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Envelhecimento humano e uma pedagogia para o cuidado

Envejecimiento humano y una pedagogía para el cuidado

 

*Autora da dissertação de mestrado desenvolvida no PPGE-ME

da Universidade Regional de Blumenau.

**Atuou como orientador na dissertação de mestrado que sustenta esse artigo

Atualmente é Prof. e pesquisador na Universidade Federal do Paraná, onde investiga

sobre a Pedagogia Latino Americana e Caribenha com matriz na fenomenologia

Ms. Rosane Terezinha Back Campanelli*

rosane.campanelli@ufsc.br

Dr. Ernesto Jacob Keim**

ernestojacobk@gmail.com

(Brasil)

 

 

 

 

Resumo

          Este artigo apresenta um debate sobre a possibilidade de desenvolver uma Pedagogia do Cuidado como caminho para que a sociedade contemporânea possa acolher e estar preparada para assistir às pessoas envelhecidas e envelhecentes. Ressalta-se que esta proposta transcende a escolarização mesmo quando se refere a uma pedagogia, adequando-se ao conceito de educação que trata da formação humana em diferentes contextos de tempo, espaço e sociedade e, portanto, estando em consonância com o pensamento de Paulo Freire. Também se desenvolve em torno do conceito de cuidado proposto e desenvolvido por Leonardo Boff. Este texto se mostra significativo tanto às pessoas idosas e envelhecentes quanto aos sujeitos que buscam compreender as atribuições laborais e características esperadas por quem se dispõem a agir como cuidador de Idosos e, também, para refletir sobre as rotinas de Instituições de Longa Permanência para Idosos. O trabalho ora apresentado é resultado de uma pesquisa de mestrado, desenvolvido junto ao PPGE-ME da Universidade Regional de Blumenau SC.

          Unitermos: Envelhecimento humano. Pedagogia do cuidado. Autonomia. Educação.

 

Abstract

          This article discusses the possibility of developing a Care Pedagogy as an alternative to contemporary society accept and have alternatives for dealing with the aged people and in the aging process. This proposal goes beyond schooling even when referring to a pedagogy, but suits the concept of education that deals with human development in different contexts of time, space and society, according to Paulo Freire and develops around the concept of care proposed and developed by Leonardo Boff. This text addresses both the old people and in the aging process people as the people who want to discuss the functions and features expected by those who are willing to act as Senior caregiver and also to discuss the routines of Long-Stay Institutions for the Elderly. This article is based on academic work characterized as dissertation, developed by the PPGE ME Regional University of Blumenau SC.

          Keywords: Human aging. Pedagogy of care. Autonomy. Education.

 

Recepção: 17/05/2015 - Aceitação: 12/06/2015

 

 
EFDeportes.com, Revista Digital. Buenos Aires - Año 20 - Nº 205 - Junio de 2015. http://www.efdeportes.com/

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Introdução

    A sociedade concebida como dinâmica produtiva, competitiva, acumuladora e consumidora de bens materiais se apoia em certa forma de conhecimento que deixa antever uma dinâmica diferenciada e segregadora de comunicação e de relação entre as pessoas. Essa possibilidade amplia a expectativa, quanto a um sempre diferente estado de solidão, presente nas mais diversas fases da vida dos sujeitos que a integram.

    Nesse contexto a educação, com um viés simplista, diretivista e objetivo, focada em resultados e em processos de produção e consumo, age de forma automatizada e robotizada inibindo e esvaziando a criatividade e a decisão pessoal. Ela, considerando a atual constituição da sociedade capitalista tem se mostrado frágil para as classes menos favorecidas, não possibilitando uma formação integral dessas pessoas, condição essencial para compreensão e reflexão sobre o mundo que os cerca.

    Ressalta-se que a pesquisa que referenda esse texto se ampara nas atitudes humanas essenciais que se manifestam a partir dos cinco lugares apontados por Stoer et al (2004) como possibilidades de exclusão/inclusão. A discussão dos lugares ganha pertinência na proposta de uma Pedagogia do Cuidado para pessoas idosas que vivem em contexto social regido por fatores desumanizadores próprios do mundo moderno, o que acaba conduzindo ao enfraquecimento dos processos identitários e à segregação dessas pessoas. Nessa direção, considerando os pressupostos que norteiam uma proposta de uma Pedagogia do Cuidado elencaremos a seguir as atitudes destacadas por Boff (2001) que vão subsidiar a reflexão.

1.     Atitudes humanas essenciais como referenciais para o cuidado

    Os seres humanos se caracterizam como sendo seres de relações em um mundo que não é estático, pronto ou acabado, mas um constante “estar sendo”. Nesse sentido é necessária uma busca de coerência entre saber e fazer que estejam intimamente ligados pela experiência concreta manifestada por diferentes atitudes humanas. Algumas dessas atitudes estão intimamente ligadas à experiência de cuidado, segundo Boff (2001), e se apresentam como possibilidades de conjugar as dimensões de transcendência e de imanência, próprias do mundo humano. São elas:

1.1.     O amor: Na natureza se verificam dois tipos de acoplamentos dos seres com seu meio, um necessário e outro espontâneo. O necessário faz com que todos estejam interconectados e garantam a sobrevivência e no espontâneo, os seres interagem por puro prazer sem razões de sobrevivência. São dinâmicos, recíprocos e gratuitos.

    Pelo amor, o social se manifesta como abertura ao outro na convivência e comunhão com o outro. E por ele os homens sobreviveram, na medida em que mais e mais partilhavam entre si os resultados da coleta e da caça, ao mesmo tempo em que compartilhavam afetos. Nesse dinamismo de amor e afeto, surgiu a linguagem como fenômeno humano. Ao contrário do que já nos fizeram acreditar, não foi pela competição, mas pela capacidade de interagir que a relação entre forte e fraco perdeu significado na questão da sobrevivência animal (Keim, 2011). E sem o cuidado, essa sintonia não se conserva ou não acontece. Sem amor não haverá um terreno onde possa florescer o que verdadeiramente humaniza: o sentimento profundo, a vontade de partilha e a busca do amor.

1.2.     Justa medida: Atitude que reporta à questão das discrepâncias impostas pela ditadura do modo-de-ser-trabalho, já discutidas anteriormente, que rouba as pretensões humanas do sentido profundo do trabalho como realização para o ser mais humano. Trata-se de “quanto de cuidado devemos incorporar para resgatar o equilíbrio perdido? Essa é uma questão fundamental para a teoria e a prática” (Boff, 2001, p. 112).

    E é a justa medida que possibilita o equilíbrio entre os aspectos contraditórios porque tem a prerrogativa de encontrar o seu “ótimo relativo”. Por um lado, a medida como limite, fazendo nascer a vontade de ultrapassá-lo, e por outro, como capacidade de usar de forma moderada potencialidades naturais, sociais e pessoais para que possam durar e reproduzir-se. Isso só é possível quando se estabelece certo equilíbrio e uma certa justa medida. “A justa medida se alcança pelo reconhecimento realista, pela aceitação humilde e pela ótima utilização dos limites, conferindo sustentabilidade aos fenômenos e processos, à Terra, às sociedades e às pessoas” (Boff, 2001, p. 112).

1.3.     Ternura diante da vida: A ternura emerge do próprio ato da vida, na coexistência, na convivência e na comunhão com tudo que nos cerca. É mais do que um sentimento, que concentrado em si gera o sentimentalismo que é produto da subjetividade mal integrada. A ternura, ao contrário, irrompe justamente quando o sujeito sai de si mesmo, na direção do outro, sente o outro com o outro e participa de sua existência. A relação de ternura, por ser livre de dominação e de vantagens, não envolve angústia. É a força própria do coração no desejo profundo de compartilhar caminhos.

1.4.     Carícia essencial: A carícia aqui é a expressão máxima do cuidado, quando se transforma numa atitude, num modo de ser que qualifica a outra pessoa em sua totalidade, na psique, no pensamento, na vontade, na interioridade e nas relações. Distingue-se da pura excitação psicológica, de um querer fugaz do outro.

    O toque, o afago, o acalento, a quietude e a relação, como expressão física da carícia, revelam muito mais do que um ato de carinho, mas sim um modo de ser carinhoso próprio do humano, próprio de sua natureza mais profunda e não apenas o ego superficial da consciência.

    Considerando a reflexão proposta neste trabalho, o agarrar é a expressão do poder, da manipulação e do enquadramento do outro ao nosso modo-de-ser, aproximando-se das relações que preponderam no modo-de-ser-trabalho. Já a mão que acaricia representa o modo-de-ser-cuidado, permite a mobilidade do ser com quem fazemos contato, pois ela é revestida de paciência que toca sem ferir.

1.5.     Cordialidade fundamental: O aspecto fundamental destacado da cordialidade como ressonância do cuidado é que através dela surge a dimensão de valor, a dimensão daquilo que realmente é importante e que interessa ao ser humano. É a relação com os fatos, e com o que eles produzem de significados para o enriquecimento e transformação pessoal. Os fatos não são o fenômeno mais decisivo e sim o que produzem de valor, e esse é que “transforma os fatos em símbolos e em sacramentos”.

    E a via de acesso privilegiada da cordialidade é a atenção e escuta pela vida em tudo o que se vê. É sempre mais do que os fatos parecem, pois neles estão embutidas dimensões de valores, sentimentos e significados que nos tocam e nos fazem crescer.

1.6.     Convivialidade necessária: O termo convivialidade aqui referido diz respeito à absoluta e urgente necessidade de um contraponto às duas grandes crises da atualidade: a do processo industrialista e da crise ecológica. O processo industrialista assassina a criatividade e a fantasia do trabalhador, pois dele só quer utilizar a força de trabalho, fazendo surgir uma sociedade de aparatos, subordinando o ser humano a ela. Com a promessa de eliminar o trabalho escravo revela-se como um processo sem alma.

    É necessária assim uma convivialidade que combine o valor técnico da produção material com o valor ético da produção social e espiritual. Trata-se de desenvolver com muita urgência uma economia das qualidades humanas, já que a economia dos bens materiais está bastante desenvolvida. Os valores humanos de sensibilidade, de cuidado, de convivialidade e de veneração podem impor limites à voracidade do poder-dominação e à produção-exploração imposta pelo processo industrialista vigente.

1.7.     Compaixão radical: A compaixão é um sentimento sintonizado com a capacidade de compartilhar a paixão do outro com esse outro, conforme sugere a filologia latina da palavra. É uma atitude ativa de sair de si em direção ao outro enquanto outro para compartilhar com ele alegrias, caminhos e construir a vida em sinergia com ele.

    A atitude de compaixão não é movida por um sentimento de piedade. É muito mais uma renúncia de domínio frente à vida, de construção de comunhão a partir de quem sofre, como ponto de partida para a existência de uma sociedade que inclui e integra. Diferentes tradições religiosas exaltam e estimulam a compaixão como uma postura de solidariedade, de não violência, de não interferência, de compartilhar, de consentir e compreender a instância do outro como tal. Essas diferentes ressonâncias são eco do cuidado essencial.

    A apresentação sumária dessas sete atitudes referentes ao cuidado foi extraída das obras do filósofo e teólogo Leonardo Boff e uma reflexão sobre elas se faz necessária quando colocada em confronto com os “lugares de exclusão e inclusão” no sentido de destacar que na prática a postura de cuidado suscitada pelas atitudes é feita de tensão e de conflitos, e de forma alguma pode ser romanceada. Ela se faz humana na medida em que se acolhem as circunstâncias de nossa humanidade, ou seja, os fatores sociais, políticos, históricos, culturais e econômicos e as contradições advindas dessa relação.

    Esse debate é enriquecido pela obra “Os Lugares da Exclusão social – Um dispositivo de Diferenciação Pedagógica” de Stoer et al (2004), que apresenta como preocupação central a problematização da inclusão/exclusão em diferentes contextos pela análise dos “lugares” nos quais a exclusão/inclusão tem vários impactos que se refletem para os autores no “lugar” do corpo, do trabalho, da cidadania, da identidade e do território nos quais os indivíduos, os grupos e a sociedade ao considerarem os paradigmas socioculturais da pré-modernidade, modernidade e pós modernidade.

    A questão dos lugares ganha pertinência na proposta de uma Pedagogia do Cuidado para pessoas idosas, na medida em que essas são, ao mesmo tempo, fruto das necessidades sociais de um lado e, de outro, fruto dos fatores desumanizadores do mundo moderno, que conduz ao enfraquecimento dos processos identitários e de segregação das pessoas idosas.

2.     Os lugares da exclusão/inclusão no contexto das pessoas idosas

    Infere-se que pela centralidade e concretude da dimensão do corpo como um “lugar” de exclusão/inclusão na construção de uma Pedagogia do Cuidado, neste artigo, optamos por abordar de forma mais específica o “lugar” do corpo como uma categoria de análise. Enfatiza-se que o corpo é tido como um sinal de pertença e de identidade colocado em jogo na aceitação ou na recusa, levando em consideração valores sociais nas diferentes culturas. Pelo corpo estão marcadas diferentes categorizações e valores desiguais nas pessoas, criando formas particulares, por vezes discretas e capciosas, de exclusão, segregação e também de inclusão e pertencimento.

    Nessa tensão, cabe destacar que a condição humana nessa fase da vida, na medida em que se mostra como possibilidade que atravessa múltiplas dimensões humanas, afirma positivamente a identidade humana como ser incompleto, inconcluso e inacabado de maneira que o presente, o passado e o futuro se enlaçam, nas palavras de Freire (2004). A compreensão desse enlaçamento nos remete a reflexão sobre a velhice no sentido de entender a pessoa idosa no movimento que se constitui, e simultaneamente é constituído, nas contradições sociais e históricas.

    Cabe inferir que o Estatuto do Idoso no Brasil, com seus alcances e seus limites, aponta que é fundamental a reflexão sobre as novas configurações que caracterizam os direitos dos cidadãos idosos. Nessa direção, objetivamos com este texto contribuir para o debate e reflexão sobre os direitos e cuidados com as pessoas idosas, para que estes tenham vida longa, mas, que acima de tudo possam viver dignamente. Ao se tratar dos cuidados e direitos dos idosos se faz necessário nos remeter às instituições de longa permanência, as quais, segundo Goffman (1999), sem sombra de dúvidas têm tendência ao fechamento, pois seu caráter total é simbolizado pela barreira à relação social com o mundo externo haja vista as proibições referentes as saídas externas, considerando o meio físico como portarias, paredes altas, portas fechadas e também outros mecanismos simbólicos de obstrução ao convívio livre com o mundo. Esse processo se manifesta no cotidiano urbano, onde a vida humana é reprimida e conduz à mortificação do eu, na medida em que a pessoa é impedida de ter o controle de sua vida.

    Com base nesse cenário é que se sinaliza na direção de uma Pedagogia do Cuidado que ainda se apresenta como algo utópico, mas possível. Aqui utopia, segundo Keim (2011) se apresenta na perspectiva do irrealizado, ou seja, daquilo que necessita ser construído e desenvolvido na realidade concreta, tendo como referencial de ação a ética da vida, e não do irrealizável, que apresenta a utopia como algo inalcançável e impossível.

    Nessa tensão do irrealizado e do irrealizável se coloca o risco frisado por Paulo Freire (2004) e que denominou de “desproblematização do futuro”, na qual a realidade se apresenta, sem muitas possibilidades de questionamentos, o que leva à morte e à negação autoritária do sonho, da utopia e da esperança.

3.     A Pedagogia do Cuidado: uma concepção de dignidade e libertação

    Com base na breve reflexão até aqui realizada, apresentamos uma proposta educacional que denominamos Pedagogia do Cuidado. Essa tem como fundamentos a ética e a transcendência próprias da filosofia do cuidado, e a perspectiva sociológica de exclusão/inclusão.

    Esses princípios fundamentam referenciais cognitivos de uma pedagogia voltada para a vida, considerando a necessidade de a educação valorizar de forma prioritária alimento, abrigo, ocupação, afeto e partilha com dignidade, propostos por Keim (2001), assim como os aspectos constituintes da dimensão de transcendência e cuidado na perspectiva de Boff (2001), para quem, além de promover debates que envolvam os agentes causadores de exclusão/inclusão indicados como os diversos lugares apoiados na sociologia de Stoer et al (2004). Esses lugares são: o corpo, o trabalho, a cidadania, a identidade e o território nos quais se deve alicerçar essa pedagogia.

    Nesse sentido, a proposta de uma Pedagogia para o Cuidado se mostra como ação pedagógica que visa favorecer posturas com o envelhecente humano na perspectiva de que identifica a educação como ação capaz de colaborar no fortalecimento da responsabilidade e do compromisso de cada indivíduo pela sua vida, pela vida das pessoas na sociedade e pela dinâmica eco-desorganizativa/organizativa do planeta. (Keim e Santos, 2012)

    A pedagogia é, por sua vez, uma postura de pensar a educação e de propor referenciais de conteúdos e princípios de identidade e existência. Assim sendo, a pedagogia do cuidado pode ser considerada como um debate que fundamenta a qualidade de vida por meio da educação e como atividade essencialmente humana, que tem um sentido e um significado contextualizado.

    A pedagogia do cuidado é, portanto, uma proposta de postura e não um roteiro ou um ritual de procedimentos que norteiam ensino e aprendizagem e menos ainda uma arte. É uma reflexão educacional que tem por base a dignidade quanto às necessidades vitais, a ética e a transcendência dos humanos e a consciência e compromisso dos lugares que cada pessoa e cada instituição ocupam no contexto da vida planetária. Essa pedagogia exige uma ação engajada e comprometida, num processo contínuo de ação e reflexão frente às contradições, limites e possibilidades impostos no cotidiano de cuidados.

    Essas atitudes e posturas se orientam por um novo sentido de viver e atuar, por uma nova percepção da realidade e por uma nova experiência do ser, o que, nas palavras de Boff (2001), emergem da natureza mais profunda do ser humano num caminho coletivo que se constrói na própria caminhada.

    A natureza profunda do ser humano trata, por um lado, de aspectos fundamentais e por outro, compreensíveis para todos. Se não nascer do cerne essencial do ser humano, não terá seiva suficiente para dar sustentabilidade a uma nova florada com frutos sadios para a posteridade” (Boff, 2001, p. 27-8).

    E o lócus da pedagogia do cuidado é o cotidiano e as ações rotineiras, que podem ou não estar imbuídas de transcendência necessária à postura de cuidado com a vida, pois é no cotidiano, que a história se faz e se reconstrói, e nela a natureza humana essencial e singular se manifesta.

    Essa condição é fundante da pedagogia do cuidado e possibilita a reflexão sobre a condição de ser e estar no mundo e dela estabelece princípios e valores fundamentais para a postura de cuidado o qual envolve essencialmente o sentir como via de acesso, de abertura e de estímulo. É se deixar abalar, mover, rever e trazer para o corpo, pelos sentidos e sensações, o sentimento como aspecto essencial da individualidade, que também é constituída pelas relações com o outro que é co-participante na constituição da individualidade e do modo de ser de cada humano em relação.

Considerações finais

    Em síntese, retomando a proposta inicial deste texto que é a de apresentar elementos para um debate sobre a possibilidade de desenvolver uma Pedagogia do Cuidado como caminho para que a sociedade contemporânea possa acolher e estar preparada para assistir as pessoas envelhecidas e envelhecentes, enfatizando que uma pedagogia do cuidado deve ter sua base a partir de uma reflexão coletiva, a fim de construir propostas consistentes de posturas de cuidado aos idosos, levando em conta que a mudança necessita, nas palavras de Freire (2000, p. 53-4), “tanto do sonho quanto a indispensável autenticidade deste, depende da lealdade de quem sonha às condições históricas e materiais relacionados ao contexto do sonhador”.

    Da análise anterior entendemos que sonhos são projetos de vida que implicam persistência e luta, além de necessário engajamento, pois sua realização é um caminho permeado de obstáculos e desafios. Os sonhos são feitos de recuos e avanços, e representam um ato político, segundo Freire (2004), no sentido de ser uma escolha por uma maneira própria de ser e de interferir na vida, reconhecendo e debatendo criticamente os condicionamentos sociais e culturais. Com essa perspectiva seria ingenuidade não reconhecer que os sonhos têm seus contra-sonhos e que, na superação das condições desumanizantes impostas pela sociedade, somos condicionados e não determinados pelas estruturas econômicas. Assim, numa pedagogia do cuidado, que envolve uma tomada de atitudes para a construção de um novo modo de ser, o debate da diferença entre condicionamento e determinação social e entre objetividade e subjetividade se faz imprescindível.

    Nessas contradições próprias da natureza humana se inclui o compromisso de cada ser humano com a sua pergunta prima, com o propósito existencial na condição de ser e estar no mundo condicionado pela cultura, porém com capacidade de reconstruir de forma incessante. Isso é possível quando dotado de vontade e capacidade crítica de escolhas por diferentes projetos e posturas de cuidado com os quais e para os quais deseja se comprometer. E é nesse direito e nessa oportunidade de estabelecer responsabilidades, que o ser humano se torna verdadeiramente livre, conforme Keim (2001).

    A grande questão que se apresenta na discussão da pedagogia do cuidado é a importância e a necessidade de modificar atitudes e práticas pessoais, pois, para se adotar uma postura ética, o fazemos movidos pela responsabilidade pelo outro que nos leva a ter que dar uma resposta. Nesse sentido é o outro que faz emergir a ética em nós, na medida em que somos obrigados a uma tomada de atitude, que pode ser de rejeição ou acolhida.

    A linguagem, nesse sentido, é outra e não fala às aspirações materiais. Ela supõe que exista uma escuta a si e ao outro, como manifestações da vida que, no caso do idoso, é maior do que seus males e doenças, ou as mazelas relacionadas com a sua história, ou ainda às suas dores e traumas. Trata-se da capacidade de ouvir o idoso para compreendê-lo e, desse modo, falar com ele e não apenas para ele. Essa postura se caracteriza por um abrir-se na busca de uma percepção mais ampla, que envolve reflexão e posicionamento, necessitando ser aprendida por todos os seres humanos envelhecentes. O estímulo a essa escuta e à discussão crítica das situações problemas, ambos norteados pela ética, pode ser transformador e promotor de vida com plenitude.

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