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O guarda-redes de Andebol
Emanuel Casimiro

http://www.efdeportes.com/ Revista Digital - Buenos Aires - Año 8 - N° 57 - Febrero de 2003

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1. Estado de orientação (6 - 10 anos)

    Esta fase caracteriza-se por não haver especialização do guarda-redes, os principais objectivos prendem-se com o facto de o jogador começar a conhecer o ANDEBOL e o seu próprio corpo, o manejo e o contacto com a bola são muito importantes. As sessões práticas devem incidir essencialmente sobre a coordenação e trabalho de equipa (o ANDEBOL é essencialmente um jogo colectivo), Olson (2000).

    É importante que as crianças percebam que têm dois braços e duas pernas e que o que conseguem fazer com os membros num dos lados também o conseguem fazer com o outro. Isto é muito importante para o guarda-redes pois na defesa da baliza é importante que este não tenha um “lado fraco”, daqui se pode concluir que devem ser sempre estimulados os dois lados do corpo e não apenas o lado forte.

    Um outro facto importante prende-se com a coordenação entre os membros superiores e inferiores. Nesta fase de desenvolvimento devem-se praticar todo o tipo de desportos e em todas as posições por forma a que haja um desenvolvimento harmonioso de todas as partes do corpo.

2. Os princípios do guarda-redes (10 - 12 anos)

    Nesta fase o principal objectivo é que o futuro guarda-redes se familiarize com a baliza, começando a ter noção dos princípios inerentes a este posto específico e a perder o “medo” da bola, também o contacto com esta é importante pelo que o trabalho com a bola deve ser mantido. É importante que o guarda-redes conquiste o seu lugar na equipa. Todos os jogadores devem passar por esta posição sem que seja imposto pelo treinador, eles próprios devem tomar a iniciativa. O treino com bolas mais moles e balizas mais pequenas deve ser contabilizado por forma a aumentar a segurança dos jovens quando se encontram naquele posto.

    O importante é que a bola não entre na baliza, os meios pelos quais eles o fazem tem pouca importância.

3. Formação do guarda-redes (12 - 15 anos)

    Esta fase caracteriza-se por ser a fase onde começa a especialização do guarda-redes propriamente dita, tem início também o trabalho de formação física (apenas com o peso do corpo, os pesos extras não são recomendados). Nesta fase é importante que o guarda-redes conheça as várias técnicas oriundas das várias escolas internacionais de guarda-redes, para que cada atleta possa, em função das suas características morfológicas, decidir qual a técnica específica que mais se adapta a si.

    Esta é a fase onde o jovem tem que decidir, em conjunto com o seu treinador, se quer ou não ser guarda-redes.

4. Evolução para o futuro (15 - 19 anos)

    Pela primeira vez o treinador pode-se dar ao trabalho de exigir que o guarda-redes se comporte como tal (que tenha atitude), dá-se continuidade especialização. Inicia-se também o trabalho conjunto com a defesa. Começa a ser dada mais importância ao factor físico (trabalho com pesos, saltos e multi-saltos) mas não só, o factor psicológico é de extrema importância. O guarda-redes em conjunto com o seu treinador deve procurar eleger uma técnica final adequada ás suas características.

    O trabalho com balizas mais pequenas pode ser implementado nesta altura, por forma a que o guarda-redes ganhe mais confiança na defesa das bolas dirigidas para dentro do seu espaço motor. Este treino deve ser feito de uma forma progressiva, i.e. o tamanho da baliza deve ser aumentado progressivamente até chegar ao tamanho normalizado.

    Nesta etapa todos devem assumir o facto de que o guarda-redes pensa, ele melhor do que todos os outros colegas de equipa consegue ler o jogo, desta forma deverá ocupar um lugar no topo desta hierarquia, deverá ser respeitado por todos.

5. Normal ou sensacional (dos 19 anos em diante)

    Esta é uma etapa onde se dá uma separação entre os guarda-redes normais e aqueles que são considerados os guarda-redes sensacionais. Nesta fase o guarda-redes deverá tomar consciência daquilo que é capaz de fazer, do seu estado físico e até quando pretende continuar a jogar.

    Nesta altura a técnica já deverá estar escolhida, agora o treino deverá incidir sobre a melhoria dos pequenos detalhes e procurar trabalhar sempre para melhorar a técnica, em consonância com a evolução do jogo.


3. Aquisição de uma técnica

    A principal ideia comum a todas as escolas de guarda-redes é evitar que a bola entre na baliza. No entanto existem outros aspectos técnicos que são comuns a todas elas. Deverão ser estes os aspectos fundamentais a ensinar ao jovem guarda-redes visto que este ainda não entrou numa etapa de especialização e ainda não escolheu uma técnica final. A assimilação destes aspectos técnicos comuns pode no futuro facilitar o especialização do guarda-redes numa só técnica que se adequada às suas características.

    Para Olson (2000, 2001), os principais aspectos técnicos comuns a todas as escolas de guarda-redes referem-se à posição das pernas e dos braços para além da atitude e do trabalho físico.

    A colocação das mãos deverá ser semelhante à de um pugilista, à frente do peito e à altura do queixo dentro do campo visual do guarda-redes, os dedos devem encontrar-se ligeiramente flectidos. Esta posição permite todo o tipo de deslocamentos laterais e em profundidade sem perda de equilíbrio. As mãos encontram-se, assim, no centro de actuação deste jogador, estão à mesma distância tanto nos remates para cima como nos remates para baixo, Olson (2000, 2001).


Fig. 1- Posição base na baliza

    Devemos evitar uma posição base de defesa onde os guarda-redes tenham a tendência de colocar os braços elevados acima da cabeça ou ligeiramente ao lado por forma a cobrir os ângulos de remate, são posições que retardam os movimentos, provocam desequilíbrios e acabam mesmo por se tornar desconfortáveis para os atletas.

    O trabalho dos membros inferiores é fundamental. A posição base deve ser obtida com os joelhos flectidos e os calcanhares ligeiramente elevados. Os pés deverão estar afastados oscilando a distância entre os 40 e os 70 cm, Olson (2000; 2001).

    Uma postura de pernas errada que algumas vezes se verifica em guarda-redes mais baixos caracteriza-se por estes defenderem nas pontas dos pés e com as pernas em extensão, pretendem assim compensar a sua falta de altura sem daí não tirarem nenhum proveito. A melhor forma de compensar esta falta de altura “é adoptar uma boa posição defensiva, o que aliado a uma boa forma física permite ter força suficiente para chegar ás bolas”, (Olson, 2001; pp. 19). Como meio privilegiado de impulsão deve-se sempre utilizar a perna contrária ao lado onde se dirige a bola, assim o guarda-redes tem sempre a outra perna livre para intervir em qualquer altura. Um bom trabalho de musculação pode ajudar a melhorar em muito esta acção técnica.


Fig. 2- Posição incorrecta das pernas

    A manutenção do contacto visual com a bola é um aspecto importantíssimo na formação do guarda-redes, Olson (2000). Durante um jogo a sua atenção deverá estar distribuída por todos os aspectos internos (movimentações dos adversários e dos colegas de equipa), mas o contacto visual com a bola nunca pode ser quebrado. Este é um aspecto que é treinável, especialmente nos aquecimentos dos guarda-redes quando há sessões seguidas de remates. O treinador deverá instruir o guarda-redes no sentido de que estes devem olhar sempre a bola até a defenderem ou deixarem entrar na baliza e deverá organizar os exercícios de forma a que exista um certo timming entre cada remate, assim o guarda-redes terá tempo de defender uma bola e entrar em contacto visual com a próxima. Desta forma podemos potenciar o facto de o guarda-redes num jogo nunca perder o contacto visual com a bola.

    Os deslocamentos na baliza são um factor fundamental nas primeiras etapas de aprendizagem. É do foro do nosso conhecimento que o guarda-redes se move sempre em função da posição da bola procurando sempre ficar no centro dos ângulos de remate.


Fig. 3- Deslocamento em função da posição da bola, adaptado de Martini (1980).

    Estes deslocamentos devem sempre ser executados em contacto com o solo, devem-se evitar saltos e passos muito grandes neste tipo de deslocamentos. Segundo Martini (1980), existem três tipos de deslocamentos que podem ser executados pelo guarda-redes na baliza: (A) em semi-circulo, (B) em triangulo e (C) em dois semicírculos.


Fig. 4- Tipos de deslocamentos do guarda-redes na baliza, adaptado de Martini (1980).

    Um aspecto onde muitos autores entram em desacordo é a questão se o guarda-redes deve ou não fazer defesas em queda. Referem que o facto do guarda-redes cair não lhe permitirá estar pré-disposto para defender um ressalto porque muitas vezes não tem tempo de voltar a alcançar a posição ideal. Os autores que afirmam que o guarda-redes deverá fazer defesas em queda referem o facto de que ao fazer uma defesa deste tipo o guarda-redes poderá oferecer uma maior superfície de contacto à bola, tornando mais fácil a defesa. Olson (2000), assume uma posição interessante, defende a metodologia da escola Sueca (defesa em queda) e justifica-a com o facto de que se o guarda-redes não defender a primeira bola nunca haverá um ressalto, assim o mais importante é sempre defender a primeira bola.

    “De tudo quanto foi dito ressalta que a base de um guarda-redes reside no TRABALHO FÍSICO, na ATITUDE, e na TÉCNICA DE BASE”, (Olson, 2000; pp. 7).


4. Preparação para um jogo

    O final de um jogo dita a imediata preparação para o jogo seguinte, desde a planificação das sessões de treino para essa semana, passando pelo visionamento de um vídeo e podendo terminar na nutrição.

    Depois de determinadas quais as opções de treino para a preparação do próximo jogo os guarda-redes têm uma preparação especial e individualizada devidamente planeada pelo seu treinador, Zvonarek (2000).

    Um factor importante neste processo é que os guarda-redes conheçam as características dos seus adversários, quais as suas tendências e opções técnico-tácticas. Tudo isto pode ser conseguido pelo visionamento de vídeos relativos a estes e pela análise efectuada em jogos anteriores.

    A cooperação entre os guarda-redes e os restantes colegas da equipa também é um factor importante pois a colaboração entre estes pode reduzir a eficácia atacante da equipa adversária, Zvonarek (2000).

    Não só o treino físico é uma componente importante desta preparação. O treino mental pode também fornecer um importante contributo. Existe pelo menos uma técnica de treino mental que permite ao guarda-redes imaginar-se (mesmo estando em casa) dentro da competição, esta técnica é designada de imagética ou visualização mental. Esta técnica não é mais do que “...a capacidade de nos vermos a nós próprios a desempenhar tarefas, evocando pensamentos e imagens, com um fim. Esta habilidade consiste em recuperar a informação armazenada na memória (através de todo o tipo de experiências) e remodelá-la através dos processos cognitivos” (Raposo et al, 2001; pp. 59).

    Existem estudos científicos que comprovam a eficácia desta técnica e referenciam que durante o emprego desta técnica mental existe um exaltar do arousal fisiológico dos atletas, Richardson (1969) cit. em Alves (1999).

    Porém não existe por agora nenhuma evidência que referencie a eficácia deste tipo de técnicas na preparação e no treino dos guarda-redes de ANDEBOL, pelo que seria um estudo interessante a desenvolver.


5. Colaboração com a defesa no funcionamento dos sistemas defensivos

    A colaboração do guarda-redes com a defesa e com o funcionamento dos sistemas defensivos depende em muito da técnica adoptada pelo guarda-redes.

    Assim, sabemos que o tipo de sistema defensivo deverá ser organizado em função do tipo de guarda-redes que temos. Por ex.: para um guarda-redes que tenha adoptado como técnica de defesa a escola balcânica deve-se evitar uma defesa do tipo 6:0 pois estes tendem a ser pouco eficazes nos remates de primeira linha. Devem-se sim utilizar defesas mais profundas tipo 3:2:1 ou 4:2. Para um guarda-redes que tenha como técnica base a escola Sueca a recomendação assenta na utilização de uma defesa menos profunda e que privilegie os remates de primeira linha, é onde estes tendem a ser mais eficazes.

    Para que a colaboração possa ser eficaz é importante que o guarda-redes tenha em atenção a última acção do defesa, um último encosto ao atacante pode permitir que este encontre um ângulo de remate diferente do inicial. Fundamental é também perceber qual a posição da mão da pega da bola e que tipo de remate é que esta permite ao jogador. Independentemente do sistema defensivo existem normas / princípios que devem ser cumpridos para que o conjunto guarda-redes / defesa possam actuar em conjunto e defender de uma forma eficaz a baliza. Apresentamos assim as formas de colaboração em função das acções ofensivas das equipas adversárias:

  • Remates de primeira linha -» Olson (2000) refere que a melhor forma de o defesa ajudar o guarda-redes é entrar em contacto com o atacante. Quando esse contacto se torna impossível o objectivo passa a ser o de evitar que o rematador cruze o remate. Desta forma o bloco efectuado pelos defesas deverá cobrir o ângulo longo, assim o guarda-redes pode intervir de uma forma mais eficaz defendendo o remate que vem na sua direcção e amortecer a bola, tendo em seguida mais facilidade para colocar a bola no contra-ataque. Esta é uma concepção que não é aceite por todas as escolas de guarda-redes.

  • Penetrações -» o objectivo dos defesas será o de tentar reduzir ao máximo os ângulos de remate, i.e. evitar que os atacantes rematem numa zona frontal à baliza obrigando-os a deslocarem-se o mais possível para o exterior do terreno de jogo. Mais uma vez os defesas devem evitar os remates cruzados por parte dos atacantes.

  • Remates de segunda linha (pivots) -» A situação ideal é evitar que o pivot tenha tempo de encarar o guarda-redes. O defesa por sua vez deverá evitar que o pivot suba muito e que remate de cima para baixo. O trabalho do guarda-redes deverá ser feito em profundidade atacando a bola e não o corpo do rematador.

  • Remates de segunda linha (pontas) -» O defensor deverá actuar no sentido de diminuir o ângulo de remate. Deverá mover-se lateralmente de forma a empurrar o atacante para o exterior do campo de jogo. O guarda-redes deverá acompanhar o movimento do atacante e colocar-se na posição ideal em função da atitude deste. O guarda-redes deverá estar consciente que quanto mais reduzido for o ângulo de remate mais dentro do seu raio de acção a bola irá passar.

  • Defesa de contra-ataques -» A colaboração entre o guarda-redes e a defesa é muito difícil nestas situações, devido às dificuldades que muitas vezes os defesas apresentam em acompanhar os atacantes. Quando o defesa acompanha lado-a-lado o atacante deverá actuar no sentido de lhe reduzir o ângulo de remate “empurrando-o” para as posições mais exteriores do terreno de jogo (as pontas). Quanto ao guarda-redes, deverá actuar como um líbero tentando anular não só o primeiro passe para o atacante (contra-ataque directo) mas também o segundo (caso o primeiro ainda se faça dentro do meio campo adversário). Para que actue neste sentido o guarda-redes deverá ter consciência que um golo directo ou marcado da primeira linha valem o mesmo, por isso não deverá ter medo de tentar interceptar os passes.

  • Defesa dos remates de sete metros -» Neste tipo de situações só intervém o guarda-redes, é ele que manda, deverá ter uma atitude agressiva face ao rematador. Hoje em dia é normal assistirmos à situação em que o guarda-redes convida o atacante a rematar para determinada zona, oferecendo-lhe essa mesma zona e depois atirando-se para lá. Olson (2000) refere que esta última situação se pode tornar mais eficaz se a colocação do guarda-redes for feita em função da posição da bola na mão do rematador, i.e. o guarda-redes deverá colocar-se precisamente na frente da bola.


VIII. Conclusão

    Ao longo da realização deste trabalho pudemo-nos aperceber a importância que um guarda-redes tem numa equipa de ANDEBOL, sendo por muitos considerado, e bem, o elemento mais importante dessa equipa.

    Da análise das características que distinguem os melhores guarda-redes podemos concluir que variáveis como a altura e a envergadura podem ser determinantes na escolha da técnica a adoptar, de qualquer forma as qualidades psicológicas e principalmente as sensório-motoras também têm peso nesta decisão. Esta técnica não seria originária de uma escola em particular mas sim de um misto entre todas as escolas.

    As etapas de formação deste jogador deverão ser divididas em função da sua idade biológica. Devemos obedecer aos princípios inerentes a cada uma delas de forma que durante a formação do jovem guarda-redes possamos assistir a uma potencialização das suas qualidades à medida que este evolui.

    A preparação para um jogo deverá obedecer a certos e determinados princípios que têm na sua base a observação das movimentações da equipa adversária. A estes princípios também podem estar implícitos outros tais como o seguimento de uma dieta adequada e um treino adaptado e organizado em função do período competitivo em causa.


Lecturas: Educación Física y Deportes · http://www.efdeportes.com · Año 8 · Nº 57   sigue Ü