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A Educação Física num contexto multicultural:

estratégia para a inclusão social

La Educación Física en un contexto multicultural: una estrategia para la inclusión social

 

*Graduação em Licenciatura Plena em Educação Física - Univercidade

Faz parte do grupo de estudos LAPEAD na UFRJ

**Professor da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ). Professor do Programa

de Pós-Graduação em Educação. Vice Coordenador do Laboratório de Pesquisa, Estudos

e Apoio à Participação e à Diversidade em Educação (LAPEADE) do Programa

de Pós-Graduação em Educação da UFRJ. Pesquisador do Laboratório de Análises

Estatisticas, Econômicas, Históricas e Sociais das Relações Raciais (LAESER)

do Instituto de Econômica da UFRJ. Vice-Coordenador

da Pós-Graduação Lato Sensu em Educação Física Escolar do CESPEB

da Faculdade de Educação da UFRJ

Maurício Ricardo da Costa Horta*

professormauriciohorta@hotmail.com

José Jairo Vieira**

diversidade.desigualdade.educa@gmail.com

(Brasil)

 

 

 

 

Resumo

          O presente trabalho tem o objetivo principal de elucidar e aumentar a consciência por parte dos profissionais de educação em geral, da importância de uma prática pedagógica inseria num contexto multicultural. Onde as diferenças convivam e cresçam em harmonia. Onde se consiga romper como currículo hegemônico, tradicional, que privilegia sempre o mais forte e exclui o mais fraco. Onde se possa romper com uma monocultura criada pelos dominantes e, detrimento dos dominados. A metodologia escolhida para a idealização do trabalho foi a da revisão bibliográfica, que através de um procedimento crítico, reflexivo e sistemático, procurou sempre dialética como ponto de partida para a construção de novos conceitos e perspectivas de práxis pedagógica da Educação Física em contextos multiculturais e o rompimento com antigos paradigmas. A partir deste estudo podemos considerar que a prática pedagógica num contexto multicultural permite uma ressignificação da atuação do docente de educação física, notadamente no que se refere aos aspectos de diversidade e desigualdades presentes na escola, e as práticas inclusivas.

          Unitermos: Educação multicultural. Prática inclusiva. Educação Física. Políticas Educacionais.

 

          Este artigo teve uma versão preliminar apresentada no Seminário Internacional Inclusão em Educação: Universidade e participação 3. Realizado pelo Laboratório de Pesquisa, Estudos e Apoio à Participação e à Diversidade em Educação na Universidade Federal do rio de Janeiro (UFRJ), no Rio de Janeiro, em maio de 2013.

 

 
EFDeportes.com, Revista Digital. Buenos Aires - Año 19 - Nº 194 - Julio de 2014. http://www.efdeportes.com/

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1.     Introdução

    O presente trabalho tem o objetivo principal de elucidar e aumentar a consciência por parte dos profissionais de educação em geral, da importância de uma prática pedagógica inserida num contexto multicultural. Onde as diferenças convivam e cresçam em harmonia. Onde se consiga romper como currículo hegemônico, tradicional, que privilegia sempre o mais forte e exclui o mais fraco. Onde se possa romper com uma monocultura criada pelos dominantes e, detrimento dos dominados.

    Nos Estados Unidos, estudantes e líderes religiosos negros se unem na luta por garantia de direitos civis como um exercício de igualdade. Assim, surge o multiculturalismo, inserido num contexto onde o princípio ético busca a orientação de grupos culturalmente dominados e que não tiveram nem suas próprias características culturais preservadas.

    Em Cashmore (2000) encontramos a seguinte definição para o termo: “O multiculturalismo possui, na sua essência, a idéia ou ideal de uma coexistência harmônica entre grupos étnica ou culturalmente diferentes em uma sociedade harmônica” (p. 371). Mais do que um simples termo ou expressão, o multiculturalismo se apresenta como um movimento de afirmação de cidadania contra as injustiças sociais. É a luta dos oprimidos contra a hegemonia excludente da elite dominante.

    Atualmente a questão multicultural preocupa muito algumas sociedades. Por exemplo, na América Latina, e particularmente no Brasil, esta questão apresenta uma especifidade singular, um contorno próprio. Nosso país apresenta um alicerce multicultural muito forte, onde as relações entre as diversas culturas fazem parte da nossa História, esta, dolorosa e trágica, principalmente quando se refere aos grupos indígenas e afrodescendentes.

    Candau (2003) diz que; “a nossa formação Histórica está marcada pela eliminação física do “outro” ou por sua escravização, que também é uma forma de negação de sua alteridade”. Podemos assim afirmar que a eliminação física do “outro” não se dá unicamente pela sua morte, mas também pela eliminação dos seus direitos de cidadão, de Ser Humano.

    A negação do “outro” (diferente) se dá em vários planos da sociedade, como por exemplo, no das representações sociais, onde esta minoria que foi violentada nos seus direitos de cidadãos, Seres Humanos, procura sobreviver e afirmar tal identidade numa situação de poder socioeconômico totalmente inferior, subordinados a condições extremas de injustiça e exclusão social.

    Para muitas pessoas a percepção desta realidade, construída durante anos e alicerçada em cima de estereótipos e preconceitos criados, é extremamente ameaçadora. Começa aí a construção de um verdadeiro processo de guetificação e formação de subculturas, produzidas pela elite dominante. Candau (2003) afirma: “surgem então comportamentos e dinâmicas sociais que constroem muros. Física, afetiva e ideologicamente evita-se o contato e criam-se mundos próprios, sem relação com os diferentes”.

2.     Multiculturalismo

    A literatura já atual já aponta para a necessidade de uma prática pedagógica preocupada com a diversidade cultural, cada vez mais presente no Brasil. Candau (2003) nos afirma que: “As relações entre direitos humanos, diferenças culturais e educação nos colocam no horizonte da afirmação da dignidade humana num mundo que parece não ter mais esta convicção como referência radical. Neste sentido trata-se de afirmar uma perspectiva alternativa e contra-hegemônica de construção social, política e educacional”. Outros autores já compartilham desta necessidade, por exemplo, quando Canen (2000) cita que: “a educação multicultural, é percebida como uma via pela qual se promove o resgate de valores culturais ameaçados, de forma a se garantir a pluralidade cultural, compreendida em uma perspectiva semelhante à de preservação da diversidade cultural ambiental e à defesa de espécies em extinção, tal como foi discutido por McGinn (1996)”.

    O simples reconhecimento do caráter multicultural de uma sociedade, não é o suficiente para a construção de uma sociedade mais justa. “Portanto a consciência do caráter multicultural de uma sociedade não leva espontânea e necessariamente ao desenvolvimento de uma dinâmica social informada pelo caráter intercultural” (CANDAU, 2003). Aceitar o caráter multicultural de uma sociedade, não implica numa intervenção intercultural, ou seja, numa participação ativa, dialética e crítica em prol do favorecimento dos alijados socialmente. A mesma autora explica: “Neste sentido, o interculturalismo é uma expressão do multiculturalismo, mas nem todo multiculturalismo é intercultural”.

    Olhar para a diversidade cultural é pensar criticamente na formação do aluno/cidadão, ou seja, uma educação rompendo as barreiras dos muros da escola, a qual seguindo a linha de pensamento de Paulo Freire se dá em qualquer seguimento da sociedade. Citando Horta (2010): “assim começamos a ter possibilidade de romper com uma monocultura curricular que privilegia os ditos ‘não diferentes’, por traz de um discurso democrático e inclusivo de que todos têm direito à educação e só depende do esforço de cada um para se ter ao menos a condição de se viver dignamente”.

3.     Multiculturalismo e Educação Física

    O debate sobre diversidade cultural começou a ser gestado na década de 1980. Período este marcado pela inserção das ciências sociais no panorama acadêmico da Educação Física. Com isso, ocorreu uma crise epistemológica, com uma nova visão da área e de um novo pensar de sua ação pedagógica. Até então sua prática limitava-se ao ativismo inconsequente, o “fazer por fazer”. Daolio e Oliveira (2011) explicam: “Tratava-se de uma prática que não considerava o contexto dos sujeitos e que tinha como preocupação a “educação do físico”.

    A partir desta década que começou-se a entender e questionar a Educação física inserida num contexto preocupado com a questão social e cultural dos sujeitos. Desse modo, com a discussão da cultura em cena na Educação Física, não se pode mais negar a questão das diferenças. Daolio (2004, p. 2), cita: “[…] cultura é o principal conceito para a Educação Física, porque tida dinâmica cultural[...] expressando-se diversificadamente e com significados próprios no contexto e grupos específicos”.

    Uma prática pedagógica da Educação Física num contexto onde se considera a historicidade de cada movimento, este fazendo parte da cultura de cada época, preocupa-se com as diferenças dos alunos, sem criar estereótipos e sem cotejá-los. Daolio explica: “essa Educação Física plural parte do pressuposto de que os alunos são diferentes, recusando o binômio igualdade/desigualdade para compará-los”.

4.     Multiculturalismo e inclusão

    Práticas pedagógicas multiculturais exigem um repensar de nossas vidas, conceitos, valores e princípios, para que possamos ter uma conduta ética na nossa prática profissional em consonância com nosso discurso teórico. Behrens (2000) explica: “a busca por um novo paradigma demanda uma nova revisão de mundo, de sociedade e de Homem”.

    É importante ressaltar que , enxergar e aceitar a diversidade cultural, não implica em uma prática pedagógica preocupada com a inclusão e muito menos com que as diferenças cresçam e convivam em harmonia. É necessário uma prática pedagógica intercultural crítica, reflexiva, dialética, onde as “diferenças” passam a ser umas das pontes na construção de uma pedagogia das “diferenças”, e como diz Candau (2005): “o que faz com que as diferenças passem a ser identificadas como um encontro e não como um esbarrão, atribuindo valores aos debates e conhecimentos de forma a não dar continuidade ao status vigente”.

    É necessário uma prática pedagógica que privilegie a subjetividade Humana como possibilidade de resgatar a essência do Ser humano enquanto sujeito ativo da sociedade, e não mais como objeto de um capitalismo que impõe, determina, anula sua individualidade, tornando-o cada vez mais passivo na construção da sua própria identidade.

5.     Conclusões finais

    Infelizmente ainda hoje, observamos a prática de uma EF escolar hegemonista, reprodutora de uma sociedade capitalista, elitista, onde o mais forte exclui socialmente o mais fraco das mais variadas formas, etnicamente, economicamente, fisicamente , e outras tantas. Daolio (1995) afirma: “A escola e a Educação Física, de modo particular, sempre tiveram dificuldades em lidar com a manifestação e a valorização das diferenças, tenderam ao longo da História, a silenciá-las, sentindo-se mais seguras e confortáveis na homogeneização e padronização”. Assim, vemos a necessidade de uma prática pedagógica inclusiva, igualitária, inserida dentro de uma visão multicultural. A escola ao em vez de preservar a tradição monocultural, tem a obrigação de aprender a lidar com a diversidade cultural que é peculiar do nosso país. Para que essa nova perspectiva de práxis pedagógica seja efetivada, é necessária uma formação multicultural de professores. Candau (2002) propõe a modificação do currículo afirmando ser necessário uma transformação para um “…currículo na perspectiva da introdução da sensibilidade à diversidade cultural” (p.134). Uma educação para o não preconceito, para a não discriminação, para um convívio multicultural, pode transformar relações desiguais em relações harmônicas de entendimento e respeito.

    A realidade da educação física escolar também é diversa e multicultural. Olhar para as diferenças culturais imersas no contexto escolar é fundamental para a formação dos alunos/cidadãos. Gonçalves e Silva (1998) afirmam que “…e como a educação, qualquer que seja ela, está integralmente centrada na cultura, pode-se entender porque os multiculturalistas fizeram da instituição escolar seu campo privilegiado de atuação” (p. 16).

    A abordagem do multiculturalismo não vem sendo realizada com afinco no campo da EF. Esta temática exige que repensemos nossos preconceitos, valores e nossa prática pedagógica. “A formação docente, dentro de uma perspectiva multicultural, deve, portanto, aproximar a realidade (cotidiano, cultura escolar) da teoria (conhecimentos adquiridos na formação)...” (CANDAU, 2005).

    Baseado no que foi dito por Darido (2005), podemos inferir que, uma prática pedagógica multicultural exige conteúdos alternativos e novas formas de aplicá-lo. Assim começaremos a ter a possibilidade de romper com uma monocultura curricular que privilegia os ditos “não diferentes”, por traz de um falso discurso de que todos tem direito à educação e só depende do esforço de cada um para se ter ao menos a condição de se viver dignamente. Como se isto pudesse ser verdade dentro do cenário de injustiças e desigualdades socioeconômicas que vemos atualmente.

    Assim cabe a nós profissionais da educação física, e da educação em geral, termos a consciência desta urgente necessidade de repensarmos e mudarmos esta prática pedagógica, mera reprodutora de uma sociedade das maiorias (“os iguais”), ultrapassada e presa a antigos paradigmas que infelizmente ainda encontramos nas nossas escolas.

Bibliografia

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