efdeportes.com

O equilíbrio na capoeira

El equilibrio en la capoeira

 

Academia da Usina

Rio de Janeiro, RJ

(Brasil)

Ricardo Martins Porto Lussac (Mestre Teco)

ricardolussac@yahoo.com.br

 

 

 

 

Resumo

          A Capoeira é uma das modalidades de luta que mais desenvolvem as qualidades físicas em seus praticantes, sendo um esporte considerado completo por muitos capoeiristas. O desenvolvimento das qualidades físicas em seus praticantes auxiliam os mesmos no treinamento e na prática do jogo e da luta da Capoeira, desenvolvendo a sua performance e habilidades. Este trabalho teve como objetivo elaborar apontamentos iniciais sobre o equilíbrio, uma qualidade física essencial para a prática do jogo-luta.

          Unitermos: Capoeira. Qualidade física. Equilíbrio.

 

 
EFDeportes.com, Revista Digital. Buenos Aires, Año 18, Nº 187, Diciembre de 2013. http://www.efdeportes.com/

1 / 1

    A Capoeira é uma das modalidades de luta que mais desenvolvem as qualidades físicas em seus praticantes, sendo um esporte considerado completo por muitos capoeiristas. O desenvolvimento das qualidades físicas em seus praticantes auxiliam os mesmos no treinamento e na prática do jogo e da luta da Capoeira, desenvolvendo a sua performance e habilidades. Este trabalho teve como objetivo elaborar apontamentos iniciais sobre o equilíbrio, uma qualidade física essencial para a prática do jogo-luta. Inicialmente abordarei os conceitos sobre esta valência para, ao longo do texto, elaborar apontamentos para seu treinamento e sua prática na Capoeira.

    Segundo Tubino, equilíbrio é “a qualidade física conseguida por uma combinação de ações musculares com o propósito de assumir e sustentar o corpo sobre uma base, contra a lei da gravidade.” (TUBINO, 1984, p. 180).

    Para Rasch e Burke, “um objeto está em estado de equilíbrio estável ou em repouso, quando a resultante de todas as forças que atuam sobre ele for igual a zero” (apud COSTA, 1996, p. 143).

Figura 1. Fotos de um jogo de Capoeira sem acompanhamento musical. Dados das fotos: Grupo: Malta da Floresta (Mestre Teco, Rio de Janeiro, RJ). Foto de cima: À esquerda, executando uma 

benção, está Mestre Teco. Do lado esquerdo, ao final do golpe meia lua de frente, está o Contra-Mestre Cabeção (in memorian). Foto de baixo: À esquerda, executando uma meia lua de frente, está

 Mestre Teco. Do lado esquerdo, ao final do golpe parafuso, está o Contra-Mestre Cabeção (in memorian). Local: Terreiro de São Rafael, Tijuca, Rio de Janeiro. Arquivo Pessoal do Mestre Teco (1998)

    Já Fernandes, no Dicionário Brasileiro da Língua Portuguesa – O Globo, deste modo define o vocábulo: “Equilíbrio, s. m. Estado de um corpo solicitado por duas ou mais forças que se anulam entre si; harmonia; justa medida. (Do lat. aequilibriu) [grifos no original]” (1993, p. 324).

    De acordo com Fátima Alves, “não pode haver coordenação de movimento sem um bom equilíbrio, permitindo o ajustamento do homem ao meio. (...) O equilíbrio é a base primordial de toda a coordenação geral” (2003, p. 60). Aurélio define o equilíbrio como “a manutenção dum corpo na posição normal, sem oscilações ou desvios. Igualmente entre forças opostas. Estabilidade mental e emocional” (apud ALVES, 2003, p. 60).

    A Física, de acordo com as suas Leis, relativo ao Equilíbrio, diz que, um corpo pode estar em equilíbrio nas formas de Equilíbrio Estático e Equilíbrio Dinâmico (BONJORNO, 1988). O Equilíbrio Estático “É aquele no qual o corpo está em repouso, isto é, sua velocidade é nula no decorrer do tempo.” (ibidem, 1988, p. 174) e “Para que um ponto material esteja em equilíbrio estático é necessário e suficiente que a resultante de todas as forças que nele agem seja nula [grifo no original]” (ibidem, 1988, p. 174). Equilíbrio Dinâmico é “aquele no qual o corpo está em movimento retilíneo uniforme, isto é, sua velocidade é constante em módulo (v = cte. ≠ 0), direção e sentido.” (ibidem, 1988, p. 174).

    Tubino (1984) afirma que o equilíbrio está dividido em três tipos: Equilíbrio Dinâmico, Equilíbrio Estático e, Equilíbrio Recuperado.

a.     Equilíbrio Estático: como a própria nomenclatura define, seria o perfeito equilíbrio do corpo em uma determinada posição. Para Mônica Nicola, o Equilíbrio Estático é “o equilíbrio no estado de repouso em que se acham os corpos solicitados por forças, encontrando-se firmes, imóveis ou parados.” (2004, p. 79). De acordo com Marcelo Gomes da Costa apoiado em Dantas e em Rasch e Burke:

    “segundo Dantas [...] “é o observado em repouso”. Convém ressaltar que uma situação hipotética de equilíbrio totalmente estático é praticamente impossível de ser concebida e mantida, quando da prática corporal. “Mesmo a chamada “atitude ereta estática” tem mostrado ser impossível; existe sempre uma oscilação, que traduz uma situação dinâmica com indispensáveis e contínuos ajustes e reajustes da posição destinados a manter o equilíbrio”, cita Rasch/Burke” (COSTA, 1996, p. 143).

    Neste sentido, poderíamos afirmar e definir o Equilíbrio Estático, como a capacidade de utilizar o menos possível do processo de equilibração. O processo de equilibração seria constante e poderia ser usado em maior ou menor grau, deste modo, supondo um Equilíbrio Estático perfeito não haveria equilibração. Na Capoeira há inúmeras posições em que o equilíbrio estático é requerido.

b.     Equilíbrio Dinâmico: de acordo com Tubino, “é o tipo de equilíbrio conseguido em movimento” (1984, p. 192). Para Nicola, o Equilíbrio Dinâmico é o “equilíbrio relativo ao movimento, equilíbrio das forças ou organismo em atividade, ativo.” (2004, p. 79). Segundo Costa, é “aquele em que, a cada momento, ocorrem constantes modificações em sua situação que requerem novos ‘ajustes e compensações’” (1996, p. 143):

    “A própria marcha tem sido definida como “uma série de catástrofes evitadas por muito pouco” (mais uma vez Rasch/Burke [...].

    Hay/Reid [...] afirmam: “Quando um corpo está-se movendo com velocidades linear e angular constantes - o que apenas pode ocorrer se a soma das forças e a soma dos torques que atuam sobre ele forem iguais a zero -, é dito que o corpo está em equilíbrio dinâmico”. (ibidem, p. 143).

    Em geral, este equilíbrio é o mais utilizado no dia a dia do homem, em seus vários movimentos executados durante toda a sua vida. O Equilíbrio está intrinsicamente relacionado ao desenvolvimento, estado e estruturação do Tônus Muscular, e conseqüentemente com todos os sistemas orgânicos envolvidos com este, como o neuro-ósteo-muscular e a postura, por exemplo. Na Capoeira existe uma infinidade de gestos e movimentos que possuem a característica do equilíbrio dinâmico, considerando as variações e a criatividade permanente, além das situações inusitadas onde se presencia novas plásticas cinestésicas.

c.     Equilíbrio Recuperado: é “a qualidade física que explica a recuperação do equilíbrio numa posição qualquer” (TUBINO, 1984, p. 192). Segundo Tubino, o “sistema nervoso é a variável principal para o sucesso nessa qualidade física” (1984, p. 192).

    Alguns autores desconsideram esta divisão do equilíbrio, pois acreditam que o Equilíbrio Recuperado estaria compreendido entre o Estático e o Dinâmico. De acordo com o entendimento de Costa: “Poderíamos considerá-lo como fase de transição entre equilíbrios – entre o Estático e o Dinâmico e vice-versa -, onde atua para restabelecer movimentos e atitudes.” (1996, p. 143). Destarte, a perspectiva conceitual dos tipos de equilíbrio podem variam de acordo com a concepção de cada treinador. Costa afirma que, de uma forma geral, o equilíbrio estático encontra-se relacionado à capacidade sensorial do indivíduo – analisadores cinestésicos (ibidem, 1996):

    “Como o centro de gravidade do corpo humano, na posição anatômica (em pé), encontra-se localizado na altura do quadril, próximo à cicatriz umbilical, quanto mais baixo for o movimento realizado mais próximo do solo o centro de gravidade ficará, aumentando, desta forma, as possibilidades de se conseguir um movimento mais estável e equilibrado.” (ibidem, 1996, p. 144).

    Devemos ressaltar e lembrar que, em cada ser humano o centro de gravidade é diferente, ou seja, o centro de gravidade não é padrão. Este centro é alterado toda vez que o homem se movimenta ou muda de posição. Como dito na citação acima, quanto mais próximo ao chão, maior a possibilidade e facilidade de se estabilizar e se equilibrar. Deste modo, os exercícios no chão com os iniciantes praticantes de Capoeira, não só trazem segurança, mas ajudam a aperfeiçoar esta qualidade física, imitando a evolução humana, que começa no rolar, engatinhar, para após, andar.

    O desenvolvimento da noção interoceptiva do centro de gravidade é uma condicionante de um bom desenvolvimento da qualidade física equilíbrio na Capoeira. Quanto maior a noção consciente do centro de gravidade, maior o potencial de otimização de aprendizado de novos gestos e movimentos. Do mesmo modo, ao ter uma maior noção consciente de seu centro de gravidade, o capoeirista também adquire um maior poder de leitura corporal dos movimentos de outros corpos e de sua situação no ambiente.

    Para Cunha, o “equilíbrio é definido como a capacidade de assumir e sustentar o corpo contra a lei da gravidade” (2003, p. 67), sendo uma das qualidades físicas que podem ser trabalhadas e aperfeiçoadas na Capoeira “através do equilíbrio dinâmico, com os movimentos aú, bananeira, golpes em geral, pois para realizá-los é necessário ficar equilibrado em uma das pernas, em determinado tempo, realizando o movimento.” (ibidem, 2003, p. 67).

    Segundo Campos, a Capoeira desenvolve o equilíbrio dinâmico (equilíbrio em movimento), o estático (pois é utilizado como forma de treinamento) e, principalmente, o recuperado. Pois, na Capoeira esta valência é por demais usada, devido à grande movimentação dos saltos e aos momentos de destreza. Para Campos (1998), o equilíbrio recuperado é a recuperação do equilíbrio em uma posição qualquer depois de estar durante um tempo fora do solo. De acordo com este autor, o equilíbrio é muito trabalhado na Capoeira, tanto no treinamento como na prática propriamente dita, pois a sua prática é muito rica, “principalmente por ser, na maioria das vezes, de equilíbrio recuperado, partindo das mais variadas posições e planos: alto, médio e baixo. Proporciona, desta maneira, equilíbrio e segurança ao praticante.” (ibidem, 1998, p. 115).

    “Na prática da capoeira, o equilíbrio é uma das qualidades mais trabalhadas. Vários autores classificam o equilíbrio em estático, dinâmico e recuperado. O estático refere-se à habilidade de manter o equilíbrio enquanto parado, na capoeira “é bastante evidenciado nas paradas de mão, cabeça e até mesmo nas esquivas por poucas frações de segundos. O equilíbrio dinâmico é a habilidade de manter o equilíbrio em movimento, na capoeira podemos evidenciá-lo quando há deslocamentos em posições invertidas e na própria ginga. O equilíbrio recuperado é evidenciado em posições invertidas, combinações de movimentos em um, dois, ou três apoios e golpes giratórios.” (SOUZA & OLIVEIRA, 2001, p. 46).

    O desenvolvimento da qualidade física equilíbrio proporciona uma maior noção de mudança de direções, de sentido dos movimentos, possibilitando uma concepção plena do estado do corpo e dos corpos ao redor. Deste modo, percebem-se as forças que interagem no ambiente e em seu próprio corpo, compreende-se tanto a harmonia como o caos presente. A postura e o tônus muscular também são elementos que podem ser condicionados quando se detêm um equilíbrio evoluído, proporcionando a utilização consciente e saudável do corpo a seu favor.

    Outro aspecto do equilíbrio, não necessariamente o motor-corporal, como qualidade física, mas que podem refletir nestes aspectos, são os equilíbrios mental e emocional, que também estão relacionados. Deste modo, é possível afirmar que o equilíbrio físico também depende e é desenvolvido junto aos equilíbrios mental e emocional.

    Tais formas de equilíbrio são imprescindíveis a qualquer pessoa e na Capoeira não seria diferente. Sem o adequado equilíbrio mental não se consegue realizar de forma plena um treinamento ou um jogo de Capoeira, ao mesmo tempo em que, sem o equilíbrio emocional não se consegue estabelecer uma relação intra e interpessoal saudável e, muito menos, estar preparado para, inclusive, as demandas emocionais pertinentes ao jogo da Capoeira e às características psíquicas de qualquer lutador. Portanto, é possível afirmar que o equilíbrio, em todos os seus aspectos e formas, é fundamental para toda a prática e treinamento da Capoeira e de outras formas de expressões corporais.

Nota

    Este trabalho, só agora publicado, é resultante de alguns apontamentos do autor quando este escreveu sua monografia de pós-graduação lato sensu (LUSSAC, 2004). Nos dias atuais o autor se dedica a outras áreas de pesquisa, entretanto, o mesmo acredita que ao publicar estes apontamentos, estes podem contribuir de algum modo somando ao desenvolvimento acadêmico no campo da Capoeira, ainda muito aquém do que poderia ser explorado.

Referências bibliográficas

  • ALVES, Fátima. Psicomotricidade: corpo, ação e emoção. Rio de Janeiro: Wak, 2003.

  • BONJORNO, Regina Azenha et al. Fisica, 2º grau: mecânica, eletricidade, termologia, ondulatória, óptica geométrica. São Paulo: FTD, 1988.

  • CAMPOS, Hélio. Capoeira na Escola. 1ª edição, Salvador: Editora da Universidade Federal da Bahia, 1998.

  • COSTA, Marcelo Gomes da. Ginástica Localizada. Rio de Janeiro: Editora Sprint, 1996.

  • CUNHA, Andréa Cristiane Alves da. Capoeira Positiva - Os benefícios da prática da Capoeira para crianças portadoras do vírus HIV. Rio de Janeiro: Edições Abada-Capoeira, 2003.

  • FERNANDES, Francisco. Dicionário Brasileiro Globo. 30ª edição. São Paulo: Globo, 1993.

  • LUSSAC, Ricardo Martins Porto. Desenvolvimento psicomotor fundamentado na prática da capoeira e baseado na experiência e vivência de um mestre da capoeiragem graduado em educação física. Universidade Cândido Mendes, Pós-Graduação “Lato Sensu”, Projeto A vez do Mestre. Rio de Janeiro: 2004.

  • NICOLA, Mônica. Psicomotricidade – Manual Básico. Rio de Janeiro: Revinter, 2004.

  • SOUZA, Sérgio Augusto Rosa de; OLIVEIRA, Amauri Aparecido Bássoli de. Estruturação da capoeira como conteúdo da educação física no ensino fundamental e médio. Revista da Educação Física/UEM. Maringá, v. 12, n. 2, p. 43-50, 2001.

  • TUBINO, Manoel José Gomes. Metodologia científica do treinamento desportivo. 3ª edição. São Paulo: Ibrasa, 1984.

Outros artigos em Portugués

  www.efdeportes.com/
Búsqueda personalizada

EFDeportes.com, Revista Digital · Año 18 · N° 187 | Buenos Aires, Diciembre de 2013
© 1997-2013 Derechos reservados