores Associados.

  • SNYDERS, Georges. (SD) Escola, classe e Luta de Classes. Lisboa, Moraes.

  • SOARES, Carmem Lúcia. (1990) O Pensamento médico-higienista e a Educação Física no Brasil: 1850 a 1930. dissertação de mestrado, PUC/SP.

  • SOUZA, João Francisco. (1987) Uma pedagogia da revolução. São Paulo: Cortez / Autores Associados.

  • SOUZA, S. (1986) Avaliação da aprendizagem na escola de 10 grau: legislação, teoria e prática. Dissertação de Mestrado, PUC/SP.

  • TAFFAREL, Celi Zulke. (1985) Criatividade nas aulas de Educação Física. Rio de Janeiro: ao livro técnico.

  • TANI, Go. et al. (1989) Educação Física Escolar: fundamentos de uma abordagem desenvolvimentista. São Paulo: EPU/EDUSP.

  • VIGOTSKI, L. S. (1988) A formação Social da Mente. São Paulo: Martins Fontes.

  • __________. (1988) Pensamento e Linguagem. São Paulo: Martins Fontes.

  • __________. (1991) Obras Escogidas I. Madrid: Centro de publicaciones del M.E.C y visor distribuiciones.

  • __________. (1993) Obras Escogidas II. Madrid: Centro de publicaciones del M.E.C y visor distribuiciones.

  • VARJAL, Elizabeth. (1988) A supervisão educacional e a questão da democratização da escola. Dissertação de mestrado, UFPE.

  • WAISELFISZ, Jacobo. (1990) Avaliação participativa. In: Cunha. M. C. A. et alli. A construção do projeto de ensino e avaliação. FDE, Diretoria Técnica, p 59-65.

Outro artigos em Portugués

  www.efdeportes.com/
http://www.efdeportes.com/ · FreeFind
   

revista digital · Año 9 · N° 60 | Buenos Aires, Mayo 2003  
© 1997-2003 Derechos reservados