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Ansiedade em estudantes de Educação Física 

que participam de espetáculos de danças

La ansiedad de los estudiantes de Educación Física que participan de espectáculos de baile

Anxiety in students of Physical Education who participate in dance shows

 

*Bacharel em Educação Física - Unileste

**Mestre em Ciências do Esporte – UFMG

Professora de Danças do Curso de Educação Física do Unileste

(Brasil)

Mariana Zanetti Menezes Silva*

Carina Morais Roberto*

Iula Lamounier Lucca**

iula.unilestemg@bol.com.br

 

 

 

 

Resumo

          O estudo objetivou identificar e comparar os níveis de ansiedade de estudantes de educação física antes e após a participação em um festival de dança e ginástica do curso universitário. A amostra foi composta por 34 voluntários (22,95 ± 3,28 anos; 20 homens). Os dados foram coletados através do inventário de ansiedade traço-estado (IDATE) antes e após as apresentações artísticas. A análise dos dados foi realizada no programa SigmaPlot 11.0 (p < 0,05) utilizando os testes Shapiro Wilk, Levene, correlação de Pearson, “t” de Student, ANOVA two way com medidas repetidas e Post Hoc de Tukey, respectivamente, para normalidade, homogeneidade, força de associação, comparações entre pré e pós-testes e comparações simultâneas. Os resultados evidenciaram médias e desvios-padrão dos traços de ansiedade: pré = 38,54 ± 8,49 e pós = 36,51 ± 8,05 (p = 0,322) e dos estados de ansiedade: pré = 41,97 ± 9,96 e pós = 35,09 ± 10,32 (p = 0,007). Conclui-se que os estudantes de educação física apresentavam níveis médios de ansiedade durante a participação no festival e que embora o traço de ansiedade não tenha se alterado, após o espetáculo houve uma redução do estado de ansiedade.

          Unitermos: Educação Física. Estado de ansiedade. Bailarinos. Desempenho.

 

Abstract

          The study aimed to identify and to compare the anxiety levels of physical education students before and after their participation in a dance and gym university spectacle. The sample consisted of 34 volunteers (22.95 ± 3.28 years; 20 men). Data were collected through the state-trait inventory (STAI) before and after the performances. The analysis was carried out in SigmaPlot 11.0 software (p <0.05). We used the tests: Shapiro-Wilk, Levene, Pearson correlation, "t" test paired, two-way ANOVA with repeated measures and Tukey, respectively, to normality, homogeneity, association strength, pre and post comparisons and simultaneous comparisons. The results show means and standard deviations of anxiety traits: pre = 38.54 ± 8.49 and post = 36.51 ± 8.05 (p = 0.322) and anxiety states: pre = 41.97 ± 9.96 and post = 35.09 ± 10.32 (p = 0.007). We conclude that the physical education students presented medium levels of anxiety during performances. The trait anxiety has not changed after the show, although there was a reduction in the state of anxiety.

          Keywords: Physical Education. Anxiety state. Dancers. Performance.

 

Recepção: 16/12/2015 - Aceitação: 02/06/2016

 

1ª Revisão: 19/05/2016 - 2ª Revisão: 31/05/2016

 

 
EFDeportes.com, Revista Digital. Buenos Aires - Año 21 - Nº 217 - Junio de 2016. http://www.efdeportes.com/

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Introdução

    Embora não se tenha exatidão da origem da dança, acredita-se que tenha surgido da necessidade de expressão humana, inicialmente com um caráter religioso, estaria presente em rituais comemorativos para aplacar ou agradecer aos deuses. Contudo ao longo dos anos estas danças étnicas sofreram transformações e deram origem às danças folclóricas, sociais e às cênicas com a realização de espetáculos de diversos estilos (Faro, 2004). Neste ambiente teatral a dança tem um caráter estético que exige aptidão e técnica do praticante, mas que também pode gerar ansiedade.

    É importante ressaltar que a ansiedade é uma reação emocional desencadeada por algum fator estressor percebido pelo indivíduo como ameaça. Os indivíduos podem apresentar traço e estado de ansiedade, ambos envolvem sensações de preocupação, nervosismo, tensão, apreensão, contudo, o primeiro é uma característica da personalidade, que indica uma propensão à ansiedade em diversas situações, enquanto o estado é mais transitório, variando em função das circunstâncias, do momento vivenciado pelo indivíduo. De acordo com a teoria do U invertido, das zonas individualizadas de ótimo funcionamento, de regressão e do modelo de catástrofe, os atletas possuem uma faixa ideal de ansiedade acima e abaixo da qual o rendimento pode cair (Samulski, 2009).

    Neste contexto, as danças também envolvem ansiedade. Estudos recentes evidenciaram sintomas de ansiedade no período pré-competitivo e na pré-estréia de um espetáculo de dança realizado por bailarinos profissionais (Pereira et al., 2014). E também em bailarinos profissionais e amadores no contexto extracompetitivo, na realidade intrínseca da dança, entre ensaios e apresentações (Gasparini, Lee & Rose Jr, 2012).

    Embora não sejam bailarinos, graduandos em educação física também participam de espetáculos de dança. O UnilesteGYM é um projeto de extensão do curso de educação física do Unileste, que transforma atividades acadêmicas e avaliativas das aulas de danças e ginásticas em um espetáculo artístico (Unileste, 2015) realizado semestralmente no teatro da instituição (Figuras 1A-D), com o intuito de estimular a valorização das artes e da atividade física. Além de lotar a platéia, as coreografias são divulgadas nas redes sociais e os grupos são convidados a reapresentá-las noutros locais (Venâncio et al., 2013; Peixoto et al., 2011) disseminando a variedade de estilos e possibilidades da dança, alcançando um público heterogêneo, formado por amigos e familiares dos universitários e por moradores da comunidade local. Assim o projeto tenta vencer importantes desafios citados por Quintero (2014) entre os quais o de facilitar o acesso às artes, ampliar os públicos e democratizar a dança. Entretanto, considerando a inexperiência artística da maioria dos alunos e o caráter avaliativo do evento, estes estudantes estão sujeitos a um quadro de ansiedade nesta situação.

Figura 1. Graduandos em educação física apresentando coreografias de danças no UnilesteGYM 

A: Bolero; B: Valsa; C: Frevo; D: Quadrilha. Fonte: arquivos do evento compostos por fotos cedidas pelos alunos

    De fato, pesquisas têm demonstrado níveis moderados de ansiedade em estudantes de medicina (Marafanti, D'Elia, Pinheiro, Cordeiro & Alves, 2013), enfermagem (Santos & Galdeano, 2009) e de cursos variados (Gama, Moura, Araújo & Teixeira-Silva, 2008), o que pode estar relacionado às atividades avaliativas, entre outros fatores acadêmicos. Vale ressaltar que ao participar do UnilesteGYM o medo de errar, esquecer a sequência coreográfica, a presença da platéia, devem ser levados em consideração, visto que podem influenciar o estado de ansiedade de bailarinos amadores ou profissionais, quem dirá de estudantes que nunca vivenciaram este tipo de experiência e que não têm relação prévia com a dança, ou com atividades artísticas.

    Entretanto, até o presente momento, são poucos os estudos que analisam ansiedade durante apresentações artísticas, especialmente em situações acadêmicas. Assim, este estudo teve como objetivo identificar e comparar os níveis de ansiedade de graduandos em educação física antes e após a participação em apresentações de dança e ginástica do UnilesteGYM.

Métodos

    Este estudo transversal, descritivo com coleta de dados em campo e análise quantitativa foi realizado entre junho/2014 e maio/2015, em uma instituição de ensino superior (IES) do Vale do Aço, respeitando as normas da Resolução 466/2012 do Conselho Nacional de Saúde. Todos os participantes assinaram Termo de Consentimento Livre e Esclarecido (TCLE) sendo garantindo aos mesmos o anonimato e direito de desistência a qualquer momento.

Amostra

    A amostra (n = 34) foi composta por graduandos em educação física, com idade média de 22,95 ± 3,28 anos, sendo 20 homens e 14 mulheres. Apenas para análise do Traço de Ansiedade a amostra foi menor (n=33), pois uma voluntária deixou uma questão do pós-teste Traço em branco. Os voluntários foram recrutados na IES, onde esclareceram dúvidas, preencheram o TCLE e a ficha de dados pessoais. Os critérios de inclusão foram: mínimo de 18 anos de idade, estar devidamente matriculado no curso de educação física e ser participante do UnilesteGYM, os critérios de exclusão foram uso de medicamento ansiolítico; histórico de transtornos psiquiátricos e falhas no preenchimento dos questionários.

Procedimentos

    Foram realizados quatro encontros com os voluntários: os dois primeiros nas salas de aula e os dois últimos no local do espetáculo: o teatro da IES. No primeiro encontro, um mês antecedendo ao espetáculo, todos foram convidados a participar do estudo; no segundo, uma semana antes do espetáculo os interessados preencheram o TCLE e a ficha de dados pessoais. Em seguida, no terceiro e no quarto encontros, ambos no dia do UnilesteGYM, os alunos responderam ao questionário IDATE antes do espetáculo (18:11 ± 1:00 h) e após a apresentação (20:37 ± 0:23 h).

Inventário de Ansiedade Traço e Estado – IDATE

    O IDATE foi proposto por Spielberger e colaboradores em 1970, traduzido para o português e validado por Biaggio e Natalício em 1979 (Gama, Moura, Araújo & Teixeira-Silva, 2008). Trata-se de um instrumento autoaplicável, constituído por dois questionários: IDATE-Traço e IDATE-Estado, cada um contém 20 questões e cada questão oferece quatro possibilidades de respostas em uma escala tipo Likert que varia de 1 - quase nunca a 4 - quase sempre (Gasparini, Lee & Rose Jr, 2012; Constantino, Prado & Lofrano-Prado, 2010; Kaipper, 2008), o escore total de cada questionário irá então variar de 20 a 80, contudo, as perguntas são pontuadas de forma diferente. Tanto no IDATE-Traço, quanto no IDATE-Estado existem perguntas com caráter positivo que estão associadas às sensações de alegria, segurança, calma e outras com caráter negativo que indicam sensações de insegurança, medo, preocupação. As perguntas negativas recebem a pontuação correspondente ao valor da escala Likert escolhido pelo indivíduo, já as perguntas com caráter positivo são pontuadas de forma invertida: se a pessoa marcar 1 atribui-se 4; se marcar 2 atribui-se 3; se marcar 3 atribui-se 2 e se marcar 4 atribui-se 1 ponto (Kaipper, 2008). Estudos têm considerado pontuação até 30 como baixa ansiedade, 31 a 49 como média ansiedade e acima de 50 como alta ansiedade (Gasparini, Lee & Rose Jr, 2012; Kaipper, 2008).

Análise dos dados

    Os dados são apresentados como média ± desvio padrão da média (DP). Utilizaram-se os testes Shapiro Wilk e Levene, respectivamente, para normalidade e homogeneidade dos dados. A força de associação entre as variáveis foi verificada por análise de correlação de Pearson. As comparações entre pré e pós-testes foram realizadas por teste "t" de Student para amostras pareadas, adotando-se ANOVA One Way com medidas repetidas e post hoc de Tukey para as comparações simultâneas entre caráter das perguntas (positivo e negativo) e momento do teste (pré e pós). A análise foi realizada no programa SigmaPlot 11.0, considerando nível de significância de 5% (p < 0,05).

Resultados

    Todos os dados apresentaram distribuição normal e homogênea (p > 0,05). A análise de correlação indicou associações positivas entre os traços de ansiedade pré e pós-espetáculo (r = 0,840; p < 0,001; Figura 2A), entre os estados de ansiedade pré e pós-espetáculo (r = 0,385; p = 0,024; Figura 2B) e entre o estado e o traço de ansiedade pós-espetáculo (r = 0,393; p = 0,023; Figura 2C). Contudo, não foram encontradas associações significativas entre o estado e o traço de ansiedade pré-espetáculo (r = 0,279; p = 0,115).

Figura 2. Força de Associação entre as variáveis. A: Associação positiva entre traços de ansiedade pré e pós-espetáculo (p < 0,05); B: Associação positiva entre 

estados de ansiedade pré e pós-espetáculo (p < 0,05); C: Associação positiva entre traços e estados de ansiedade pós-espetáculo (p < 0,05). Correlação de Pearson

    Não foi encontrada diferença significativa entre o traço de ansiedade pré e pós-espetáculo (p = 0,322), contudo, houve uma redução significativa (p = 0,007) do estado de ansiedade após o espetáculo (Tabela 1). A Tabela 2 demonstra que este decréscimo do estado de ansiedade ocorreu tanto por aumento das sensações positivas (p = 0,011), quanto por diminuição das sensações negativas (p = 0,048), sem diferenças entre tais aspectos antes (p = 0,116) e após o espetáculo (p = 0,324).

Tabela 1. Resultados do IDATE-Traço (n=33) e Estado (n=34) pré e pós-espetáculo

 

Tabela 2. Comparações dos aspectos positivos e negativos do IDATE-Estado pré e pós-espetáculo (n=34)

Discussão

    Os resultados da análise de correlação indicaram uma associação forte e positiva entre os traços de ansiedade antes e após o espetáculo (r = 0,840; p < 0,001), o que era esperado por refletir aspectos da personalidade, que são estáveis (Samulski, 2009). Já entre os estados de ansiedade pré e pós-espetáculo a associação positiva foi fraca (r = 0,385; p = 0,024) talvez o término da apresentação tenha sido motivo de relaxamento para alguns, mas de preocupação para os que ficaram insatisfeitos com seu desempenho, o que poderia influenciar a força de associação.

    Quanto aos aspectos permanentes e transitórios, foi encontrada uma associação positiva fraca entre traço e estado de ansiedade após o espetáculo
(r = 0,393; p = 0,023), demonstrando que estudantes com maior traço de ansiedade tendem a apresentar estado de ansiedade mais elevado. O que é coerente com os achados de Pereira et al (2014) que encontraram uma correlação positiva entre a ansiedade traço e estado de ansiedade (r= 0,275; p<0,01), contudo, antes do espetáculo, o que não foi evidenciado no presente estudo. Possivelmente, a necessidade de participação em um espetáculo de danças desencadeie ansiedade mesmo em alunos que apresentem traços mais baixos.

    Neste aspecto, Silva e Carneiro (Silva & Carneiro, 2006) demonstram que a maioria dos ingressantes no curso de educação física escolhe esta carreira por gostar e praticar esportes e atividades físicas, porém, apenas 1,7% demonstraram interesse em atuar na área de dança, enquanto somente 0,57% relataram desejar combinar educação física com artes cênicas, o que talvez exponha estes indivíduos a maiores níveis de ansiedade durante apresentações de dança. Além disso, a dança está sujeita aos estereótipos de corpo disseminados pela mídia (Bittencourt, 2014) esta exposição em caráter avaliativo poderia aumentar a importância do desempenho do estudante. Desta forma, ainda que não apresentem fortes traços de ansiedade, o estado de ansiedade poderia elevar-se frente à obrigatoriedade de participação neste evento artístico.

    No presente estudo, o estado de ansiedade dos estudantes diminuiu após o espetáculo, o que também foi percebido em pesquisas que fizeram análises semelhantes em bailarinos profissionais (Constantino, Prado & Lofrano-Prado, 2010) e também parece ter ocorrido em bailarinos competitivos (Pereira et al., 2014). Acredita-se que a participação no UnilesteGYM possa desencadear, medo, tensão, preocupação, assim, antes das apresentações os estudantes se encontrariam mais ansiosos pela proximidade do momento do espetáculo, pelo fato das apresentações serem avaliativas, pela presença da platéia. Depois das apresentações esse nível de ansiedade pode cair já que o fator estressante não existe mais.

    Os estados de ansiedade do presente estudo (pré = 41,97 ± 9,96 e pós = 35,09 ± 10,32) indicam ansiedade em grau médio (31 a 49) o que já foi evidenciado em estudantes de enfermagem: 42,7 ± 5,7 (Santos & Galdeano, 2009) e de outros cursos universitários do nordeste: 41,8 ± 9,4 e do sudeste brasileiro: 43,8 ± 10,7 (Gama, Moura, Araújo & Teixeira-Silva, 2008). E também é coerente com o identificado, respectivamente, antes e após competição em bailarinos do sexo feminino: 42 ± 7 e 37 ± 7 e masculino: 39 ± 7 e 35 ± 8 (Pereira et al., 2014) e também em bailarinos profissionais: 37,61 ± 5,88 e 32,42 ± 6,21 (Constantino, Prado & Lofrano-Prado, 2010). No entanto, os graduandos em educação física parecem mais tranquilos que os voluntários de Zapelini, Brazilino e Morales (2015) cujos resultados demonstraram que 47% dos bailarinos de dança de rua competitiva apresentavam estado de ansiedade igual ou superior a 50. Desta forma o projeto UnilesteGYM não parece ser um fator estressante diferente daqueles já vivenciados por universitários, ou por bailarinos profissionais e amadores.

    Antes do espetáculo os estudantes manifestaram maior frequência de sensações desagradáveis, como medo, insegurança, tensão, arrependimento e menor frequência de sensações de alegria e satisfação, quadro que se inverte após as apresentações. Assim, ainda que este festival de dança possa intimidar os participantes, a sua realização parece ser também fonte de bem-estar, é provável que contribua para autoestima e segurança destes indivíduos, além de estimular a prática e a valorização da dança.

Conclusão

    Os graduandos em educação física apresentam sintomas de ansiedade durante a participação no UnilesteGYM, com uma redução dos mesmos após o espetáculo, o que ocorre tanto por diminuição de sensações negativas, como medo e tensão, quanto por aumento de sensações positivas, como alegria e segurança. Talvez estas alterações positivas resultantes do enfrentamento do desafio de participar do festival beneficie os estudantes sob o aspecto afetivo.

    Por fim ressalta-se a importância de realizar estudos acerca dos benefícios e do potencial dos diferentes estilos de dança para melhoria e manutenção da saúde e qualidade de vida de pessoas de diferentes faixas etárias.

Bibliografia

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