efdeportes.com

Contribuições da psicofisiologia à análise da 

experiência do usuário relacionada a jogos eletrônicos

Contribuciones de la psicofisiología al análisis de la experiencia del usuario en relación a los juegos electrónicos

 

Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC)

(Brasil)

Karen Cristine Teixeira

Luciano Caminha Junior

karen_cristine_teixeira@hotmail.com

 

 

 

 

Resumo

          Os jogos eletrônicos têm ganhado cada vez mais destaque nas últimas décadas e apresentam objetivos bastante diversificados. Além do objetivo principal de entreter o jogador, objetivos possíveis se relacionam com a aprendizagem de conteúdos e habilidades cognitivas. O estudo da experiência do usuário permite avaliar a efetividade do jogo em proporcionar aprendizado e como o jogador reage aos elementos presentes nele. Dada a importância que o engajamento, a imersão e o afeto positivo possuem no sucesso de um jogo eletrônico, seja ele educativo ou não, diferentes métodos foram desenvolvidos para acessar a experiência do usuário na relação com o jogo. Protocolos baseados em indicadores psicofisiológicos. A análise das reações fisiológicas do indivíduo na interação com o jogo vem sendo utilizada em larga escala para compreender fenômenos como atenção, excitação, desempenho, estresse mental, cognição e emoções.

          Unitermos: Experiência do usuário. Psicofisiologia. Jogos eletrônicos.

 

Resumen

          Los juegos electrónicos vienen teniendo cada vez más importancia en las últimas décadas y tienen muy diversos objetivos. Además del objetivo principal de entretener al jugador, los posibles objetivos están relacionados con el aprendizaje de contenidos y habilidades cognitivas. El estudio de la experiencia del usuario evalúa la eficacia del juego para proporcionar el aprendizaje y cómo el jugador reacciona a los elementos presentes en el mismo. Dada la importancia que la participación, la inmersión y el efecto positivo tienen sobre el éxito de un juego electrónico, ya sea educativo o no, fueron desarrollados diferentes métodos para acceder a la experiencia del usuario en relación con el juego. El análisis de las reacciones fisiológicas de la persona que interactúa con el juego ha sido utilizado en gran escala para entender fenómenos tales como la atención, excitación, rendimiento, estrés mental, cognición y emociones.

          Palabras clave: Experiencia del usuario. Psicofisiología. Juegos electrónicos.

 

Recepção: 22/09/2015 - Aceitação: 28/10/2015

 

 
EFDeportes.com, Revista Digital. Buenos Aires, Año 20, Nº 210, Noviembre de 2015. http://www.efdeportes.com/

1 / 1

    Os jogos eletrônicos favorecem a aprendizagem de novos conteúdos e incrementam o repertório de habilidades cognitivas e intelectuais, indispensáveis para o desenvolvimento de uma visão estratégica (Prensky, 2000; Gee, 2003). Segundo Fernandes (2010) o feedback imediato, o nível de interatividade e de desafio, elementos surpresas e o estabelecimento de regras e objetivos educacionais são alguns elementos presentes nos jogos que motivam o aprendizado e o envolvimento do jogador.

    A qualidade de cada jogo eletrônico e a capacidade que possui de entretenimento afeta diretamente a motivação dos usuários para a prática. Tradicionalmente, o processo de testagem da qualidade de um jogo eletrônico é focado em procurar defeitos de programação (bugs), priorizando a qualidade técnica do produto. Quando ocorre algum tipo de testagem com foco no usuário, esta é feita com um alto grau de informalidade (Nacke, Drachen & Göble, 2010). Dada a importância que o engajamento, a imersão e o afeto positivo possuem no sucesso de um jogo eletrônico, seja ele educativo ou não, diferentes métodos foram desenvolvidos para se acessar a Experiência do Usuário (EU) na relação com o produto.

    A busca por formas de mensuração acerca da experiência do usuário na prática dos jogos eletrônicos e seus estudos decorrentes têm crescido nas últimas décadas. Este é um reflexo do alto impacto econômico que os videogames, como sistemas de entretenimento, obtiveram na sociedade (Sánchez, Vela, Simarro & Padilla-Zea, 2012). Há muito debate sobre a definição de experiência do usuário. A ISO FDIS 9241-210 define experiência do usuário como a percepção e resposta de um indivíduo que deriva do uso e/ou o uso antecipado de um produto, sistema ou serviço (Bevan, 2009). A esta definição inclui-se ainda as emoções do usuário, crenças, preferências, percepções, respostas físicas e psicológicas, comportamentos e o acompanhamento do que acontece antes, durante e depois do uso (Bevan, 2009).

    Na perspectiva da experiência do usuário, o produto não é visto primariamente por sua funcionalidade ou benefícios, mas pelas experiências que são capazes de provocar (Savi, Wangenheim, Ulbricht & Vanzin, 2010). Segundo Gámez (2009) o objetivo final da avaliação de EU é acessar se o usuário obteve como resultado da interação uma experiência positiva. No caso dos jogos eletrônicos então, uma boa experiência seria aquela em que se provocam efeitos de imersão, emoções de valência positiva e desafio para o usuário (Savi, Wangenheim, Ulbricht & Vanzin, 2010).

    A experiência do usuário pode ser analisada pelas reações do jogador aos efeitos do jogo (respostas fisiológicas, emocionais e comportamentais), pelas ações que ele executa no ambiente virtual (medidas próprias do jogo) e pela evocação das memórias da prática (entrevistas, questionários) (Nacke, Drachen & Göbel, 2010). A análise das reações psicofisiológicas do indivíduo na interação com o jogo vem sendo utilizada em larga escala para compreender fenômenos como atenção, excitação, desempenho, estresse mental, cognição e emoções (Lin & Imamiya, 2006).

    A interação com mídias eletrônicas pode atuar como reguladora de estados de humor, modificando-os positivamente. Mais precisamente em relação aos jogos eletrônicos, estes apresentam um potencial diferenciado das demais mídias no que concerne a modificações dos estados de humor dos usuários (Zilmmann & Bryant, 1985). Bowman e Tamborini (2012) encontraram como resultado em sua pesquisa, o fato de a interação com o jogo se constituir como um reparador de humor, principalmente quando os participantes se encontravam estressados ou entediados antes da interação com a mídia.

    Os estados de humor, bem como as emoções e afetos, interferem diretamente na relação entre o usuário e o jogo, este também podendo contribuir para a modificação do humor. O estudo da relação entre a experiência do usuário e modificações humorais é bastante relevante no que diz respeito aos serious games, que se caracterizam como jogos que objetivam a aprendizagem por meio da simulação. Isso, porque o humor exibe relações com o processo de aprendizagem como um todo, percepção, tomada de decisões e motivação (Wu, Tzeng & Huang, 2014).

    Por outro lado, dentre os indicadores fisiológicos mais utilizados para a mensuração da experiência do usuário, destacam-se a resposta galvânica da pele, a eletromiografia dos músculos faciais, a variabilidade da freqüência cardíaca (VFC), a análise do comportamento ocular e o eletroencefalograma (Lin & Imamiya, 2006, Nacke, Drachen & Göbel, 2010). Dados psicofisiológicos trazem contribuições para a área da EU por fornecerem respostas independentes das declarações do indivíduo, por serem obtidas em tempo real durante a experiência e por indicar os impactos de um jogo eletrônico nos estados fisiológicos do usuário (Nacke, Drachen & Göbel, 2010, Kivikangas et al, 2010).

    Um aumento em indicadores de ativação simpática durante uma tarefa sugere que o indivíduo está mais mobilizado e envolvido na atividade que está realizando (Giakoumis et al, 2009). Este aumento nos indicadores de ativação pode ser fruto de elementos externos à atividade como ruídos no ambiente, movimentação ou conversa, sendo necessário, nestes casos, ferramentas adicionais como um vídeo das ações do jogador que controlem estas variáveis.

    A análise do comportamento cardíaco não se restringe apenas à observação da freqüência cardíaca, a VFC é uma medida que possui fortes implicações na análise de jogos eletrônicos, já que através dela é possível inferir aspectos da cognição, emoção e modulação autonômica (Thayer, 2007). O conceito de VFC refere-se às variações nos intervalos entre cada batimento cardíaco (Task Force, 1996; Lopez, 2010; Teixeira, 2008). O SNA exerce no coração influências constantes para a manutenção da homeostase e adaptação do organismo às demandas do meio. É, como um todo é responsável pela regulação do organismo para melhor lidar com as demandas ambientais, sendo que a resposta eficiente às demandas está intimamente relacionada ao balanço simpato-vagal (Teixeira & Takase, 2013).

    Estudos com jogos eletrônicos vêm demonstrando que a VFC é sensível ao nível de esforço mental (Lin, Imamiya, Hu & Omata, 2007; Hercegfi, 2011; Brogni, Vinayagamoorthy, Steed & Slater, 2006), excitação (Luay & Revett, 2011; Lin, Imamiya, Hu & Omata, 2006) e capaz predizer desempenho cognitivo (Leone, Petroni, Slezak & Sigman, 2012; Drucaroff et al, 2011; Cowley, Ravaja & Heikura, 2013). Neste contexto a VFC tem sido utilizada para descrever estresse mental, desempenho cognitiva, dificuldade das tarefas e envolvimento no jogo.

    É percebido um predomínio em pesquisas que focam a relação que os componentes da VFC possuem com a carga de trabalho mental (mental work load), este construto é utilizado como sinônimo de estresse mental e refere-se à quantidade de esforço cognitivo que determinada tarefa exige do indivíduo (Szalma et al, 2004; Sun et al, 2012). Mukherjee, Yadav, Yung, Zajdel e Oken (2011) encontraram correspondências entre esforço mental e VFC em diversos indicadores, mas relata que os componentes do domínio do tempo se relacionam de forma mais forte com esse fenômeno.

    Os indicadores de variabilidade da freqüência cardíaca apresentam sensibilidade para distinguir níveis de dificuldade relacionados às tarefas. Há mudanças significativas nos padrões dos indicadores de VFC, principalmente na média da freqüência cardíaca e no componente de baixa freqüência do domínio do tempo (Lin et al., 2006). A modificação dos indicadores de VFC em função dos níveis de atividade foi observada Rowe, Sibert e Irwin (1998). Entretanto, sujeitos com experiência nas tarefas propostas tendem a não apresentar modificações significativas em sua freqüência cardíaca, alterações essas que são mais perceptíveis em sujeitos inexperientes ou pouco experientes. (Mandryk et al., 2005)

    Estes resultados vão de encontro aos achados nas pesquisas de estresse mental, sendo a dificuldade da tarefa um promotor de exigência cognitiva. Estas pesquisas partilham a noção de que maior nível de esforço cognitivo é acompanhado por mecanismos de modulação simpática no organismo, aumentando o indicador LF e a freqüência cardíaca. A relação entre desempenho no jogo, imersão e VFC também tem sido observada nos estudos científicos (Mandryk, Atkins & Inkpen, 2006; Lin, Hu & Omata, 2006).

Bibliografia

  • Bevan, N. (2009). What is the difference between the purpose of usability and user experience evaluation methods? Sweden: User Experience Evaluation Methods in Product Development Workshop – UXEM’09.

  • Bowman, N. D. & Tamborini, R. (2012). Task demand and mood repair: the intervention potential of computer games. New Media & Society, 0(0), 1-19.

  • Brogni, A., Vinayagamoorthy, V., Steed, A. & Slater, M. (2006). Variations in physiological responses of participants during different stages of an immersive virtual environment experiment. Cyprus: Proceedings of the ACM symposium on Virtual reality software and technology - VRST’06, 376-382.

  • Cowley, B., Ravaja, N. & Heikura, T. (2013). Cardiovascular physiology predicts learning effects in a serious game activity. Computers & Education, 60(1), 299–309.

  • Drucaroff, L. J., Kievit, R., Guinjoan, S. M., Gerschcovich, E. R., Cerquetti, D. et al. (2011). Higher autonomic activation predicts better performance in Iowa gambling task. Cognitive and behavioral neurology: official journal of the Society for Behavioral and Cognitive Neurology, 24(2), 93-8.

  • Fernandes, J. C. L. (2010). Educação digital: utilização dos jogos de computador como ferramenta de auxílio à aprendizagem. Fasci-Tech, 1(3), 88-97.

  • Gámez, E. H. C. (2009). On the core elements of the experience of playing video games. Tese de doutorado, UCL Interaction Centre, Londres. Genova: Proceedings of the eNTERFACE.

  • Giakoumis, D., Vogiannou, A., Kosunen, I., Devlaminck, D., Ahn, M. et al. (2009). Multimodal monitoring of the behavioral and physiological state of the user in interactive.

  • Hercegfi, K. (2011). Heart Rate Variability Monitoring during Human-Computer Interaction. Acta Polytechnica Hungarica, 8(5), 205–224.

  • Kivikangas, J. M., Ekman, I., Chanel, G., Järvelä, S., Cowley, B. et al. (2010). Review o psychophysiological methods in game research. Sweden: Nordic DiGRA.

  • Leone, M. J., Petroni, A., Fernandez Slezak, D. & Sigman, M. (2012). The tell-tale heart: heart rate fluctuations index objective and subjective events during a game of chess. Frontiers in human neuroscience, 6(273), 1-18.

  • Lin, T. & Imamiya, A. (2006). Evaluating usability based on multimodal information: an empirical study. Canada: Proceedings of the 8th international Conference on Multimodal interfaces (ICMI 2006), 364–371.

  • Lin, T., Hu, W., Mamiya, A. & Omata, M. (2006). Large display size enhances user experience in 3D games. Canada: Proceedings of Smart Graphics, 6th International Symposium, 257–262.

  • Lopez, M. (2010). Variabilidade da freqüência cardíaca durante desempenho cognitivo: diferenças entre adultos e idosos. Dissertação de Mestrado, Universidade Federal de Santa Catarina, Florianópolis.

  • Luay, M. & Revett, K. (2011). On the Applicability of Heart Rate for Affective Gaming. USA: Proceedings of the 15th WSEAS International Conference on Computers, 267–272.

  • Mandryk, R. L., Atkins, M. S. & Inkpen, K. M. (2006). A continuous and objective evaluation of emotional experience with interactive play environments. CHI Proceedings, 1027-1036.

  • Mandryk, R. L., Inkpen, K. M., Calvert, T. W., Science, C. & Canada, B. C. V. A. (2005). Using psychophysiological techniques to measure user experience with entertainment technologies. Journal of Behaviour and Information Technology, 25(2), 141-158.

  • Mukherjee, S., Yadav, R., Yung, I., Zajdel, D. P. & Oken, B. S. (2011). Sensitivity to mental effort and test-retest reliability of heart rate variability measures in healthy seniors. Clinical neurophysiology: official journal of the International Federation of Clinical Neurophysiology, 122(10), 2059–66.

  • Nacke, L. E., Drachen, A. & Göbel, S. (2010). Methods for Evaluating Gameplay Experience in a Serious Gaming Context. International Journal of Computer Science in Sport (Special Edition), 9, s/p.

  • Prensky, M. (2000). Digital game-based learning. San Francisco: McGraw Hill.

  • Gee, J. P. (2003). What video games have to teach us about learning and literacy. NY: Palgrave Macmillan.

  • Rowe, D. W., Sibert, J. & Irwin, D. (1998). Heart rate variability: indicator of user state as an aid to human-computer interaction. Proceedings of the SIGCHI Conference on Human Factors in Computing Systems, 480-487.

  • Sánchez, J. L. G., Vela, F. L. G., Simarro, F. M. & Padilla-Zea, N. (2012). Playability: analyzing user experience in video games. Behavior & Information Technology, 31(10): 1033-1054.

  • Savi, R., Von Wangenheim, C. G., Ulbricht, V. & Vanzin, T. (2010). Proposta de um Modelo de Avaliação de Jogos Educacionais. RENOTE – Revista Novas Tecnologias na Educação, 8(3).

  • Sun, F., Kuo, C., Cheng, H., Buthpitiya, S., Collins, P. et al. (2012). Activity-aware mental stress detection using physiological sensors. Mobile Computing, Applications, and Services, Lecture Notes of the Institute for Computer Sciences, Social Informatics and Telecommunications Engineering, 76, 211-230.

  • Szalma, J. L., Warm, J. S., Matthews, G., Dember, W. N., Weiler, E. M. et al. (2004). Effects of sensory modality and task duration on performance, workload, and stress in sustained attention. Human factors, 46(2), 219–233.

  • Task Force of the European Society of cardiology and the North American society of pacing and electrophysiology. (1996). Heart rate variability: standards of measurement, physiological interpretation, and clinical use. European Heart Journal, 17, 354-381.

  • Teixeira, K. C. & Takase, E. (2013). Desenvolvimento de um protocolo de avaliação para identificação precoce de fadiga em atletas: eyetracking e variabilidade da freqüência cardíaca. Lecturas, Educación Física y Deportes, 18, 1-1. http://www.efdeportes.com/efd183/identificacao-precoce-de-fadiga-em-atletas.htm

  • Teixeira, L. B. (2008). Freqüência cardíaca, variabilidade da freqüência cardíaca e o desempenho em uma partida de xadrez. Dissertação de Mestrado, Universidade Federal de Santa Catarina, Florianópolis.

  • Thayer, J. F. (2007). What the heart says to the brain (and vice versa) and why we should listen. Psychological Topics, 16(2), 241–250.

  • Wu, C., Tzeng, Y. & Huang, Y. M. (2014). Understanding the relationship between physiological signals and digital game-based learning outcome. Journal of Computers in Education, 1(1), 81-97.

  • Zilmmann, D. & Bryant, J. (1985). Affect, mood, and emotion as determinants of selective exposure. In: Zilmmann, D.. & Bryant, J. (org). Selective exposure to communication. Hillsdale: LEA, 157-190.

Outros artigos em Portugués

www.efdeportes.com/
Búsqueda personalizada

EFDeportes.com, Revista Digital · Año 20 · N° 210 | Buenos Aires, Noviembre de 2015
Lecturas: Educación Física y Deportes - ISSN 1514-3465 - © 1997-2015 Derechos reservados