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Estudo da gestão democrática na organização escolar

Estudio de la gestión democrática en la organización escolar

 

Especialista em Gestão Pública pelo Instituto Federal, Ciência

e Tecnologia de Santa Catarina – IFSC

(Brasil)

Nilton Cézar Rodrigues Menezes

luzhinn@hotmail.com

 

 

 

 

Resumo

          Este artigo originou-se do tema monográfico sob o título: Estudo da Gestão Democrática na organização escolar. O tema constitui-se, sobretudo, na visão de que a implementação da Gestão Democrática é o viés mediador do trabalho da organização escolar. No contexto formado de pesquisa, o presente trabalho teve como objetivo central analisar os pressupostos teóricos na implementação da Gestão Democrática na organização escolar e como objetivos específicos: Situar os pressupostos teóricos da Gestão Democrática nos sistemas de ensino brasileiros; Pontuar o Projeto Político Pedagógico como eixo norteador nas ações escolares; Identificar as perspectivas na formação de gestores. Na metodologia aplicada à pesquisa, propôs-se a construção de uma análise bibliográfica de cunho reflexivo para, assim tornar visíveis os elementos relevantes para implementação de uma Gestão Democrática na escola, na qual foram utilizadas como fontes de coleta de informações: Projeto Político Pedagógico da escola, livros, artigos científicos, revistas pedagógicas e boletins informativos de escolas, instituições de educação e atendimento na área. Neste sentido, constituindo-se uma análise de conteúdo como instrumento de interpretação ao levantamento conceitual da temática, através da percepção de que há iniciativas no sentido de ampliar os processos da Gestão Democrática no âmbito da organização escolar. Concluí-se, portanto que, a escola enquanto organização social é parte constituinte da sociedade a qual está inserida, tornando-se necessária a efetivação de novas dinâmicas a partir da Gestão Democrática na organização escolar, baseadas em processos que favoreçam a participação coletiva na tomada de decisões para que a escola cumpra com as suas finalidades sociais.

          Unitermos: Gestão democrática. Organização escolar. Perspectivas.

 

Abstract

          This article originated from the monographic issue under the title: Study of Democratic Management in the school organization. The theme consists, above all, on the view that the implementation of democratic management is the mediator bias the work of the school organization. Formed in a research context, this study was mainly aimed to analyze the theoretical assumptions in the implementation of democratic management in school organization and specific objectives: Locate the theoretical assumptions of the Democratic Management in the Brazilian education systems; Score the Political Pedagogical Project as shaft guiding actions in school; Identify prospects in management training. Methodology applied in the research, proposed the construction of a literature review of reflective die for, so make visible the relevant implementing a democratic management at school elements, which were used as sources of information gathering: Political Pedagogical Project of school, books, papers , magazines and newsletters pedagogical schools, educational institutions and service in the area . In this sense, constitutes a content analysis as a tool for interpreting the conceptual survey of the subject, through the perception that there are initiatives to expand the Democratic Management processes within the school organization. We conclude, therefore, that the school as a social organization is a constituent part of society which is inserted, making necessary the realization of new dynamics from the Democratic Management in the school organization based on processes that encourage collective participation in decision decisions so that the school complies with its social purposes.

          Keywords: Democratic management. School organization. Perspectives.

 

 
EFDeportes.com, Revista Digital. Buenos Aires, Año 19, Nº 195, Agosto de 2014. http://www.efdeportes.com

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1.     Introdução

    Na atualidade, a gestão democrática é tema de grande repercussão nas escolas, sendo alvo de diálogos, reflexões e propostas. Na sua temática, traz ao diálogo, a gestão compartilhada e reflexão, entretanto, numa autonomia interdependente que reconhece a importância dos indivíduos que compõem e atuam na escola. Com efeito, a atuação mediante esta autonomia interdependente e seus referenciais são fatores reveladores de práticas formando o todo escolar e as suas especificidades. No entanto, antes de aprofundar o tema escolhido, torna-se necessário esclarecer o que é a gestão e apresentar a gestão escolar democrática.

    Quanto à palavra Gestão, afirma que a origem “advém do verbo latino gero, gessi, gestum, gerere, cujo significado é levar sobre si, carregar, chamar a si, executar, exercer e gerar” (CURY, 2002, p. 30). Com efeito, um dos substantivos gerados do verbo demonstra que sempre implica o sujeito. Desse modo, gestão é a geração de um novo modo de administrar uma realidade, sendo então, por si mesma, democrática, pois traduz a ideia de comunicação, pelo envolvimento do pensar coletivo, por meio do diálogo.

    De acordo com Cury (2002) gestão, pensada de forma democrática, pode adquirir uma dimensão muito diferente daquela associada à ideia de comando. Isto significa que se pode administrar por meio do diálogo e do envolvimento do coletivo. Neste sentido, a participação e o exercício da cidadania no campo educacional, e mais especificamente na gestão da escola, estão ligados a um processo mais amplo de extensão da cidadania social à cidadania educacional, e, portanto, ligado à sua função social.

    Assim, a gestão democrática reporta um ou mais interlocutores e possibilita ao diálogo, a respostas que possam auxiliar na condição da educação e solução dos conflitos. Ela acontece no grupo e para o grupo, implicando decisões coletivas e organizadas. Dentro dessa visão, a gestão escolar democrática apresenta um novo perfil, um novo modo de administrar uma realidade que é, em princípio, uma questão dialógica que traduz comunicação pelo envolvimento enquanto processo pensado de forma coletiva e democrática. Observamos também que legalmente, a gestão democrática está amparada tanto pela Constituição Federal (CF 05/10/1988), quanto pela Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (LDB de 20/12/1996) e pelo Plano Nacional de Educação (PNE – Lei n. 10.127, 09/01/ 2001).

    Diante do processo de trazer ao diálogo a gestão democrática na organização escolar num continuo pensar e refletir, este tema de estudo teve como fulcro uma análise bibliográfica ao qual se chegou ao seguinte problema de pesquisa: quais são os elementos relevantes para a implementação de uma gestão democrática na organização escolar? A partir disso, a hipótese da pesquisa levantada foi de que a implementação da gestão democrática é o viés mediador do trabalho no cotidiano da organização escolar. Deste modo, o presente trabalho de caráter qualitativo objetivou situar e apontar numa análise de forma reflexiva, tornar visíveis os elementos relevantes para a implementação de uma gestão democrática na organização escolar. Neste sentido propôs-se como objetivo principal: Analisar os pressupostos teóricos na implementação de uma gestão democrática na organização escolar. No que tange aos objetivos específicos teve como lócus: Situar os pressupostos teóricos da gestão democrática nos sistemas de ensino brasileiros; Pontuar o Projeto Político Pedagógico como eixo norteador nas ações escolares; Identificar as perspectivas na formação de gestores. No concernente a programática investigativa, foi utilizada como fonte de estudo: Projeto Político Pedagógico da escola, livros, artigos, revistas pedagógicas, boletins informativos de escolas, instituições de educação e atendimento na área.

    Desta forma, a partir da relevância desde esta análise, a gestão democrática na organização escolar possui como foco a observação da escola e dos problemas educacionais globalmente, através de uma visão estratégica e de conjunto, bem como pelas ações interligadas, tal como uma rede, os problemas que, de fato, funcionam de modo interdependente.

    A gestão escolar é uma dimensão, um enfoque de atuação, um meio e não um fim em si mesmo, uma vez que o objetivo final da gestão é a aprendizagem efetiva e significativa dos alunos, de modo que, no cotidiano que vivenciam na escola, desenvolvam as competências que a sociedade demanda, dentre as quais se evidenciam: pensar criativamente; analisar informações e proposições diversas, de forma contextualizada; expressar idéias com clareza, tanto oralmente, como por escrito; empregar a aritmética e a estatística para resolver problemas; ser capaz de tomar decisões fundamentadas e resolver conflitos, dentre muitas outras competências necessárias para a prática de cidadania responsável (LUCK, 2000, p. 33).

    Em razão disso, o processo de gestão escolar deve estar voltado para garantir que os alunos aprendam sobre o seu mundo e sobre si mesmo em relação a esse mundo, adquiram conhecimentos úteis e aprendam a trabalhar com informações de complexidades gradativas e contraditórias da realidade social, econômica, política e científica, como condição para o exercício da cidadania responsável. Assim, “a cultura democrática está além da implantação de uma ideologia, por exemplo, de estilo liberal, comprometida com certos pressupostos de igualdade, do Estado de direito, da equalização de oportunidades” (DEMO, 1999, p. 79). A gestão democrática conduz a exigência do cultivo da cultura de participação, do trabalho da coletividade, da ação do colegiado na realização de um bem para todos. Florestan Fernandes (GADOTTI, 1990, p. 30), referindo-se à “Democratização do ensino”, através deste conceito, dizia: “Pretende-se assinalar coisas que são distintas, como a universalização de certas oportunidades educacionais, a transformação das técnicas e dos métodos pedagógicos ou uma interação aberta e construtiva da escola com as necessidades e os interesses sociais dos círculos humanos que ela sirva” (GADOTTI, 1990, p. 28).

    Na perspectiva da escola, há um reconhecimento de que a educação é tarefa complexa e, portanto, requer esforço dos círculos humanos do seu conjunto na parceria com a família. A gestão democrática da escola é responsabilidade conjunta de uma equipe gestora, composta por Direção, Coordenadores, Professores, Funcionários, com representantes de todos os segmentos das comunidades escolar e local. Este corpo gestor, partindo de definições em reuniões, é responsável pelas decisões e ações vividas na escola. A missão, visão de futuro, objetivos estratégicos e valores da escola são efetivos trabalhos desse grupo, elaborados para o social.

    Neste contexto, estabelece-se, então, uma cultura comunitária e esse fator é essencial no desenvolvimento da função social da escola: a democracia. Assim, para atingir plenamente a gestão democrática há de se perceber que todos os setores da unidade escolar necessitam de um envolvimento nessa perspectiva, os avanços dentro do propósito estabelecidos devem ser apreciados, avaliados e reavaliados em conjunto. As medidas desenvolvidas dentro de uma percepção conjunta ganham, por excelência, parâmetros competentes que se transformam em realidade que, certamente mudam de forma contínua e gradual os aspectos do cotidiano das unidades escolares.

    No seu conjunto e fora dele, a gestão democrática está relacionada com tendências mundiais de globalização e mudança de paradigma que têm repercussões significativas nas concepções de organização escolar e nas ações dela decorrentes. Neste contexto, a descentralização do poder, democratização do ensino, instituição de parcerias, flexibilização de experiências, mobilização social pela educação, sistema de cooperativas, interdisciplinaridade na solução de problemas são estes alguns dos conceitos relacionados com essa mudança. Entende-se, nesse conjunto de concepções, como fundamental, a mobilização, conscientização dos sujeitos para se promover a transformação e sedimentação de novos referenciais de gestão democrática para que a escola e os sistemas educacionais atendam às novas necessidades de formação social a que a escola deve responder.

    Outro importante ponto pertinente à gestão democrática é a formação dos gestores escolares. O trabalho de gestão escolar exige o exercício de múltiplas competências específicas. É necessário ressaltar a necessidade de os sistemas de ensino adotar uma política de formação continuada de gestores, de modo a estabelecer unidade e direcionamento aos seus programas e cursos. É necessário, também, articular política de formação com política de gestão.

2.     Projeto político pedagógico: norte das ações na escola

    O Projeto Político Pedagógico é um documento norteador das ações futuras da escola, no qual são estabelecidos princípios e diretrizes para um funcionamento mais eficaz das atividades a serem desenvolvidas no âmbito escolar. Neste contexto:

    Resulta da construção coletiva dos atores da educação escolar. Ele é a tradução que a Escola faz de suas finalidades, a partir das necessidades que lhe estão colocadas, com o pessoal – professores/alunos/equipe pedagógica/pais – e com os recursos de que dispõe (PIMENTA, 1991, P.79).

    Desta forma, quanto mais socializado for o Projeto Político Pedagógico da escola, maior será a participação e o envolvimento da comunidade escolar. Porque ao elaborarem-se as ações que nortearão o fazer administrativo pedagógico da escola torna-se coparticipe na sua execução e avaliação. Reduzindo assim a improvisação que algumas vezes faz parte do cotidiano da escola. A existência na escola de um Projeto Político Pedagógico significa ter uma proposta pedagógica clara, orientada, intencional, numa perspectiva de visão dinâmica e de circularidade, concebida em um processo participativo, não improvisado, catalisador de potencialidades e do compromisso coletivo.

    O projeto político pedagógico é apontado como expressão coletiva do esforço da comunidade escolar na busca de sua identidade e, nesse sentido, uma das principais expressões da autonomia escolar. A sua elaboração participativa pode, mesmo, propiciar uma experiência mais consequente de outros mecanismos de gestão democrática, como a escolha dos dirigentes e a definição das funções dos colegiados escolares, na medida em que passam a constituir-se referência da ação orgânica de todos os membros da comunidade escolar na busca de objetivos comuns (GADOTTI, 1990, p. 119).

    Essas características subsidiarão as estratégias de ação que poderão ser incorporadas de forma consciente e contínua, em função das bases teóricas, filosóficas, legais e práticas com as quais a escola está comprometida e deve atuar. Assim, o Projeto Político Pedagógico auxilia a escola na formação do indivíduo como um todo, priorizando a formação de verdadeiros cidadãos, capazes de transformar a sociedade a qual estão inseridos, atuando de forma ativa, crítica e participativa. De modo a gerar mudanças significativas, com mecanismos capazes de solucionar problemas específicos da comunidade a qual a escola está inserida. Ressalta-se, portanto que o Projeto Político Pedagógico não deve ser utilizado como um documento para atender a exigências burocráticas. Quando se quer indivíduos críticos, participativos e transformadores, para tanto se deve orientar por uma concepção de educação que esteja comprometida com a transformação social. Torna-se necessário que a escola se defina e atue orientada por um conceito de sociedade democrática, participativa, plural e socialmente justa.

    Delineada a sua postura com o envolvimento e a participação ativa de todos, a escola cogita seu exercício educativo no sentido de formar cidadãos relativamente conscientes capazes de compreender e criticar a realidade, pautando a sua atuação na busca da superação das desigualdades e do respeito ao ser humano. Sendo a escola capaz de construir, elaborar, executar e avaliar o seu Projeto Político Pedagógico tendo em seu âmbito as metas e ações proposta em seu Plano de Desenvolvimento da Escola (PDE), ela propicia uma educação de qualidade e exerce sua autonomia pedagógica.

    Todo projeto pressupõe rupturas com o presente e promessas para o futuro. Projetar significa tentar quebrar um estado confortável para arriscar-se, atravessar um período de instabilidade e buscar uma nova estabilidade em função da promessa que cada projeto contém de estado melhor do que o presente. Um projeto educativo pode ser tomado como promessa frente a determinadas rupturas. As promessas tornam visíveis os campos de ações possíveis, comprometendo seus atores e autores (GADOTTI, 1990, p. 579).

    Sem embargo, a autonomia pedagógica, objetiva ampliar os espaços de decisão e participação da comunidade atendida pela escola, criando e desenvolvendo instâncias coletivas. É importante ressaltar ainda que o êxito escolar dependa de outros fatores, como o político, econômico, cultural e social. Os processos de democratização, descentralização da tomada de decisão e transparência têm como suporte institucional as estruturas de gestão colegiada, sendo o Conselho Escolar, órgão consultivo, deliberativo, fiscalizador e mobilizador. É importante, que esse esteja legalmente constituído e que seus membros participem sistematicamente dos processos de tomada de decisão.

    Dessa forma, profissionais da educação, alunos, pais e comunidade, conscientes da necessidade de um projeto democrático de educação podem constituir núcleos de pressão e exigir do gestor o compromisso com a participação de todos na busca da construção coletiva de uma escola verdadeiramente, democrática. Também se salienta que as atuações dos organismos colegiados dão-se na medida em que ações articuladas estimulem a efetiva ocupação dos seus membros, não como meros executores, prestadores de serviços voluntários, mas especialmente como sujeitos atuantes no processo de tomada de decisão. Neste sentido:

    Tudo o que a gente puder fazer no sentido de convocar os que vivem em torno da escola, e dentro da escola, no sentido de participarem, de tomarem um pouco o destino da escola na mão, também. Tudo o que a gente puder fazer nesse sentido é pouco ainda considerando o trabalho imenso que se põe diante de nós que é o de assumir esse país democraticamente (FREIRE, 1997, p. 62).

    Nessa ideia os Grêmios Estudantis podem ser instrumentos que, se fortalecidos pela equipe gestora, professores e demais membros da escola, poderão contribuir para agrupar de forma positiva o jovem, afastando-o do convívio antissocial. Portanto é importante que os estudantes tenham informações mais concretas e detalhadas sobre a função que o grêmio pode desempenhar, tanto no contexto escolar quanto no espaço extraescolar.

3.     A gestão democrática nos sistemas de ensino brasileiros

    A Constituição Federal de 1988 trouxe uma inovação para o capítulo sobre educação ao incorporar, forma da lei, a gestão democrática como um princípio do ensino público. Assim, ao fazê-lo, a Constituição institucionalizou, no âmbito federal, práticas que já vinham ocorrendo em vários sistemas de ensino estaduais e municipais, algumas delas amparadas por instrumentos legais emanados pelas respectivas casas legislativas ou pelos executivos locais. Com efeito, a promulgação da Constituição, em 1988, tornou obrigatória a adaptação das Constituições Estaduais e das Leis Orgânicas do Distrito Federal e dos municípios às novas determinações, dentre elas a do princípio da gestão democrática do ensino público.

    A gestão democrática do ensino fez-se presente nas reivindicações das entidades, indicando que, já naquele momento, a ideia de democratização da educação superava o conceito de escola para todos, incluindo a noção da escola como espaço de vivência democrática e de administração participativa. Assim, a sociedade civil passou a participar do processo constituinte e tornou-se mais organizada em função da existência de um Fórum que congregou entidades de âmbito nacional na defesa do ensino público e representou uma plataforma avançada dessa defesa

    Quando a gestão democrática do ensino público ainda não tinha sido incorporada à Constituição de 1988, a mobilização em torno de sua introdução na LDB foi iniciada. Assim, apresentou-se um projeto de lei à Câmara Federal, partindo de um estudo de Dermeval Saviani publicado na revista da ANDE substituindo o componente sobre financiamento da educação por um texto mais detalhado, baseado em estudos já realizados. O projeto “apresentado não continha nenhuma referência explícita sobre a gestão democrática como princípio do ensino público, apesar de, naquele momento, este já ser um ponto conquistado na Constituição recentemente promulgada” (GADOTTI, 1990, p. 68). Neste sentido, incorporaram-se importantes avanços no campo da democratização da educação, inclusive de sua gestão democrática, por meio de mecanismos como autonomia pedagógica e administrativa e de gestão financeira das unidades escolares, bem como de descentralização dos sistemas de ensino.

    Em razão disso, tendo passado por um período de intensa turbulência, em sua tramitação no Senado, a LDB finalmente promulgada em dezembro de 1996, como Lei 9394/96 termina por contemplar de maneira direta ou indireta a gestão democrática do ensino público. Primeiro como princípio, na forma daquela lei e “da legislação dos sistemas de ensino”, ampliando, assim, o ordenamento constitucional. Segundo, determinando que as normas de gestão democrática atendam as peculiaridades locais e os princípios de participação dos profissionais na elaboração do projeto pedagógico da escola e da comunidade escolar em conselhos escolares ou equivalentes. A terceira referência trata da gestão democrática nas instituições de ensino superior. Além dessas referências diretas, a LDB fixa incumbências dos estabelecimentos de ensino, incluindo, no Art. 12, a elaboração e execução da proposta pedagógica, e no Art.15, a ampliação progressiva de autonomia pedagógica, administrativa e de gestão financeira nas escolas.

4.     Perspectivas na formação de gestores

    O aumento da qualidade e competência da escola exige mais de sua gestão, em vista do que, a formação de gestores escolares passa a ser uma necessidade e um desafio para os sistemas de ensino. No entanto, sabe-se em geral, que a formação básica dos dirigentes escolares não se assenta sobre essa área específica de atuação e que, mesmo quando estes profissionais a têm, ela tende a ser conceitual.

    Em razão disso, recaem sobre os sistemas de ensino a tarefa e a responsabilidade de promover, organizar e até mesmo, como acontece em muitos casos, realizar cursos de capacitação para a preparação de gestores escolares. Essa responsabilidade se torna mais marcante quando se evidencia a necessidade de formação contínua, complementarmente à formação inicial, como condição para acentuar o processo de profissionalização de gestores, de modo que dialoguem com os novos desafios a que estão sujeitas as escolas e os sistemas de ensino.

    Neste contexto vigente, não adianta até mesmo a melhoria do currículo formal, a introdução de métodos e técnicas inovadores, por exemplo, caso os mesmos não sejam acompanhados de um esforço de capacitação dos dirigentes nesses processos. Essa capacitação, aliás, constitui-se num processo aberto, de formação continuada e permanente. Não se pode esperar mais que os dirigentes escolares aprendam em serviço, pelo ensaio e erro, sobre como resolver conflitos e atuar convenientemente em situações de tensão, como desenvolver trabalho em equipe, monitorar resultados, planejar e implementar o projeto político pedagógico da escola, promover a integração escola-comunidade, criar novas alternativas de gestão, realizar negociações, mobilizar e manter mobilizados atores na realização das ações educacionais, manter um processo de comunicação e diálogo abertos, como estabelecer unidade na diversidade, planejar e coordenar reuniões eficazes, como articular interesses diferentes entre outros.

    Dessa maneira, os resultados da ineficácia dessa ação são tão sérios em termos individuais, organizacionais e sociais, que não se pode continuar com essa prática. A responsabilidade educacional exige profissionalismo. O trabalho de gestão escolar exige, pois, o exercício de múltiplas competências específicas de variados matizes. A sua diversidade é um desafio para os gestores, cabendo também aos sistemas, organizar experiências capazes de orientá-los nesse processo.

    Assim, considerando-se, de um lado, essa multiplicidade de competências, e de outro, a dinâmica constante das situações, que impõe novos desdobramentos e novos desafios ao gestor, não se pode deixar de pontuar como fundamental para a formação de gestores, um processo de formação continuado em serviço, além de programas específicos e concentrado, como é o caso da formação em cursos de Pedagogia e em cursos de Pós-graduação, bem como os freqüentes cursos de extensão oferecidos e/ou patrocinados pelos sistemas de ensino. Neste sentido, como de nada valem as boas ideias, se não forem postas em ação, os programas de formação, para serem eficazes, deverão ser realizados de modo a articular teoria e prática, constituindo- se uma verdadeira práxis.

    Desse modo, a educação e a formação de profissionais, a escola e sua gestão, devem ser fundamentadas em ideais que precisam ser firmados, explicitados, compreendidos e compartilhados nas tomadas de decisões sobre a formação dos cidadãos. Evidencia-se, assim, a necessidade de se repensar a gestão da educação ante a cultura globalizada e os desafios que a sociedade impõe como instituição responsável e comprometida com a formação de profissionais da educação e de profissionais em geral. O desenvolvimento de conhecimento e formação de profissionais entendidos em gestão educacional, “capazes de implementar e operar as transformações necessárias dos sistemas de ensino e escolas, é prioritário, por ser condição fundamental para o imprescindível salto qualitativo da educação brasileira” (LUCK, 2000, p. 24).

    Nessa concepção, a gestão significa tomada de decisões, organização, direção. Relaciona-se com a atividade de impulsionar uma organização a atingir seus objetivos, cumprir suas responsabilidades. “Gestão da educação significa ser responsável por garantir a qualidade de uma mediação no seio da prática social global” (FERREIRA, 2004, p. 15).

    Significa aprender com cada 'mundo' diferenciado que se coloca, suas razões e lógica, seus costumes e valores que devem ser respeitados, por se constituírem valores, suas contribuições que são produção humana. Estas compreensões têm como objetivo, se possível, 'iluminar' um campo profissional 'minado' de todas essas incertezas e inseguranças, tornando- o conseqüente com o próprio conceito e nome, a fim de tomar decisões sobre como formar e como garantir a qualidade da educação a partir de princípios e finalidades definidos coletivamente, comprometidos com o bem comum de toda a humanidade (FERREIRA, 2004, p. 15).

    Luck (2000) corrobora com a concepção e valorização da gestão na garantia da qualidade proposta por Ferreira (2004), ao entender que a gestão educacional estabelece direcionamento e mobilização capazes de sustentar e dinamizar o modo de ser e fazer do sistema de ensino e das escolas, sem o que todos os demais esforços e gastos são despendidos sem promover os resultados esperados. Com efeito, defende-se ainda, que o processo de gestão pressupõe a ação ampla e continuada que envolve múltiplas dimensões, tanto técnicas quanto políticas, que só se efetivam de fato, quando articuladas entre si.

    Desta forma, o contexto indica necessidade da expansão da educação de maneira democrática, a formação plena do profissional que supere as problematizações do cotidiano escolar e a visão de eficácia para as práticas educacionais. Coloca-se, então, a importância de uma gestão para a educação, cumprindo as intenções de renovação dos aspectos da formação humana e de seu desenvolvimento, em uma administração que seja boa no presente, construindo um futuro de possibilidades para os alunos.

    A democratização do conhecimento e as atuais exigências socioculturais para a evolução do crescimento humano incidem em como formar profissionais na área da educação, sob a renovada orientação de gestão voltada à dimensão dessas habilidades e competências. Com a direção estabelecida democraticamente, a gestão da educação constitui-se na possibilidade de concretizar na experiência humana um modo de pensar coletivo, cumprindo seu papel fundamental de conduzir a educação e o ensino para a construção da cidadania, da justiça entre os seres humanos e da igualdade de oportunidades, com vistas a superar um mundo de exclusão, de sofrimento, de desigualdades e injustiças. Dessa forma, gestão democrática não só concretiza os caminhos, como confere o sentido das práticas que emergem no ambiente escolar e das relações construídas coletivamente.

    Assim, a gestão democrática tem seus pilares nos movimentos sociais de democratização e expressam as experiências e lutas por administrações e práticas coletivas, colegiadas e participativas nas escolas e sistemas de ensino. Tem como fundamento a humanização da formação do indivíduo e explicitação mediante o diálogo entre as pessoas na busca da solução dos conflitos de forma coletiva e solidária. Isso configura um contexto histórico-político de transição do centralismo do regime autoritário para a redemocratização, sendo a gestão evidenciada na agenda política, um conceito superador do enfoque limitado de administração e base fundamental para a organização e estabelecimento dos processos educacionais, orientados pelos princípios democráticos que reconhecem a importância da mobilização e participação das pessoas para a melhoria da qualidade do ensino.

    É necessário, portanto, entender a democratização como uma mudança decorrente de um processo de interação e organização de acordo com o contexto educacional que é uma expressão política da norma constitucional e da LDB (Lei de Diretrizes e Base da Educação Nacional, Nº 9.394/96), estando vinculada à formação da cidadania por meio da construção coletiva do Projeto Político Pedagógico. “A gestão democrática visa romper com a separação entre concepção e execução, entre o pensar e o fazer, entre teoria e prática” (VEIGA, 2001, p. 18). É necessário cultivar e desenvolver a cultura do “nós” para que se possa efetivamente construir uma gestão democrática na escola.

    Uma gestão escolar democrática se desenvolve e se realiza através da efetiva participação comprometida, tendo o gestor escolar papel fundamental na orientação e efetivação desse processo. Para tanto, torna-se imprescindível o fortalecimento de um aporte teórico, a habilidade para lidar com pessoas, detectar e solucionar problemas, bem como ter a sensibilidade para intervir de maneira dinâmica e produtiva, com o intuito de contribuir para a melhoria da qualidade da educação.

    Luck (2000) atribui ao gestor o papel fundamental no sentido de dinamizar e coordenar o processo coparticipativo para atender, na escola, às demandas educacionais da sociedade dinâmica centrada na tecnologia e no conhecimento. Nesse sentido, percebe-se que o gestor escolar precisa “munir-se” de conhecimentos dos diversos aspectos que envolvem a questão educacional, desde a organização, estrutura, dinâmica e legalização até a capacidade de analisar esses aspectos à luz do contexto socioeconômico, tornando-se capaz de perceber a relação e influência do contexto com a escola, tendo em vista que escola e sociedade se entrelaçam continuamente e se constroem mutuamente.

5.     Conclusão

    Este estudo teve como proposta uma análise bibliográfica ao qual se chegou a um questionamento mais elaborado que consta como: quais são os elementos relevantes para a implementação de uma gestão democrática na organização escolar? Neste contexto, a hipótese da pesquisa levantada foi de que a implementação da gestão democrática é o viés mediador do trabalho no cotidiano da organização escolar. Deste modo, objetivou-se numa análise de forma reflexiva, tornar visíveis os elementos relevantes para a implementação de uma gestão democrática na organização escolar. Nesta análise, propôs-se como objetivo principal: Analisar os pressupostos teóricos na implementação de uma gestão democrática na organização escolar. No concernente aos objetivos específicos coube como lócus: Situar os pressupostos teóricos da gestão democrática nos sistemas de ensino brasileiros; Pontuar o Projeto Político Pedagógico como eixo norteador nas ações escolares; Identificar as perspectivas na formação de gestores.

    Diante deste arcabouço elaborado, percebeu-se a necessidade de ampliação dos esforços na construção de escolas cada vez mais democráticas, que rompam com práticas da escola tradicional. Com efeito, reconhecendo que a democracia permeia todos os princípios da educação democrática, a comunidade escolar como um todo deve decidir e compartilhar todos os problemas e progressos da instituição escolar. Neste sentido, sabe-se que a gestão democrática é um processo complexo, mas não irrealizável, e que exige de todos os envolvidos neste processo (família, profissionais, governo e sociedade), ações imediatas e sólidas que garantam a concretização das ações de um trabalho consciente e coletivo, com o propósito de substituir o paradigma de políticas educacionais autoritárias pelo democrático.

    Desta forma, ao longo desta pesquisa percebeu-se que a escola pelos princípios democráticos, deve ser de qualidade para todos, onde os envolvidos neste processo podem mudar a estrutura organizacional dada à escola tradicional, para uma versão contemporânea de educação voltada para a necessidade dos educandos em consonância com os desejos da comunidade escolar. Neste sentido, procurando mobilizar e articular os que participam desta organização, dando condições necessárias materiais e humanas para que a ação do processo sociopolítico e educacional aconteça da melhor forma possível e com resultados satisfatórios.

    Porém, ainda há muito que se fazer, para que a gestão democrática seja realmente entendida e cooptada por todos os seus participes. É preciso que todos estejam conscientes de que a democracia em uma sociedade não pode ser considerada exclusivamente como um sistema político, pois a democracia só pode ser real se todos os seus princípios se incorporarem à lógica da vida cotidiana dos indivíduos.

    Também, no decorrer deste estudo, pode-se perceber que a preocupação com a capacitação profissional é uma premissa servindo de alerta a todos aqueles que pretendem participar do processo de gestão escolar. Assim, é de vital importância evidenciar a importância de se desenvolver programas de formação voltados para as especificidades do trabalho dos gestores, alicerçados na articulação entre as dimensões administrativas e pedagógicas, na integração entre tecnologias e metodologias de formação, tendo as tecnologias como artefatos que favorecem os encontros entre pessoas, valores, concepções, práticas e emoções. Por fim, é preciso que o gestor seja formado para perceber as diversas redes que compõem o conhecimento, num processo que envolve muito mais do que “controlar” o uso e o acesso às tecnologias disponíveis, já que na formação, ele também aprende a buscar os caminhos possíveis para desempenhar o seu papel.

Referências

  • CURY, C.R.J. Gestão democrática da educação: exigências e desafios. In: Revista Brasileira de Política e Administração da Educação. São Bernardo do Campo. V. 18, n.2, 2002.

  • DEMO, P. Participação é conquista. São Paulo: Cortez, 1999.

  • FERREIRA, N. C. Gestão democrática da educação: atuais tendências, novos desafios. 2. Ed. São Paulo: Cortez, 2004.

  • FREIRE, P. Pedagogia da Autonomia: saberes necessários à prática educativa. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1997.

  • GADOTTI, M. Uma só escola para todos. RJ. Petrópolis: Vozes, 1990.

  • LDB - Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional: Texto na íntegra Lei 9394 de 20 de dezembro de 1996. São Paulo: Saraiva, 1996.

  • LUCK, H. A escola Participativa: o trabalho do gestor escolar. 4 ed.Rio de Janeiro: DP&A, 2000.

  • PIMENTA, Selma Garrido. Questões sobre a organização do trabalho na escola. Série Idéias no. 16. São Paulo: FDE, 1991.

  • PNE. Plano Nacional de Educação-Lei n. 10.127, 09/01/ 2001

  • VEIGA, I. P. (Org.). Projeto político-pedagógico da escola: uma construção possível. 13. Ed. Campinas: Papirus, 1995.

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