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Conteúdos culturais do lazer. Uma ferramenta 

pedagógica nas aulas de Educação Física no ensino médio

Contenidos culturales de la recreación. Una herramienta pedagógica en las clases de Educación Física en la escuela media

Cultural contents of recreation. A pedagogical tool in Physical Education classes in high school

 

Faculdade de Jaguariúna – FAJ

(Brasil)

Ariene Benatti Silva

Jarbas Natalino Bovolenta

Willian Pires da Rocha

Daniel Zancha

ariene_pantera@outlook.com

 

 

 

 

Resumo

          Este artigo pretende apresentar os conteúdos culturais do lazer como uma possível ferramenta pedagógica para o ensino da Educação Física no Ensino Médio. Para isso realizamos uma pesquisa bibliográfica, analisando as características do Ensino Médio e da Educação Física, apresentando alguns conceitos de lazer e paralelamente ressaltamos quais são os conteúdos culturais do lazer. Finalmente, destacamos o lazer e seus conteúdos culturais como um meio relevante para se atingir as potencialidades do aluno no intuito de educar para a reflexão e a autonomia.

          Unitermos: Educação Física. Ensino médio. Conteúdos culturais do lazer.

 

Abstract

          This article intends to present the cultural contents of leisure as a possible pedagogical tool for teaching Physical Education in High School. For this we conducted a literature search, analyzing the characteristics of High School and Physical Education, presenting some concepts of leisure and parallel emphasize the cultural contents of leisure. Finally, we highlight leisure and its cultural contents as a relevant mean to achieve the student’s potential in order to educate him for reflection and autonomy.

          Keywords: Physical Education. High school. Cultural contents of leisure.

 

Recepção: 13/11/2014 - Aceitação: 30/01/2015

 

 
EFDeportes.com, Revista Digital. Buenos Aires, Año 19, Nº 202, Marzo de 2015. http://www.efdeportes.com/

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Introdução

    O Ensino Médio no Brasil surgiu por volta de 1930, com o advento da industrialização e contemplava duas modalidades: uma delas voltada para a promoção do ensino propedêutico, visando o ingresso na universidade, e a outra referente ao ensino terminal, objetivando a capacitação profissional. (Krawczyk, 2009).

    O Ensino Médio é a última etapa da Educação Básica, formado por alunos da faixa etária entre 14 e 17 anos de idade, com duração mínima de três anos, e tem por finalidade afirmar e aprofundar os conhecimentos obtidos no Ensino Fundamental, facilitando assim a prolongação dos estudos. (Lemos, 2009).

    A Educação Física escolar no Brasil tem seus conhecimentos teóricos importados da Europa, sendo conhecida anteriormente como a disciplina “Ginástica”. A justificativa de sua prática era que a Educação Física seria um antídoto para todos os males, prevenindo doenças, construindo o corpo robusto e saudável do trabalhador e do cidadão. Além dos hábitos higiênicos e das melhorias na saúde física, era destacado o sentimento patriótico, visando a formação do caráter, autodisciplina, para assim, formar moralmente os cidadãos brasileiros.

    Em 1882, Rui Barbosa propôs pareceres a respeito da reforma de Ensino Leôncio de Carvalho de 1879, defendendo que a Educação Física deveria ser incluída nas Escolas Estaduais com o objetivo de promover a saúde física, a educação moral, higiene e a regeneração das raças. (Projeto Político Pedagógico, 2009).

    De acordo com o Conselho Nacional de Educação Câmara de Educação Superior, Resolução nº 07, de 31 de Março de 2004 no Art. 3º:

    A Educação Física é uma área de conhecimento e de intervenção acadêmico-profissional que tem como objeto de estudo e de aplicação o movimento humano, com foco nas diferentes formas e modalidades do exercício físico, da ginástica, do jogo, do esporte, da luta/arte marcial, da dança, nas perspectivas da prevenção de problemas de agravo da saúde, promoção, proteção e reabilitação da saúde, da formação cultural, da educação e da reeducação motora, do rendimento físico-esportivo, do lazer, da gestão de empreendimentos relacionados às atividades físicas, recreativas e esportivas, além de outros campos que oportunizem ou venham a oportunizar a prática de atividades físicas, recreativas e esportivas.

    Com a globalização e as transformações do mundo moderno, a Educação Física perde sua finalidade original nos currículos escolares e ainda hoje passa por transformações e busca de novas significações para a sua valorização real na escola. Segundo Darido (1999), a Educação Física no Ensino Médio tem como objetivo buscar no aluno o conhecimento sobre a cultura corporal do movimento, que tem como resultado a reflexão, compreensão e análise crítica, inclusive de prepará-lo para o vestibular e o mercado de trabalho, transformando-o como cidadão, assim favorecendo o desenvolvimento do aluno como um todo e não somente dos mais habilidosos.

    Reconhecendo as exigências e demandas de um mundo globalizado, os Parâmetros Curriculares Nacionais (2008) centram na ação do professor as possibilidades de mudança e revalorização do componente curricular Educação Física no Ensino Médio, entendendo que o mesmo deve ser sensível à realidade circundante e sempre estar atualizado. Para isso é relevante ao professor buscar informações constantemente, por meio das mais variadas mídias, podendo ser via internet, televisão, jornais, revistas, artigos científicos e outros meios de comunicação, evitando limitar-se apenas ao ensino das tradicionais modalidades coletivas, contribuindo assim para a exposição de vários conteúdos constituintes da cultura corporal e para a vivência, por parte dos alunos, das dimensões do lazer.

    Logo, o objetivo deste artigo é propor aos profissionais de Educação Física, relacionados ao Ensino Médio, a ampliação do repertório dos conteúdos culturais do lazer, que façam parte do cotidiano do aluno, contribuindo assim para o desenvolvimento de suas habilidades, procurando torná-lo um cidadão crítico e posteriormente criativo. Neste cenário social, encontram-se as atividades que constituem a cultura corporal do movimento, das quais uma minoria da comunidade tem acesso, levando em conta a inclusão destes como grande possibilidade para uma proposta pedagógica, evitando assim com que as aulas de Educação Física sejam apenas aplicadas com o intuito físico-esportivo, mas sim nas dimensões supracitadas.

A Educação Física no Ensino Médio

    A partir dos anos 30 do século XX, com a consolidação da industrialização no Brasil, foi organizado no país um sistema legal de ensino profissional, estabelecendo formalmente a dualidade pedagógica, correspondente à dualidade social. (Nossela, 2011).

    Como desdobramento da Constituição de 1937, a Lei Orgânica do Ensino Secundário, de 1942, estabeleceu a dualidade do sistema, explicitando que a escolarização, depois do primário obrigatório de quatro anos, teria duas vertentes: o ensino secundário regular – em dois ciclos perfazendo sete anos destinados às 'elites condutoras' e o ensino profissionalizante - também em dois ciclos em sete anos – para as classes populares. (ZIBAS, 2005, p.4).

    Buscando o rompimento da dicotomia ensino propedêutico e o ensino profissionalizante, os objetivos do novo Ensino Médio podem ser divididos em três grandes blocos, sendo: 1. Estabilizar aprendizagens anteriores; 2. Capacitar para o mundo do trabalho; 3. Preparar o discente como sujeito que vai atuar no século XXI (BRASIL, 2002). A este propósito, a Educação Física escolar tem a contribuir com o aperfeiçoamento do educando como indivíduo, como cidadão e não somente com a sua preparação física (Melo, 2007).

    Em conformidade à Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional – 1996 (LDB), é dever do Ensino Médio solidificar os conhecimentos obtidos no Ensino Fundamental e visar o perfeito exercício da cidadania, à disposição para o trabalho e a continuação dos estudos.

    O Art. 35º da LDB tem as seguintes finalidades no Ensino Médio:

  1. a consolidação e o aprofundamento dos conhecimentos adquiridos no ensino fundamental, possibilitando o prosseguimento de estudos;

  2. a preparação básica para o trabalho e a cidadania do educando, para continuar aprendendo, de modo a ser capaz de se adaptar com flexibilidade a novas condições de ocupação ou aperfeiçoamento posteriores;

  3. o aprimoramento do educando como pessoa humana, incluindo a formação ética, o desenvolvimento da autonomia intelectual e do pensamento crítico;

  4. a compreensão dos fundamentos científico-tecnológicos dos processos produtivos, relacionando a teoria com a prática, no ensino de cada disciplina.

    Nahas (1997) apud Darido (1999), por exemplo, aconselha que o papel da Educação Física para o Ensino Médio deve ser a de uma educação para um estilo de vida ativo, objetivando ensinar os conceitos básicos entre a atividade física, aptidão física e saúde, além de proporcionar vivências variadas, levando os alunos a optarem por um estilo de vida mais ativo.

    Verenguer (1995), em um dos poucos estudos voltados à formação do educador atuante no Ensino Médio, entende que o papel da Educação Física é enriquecer os conteúdos que capacitem aos alunos pensar suas possibilidades motoras e a influência que recebem do contexto sociocultural, sem deixar de lado, naturalmente, experiências motoras que propiciem sua melhora e/ou refinamento.

    Já se referindo aos Parâmetros Curriculares Nacionais para o Ensino Médio – 1998 (PCNEM) é característica do ensino da Educação Física trabalhar com conteúdos como jogos, brincadeiras, ginásticas, lutas, esportes, danças e expressões alternativas. Esse conjunto de atividades, culturalmente produzidas e historicamente situadas, estipulou-se chamar de “cultura corporal”.

    As aulas de Educação Física têm a difícil missão de superar a perspectiva de simples hora de lazer ou mera prática esportiva, constituindo-se como um trabalho que tematiza a cultura corporal, encarada como linguagem. (Parâmetros Curriculares Nacionais + Ensino Médio, s/d, p. 146)

    Deve-se também deixar claro aos alunos o conhecimento e a responsabilidade de cada um em relação ao seu corpo, pois a compreensão de seu corpo não é apenas saber como funcionam todos os aparelhos do organismo, mas também distinguir seus limites e potencialidades físicas, além de compreender as práticas corporais e de intervenção no corpo que apresentam-se como parte da cultura vigente.

As características do lazer e seus conteúdos culturais

    O lazer, na Constituição da República Federativa do Brasil (BRASIL, 1988), também é tratado como um direito social de todo cidadão, como qualquer outro aspecto, como a saúde e o transporte.

    De acordo com a sistematização indicada por Gomes (2003; 2004), duas correntes opostas dividem as opiniões quanto à discutível questão sobre o surgimento do lazer. Inseridos na primeira corrente estão autores que consideram que o lazer sempre existiu, mesmo nas sociedades mais antigas, pois a sociedade rural não distinguia lazer do trabalho, as festas que ocorriam eram relativas a estações do ano e temporada de colheitas que estavam diretamente ligadas ao ambiente de labor. Por outro lado, há autores que entendem o lazer como um fenômeno recente, com origem marcada nas modernas sociedades urbano-industriais, em consequência da Revolução Industrial no século XVIII, sendo entendido como uma conquista dos trabalhadores.

    Segundo Reis (2008), não é possível encontrar uma origem incontestável para o surgimento do lazer, afinal é incabível imaginar a existência de um período histórico no qual, de um instante para o outro, o fenômeno tenha simplesmente aparecido como algo completamente novo, sem qualquer antecedência histórica.

    Marcellino (1998) afirma que o lazer distingue-se em duas grandes categorias: de um lado o aspecto da atitude, que aborda o lazer como um estilo de vida, e de outro lado o aspecto do tempo, que é abordado como a opção que alguém possui de se fazer o que quer no tempo livre fora das obrigações trabalhistas.

    Neste sentido, lazer considerado "atitude" é a associação entre o sujeito e a experiência vivenciada, que tem como característica o caráter desinteressado, buscando apenas o prazer pela prática com um fim em si mesmo. Já o lazer como "tempo" é a "disponibilidade de tempo", onde o indivíduo opta pela prática buscando o prazer por si mesmo fora das obrigações cotidianas.

    Ao se discutir os significados do lazer, corre-se também, o risco de se utilizar abordagens "funcionalistas" do lazer, sendo totalmente conservadoras, que procuram a "paz social" e o gerenciamento da “ordem”, utilizando o lazer como uma ferramenta de ajuda. Para Marcellino (1998), essas abordagens são classificadas em: "abordagem romântica", com ênfase nos valores da sociedade tradicional e na nostalgia do passado; "abordagem moralista" com foco no lazer como bom e ruim, conveniente e inconveniente motivado pelo caráter de ambiguidade do lazer; "abordagem utilitarista" como recuperação da força de trabalho, ou seja, eliminação do stress do trabalho e por último, "abordagem compensatória", que apresenta o trabalho como algo alienado e brutalizado, usando o lazer para compensar a insatisfação do trabalho (Sousa, 2007).

    Procurando a ordem na sociedade, estas abordagens funcionalistas vêm sendo um modo de se instrumentalizar o lazer, instituindo-se que as atividades desempenhadas em momento disponível sejam moralmente corretas e aceitas pela sociedade. Dessa forma, não se questiona o critério social, não se produz algo novo, pois lazer seria uma espécie de recurso de dominação, e não "(...) um fenômeno gerado historicamente e do qual aparecem valores questionadores da sociedade com um todo" (...) "a admissão da influência do lazer na vida contemporânea significa declará-lo como um tempo excelente para aprendizado de valores que cooperam para mudanças de ordem moral e cultural. Mudanças necessárias para introdução de uma nova ordem social." (MARCELLINO, 1998; p. 40-41).

    Marcellino (1998) também afirma que dentro do lazer podemos encontrar os conteúdos culturais do lazer no qual estes têm como objetivo uma busca maior pela satisfação, do prazer de quem os pratica, abrindo um leque de opções para escolha, buscando atingir todos os aspectos que caracterizam o ser humano.

    Atualmente, deparamo-nos com a predominância de aulas físico-esportivas, esquecendo-se muitas vezes dos demais conteúdos culturais do lazer que Dumazedier apud Silva (2011) categorizou, os quais são denominados:

  • Artísticos – composto pela beleza e encantamento, simboliza imagens, emoções e sentimentos. Abrangem todas as manifestações artísticas.

  • Físico-Esportivos – formado por práticas esportivas e demais atividades nas quais predomina o movimento ou o exercício físico. Novas relações com a natureza são buscadas, como reações às condições de trabalho e convivência nos grandes centros urbanos, ou à superação de limites do próprio corpo;

  • Intelectuais – ênfase dada à experiência vivida. Busca o contato com o real, com as informações obtidas e explicações racionais, baseadas em leituras, participação em cursos livres, dentre outros.

  • Manuais – capacidade de manipulação para transformar objetos ou materiais. Como exemplos podemos citar: cuidados com a jardinagem, com os animais, ou oficinas de trabalhos manuais.

  • Sociais – procura o contato direto com outras pessoas, por meio de um relacionamento com objetivos socializantes. Busca-se o repouso, o divertimento e a informação. Exemplos: festas, bailes, bares, cafés servindo de pontos de encontro e atividades familiares.

    Camargo (1989) apresenta um sexto conteúdo, o turístico, onde se busca a quebra da rotina temporal ou espacial.

    Schwartz (2003) também apresenta outro conteúdo, o virtual. Esse campo de estudo envolve diversas ciências, como a computação, ecologia, psicologia, entre outras, possibilitando uma ampla escala de interpretações, com a participação humana.

    Esses conteúdos culturais, divididos em áreas de interesses, possuem o predomínio de uma área sobre a outra. Uma atividade pode ter mais de um interesse nela inclusa, pois um não exclui os outros e a eles complementam.

    Essa classificação foi pensada no intuito de se compreender melhor as diversas e diferentes experiências de lazer. Entretanto, devemos ter em conta suas limitações, como abordado por Melo (2004, p.52), visto que “a ação humana é complexa demais para caber em limites rígidos de categorias” e nem sempre a seleção dos indivíduos é clara ou conformada em apenas um interesse. Entretanto, como colocado pelo autor, isso não significa que a classificação seja ineficiente, contudo só deve ser utilizada como uma orientação aos estudos e que devemos ter claros seus limites.

    Não se pode deixar de ressaltar que os “conteúdos culturais” não são exclusividade do lazer, e sim da própria cultura, e neste sentido, engloba inúmeras possibilidades. Jogos, brincadeiras, danças, esportes, lutas e ginásticas são práticas culturais que podem ser vivenciadas tanto no tempo de lazer quanto dentro da organização e planejamento de conteúdos da Educação Física escolar.

    O professor deve ter como objetivo utilizar os conteúdos culturais do lazer como uma ferramenta pedagógica para a formação do aluno dentro da escola, não priorizando apenas o conteúdo físico-esportivo, onde ocorre muitas vezes a resistência do aluno à participação, mas sim todos os demais conteúdos inseridos nas aulas de Educação Física no Ensino Médio, para que todos sejam contemplados.

Educação Física e o Lazer

    A Proposta Curricular do Estado de São Paulo (2008) define como objetivos gerais da Educação Física no Ensino Médio a compreensão de jogos, lutas, esportes, ginásticas e atividades rítmicas como manifestações sócio-culturais, em sintonia com os temas do nosso tempo e das vidas dos alunos, estendendo os conhecimentos no campo da cultura de movimento, rumo à construção de uma autonomia crítica e autocrítica.

    Porém, com a evolução tecnológica, há uma diminuição no interesse de atividades físicas tradicionais. Como nos apresenta a Proposta Curricular do Estado de São Paulo (2008) os adolescentes e jovens revelam interesse em certas manifestações da cultura de movimento (hip-hop, capoeira, artes marciais, skate, musculação etc.), dependendo de suas vinculações sócio-econômicas e culturais. Muitas vezes, o adolescente que resiste a participar das aulas de Educação Física na escola, movimenta-se naturalmente em outros contextos – o que exige, por parte do professor, a necessidade de entender a manifestação das culturas juvenis, pois tem ocorrido uma fragmentação entre a vida (a “cultura viva”) e a escola.

    Mermelstein (1982) apud Marcellino (1998), afirma que na busca de adaptações de valores, vivenciados no lazer como prática educativa, ocorre a incerteza entre orientação e motivação, como um simples "deixar fazer". A situação é grave, principalmente, nas matérias ligadas à iniciação aos conteúdos culturais do lazer. Por tantas vezes, os professores confundem omissão com facilidades para liberdade de expressão, não participando do desenvolvimento de atividades, encarando-as, assim, como um fim em si mesmas e não como parte de um plano de objetivos educacionais a serem almejados. Se for assim, o professor transforma-se em um mero espectador, demonstrando atitudes que simulam falta de profissionalismo e comodismo.

    “Acredito que negar a possibilidade de manifestação do lúdico é negar a esperança. E ao negar a esperança para a faixa etária infantil, a sociedade nega para si, como um todo, a esperança de um futuro novo.” (MARCELLINO 1990b; 57-58).

    Refletindo sobre a consideração acima, pode-se tentar aumentar a gama de possibilidades de se educar, de se informar por meio do lazer, visto que a dimensão lúdica da vida é uma característica humana. Logo, devemos pensar no lazer como um potencializador de mudanças sociais, por meio da aquisição de novos conhecimentos que podem ser transmitidos nos momentos em que se está livre de obrigações e exigências e onde há maior espontaneidade no comportamento das pessoas.

    Neste campo, o lazer pode ser um poderoso instrumento convertedor da ordem social, facilitando o processo educativo, não depredando o ensino formal, mas, unificando forças e refletindo sobre a realidade para atuar em um sistema que nem sempre educa para a construção de pessoas mais questionadoras e reflexivas, e que muitas vezes forma sujeitos repetidores de hábitos educados para continuidade, impossibilitando até mesmo essa vivência do lazer em sua totalidade. De acordo com MARCELLINO (1990b, p. 60):

    Toda ênfase que vem sendo imprimida ao processo educativo, tanto informal, quanto formal, é no sentido de transmissão da herança cultural, para a continuidade. E com isso a criação e verdadeira participação cultural caem para planos muito inferiores, sendo desconsideradas as possibilidades de transformação e mudança.

    Bracht (2003) defende a ideia de que “(...) a escola de modo geral deve assumir a educação para o lazer como tarefa importante, o que significa colocar em questão as próprias finalidades sociais da instituição escolar. Isso ocasionaria uma razoável mudança no que chamamos de cultura escolar (...)”. (p. 164)

    A Educação Física deve se interessar com questões relacionadas ao lazer que atravessem os discursos e práticas dentro da sistematização de seus conteúdos, não reproduzindo um conceito do lazer como “atividades auxiliares na aprendizagem”, que não limitem sua “atuação” apenas ligada aos conteúdos físico-esportivos, numa visão restrita acerca das perspectivas da Educação Física e do entendimento do próprio lazer. A ruptura com essas formas de pensar funcionalistas e que deixam o lazer à margem dos assuntos importantes da vida humana pode inclusive ser um dos temas problematizados no ambiente escolar. O mesmo pode ocorrer através da elaboração de projetos de jogos, resgate de brincadeiras populares, elaboração de coreografias de danças regionais, narração da história da ginástica, das lutas, a evolução geral sofrida pelos grandes conteúdos da Educação Física, enfim, todos os aspectos que englobam as manifestações da cultura do movimento, correlacionados com os Conteúdos Culturais do Lazer podem ser aproveitados, sempre respeitando suas diferenças, particularidades e estimulando os alunos a um maior conhecimento de si e suas potencialidades. Dar mérito a essas atividades e exigir o acesso a elas para todos é um importante caminho que devemos trilhar, proporcionando ao discente experimentar todas as esferas que envolvem o lazer, além de possibilitar ao aluno maior autonomia, socialização e conscientização dos seus direitos.

Considerações finais

    Este trabalho procurou, a partir de uma pesquisa bibliográfica, sugerir a utilização dos conteúdos culturais do lazer no Ensino Médio como uma ferramenta pedagógica, buscando instigar os alunos em todas as suas potencialidades, visto que, em geral, há uma insegurança por parte dos professores de Educação Física para desenvolver os conteúdos que fogem dos aspectos ligados aos esportes tradicionais e ao ensino de suas práticas. Além disso, também pode se tornar um excelente auxílio ao profissional para uma atitude inclusiva, buscando apoiar, estimular, incentivar, valorizar, promover e acolher o estudante.

    Reforçamos ainda que, a partir desta proposta pedagógica, o professor busque compreender a relevância de se fugir um pouco do conteúdo físico-esportivo no qual a Educação Física está enraizada, tendo em vista que os conteúdos culturais do lazer envolvem inúmeras possibilidades. Assim, apresentamos que a Educação Física não se restringe apenas ao ensino de modalidades esportivas, mas que possui um leque abrangente de práticas e possibilidades. A partir dos conhecimentos gerados no processo de vivências do lazer, o aluno pode ter um estilo de vida mais saudável, tornar-se um cidadão reflexivo, autônomo, crítico e conhecedor dos seus direitos fora do ambiente escolar.

    Logo, buscamos demonstrar aos profissionais da Educação Física, que os conteúdos culturais do lazer são viáveis de se aplicar em suas aulas no meio escolar e assim cabe a estes docentes, criar alternativas para se trabalhar com os conteúdos culturais do lazer apresentados. Deste modo, acreditamos que é necessário e possível repensar sobre como devemos inserir os demais conteúdos no Ensino Médio dentro das aulas de Educação Física.

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