efdeportes.com

A integração de alunos com necessidades educativas especiais
nas aulas de Educação Física. Um estudo de caso
Alice Silva y Rui Neves

http://www.efdeportes.com/ Revista Digital - Buenos Aires - Año 8 - N° 54 - Noviembre de 2002

2 / 2


    De acordo com esta análise, verifica-se que o comportamento mais observado diz respeito ao desempenho adequado da actividade por parte do aluno, seguindo-se os que se referem a atitudes descontextualizadas e à colaboração e ajuda, imediatamente seguidos do comportamento de afastamento do grupo ou isolamento. A proximidade ou contacto com a professora também foram observados com alguma frequência assim como a aceitação das suas orientações. Em relação ao contacto com colegas foi observado que este comportamento se verificou mais por iniciativa do aluno do que pela dos colegas. As atitudes descontextualizadas e o afastamento do grupo foram observados com maior frequência em situação de pausa, enquanto que a colaboração e ajuda se verificou mais frequentemente durante a actividade. A proximidade com a professora foi observada com maior frequência em situação de pausa, enquanto que a proximidade com os colegas se verificou mais em situação de actividade.

Quadro 1 - Sistematização Quantitativa dos Dados de Observação - Fase I


Nota: Os números assinalados com (*) referem-se ao tempo (momentos) de observação

    Durante a fase II da observação estruturada foram considerados 31 momentos de observação (quadro 2) que se refere à sistematização quantitativa destes dados.

Quadro 2 - Sistematização Quantitativa dos Dados de Observação - Fase II


Nota: Os números assinalados com (*) referem-se ao tempo (momentos) de observação

    Nesta observação o comportamento de recusa à participação na actividade, por parte do aluno H verificou-se sete vezes. O afastamento do grupo ou isolamento foi observado quinze vezes com maior frequência em situação de pausa. Igualmente quinze vezes foram observadas atitudes descontextualizadas com maior frequência em situação de pausa. Não foram observadas falhas no desempenho da actividade e o desempenho adequado foi observado dez vezes. O comportamento de colaboração e ajuda foi observado sete vezes, sobretudo em situação de pausa. A proximidade ou o contacto com os colegas por iniciativa do aluno aconteceu seis vezes com maior frequência durante a actividade, tendo sido observado o mesmo comportamento por iniciativa dos colegas quatro vezes em situação de pausa. A proximidade com a professora foi procurada pelo aluno duas vezes em situação de pausa, tendo sido observado o mesmo comportamento por iniciativa da mesma seis vezes, com maior frequência em situação de actividade. A aceitação de orientações dos colegas foi observada duas vezes em situação de pausa, e as orientações da professora foram aceites uma vez, também em situação de pausa. Não foi observada a recusa de orientações vindas de colegas e este comportamento em relação às orientações da professora.

     A análise comparada de resultados da observação estruturada (quadro 3) mostra que os comportamentos mais observados na primeira fase foram também os mais frequentes na segunda fase : desempenho adequado; atitudes descontextualizadas (deslocações, movimentos, ...); afastamento do grupo ou isolamento e colaboração e ajuda.

Quadro 3 - Sistematização Final dos Dados de Observação - Fases I e II


Nota: Os números assinalados com (*) referem-se ao tempo (momentos) de observação

    No entanto, há que salientar algumas diferenças entre as duas fases de observação. Assim, enquanto que, na primeira, não houve recusa à participação, na segunda, este comportamento foi observado sete vezes. O afastamento do grupo e as atitudes descontextualizadas aumentaram na segunda fase a par de uma diminuição significativa do desempenho adequado, da colaboração e ajuda e da proximidade com a professora, enquanto que a proximidade com os colegas se manteve, em relação à primeira fase. Foi ainda observada uma menor aceitação das orientações da professora e recusa das mesmas (quatro vezes), na segunda fase.


O Teste Sociométrico

    Analisando os dados resultantes da aplicação dos testes sociométricos aos alunos (quadro 4) a maioria dos alunos(14), incluindo o aluno H, sentem-se capazes em relação à aula de EF.

Quadro 4 - Opinião dos alunos sobre o seu auto-conceito em EF

    Dois rapazes e quatro raparigas dizem sentir-se capazes às vezes. Num grupo de 19 alunos é de salientar que nenhum aluno referiu não se sentir capaz relativamente à disciplina de EF.

    Os dados constantes do quadro 5, relativo à aceitação por parte dos colegas, evidenciam que nove rapazes incluindo o aluno H e uma rapariga dizem julgar que os colegas gostam de si.

Quadro 5 - Opiniões dos alunos sobre a sua aceitação por parte dos colegas

    Três rapazes e cinco raparigas referem julgar que os colegas gostam de si às vezes e uma rapariga julga mesmo que os colegas não gostam de si.

    No quadro 6 os dados mostram que os alunos mais vezes escolhidos (máximo dezasseis vezes) são duas raparigas e um rapaz. O nosso aluno H escolheu quatro colegas todos rapazes e foi o aluno que menos vezes foi escolhido (duas vezes).

Quadro 6 - Alunos escolhidos e rejeitados pelos colegas


Nota:(*) identifica o nosso aluno H

    Os alunos mais vezes rejeitados (máximo sete vezes) foram todos rapazes. O nosso aluno H foi rejeitado três vezes e não rejeitou nenhum dos colegas.


A opinião das professoras - Integração de alunos com NEE’s nas aulas de EF

    Em relação a esta problemática, a professora, com vinte e sete anos de idade, cinco anos de serviço e licenciada com o Curso de Professores do Ensino Básico 2º Ciclo - Educação Física, diz achar «importante a integração de alunos com NEE, visto que o convívio com os colegas da turma regular lhes proporciona experiências e modelos de comportamento importantes para o seu desenvolvimento».

    A professora colocada em substituição da primeira, com 23 anos de idade e um ano de serviço, licenciada com o Curso de Professores do Ensino Básico 2º ciclo - Educação Física, diz não ter «nenhuma opinião formada a esse respeito porque ainda não está muito bem integrada com o sistema e não sabe muito bem o funcionamento».

    A análise destes resultados revela que, apesar das competências de realização observadas através do desempenho adequado da actividade, verificou-se a existência de comportamentos que fazem com que o aluno H se destaque do grupo.

    Foi notória a frequência do comportamento de desvio, observado através de atitudes descontextualizadas, afastamento, movimentos e deslocações, revelando necessidade de actividade constante. Este comportamento surgiu com maior frequência em situações de pausa, tornando pertinente a sugestão de reduzir o mais possível estes momentos, de modo a diminuir as probabilidades de ocorrência.

    A frequência com que foi observado o comportamento de colaboração e ajuda revela que o aluno procura sempre ser prestável, sentindo-se valorizado e útil através disso.

    Sobretudo na primeira fase de observação, verificou-se também a procura da proximidade ou contacto com a professora, colocando-se ao seu lado ou de frente, de modo a estabelecer contacto visual, fazendo-se notar e tentando obter protecção e apoio.

    A maioria dos contactos com a professora, por iniciativa da mesma, dizem respeito a inferências, notando-se um relacionamento calmo e caloroso, observado através da proximidade e contacto físico estabelecidos com o aluno.

    Em relação ao contacto com os colegas, verificou-se que o aluno comunica pouco com os outros e que estes comunicam ainda menos com ele, embora aceitem e respondam às suas solicitações. Não foram observados conflitos e os comportamentos desajustados eram ignorados pelos colegas.

    Os resultados dos testes sociométricos vieram reforçar esta perspectiva, visto que as capacidades de desempenho observadas proporcionam um nível de auto-eficácia que levam o aluno a sentir-se capaz. A ausência de conflitos e desvalorização dos comportamentos negativos terá contribuído para que o aluno se sentisse aceite pelos colegas.

    As diferenças verificadas entre as duas fases de observação poderão estar relacionadas com a mudança de professora e adaptação à relação com a mesma que, como ela própria declarou, possuía pouca experiência profissional e um conhecimento pouco profundo sobre a problemática da integração de alunos com NEE’s.

    O tipo e natureza da actividade desenvolvida poderá também ter originado comportamentos diferentes por parte do aluno. Uma primeira fase com actividades colectivas e utilização de um objecto referencial (a bola) utilizado frequentemente, podendo constituir-se como um atractivo especial, seguida de uma segunda caracterizada por actividades individuais (luta e ginástica) exigindo contacto físico e concentração.


Conclusões

    Em função dos dados recolhidos e analisados podemos considerar que numa lógica da integração de alunos com NEE’s na aula de EF alguns indicadores caracterizaram o caso estudado. De entre esses consideramos pertinentes os seguintes :

  • a existência de comportamentos, que fazem com que o aluno H se tenha destacado em relação ao grupo;

  • o aluno revelou competências de realização observadas através do desempenho adequado da actividade;

  • a frequência de comportamentos-desvio, observado através de atitudes descontextualizadas e do afastamento do grupo, em que o aluno se desloca ou faz movimentos, revelando a necessidade de estar em constante actividade;

  • os comportamentos-desvio foram observados com maior frequência em situações de pausa da aula de EF, parecendo pertinente sugerir que estes momentos sejam o mais possível reduzidos, de forma a diminuir a possibilidade de ocorrência do mesmo comportamento;

  • a colaboração e ajuda, tanto com os colegas, como com a professora, foi um comportamento observado no aluno com frequência, através da procura de ser sempre prestável e colaborante, podendo ser entendido como uma forma de se sentir valorizado e útil;

  • a frequência da proximidade física ou contacto com a professora, sobretudo na primeira fase de observação, em que o aluno procurou colocar-se ao seu lado ou de frente para ela, de forma a estabelecer e/ou manter o contacto visual;

  • o aluno comunica pouco com os colegas por iniciativa própria, mas estes comunicam ainda menos com ele.

    Deste modo, tal como foi referido na primeira parte deste trabalho, a aula de EF poderá ser, para este aluno, o ambiente privilegiado para a sua valorização pessoal, onde ele se sente capaz, procurando optimizar o seu desenvolvimento e competências a todos os níveis. Isto porque é compreensível que realizações com êxito sejam impulsionadoras de outras realizações, aumentando as possibilidades de sucesso e a tolerância ao fracasso.

    Apesar da postura de afastamento do grupo e da pouca comunicação que foram observadas, o convívio do aluno com os colegas constitui uma fonte única de modelos de comportamento e atitudes, com os quais ele pode, ou não, identificar-se adquirindo bases e princípios para a formação e desenvolvimento da sua identidade. Ainda a respeito das capacidades de realização do aluno, poderia ser interessante alargar este estudo ao contexto de outras áreas disciplinares, nas quais o aluno não consegue obter o mesmo sucesso, com vista a uma comparação de resultados.

    Apesar das limitações do estudo efectuado, a realização deste trabalho possibilitou o desenvolvimento e aperfeiçoamento de algumas técnicas de observação da turma que permitiram o acesso a informações de extrema importância para o desempenho da função educativa. A partir desta observação poderão ser definidas medidas e estratégias de intervenção que contribuam para uma aproximação cada vez maior do modelo que se pretende atingir, proporcionando a todos os alunos uma resposta o mais adequada possível, de forma a tornar efectiva a “escola para todos” que tanto se deseja.


Bibliografia

  • BARREIROS, J. Carlos - A Turma como Grupo e Sistema de Interacção. Porto Editora: Porto, 1996

  • COLL; César - Desenvolvimento Psicológico e Educacional. Necessidades Educativas Especiais e Aprendizagem Escolar. Artes Médicas: Porto Alegre, 1995

  • COSTA, Ana Maria Benard (1997) in «Caminhos para Escolas Inclusivas».

  • ESTRELA, Albano - Teoria e Prática de Observação de Classes. Porto Editora: Porto, 1994

  • LOPES, Joao A. - Necessidades Educativas Especiais: estudos e investigação. S. H.O. - Sistemas Humanos e Organizacionais, Lda: Braga, 1998

  • PORTUGAL, Gabriela - Ecologia e Desenvolvimento Humano em Bronfenbrenner. CIDINE - Centro de Investigação, Difusão e Intervenção Educacional: Aveiro, 1992

  • ROSADO, António - Nas Margens da Educação Física e do Desporto. Edições FMH - Faculdade de Motricidade Humana. Universidade Técnica de Lisboa, 1998

  • SARMENTO, P. e al. - Pedagogia do Desporto - Instrumentos de Observação Sistemática da Educação Física e Desporto. Departamento de Ciências do Desporto. Edições FMH - Faculdade Motricidade Humana. Universidade Técnica de Lisboa, 1993


| Inicio |

Outro artigos em Portugués

  www.efdeportes.com/
http://www.efdeportes.com/ · FreeFind
   

revista digital · Año 8 · N° 54 | Buenos Aires, Noviembre 2002  
© 1997-2002 Derechos reservados