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Análise estatística do desempenho
técnico coletivo no basquetebol

   
*Professor Associado do Departamento de Esporte da
Escola de Educação Física e Esporte da USP
** Bacharel em Esporte - Escola de Educação Física e Esporte da USP
*** Mestrando do Programa de Pós Graduação
em Educação Física - Escola de
Educação Física e Esporte da USP
http://www.geppe.web.pt
 
 
Dante De Rose Junior*
Alexandre Gaspar**
Marcello Siniscalchi***

danrose@usp.br
(Brasil)
 

 

 

 

 
Resumo
     O presente estudo teve como principal objetivo definir padrões de desempenho técnico coletivo no basquetebol, através da análise estatística dos indicadores de jogo no referido esporte. O estudo foi realizado com base nos dados estatísticos coletados em 210 jogos do Campeonato Paulista de Basquetebol Masculino Adulto, realizado no Estado de São Paulo e organizado pela Federação Paulista de Basketball, do qual participaram 15 clubes, envolvendo cerca de 200 atletas. Os dados foram analisados estatisticamente através do teste t-Student e pelo Coeficiente de Correlação de Postos de Spearman. Os resultados apontaram que 62% dos jogos foram vencidos pelas equipes mandantes, que por sua vez apresentaram médias significativamente maiores em todos os indicadores de jogo, com exceção de bolas perdidas e faltas cometidas. Os jogos com resultados cujas diferenças foram de até 10 pontos predominaram (51%) sobre os jogos cujas diferenças superaram os 20 pontos (19%), atestando um relativo equilíbrio entre as equipes. As equipes vitoriosas foram melhores do que as equipes derrotadas nos indicadores de jogo relacionados à eficiência nos arremessos e ao rebote de defesa (p <0.01), enquanto que nos outros indicadores também houve diferenças estatisticamente significativas (p <0.05). As exceções foram as bolas perdidas e faltas, que como era de se esperar, predominaram nas equipes derrotadas, principalmente nos jogos mais equilibrados. Foi encontrada uma forte correlação entre as médias de aproveitamento de arremessos (rs = 0.84), aproveitamento geral (rs = 0.79), bolas recuperadas e assistências (rs = 0.74) e porcentagem de acertos de lances livres (rs = 0.70) e a classificação final das equipes. Esta forte correlação também foi notada em relação à média do conjunto de postos dos indicadores de jogo (rs = 0.86). De forma geral concluiu-se que se pode aceitar o fato que a eficiência nos arremessos combinada com os rebotes de defesa parecem ser fatores preponderantes para a vitória, independentemente do mando de jogo ou da diferença de pontos de uma partida. Também concluiu-se que este tipo de análise pode fornecer subsídios consistentes para que técnicos e atletas possam estruturar adequadamente suas estratégias de treinamento e de jogo.
    Unitermos: Basquetebol. Estatística de jogo.
 

 
http://www.efdeportes.com/ Revista Digital - Buenos Aires - Año 8 - N° 49 - Junio de 2002

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Introdução

Caracterizando o basquetebol

    O basquetebol, segundo a classificação de modalidades esportivas proposta por Hernandez Moreno (1998), pode ser caracterizado como um esporte de oposição e cooperação, envolvendo ações simultâneas entre duas equipes (atacante e defensora) que ocupam um espaço comum, proporcionando contato direto entre os participantes.

    Além disto, o basquetebol é composto por habilidades específicas (fundamentos) que, em sua maioria, são contínuas ou seriadas e que são executadas em ambiente aberto, no qual companheiros de equipe, adversários, limites de tempo e espaço determinam uma imprevisibilidade, aspectos que o tornam um esporte dinâmico e variado (Magill, 1984; De Rose Jr., 1999).

    Para atender as exigências mínimas do jogo, o atleta de basquetebol deve ter o domínio dos fundamentos do jogo que, de acordo com De Rose Jr. (1996) podem ser: de defesa (controle de corpo, posição defensiva e rebote de defesa) e de ataque (controle de corpo, controle de bola, drible, arremessos, passes e rebote de ataque). Esses fundamentos combinados formam pequenas estruturas grupais (situações de jogo: 1x1; 2x2 e 3x3) que por sua vez levam a uma organização tática (sistemas de defesa e ataque) necessária para que se obtenha um mínimo de eficiência coletiva.

    Glick e Marcotte (1989) afirmam que o jogador de basquetebol deve ser capaz de compreender e executar movimentações complexas e todas suas variações, antecipando respostas de seus companheiros e dos adversários, levando a tomadas de decisões muito rápidas e que exigem grande eficiência na execução dos fundamentos.

    Esta eficiência é buscada insistentemente por técnicos e atletas através dos treinamentos, análises de situações específicas, estudo dos adversários e o controle estatístico das ações de cada jogador e, conseqüentemente, de toda a equipe.

Análise técnica e tática do jogo

    A competitividade nas competições esportivas é muito grande. Uma das causas parece ser o conhecimento que cada equipe tem de si própria e dos adversários, já que os técnicos buscam minimizar os aspectos desconhecidos, pois cada decisão errada ou fator surpresa pode acarretar uma derrota.

    O conhecimento das características que definem qualquer modalidade esportiva e a análise dos tipos de exigências competitivas são imprescindíveis para se progredir, aperfeiçoar e elaborar programas de preparação e treinamento apropriados nos esportes coletivos (Barbero Alvarez, 2001).

    De acordo com Garganta (1996), o estudo do jogo a partir da observação do comportamento dos jogadores e das equipes, constitui-se em um forte argumento para a organização e avaliação dos processos de ensino e treino nas modalidades esportivas coletivas. As formas de manifestação da técnica, os aspectos táticos e a atividade física desenvolvida pelos jogadores são parte do conteúdo abordado.

    Para Janeira (1999), no universo dos esportes de rendimento e, particularmente, nos jogos esportivos coletivos, a observação de jogo tem-se revelado como um meio imprescindível para a caracterização das exigências específicas que são impostas aos jogadores em situação competitiva.

    Para que qualquer processo de análise tenha fidelidade e validade, é necessário desenvolver sistemas e métodos de observação que possibilitem o registro de todos os fatos relevantes do jogo de Basquetebol, produzindo-se deste modo informação objetiva e quantificável. A melhor maneira de ter um parâmetro para isto é a utilização da estatística e do “scouting” (Gapar, 2001). Uma partida de basquetebol pode ser analisada sob diferentes pontos de vista e através das mais variadas metodologias que são criadas, muitas vezes, sem um rigor científico, embasando-se na experiência dos observadores (na maioria dos casos, os próprios técnicos), o que não permite análises consistentes.

    De maneira geral um jogo de basquetebol pode ser analisado sob o ponto de vista:

  1. técnico: quando se analisa o desempenho de um ou mais jogadores, procurando-se determinar o nível de suas ações, a execução dos fundamentos e a eficiência dessa execução, quantificando a ação através de uma determinada mensuração;

  2. tático: quando se analisam situações desenvolvidas por pequenos grupos ou por toda a equipe, a partir de padrões pré definidos (plano tático de jogo) tanto na defesa, quanto no ataque.

    Qualquer das análises citadas anteriormente pode ser feita de forma objetiva (quando se procura quantificar ou nomear uma determinada ação), ou através de observações subjetivas (quando se tenta fazer uma observação qualitativa da execução técnica, ou da ação conjunta de pequenos grupos ou de toda a equipe).

    O conjunto dessas observações (objetiva/subjetiva; qualitativa/quantitativa) é chamado de “scouting”, termo aceito universalmente na linguagem corrente do basquetebol.

    O “scouting” é a arte de detectar as variações do jogo e seus aspectos subjetivos, buscando sempre identificar o fator desencadeador das atitudes dos jogadores e das equipes (Gaspar, 2001).

    O “scouting” é, segundo Garganta (1996), a detecção das características e do estilo de jogo da equipe adversária, no sentido de explorar os seus pontos fracos e contrariar as suas dimensões fortes. Cosy e Power Jr. (1985) definem o “scouting” como uma observação qualificada que estuda um futuro adversário, servindo para aprender as estratégias e comportamentos dos jogadores e suas fraquezas, tanto individualmente quanto coletivamente. Brown (1983) afirma que o “scouting” é responsável por detectar características específicas como, por exemplo, qual lado da quadra o bom arremessador prefere usar, se o armador é destro ou canhoto, se o pivô executa um bom bloqueio de rebote e as principais movimentações táticas ofensivas e defensivas.

Análise estatística do jogo

    Uma das formas mais utilizadas para se avaliar o desempenho em jogo é a análise estatística. Representada por uma observação numérica das ocorrência dos indicadores de jogo a estatística pode ser considerada uma técnica quantitativa, descrita por Knudson e Morrison (2001) como uma medida de desempenho baseada em números.

    Segundo Gaspar (2001), a estatística é a ciência de coletar e interpretar os números obtidos e transformá-los em significados para o jogo. Ela é responsável por contabilizar cada uma das ações do jogo, sem se preocupar com a maneira que elas ocorrem. Segundo Martin e Gross (1990), ela fornece informações relevantes e objetivas, que servem como uma base construtiva para avaliar o desempenho. O objetivo de se obter este tipo de informação é dar aos técnicos e atletas informações sobre o jogo de maneira que os desempenhos subseqüentes possam ser melhorados.

    A estatística de jogo é utilizada mundialmente e existem critérios que definem previamente cada um desses indicadores para garantir a objetividade das observações e da quantificação. Esses mesmos critérios são utilizados em torneios internacionais (Jogos Olímpicos e Campeonatos Mundiais) como também em torneio nacionais e regionais (exemplo: Liga Nacional e Campeonato Paulista) tanto para o masculino, quanto para o feminino.

    Técnicos de basquetebol reconhecem que um jogador não pode ser avaliado simplesmente em função do número de pontos que ele faz. Os aspectos que demonstram a habilidade de um jogador vão muito além da sua pontuação, e nada mais eficiente do que as informações estatísticas para dar um melhor panorama da atuação do jogador. Ela é capaz de mostrar o volume de jogo do jogador, em função do volume de sua equipe, mostra o aproveitamento dos arremessos, a sua eficácia nos rebotes, enfim, enquadra o jogador em contexto maior (Cousy e Power Jr. 1985).

    A análise quantitativa do jogo de basquetebol é um processo fundamental na explicação de fatores que influenciam no êxito esportivo. A avaliação do desempenho através dos indicadores de jogo, constitui um método válido, fidedigno e objetivo, tando do ponto de vista do jogador, quanto da própria equipe (Sampaio, 1998).

    Os indicadores de jogo, segundo Comas (citado por Sampaio, 1998), são um conjunto referencial das principais ações técnico-táticas do jogo. Podem ser representados pelas situações ou ocorrências possíveis de serem observadas e quantificadas em situação de jogo. Por exemplo: um arremesso certo, uma bola recuperada, uma falta, entre outras.

    Normalmente, os indicadores observados e analisados em um jogo são: tempo de jogo, quantidade de arremessos tentados (3 pts, 2 pts e lances-livres), quantidade de arremessos convertidos (3 pts, 2 pts e lances-livres), rebotes de defesa e de ataque, assistências, bloqueios de arremessos (tocos), bolas recuperadas, bolas perdidas e faltas.

    A análise conjunta dos indicadores de jogo é responsável por fornecer subsídios importantes aos técnicos e atletas para que possam estabelecer estratégias adequadas de treinamento e também para os jogos, objetivando a melhora do desempenho individual e coletivo.

    Pode-se também considerar a importância da estatística de jogo para os meio de informação que divulgam os resultados e os utilizam para embasar as análises e comentários técnicos e táticos do jogo.


Objetivos

    Considerando que a análise estatística de jogos de basquetebol necessita de um aprofundamento para consolidar uma metodologia válida e objetiva e da ampliação de sua abordagem para uma melhor utilização por parte de técnicos e atletas, este estudo teve como objetivos:

    Definir padrões de desempenho técnico coletivo (eficiência na execução de indicadores de jogo)

    Identificar os padrões de desempenho coletivo considerando as seguintes variáveis: Resultado do jogo (equipe vitoriosa e equipe derrotada); Mando de jogo (equipe mandante e equipe visitante) e diferença de pontos

    Comparar o resultado de cada um dos indicadores de jogo e o seu conjunto em cada uma das variáveis estudadas

    Estabelecer correlações entre cada um dos indicadores e a classificação final das equipes, considerada a primeira fase do campeonato, na qual todos se enfrentaram e realizaram o mesmo número de jogo (28 por equipe).


Metodologia

    O estudo foi realizado com base nos dados estatísticos de 210 jogos do Campeonato Paulista Masculino Adulto realizado em São Paulo no ano de 2001, com a participação de 15 equipes, envolvendo cerca de 200 atletas com idade mínima de 17 anos. As equipes participantes pertencem a diferentes regiões do Estado de São Paulo e são filiados à Federação Paulista de Basketball.

Definição das variáveis:

Indicadores de jogo:

* Pontos possíveis = (tentativas de 3 pts x 3) + (tentativas de 2 pontos x 2) + (tentativas de lances-livres)
** Aproveitamento Geral: (pontos feitos/pontos possíveis) x 100

Mando de jogo:

  • Equipe mandante (Man): equipe que realiza seus jogos em sua quadra

  • Equipe visitante (Vis): equipe que realiza seus jogos na quadra do adversário

Resultado final:

  • Equipe vitoriosa (Vit)

  • Equipe derrotada (Der)

Diferença de pontos (adaptado a partir dos estudos de Sampaio, 1998)

  • Até 3 - Jogos com diferença até 3 pontos

  • 4 a 10 - Jogos com diferença de 4 a 10 pontos

  • 11 a 20 - Jogos com diferença de 11 a 20 pontos

  • >20 - Jogos com diferença acima de 20 pontos

    Os dados foram extraídos das estatísticas oficiais dos jogos, coletados por equipes da Federação Paulista de Basketball, utilizando os critérios internacionais da FIBA (Federação Internacional de Basquetebol) e que foram padronizados para o Brasil pela Confederação Brasileira de Basketball. A estatística de cada jogo foi processada em um programa Excel, de onde foram obtidos os totais individuais e por equipe e posteriormente tratados pelo programa Statistics para a efetuação dos cálculos, comparações e correlações.

    Para comparação de médias foi utilizado o teste T Student (p <0.05). Para a correlação dos indicadores de jogo com a classificação final das equipes foi utilizado o Coeficiente de Correlação de Postos de Spearman (p <0.05).


Resultados: apresentação e discussão

Mando de Jogo:

    A TABELA 1 mostra o número de vitórias das equipes mandantes e visitantes.

Tabela 1: Número de vitórias das equipes mandantes e das equipes visitantes no Campeonato Paulista Masculino - 2001

    Os resultados da TABELA 1 demonstram haver uma predominância de vitórias das equipes mandantes sobre as visitantes, situação que pode ser considerada normal. Esses resultados estão coerentes com o resultados dos últimos campeonatos brasileiros realizados em 1999, 2000 e 2001 (www.cbb.com.br).

    As médias dos resultados coletivos gerais de cada um dos indicadores de jogo e as médias dos mesmos indicadores em função do mando de jogo do Campeonato Masculino são demonstradas na TABELA 2.

Tabela 2: Médias de cada indicador de jogo dos 210 jogos do Campeonato Paulista de Basquetebol Masculino - 2001 (Geral e Por mando de jogo)

    Houve uma nítida tendência das equipes mandantes terem melhor desempenho do que as visitantes em quase todos os indicadores de jogos, ficando as exceções por conta dos lances-livres certos e lances livres tentados que têm uma relação direta com o número de faltas cometidas (no caso a equipe mandante é mais faltosa do que a visitante, apesar de não haver diferenças significativas).

    Outro indicador que não favorece os mandantes é a quantidade de bolas perdidas, mas que neste caso, deve ser considerado como fato positivo, pois a perda de bolas, quer por erros técnicos ou por violações, significam uma deficiência da equipe.


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