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Reconhecimento dos riscos ocupacionais
em laboratórios de prótese dentária

El reconocimiento de los riesgos profesionales en los laboratorios dentales

Recognition of occupational hazards in dental laboratories

 

Secretaria Municipal de Saúde Pública de Campo Grande-MS

Universidade Federal de Mato Grosso do Sul (UFMS)

(Brasil)

Vivian Rosa dos Santos Paes de Barros*

Joel Saraiva Ferreira**

falecomjoel@hotmail.com

 

 

 

 

Resumo

          Os laboratórios de prótese dentária são estabelecimentos onde atuam os técnicos em próteses dentária (TPD), profissionais que, sob a requisição de um cirurgião-dentista, elaboram aparelhos e peças protéticas odontológicas. A variedade e a complexidade de materiais e procedimentos envolvidos no processo de trabalho destes profissionais são causadoras de importantes riscos ocupacionais. O objetivo deste trabalho foi estudar aspectos relacionados aos riscos ocupacionais encontrados nos laboratórios de prótese dentária e os desafios para atuação da Vigilância Sanitária, órgão responsável pela fiscalização das condições sanitárias e dos processos de trabalho nestes estabelecimentos. Para isso, optou-se pela realização de uma pesquisa bibliográfica, envolvendo a busca de artigos científicos, legislações, normas e manuais sobre os riscos e práticas em laboratórios de prótese dentária. Os resultados do estudo indicaram a deficiência de conhecimento cientifico por parte dos técnicos em prótese dentária, carência de legislação federal e diretrizes na área e baixa adesão às medidas de segurança no trabalho. Dessa forma, as práticas atuais em laboratórios de prótese dentária colocam em risco a saúde de seus trabalhadores, bem como dos cirurgiões-dentistas e pacientes que se utilizam de seus serviços.

          Unitermos: Vigilância sanitária. Saúde do trabalhador. Condições de trabalho. Riscos ocupacionais.

 

Abstract

          Dental laboratories are facilities where dental technicians, under dentists’ request, manufacture dental prosthesis and appliances. The variety and complexity of the materials and procedures involved in these professionals line of work cause important occupational hazards. This work’s aim was to study aspects on the dental technicians occupational hazards in dental laboratories, under the perspective of sanitary and occupational health surveillance. For this, it was chosen a literature review on the risks and practices performed in these laboratories, involving the search of scientific articles, laws, guides and manuals. It was observed that most professionals aren’t aware of the profession’s occupational risks and that there is poor adherence to safety measures. Thus, the current practices in dental laboratories endanger the workers health, as well as of dentists and patients who use their services.

          Keywords: Health surveillance. Occupational health. Work hazards. Occupational hazards.

 

Recepção: 06/10/2015 - Aceitação: 17/01/2016

 

 
EFDeportes.com, Revista Digital. Buenos Aires, Año 20, Nº 214, Marzo de 2016. http://www.efdeportes.com/

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Introdução

    Ao lado do câncer de boca, a ausência de dentes é um dos mais graves problemas da saúde bucal no Brasil. Dados da Pesquisa Nacional de Saúde Bucal “SB Brasil 2010” apontaram que 92,7% dos indivíduos de 65 a 74 anos e 68,8% dos indivíduos na faixa etária de 35 a 44 anos necessitam de prótese dentária (Brasil, 2011). Considerando-se o dever de garantir acesso integral às ações de saúde bucal, o Ministério da Saúde procura investir na reabilitação protética bucal da população usuária do Sistema Único de Saúde (SUS). Para isso está implantando os Centros de Especialidades Odontológicas (CEO) e Laboratórios Regionais de Próteses Dentárias (LRPD) (Murakami; Moysés; Moysés, 2007; Brasil, s/d, Brasil, 2011).

    À frente dos laboratórios de prótese dentária, públicos ou privados, encontra-se a figura do Técnico em Prótese Dentária (TPD). Este profissional é responsável, dentre outras atribuições, pela elaboração e reparos das próteses e aparelhos protéticos, sempre sob a requisição de um cirurgião-dentista, para um determinado paciente. De acordo com o Conselho Federal de Odontologia (CFO), no Brasil, há um total de 21026 TPD cadastrados (Conselho Federal de Odontologia, 2014).

    Como recursos humanos auxiliares, nos laboratórios de próteses dentárias, atuam também auxiliares em prótese dentária (APD), recepcionistas, entregadores (motoboys) e funcionários responsáveis pela limpeza. A saúde destes trabalhadores é condicionada à exposição a uma diversidade de riscos ocupacionais, sendo que o TPD merece atenção especial pela alta concentração de riscos a que se expõe e pela responsabilidade de zelar pela saúde de seus funcionários, quando responsável técnico. Observa-se comumente a falta de padronização nas condutas e falta de cuidados com os riscos ocupacionais desta profissão. Muitos profissionais atuam na informalidade, inclusive em dependências de suas residências, compartilhando ambientes e utensílios das mesmas, colocando em risco sua saúde e de suas famílias.

    Sendo o trabalho a base da organização social e direito humano fundamental, é dever do Sistema Único de Saúde (SUS) garantir que este seja realizado em condições que contribuam para a melhoria da qualidade de vida, a realização pessoal e social dos trabalhadores, sem prejuízo para sua saúde, integridade física e mental (Brasil, 2004). A execução das ações voltadas para a saúde do trabalhador é atribuição do SUS, prescritas na Constituição Federal de 1988 e regulamentadas pela Lei Orgânica da Saúde. Perante a lei, Saúde do trabalhador é definida como um conjunto de atividades que se destina, por meio das ações de vigilância epidemiológica e vigilância sanitária, à promoção e proteção da saúde do trabalhador, assim como visa à recuperação e à reabilitação dos trabalhadores submetidos aos riscos e agravos advindos das condições de trabalho (Brasil, 2001b).

    Cabe à Vigilância Sanitária normatizar, fiscalizar e controlar as condições de trabalho nos laboratórios de prótese dentária públicos ou privados. Conforme o Protocolo das ações de Vigilância Sanitária da Agencia Nacional de Vigilância Sanitária (ANVISA), a inspeção em estabelecimentos de interesse da área de saúde do trabalhador, inclusive de estabelecimentos de prótese odontológica, deve ser realizada por equipe composta por profissionais de nível médio ou superior, com capacitação em ações básicas de Vigilância Sanitária (VISA) e/ou capacitações específicas na área. São objetivos da inspeção vistoriar as condições físicas e higiênico-sanitárias das instalações, equipe de trabalho, vínculo, equipamentos, materiais e produtos utilizados, equipamentos de proteção individual (EPI), processo produtivo, monitorização biológica e ambiental dos riscos, incidência de acidentes e outros agravos relacionados ao trabalho, bem como, a assistência e os encaminhamentos adotados e documentação (ANVISA, 2007b). Contudo, não há uma legislação federal específica regulamentando as condições para o funcionamento destes estabelecimentos ou estabelecendo condutas para proteção da saúde dos que trabalham nestes locais, especialmente os técnicos em prótese dentária.

    Diante destes fatos, torna-se fundamental direcionar o foco da saúde do trabalhador também a esta profissão. A presente pesquisa teve como objetivo o reconhecimento dos riscos ocupacionais e das condições e processos de trabalho da profissão do técnico de prótese dentária, conforme descritos na literatura, e a identificação dos desafios para a atuação da Vigilância Sanitária nos seus ambientes de trabalho.

Procedimentos metodológicos

    O presente estudo caracteriza-se como uma Revisão Narrativa (Rother, 2007) e para o seu desenvolvimento foram selecionados artigos científicos de revistas nacionais e internacionais, legislações e normas nacionais, assim como manuais de órgãos oficiais, nas línguas portuguesa e inglesa. Os temas pesquisados envolviam as práticas e riscos ocupacionais de laboratórios de próteses dentárias, de importância para a saúde dos técnicos em prótese dentária. As datas de publicação das referências selecionadas partiram do ano de 1982 ao ano de 2014.

    Os artigos científicos foram obtidos por meio de pesquisas aos bancos de dados Pubmed, Scielo, CAPES, Science Direct e pelos endereços eletrônicos específicos das revistas científicas.

    Para as demais fontes, a pesquisa foi realizada nos endereços eletrônicos dos órgãos oficiais como Ministério da Saúde, Ministério do Trabalho e Emprego (MTE) e Center of Diseases Control (CDC).

    Os termos utilizados para as buscas foram: técnico em prótese dentária; laboratórios de prótese dentária; riscos ocupacionais e saúde do trabalhador, assim como seus equivalentes para a língua inglesa.

    Todo o levantamento teórico, incluindo a revisão e a discussão dos estudos selecionados, foi realizado no período de agosto de 2011 a abril de 2014.

    Os dados coletados foram organizados em três grupos de assuntos, sendo um deles relacionado às atividades profissionais em laboratórios de prótese dentária, outro envolvendo os riscos ocupacionais e, por fim, a atuação da Vigilância Sanitária. Tal organização teve por finalidade sistematizar a discussão das informações de forma cronológica e por afinidade de assuntos.

Desenvolvimento

    Após os procedimentos de coleta de dados, foram selecionados 43 materiais bibliográficos que atenderam os critérios mencionados anteriormente. A seguir, são apresentadas tais informações, conforme a organização adotada para agrupar os assuntos considerados relevantes para discussão da temática abordada.

Exercício profissional do TPD e equipe de apoio

    A Lei Federal nº 6.710 de 05 de novembro de 1979, regulamentada pelo Decreto nº 87.689 de 11 de outubro de 1982, dispõe sobre a profissão de Técnico em Prótese Dentária e determina outras providências. O exercício da profissão de TPD, em todo o território nacional, somente é permitido aos profissionais inscritos no Conselho Regional de Odontologia da jurisdição em que exerçam a profissão. A obediência à proibição de prestação de assistência direta a clientes (pacientes) é essencial para sua atuação (Brasil, 2008b).

    De acordo com o Catálogo Nacional de Cursos Técnicos do Ministério da Educação (MEC) de 2008, o curso técnico para formação do TPD faz parte do Eixo Tecnológico: Ambiente, Saúde e Segurança. Tal eixo compreende tecnologias associadas à melhoria da qualidade de vida, à preservação e utilização da natureza, desenvolvimento e inovação do aparato tecnológico de suporte e atenção à saúde. Como possíveis locais de atuação deste profissional são relacionados: Laboratório de prótese dentária e de aparelhos ortodônticos, clínicas e consultórios odontológicos, serviços públicos de saúde e empresas de materiais odontológicos.

    Quanto aos APD, para se habilitar ao registro e à inscrição, o interessado deverá ser portador de certificado expedido por curso que atenda integralmente ao disposto nas normas vigentes do órgão competente do Ministério da Educação e, na ausência destas, em ato normativo específico do Conselho Federal de Odontologia. Este, somente pode exercer sua atividade sempre sob a supervisão do cirurgião-dentista ou do TPD, em consultórios, clínicas odontológicas ou laboratórios de prótese dentária, em estabelecimentos públicos ou privados (Conselho Federal de Odontologia, 2014).

    Os laboratórios de prótese dentária devem ser inscritos no Conselho Regional de Odontologia da jurisdição em que estejam instalados (Brasil, 1982). Tratam-se de estabelecimentos onde, sob a requisição de um cirurgião-dentista, são elaboradas e reparadas próteses e aparelhos dentários pelo TPD e sua equipe. Com o objetivo de substituir estruturas vivas bucais perdidas de diferentes composições, comportamentos e funções, as próteses e aparelhos dentários contêm os mais variados e complexos elementos, como ligas metálicas, cerâmicas, resinas, materiais plásticos e outros materiais combinados.

    Além da complexidade de processos envolvidos na fabricação e reparo das peças protéticas, a tentativa de substituir estruturas bucais orgânicas exige um trabalho minucioso e muitas vezes artístico, exigindo grande empenho e concentração pelos profissionais que ali atuam. Somados a estes fatores, acrescenta-se a demanda de resultado, qualidade e agilidade do serviço pelos cirurgiões-dentistas. Nestes estabelecimentos, os trabalhadores estão expostos a muitos riscos, tal qual a complexidade e variedade das atividades realizadas em cada um deles, por isso são relevantes os estudos que confrontam a legislação pertinente à área de saúde do trabalhador, com as condições laborais existentes e descritas na literatura.

Riscos ocupacionais em laboratórios de prótese dentária

    O reconhecimento dos riscos ambientais é uma etapa fundamental do processo que servirá de base para decisões quanto às ações de prevenção, eliminação ou controle desses riscos. Reconhecer o risco significa identificar, no ambiente de trabalho, fatores ou situações com potencial de dano à saúde do trabalhador ou, em outras palavras, se existe a possibilidade deste dano (Brasil, 2008a). A incorporação de novas tecnologias e de métodos gerenciais nos processos de trabalho modifica o perfil de saúde, adoecimento e sofrimento dos trabalhadores. Essas mudanças se expressam no aumento da prevalência de doenças relacionadas ao trabalho (Brasil, 2006b).

    Tem-se hoje à disposição uma grande variedade de produtos e serviços de saúde que facilitam e estendem a sobrevida humana, mas grande parte dessas tecnologias é potencialmente iatrogênicas, o que faz com que a qualidade, eficácia, segurança e a racionalidade em seu uso ou consumo tornem-se questões críticas para a saúde pública e uma preocupação para a sociedade, colocando desafios para os órgãos responsáveis pelo controle sanitário (Brasil, 2006d).

    Classicamente, os fatores de risco para a saúde e segurança dos trabalhadores, presentes ou relacionados ao trabalho, podem ser classificados em cinco grandes grupos: físicos; químicos; biológicos; ergonômicos e psicossociais; mecânicos e de acidentes.

    Dentre os muitos ambientes de trabalho, merecem destaque os laboratórios de prótese dentária, nos quais se observam deficiências em conhecimentos e práticas de biossegurança, visíveis na irregularidade da desinfecção de instrumentos de trabalho e das peças protéticas e pela baixa cobertura vacinal dos trabalhadores. Além disso, as condições de proteção individual e coletiva são ausentes ou inadequadas frente aos agentes químicos a que os TPD estão expostos e há sobrecarga de trabalho, indicada pela existência de jornadas extensas e pela inadequação de postos de trabalho (Ellero e Lepera, 2008).

    Observando o conteúdo programático de um curso técnico de formação de TPD, nota-se, proporcionalmente às demais disciplinas, número reduzido de horas para as disciplinas relacionadas à saúde do trabalhador e biossegurança (Pernambuco, 2011). Esse fato, somado a outros fatores, pode ser o desencadeador de muitos problemas relacionados à saúde do TPD, pois o profissional que não é capacitado para determinada situação, dificilmente será capaz de adotar uma prática que afaste os riscos aos quais está eventualmente exposto.

    Em relação ao risco biológico, o manejo pelo TPD dos moldes contaminados recebidos dos cirurgiões-dentistas, importante porta de entrada para a contaminação biológica nos laboratórios, merece destaque. Estudos revelaram a inadequação das medidas de limpeza e desinfecção utilizadas nos moldes recebidos, falta de comunicação entre laboratórios e clínicas sobre a responsabilidade sobre estes procedimentos e baixa adesão à utilização de EPI (Kugel et al., 2000; Al-Dwairi, 2007; Marya et al., 2011; Silva et al., 2010; Queiroz, 2010). Há ainda a necessidade de padronização e aprimoramento do ensino das técnicas de desinfecção de moldes nos cursos para TPD, além de melhora na comunicação entre laboratório e consultório, visando aprimorar a qualidade dos trabalhos e a redução da chance de contaminação cruzada (Kugel et al., 2000).

    O uso das precauções-padrão é de fundamental importância para se evitar infecção ocupacional a partir de uma exposição acidental a material biológico. Todos os moldes, modelos de gesso e próteses devem ser propriamente desinfetadas antes do seu envio ao laboratório de prótese, bem como quando são enviadas ao consultório, previamente à inserção na boca dos pacientes (Chassot; Poisl; Samuel, 2006). Egusa et al. (2008) detectaram a presença de Cândida, Methicillin-resistant Staphylococcus aureus (MRSA) e P. aeruginosa, conhecidos patógenos responsáveis por infecções nosocomiais e/ou infecções que ameaçam a vida de hospedeiros imunocomprometidos em moldes de alginato provenientes de pacientes.

    A chave para desinfecção bem sucedida de moldes está na manutenção das propriedades físico-químicas dos materiais de moldagem (Alves-Rezende; Lorenzato, 1999). Não há consenso a respeito do material desinfetante adequado para cada tipo de material de moldagem e muitos profissionais (TPD e cirurgiões-dentistas) alegam não realizar os procedimentos de desinfecção, pois poderiam resultar em alterações nos modelos de gesso obtidos. Como conseqüência de um molde distorcido, a peça protética seria elaborada sobre uma réplica (modelo de gesso) distorcida das estruturas bucais do paciente, ocorrendo desadaptação da peça. Ainda, Pasini, Boscarioli e Pinto (2002) alegam que os materiais de moldagem podem absorver água e os sais dos agentes de desinfecção eventualmente impregnam a superfície dos moldes e são transferidos para a superfície do gesso, prejudicando as suas propriedades. Como recomendação oficial, o Ministério da Saúde (Brasil, 2000) preconizou a aspersão ou imersão em hipoclorito de sódio a 1% por um período de dez minutos para moldes de alginato e imersão em glutaraldeído a 2% por dez minutos para materiais como siliconas, mercaptanas, polissulfetos e poliésteres. Previamente aos procedimentos desinfetantes, recomenda-se a lavagem em água corrente. Alguns estudos realizados com moldes a base de poliéteres e siliconas demonstraram que os procedimentos de desinfecção não interferiram nas propriedades destes materiais (Alves-Rezende; Lorenzato, 1999; Silva; Salvador, 2004). No entanto, os alginatos são materiais sensíveis à perda e ganho de umidade e, portanto, mais suscetíveis às alterações dimensionais.

    Estudo conduzido em João Pessoa-PB revelou que 92% dos TPD entrevistados acreditavam na possibilidade de ocorrer infecção cruzada entre os laboratórios de prótese e os consultórios odontológicos, entretanto 64% declararam não realizar nenhum procedimento de desinfecção nos trabalhos recebidos. A maior parte dos técnicos (96%) afirmou que não conhecem nenhum TPD ou APD que tenha se infectado no laboratório com doenças infectocontagiosas (Silva et al., 2010).

    Um procedimento comum na prática odontológica é o envio de próteses totais confeccionadas em acrílico (dentaduras) em uso pelos pacientes para ajustes, reembasamentos, reparos e/ou polimentos no laboratório de prótese. Tais peças permaneceram na cavidade bucal dos pacientes muitas vezes por anos e, portanto, são grandes fontes de micro-organismos. No ciclo de contaminação cruzada que ocorre nos laboratórios de prótese, são fontes de suma importância. A transmissão dos micro-organismos presentes nas próteses para os profissionais e equipamentos utilizados nas próteses e, por conseqüência para outros trabalhos protéticos, foi comprovada (Agostinho et al., 2004).

    Já em relação aos riscos químicos, numerosos agentes estão presentes na rotina de trabalho dos TPD. De acordo com Ministério da Saúde (Brasil, 2006c), o reconhecimento e a análise dos riscos relacionados a agentes químicos são atividades prioritárias para qualificar a intervenção na defesa da saúde do trabalhador. No processo de desinfecção de moldes, os profissionais utilizam a imersão ou aspersão destes em hipoclorito de sódio e/ou glutaraldeído (Torbica; Krstev, 2006; Brasil, 2006a; ANVISA, 2007a), na maioria das vezes sem qualquer tipo de cuidado ou proteção respiratória ou cutânea. Na confecção de próteses, os TPD entram em contato direto (mãos sem luvas) com metacrilato, substância potencialmente neurotóxica e irritante (Rajaniemi, 1986; Parizi et al., 2005).

    Ainda no processo de elaboração de peças protéticas, são liberadas substâncias como sílica (Ribeiro, 2010) e demais agentes químicos tóxicos como solventes, ácidos minerais, gases e vapores liberados durante polimerização, fundição de metais e cocção de porcelana, os quais têm potencial de afetar o sistema nervoso central (Bernstein et al., 1994; Torbica; Krstev, 2006; Fabrizio et al., 2007). Na exposição ocupacional à sílica, a inalação de poeira freqüentemente ultrapassa os limites de reparação do organismo, estando associada ao desenvolvimento de silicose, câncer de pulmão, tuberculose e doenças auto-imunes (Ribeiro, 2010).

    Quanto aos riscos físicos, os trabalhadores que atuam em LP estão sujeitos à exposição contínua ou intermitente aos ruídos de diferentes intensidades produzidos nestes estabelecimentos (Mojarad; Massum; Samavat, 2009; Kumar et al., 2011). Dessa forma, podem desenvolver perda auditiva ocupacional (Doğan et al., 2008; Kumar et al., 2011). Como conseqüências do ruído, também podem ocorrer interferências na fala, perturbação, redução na eficiência de trabalho e danos psicológicos (Kumar et al., 2011). O ruído produzido pelos equipamentos nestes ambientes de trabalho deve ser alvo de monitoramento e controle. Associado ao uso de EPI, a saúde auditiva destes trabalhadores deve ser monitorada regularmente a fim de evitar doenças ocupacionais (Doğan et al., 2008).

    Estudos observacionais realizados em laboratórios de prótese dentária, como o de Queiroz (2010), apontam o uso de equipamentos e mobiliários improvisados, inadequados e/ou mal adaptados gerando desconforto e dores aos profissionais. A adoção de posturas inadequadas por profissionais da Odontologia, conforme estudo de Samat et al. (2011), resultou em chance 3,5 maior de desenvolver dores nas costas. Dentre os profissionais observados, encontrou-se maior prevalência de dores nas costas para os TPD (52,4%). A necessidade de se adotar medidas de segurança em ergonomia para estes locais de trabalho é essencial, organizando o ambiente de trabalho quanto ao espaço e disposição de mobiliários, assim como na regulagem de altura dos postos de trabalho para cada indivíduo e na adoção de pausas periódicas para os funcionários (Salve; Bankoff, 2003; Torbica; Krstev, 2006; Tiebout; Winings; Rogers; 2007).

Conclusão

    O processo de trabalho nos laboratórios de prótese dentária envolve a exposição rotineira dos trabalhadores a diversos riscos ocupacionais, sendo eles de natureza química; física; biológicos; mecânicos e de acidentes; ergonômicos e psicossociais. Diante destes complexos ambientes de trabalho, encontra-se o técnico de prótese dentária, responsável pela execução de trabalhos a pedido de cirurgiões-dentistas e pela coordenação da sua equipe. São exercidas longas jornadas de trabalho, muitas vezes em posturas inadequadas, em condições precárias ou improvisadas e com baixa adesão a medidas de segurança, seja pelo desconhecimento das mesmas ou descrédito quanto às conseqüências nocivas à saúde.

    Atualmente, observa-se a carência de atenção a esta profissão pelos órgãos normatizadores e quantidade reduzida de estudos científicos acerca dos riscos ocupacionais, bem como da existência de processos de formação técnica que não contemplam o necessário para exercício saudável da profissão. Dessa forma, a fiscalização nestes estabelecimentos quanto às condições sanitárias e de saúde do trabalhador torna-se desafiadora. A saúde do TPD não é a única colocada em risco. Cirurgiões-dentistas, sua equipe auxiliar e pacientes podem ser afetados pela conseqüente exposição a agentes biológicos e químicos e pela baixa qualidade do serviço prestado.

    Torna-se necessário incentivar a pesquisa cientifica sobre os riscos da profissão, a criação de grupos técnicos para elaboração de legislações, a revisão do conteúdo programático dos cursos de formação de TPD e atuar frente aos TPD do mercado de trabalho para que sejam agentes responsáveis pela sua saúde e das pessoas vinculadas ao trabalho deste profissional.

    Além disso, é importante atuar com cirurgiões-dentistas, orientando-os a somente contratar serviços de laboratórios licenciados pela Vigilância Sanitária responsável e buscando melhorar a relação entre estes profissionais. Dessa forma, os cirurgiões-dentistas são agentes importantes no combate às condições inadequadas de trabalho e biossegurança nos estabelecimentos onde se confeccionam os trabalhos protéticos. Ao solicitarem somente serviços de laboratórios cadastrados e licenciados pela Vigilância Sanitária, certificam-se de que os ambientes e processos de trabalho destes estabelecimentos foram fiscalizados e os responsáveis foram orientados quanto à proteção de sua saúde e de sua equipe. Acima de tudo, os cirurgiões-dentistas respaldam-se no fato de que estabelecimentos submetidos à fiscalização tendem a apresentar menor risco de contaminação biológica e química para sua equipe e pacientes, assegurando também a qualidade do serviço prestado, seja ele público ou privado.

Agradecimentos

    Os autores agradecem a Escola Nacional de Saúde Pública (ENSP/FIOCRUZ) e a Escola de Saúde Pública de Mato Grosso do Sul (ESP/SES/MS) pelo auxílio no desenvolvimento do curso de Especialização em Saúde do Trabalhador e Ecologia Humana, do qual se originou a monografia que agora foi formatada no presente artigo.

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EFDeportes.com, Revista Digital · Año 20 · N° 214 | Buenos Aires, Marzo de 2016
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