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Desenvolvimento de pessoas com deficiência 

intelectual por meio da corrida de orientação

El desarrollo de personas con discapacidad intelectual a través de la carrera de orientación

 

*Bacharéis em Educação Física pela Universidade Estadual de Maringá

**Mestre em Educação. Professora Assistente no Departamento

de Teoria e Pratica da Educação (DTP/UEM)

(Brasil)

Isabela Gouveia Marques*

Thiago Bassani Bellusci*

Gizeli Aparecida Ribeiro de Alencar**

ig.marques@hotmail.com

 

 

 

 

Resumo

          A educação básica contempla inúmeros saberes que se fazem presentes por meio dos componentes curriculares. De modo bastante sintetizado aludiremos a uma atividade que ainda não se consagrou como componente da educação física escolar: a corrida de orientação. Nesse sentido, esse estudo se propõe a desenvolver atividades de corrida de orientação junto a pessoas com deficiência intelectual. Entendendo corrida de orientação como uma modalidade esportiva fundamentada no uso de mapas com fins de orientação espacial, essa pesquisa tem por objetivo dissertar sobre as possibilidades de desenvolvimento das funções psicológicas superiores nas pessoas com deficiência intelectual. Trata-se de uma pesquisa teórico-empírica, contemplando referencial teórico e algumas atividades desenvolvidas. Participam da pesquisa 14 adultos diagnosticados com deficiência intelectual, sendo 10 do gênero masculino e 4 (quatro) feminino, com idades variando de 20 anos a 52 anos. Os registros contínuos das observações estão sendo efetivados por meio do planejamento de aula, com base na proposição da Metodologia da Mediação Dialética. Acreditamos que o esporte de orientação configura-se como uma das possibilidades de prover aprendizagens escolares. Os primeiros resultados evidenciaram que mesmo passando pelos mesmos espaços físicos todos os dias, localizar pontos específicos em um mapa de orientação é uma tarefa extremamente difícil. Contudo, as vivencias teóricas e práticas introduzidas de forma gradativas estão possibilitando mediações entre os participantes e com a professora, bem como indagações.

          Unitermos: Funções psicológicas superiores. Corrida de orientação. Deficiência intelectual.

 

Apresentado no VI Congresso Brasileiro de Educação Especial em 2011.

 

 
EFDeportes.com, Revista Digital. Buenos Aires, Año 18, Nº 186, Noviembre de 2013. http://www.efdeportes.com/

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Introdução

    Práticas educativas eficazes sempre estiveram presentes dentre as preocupações dos profissionais da educação. A escola enquanto instituição formal deve responder educacionalmente a um grande contingente de alunos, os quais são reais e não ideais como gostaríamos que fossem visão essa resultante de um legado educacional no qual fomos formados com base no reprodutivismo e na transmissão de conhecimentos.

    Os problemas vividos pelos alunos durante o processo educacional são inúmeros. Dentre esses há também os alunos que por motivos diversos, se afastam dos padrões de normalidade constituídos em nossa sociedade.

    O modo como a sociedade concebe a deficiência atualmente é produto do processo histórico, da herança cultural, desenvolvida e compartilhada socialmente. Essas atividades, presentes e constituidoras das mentalidades, de acordo com Mendes (2006), estão pautadas na concepção de estudos sistêmicos, que ao longo da história caracterizam a deficiência de inúmeras formas. Essas concepções já foram associadas a questões hereditárias e irreversíveis, baseadas em patologias que legitimaram a marginalização dessa população por meio de confinamento em instituições e perpassando por diversos rótulos.

    Com o avanço cientifico e de inúmeras pesquisas respaldadas em documentos oficiais, tanto internacionais quanto nacionais, vivemos hoje um momento histórico no qual o conceito de inclusão nos direciona a pensar e refletir acerca das práticas educativas junto a essa população.

    A inclusão tal como proposta já se consolidou na sociedade, e o professor deve buscar subsídios teóricos para fundamentar a práxis do trabalho escolar. A educação básica contempla inúmeros saberes que se fazem presentes por meio dos componentes curriculares. De modo bastante sintetizado aludiremos a uma atividade que ainda não se consagrou como componente da educação física escolar– a corrida de orientação. Nesse sentido, esse estudo se propõe a desenvolver atividades de corrida de orientação junto a pessoas com deficiência intelectual.

    Entendendo corrida de orientação como uma modalidade esportiva fundamentada no uso de mapas com fins de orientação espacial, essa pesquisa tem por objetivo dissertar sobre as possibilidades de desenvolvimento das funções psicológicas superiores nas pessoas com deficiência intelectual.

    Dessa forma, subdividimos este texto em três eixos. No primeiro, fazemos uma breve contextualização da corrida de orientação. No segundo eixo abordamos as possibilidades de desenvolvimento da pessoa com deficiência intelectual na perspectiva histórico-cultural e, por fim, as primeiras considerações.

Iniciando o diálogo sobre a corrida de orientação

    O esporte de orientação configura-se como uma das possibilidades de prover aprendizagens escolares. (OLIVEIRA et al.,2008, CAMPOS et al, 2010, PASINI e DANTAS, 2003). De acordo com o contexto histórico, a orientação surge num primeiro momento com intuito de facilitar e agilizar os deslocamentos terrestre e marítimos.

    Pode-se dizer que a orientação teve origem a 2000 a.C. com os egípcios com os primeiros registros de mapas rudimentares (Palmer apud Oliveira, 2008). Entretanto, Pasini e Dantas (2003) relatam que diversos povos na antiguidade criavam diferentes formas de registros geográficos, retratando a necessidade humana de orientar-se.

    Nos dias atuais a corrida de orientação é uma modalidade esportiva com competições em associações, confederações e federações nacionais e internacionais nos cinco continentes, podendo ser praticada nas mais diversas modalidades: a pé, esqui, bike, trail orieentering para deficientes físicos, entre outros (IOF, CBO, 2011).

    No Brasil a corrida de orientação foi introduzida pelos militares após o contato com a mesma nos jogos militares na Suécia; na década de 70. A partir de então a corrida de orientação ingressou no currículo de educação física do exército. Em 1998, a orientação como esporte foi introduzida no currículo de escolas municipais de Cachoeira do Sul – RS, e em algumas escolas e universidades do Paraná.

    Segundo Pasini e Dantas (2003) a corrida de orientação é uma modalidade com grande aceitação do público infantil, por envolver não somente os aspectos físicos como também os cognitivos. Para a atividade ser realizada de maneira adequada não basta somente ser veloz, é preciso utilizar dos artifícios cognitivos, como orientar o mapa, localizar-se para então cumprir a prova no menos tempo possível.

    (...) o esporte de orientação cresce no universo escolar por sua capacidade de unir, sobretudo aspectos físicos e cognitivos, o que amplia a possibilidade de participação dos estudantes em condições de igualdade, por sua necessidade de se conhecer a leitura precisa de mapas, avaliação e escolha da rota, uso da bússola, concentração sob tensão, tomada rápida de decisão, entre outras. (OLIVEIRA et al., 2008, p. 02)

    Para além de trabalhar o exercício físico, trabalha aspectos pessoais e sociais, como tomada de decisão, capacidade de resolução de problemas, localização no espaço, relações sociais, comunicação, contato/interações com meios não tradicionais. No ambiente educacional, a corrida de orientação vem sendo discutida como instrumento pedagógico, podendo ser trabalhada na vertente interdisciplinar.

Desenvolvimento da pessoa com deficiência intelectual na concepção histórico-cultural

    Vigotski desde o início de suas obras, enfatizava a necessidade de análise histórica como primordial à compreensão do comportamento humano. Para o autor, o homem só pode ser entendido mediante as relações que estabelece em sociedade. Em seus trabalhos, reafirmava a importância da análise histórica para a qual se fazia necessário construir uma psicologia compatível com as transformações, deixando de lado o determinismo biológico e pensando no homem como sujeito dessas transformações.

    Dentre outras questões, Vigotski (2001) preocupou-se em descrever o processo de apropriação, desenvolvimento e integração da criança ao seu meio histórico-cultural, correlacionando o meio social às formas e conteúdos do comportamento e pensamento na formação dos indivíduos.

    Mediante o método dialético deu ênfase ao estudo dos mecanismos psicológicos mais sofisticados, próprios da espécie humana: as funções psicológicas superiores.

    Suas análises objetivavam identificar as mudanças comportamentais que ocorrem durante o desenvolvimento do homem e a sua relação com o meio social. Seus trabalhos evidenciaram que o controle consciente do comportamento, a atenção e a lembrança voluntária, a memorização ativa, o pensamento abstrato, o raciocínio dedutivo, dentre outros, são oriundos das funções psicológicas superiores. Segundo ele, essas funções são de origem sociocultural, surgindo dos processos psicológicos elementares, de origem biológica.

    Nesse âmbito, esses processos se originam nas relações entre as pessoas e se desenvolvem ao longo do processo de internalização de formas culturais de comportamento, sendo resultado, portanto, da interação dialética do homem e seu meio sociocultural.

    Ressaltamos, portanto, que em seus estudos Vigotski não negligenciou a base biológica, porém, ao conceber o cérebro como um sistema aberto, constata que as estruturas e formas de funcionamentos são moldadas ao longo da história da espécie humana e do desenvolvimento individual.

    Nesse interstício, a mediação configura-se de suma importância, sendo concebida como instrumentos técnicos e sistemas de signos, ou seja, ferramentas auxiliares. O autor frisa que dentre esses instrumentos e signos a linguagem é tida como signo mediador fundamental para a efetivação da interação do contexto cultural e social. Para Vigotski, por meio da mediação simbólica que o processo das funções psicológicas superiores se desenvolve. O instrumento, nesse prisma, tem a função de regular as ações sobre os objetos, enquanto os signos as ações sobre o psiquismo.

    Os signos são mediadores das relações entre os homens e seu uso marca o ser social, sendo a palavra o signo por excelência. A linguagem é considerada um sistema simbólico essencial, porque organiza os signos em estruturas complexas, corroborando de forma ímpar na formação das características psicológicas humanas.

    Para Vigotski (2001), não há possibilidade de desenvolvimento cognitivo fora da linguagem, e nem linguagem sem a mediação. Configura-se, portanto, em principal mediadora entre o mundo cultural e o biológico. Assim, o desenvolvimento do psiquismo humano é sempre mediado pelo outro, dando significados à realidade.

    As pessoas, ao compreenderem, dominarem e criarem sentidos, desenvolvem as funções especificamente humanas como a vontade, a memória, a atenção voluntária, o raciocínio, o pensamento abstrato, a formação de conceitos, o afeto, a imaginação.

    No que diz respeito à formação de conceitos, Vigotski (2001) ressalta a necessidade de compreensão do processo de formação de conceitos e suas fases básicas – agregação desorganizada (conglomeração vaga e sincrética de objetos isolados); pensamento por complexos e formação de conceito. A clareza do desenvolvimento dessas fases, por parte dos professores, e o uso de materiais necessários e adequados possibilitam o entendimento de que apenas a transmissão de conceitos não logra resultados, auxiliando-os a encontrar caminhos para o processo de ensino-aprendizagem.

    No que tange às pessoas com deficiência intelectual, é imprescindível compreender, a partir das pesquisas científicas, as leis gerais do desenvolvimento, principalmente no que concernem às funções psicológicas superiores que vão se estruturando à medida que a criança vai formando conceitos.

    Em sua obra, Vigotski enfatiza que se deve identificar como essas leis se processam na pessoa com deficiência intelectual e como associá-la às condições externas, pois o desenvolvimento incompleto das funções psicológicas superiores na pessoa com deficiência intelectual não é resultante das conseqüências imediatas e diretas da patologia em si, e sim de obstáculos secundários que aparecem nas relações sociais.

    Vigotski faz uma diferenciação entre deficiência primária (patologia em si) e deficiência secundária, resultantes da forma de inserção no contexto social. Para o autor, “as conseqüencias sociais do defeito acentuam, alimentam e consolidam o próprio defeito. Neste problema não existe aspecto algum em que o biológico possa ser separado do social” (1997, p. 93.)

    Analisando o aspecto qualitativo da deficiência, o autor busca investigar o modo como o funcionamento psíquico se organiza nessa condição, e conclui que as alternativas de desenvolvimento, na presença de uma deficiência, seguem a direção da compensação social das limitações orgânicas e funcionais impostas pela patologia.

    Em seus estudos, sugere a possibilidade de superação das limitações por meio da mediação simbólica em que o educador deve criar oportunidades para que não só a compensação social se efetive, como também a apropriação cultural.

    Por fim, Vigotski postula que em relação às pessoas com deficiência intelectual, os processos afetivos e intelectuais são indissociáveis, e afirma que a peculiaridade dessa condição reside na relação interfuncional entre essas duas dimensões – emoção e cognição – na organização do psiquismo.

Metodologia

    Trata-se de uma pesquisa teórico-empírica, contemplando referencial teórico e algumas atividades desenvolvidas. Participam da pesquisa 14 adultos diagnosticados com deficiência intelectual, sendo 10 do gênero masculino e 4 feminino, com idades variando de 20 anos a 52 anos, que frequentam um projeto de extensão na Universidade Estadual de Maringá que tem como objetivo desenvolver atividades alternativas para pessoas com necessidades especiais.

    Por se tratar de um projeto que oferece diversos ateliês (atividades), a escolha de participação no mesmo foi feita pelos próprios alunos, critério também adotado para esta pesquisa. A pesquisa de campo teve início no mês de fevereiro de 2011 e a coleta de dados está sendo realizada uma vez por semana, durante atendimento, com duração de 2 horas/aula.

    Os registros contínuos das observações estão sendo efetivados por meio do planejamento de aula, com base na proposição da Metodologia da Mediação Dialética (ARNONI, 2007).

    A fundamentação teórica está pautada em Pasini e Dantas (2003), Oliveira et al. (2008), Campos et al. (2010) e pesquisadores russos como Vigotski (1997; 2001), Leontiev (2004), dentre outros. Os pais e responsáveis assinaram o Termo de Consentimento “Livre e Esclarecido” com informações relativas aos objetivos e procedimentos a serem adotados neste estudo, garantindo sigilo, anonimato e confidencialidade dos dados para futura disseminação.

Primeiros resultados e discussões

    Para esse artigo apresentaremos as três primeiras atividades desenvolvidas junto aos alunos.

    Para realização da atividade 1 os alunos foram separados em dois grupos os quais receberam um papel com um mapa contendo alguns espaços da Universidade pelo qual eles transitam semanalmente. Neste foram desenhados o Departamento de Educação Física e suas repartições. Como ponto de controle, locais que os alunos devem localizar no mapa, foram destacados e numerados a sala do PET, a secretaria do Departamento, a quadra poliesportiva e a cantina. Em cada ponto de controle os alunos tinham como missão perguntar ao responsável pelo posto “qual a senha”. De posse da senha, a qual deveria ser registrada em papel - no grupo havia alunos alfabetizados e não-alfabetizados – os alunos seguem para o posto seguinte.

    Em cada um desses pontos de controle orientamos um funcionário para que fornecessem verbalmente uma senha aos alunos assim que eles chegassem ao local.

Figura 1. Mapa de Orientação

 

Ponto 1 – PET – sala B1

Falar com: aluno

Senha: ________________

 

Ponto 2 – Secretaria

Falar com: Odete

Senha: ________________

Ponto 3 – almoxarifado da quadra

Falar com: Didi

Senha: ________________

 

Ponto 4 – cantina

Falar com: Adriano

Senha: ________________

Figura 2. Registro das senhas

    Durante a realização da atividade foi possível constatar que mesmo passando por esses espaços todos os dias, localizar pontos específicos no mapa evidenciou-se uma tarefa extremamente difícil.

    Dentre as falas destacamos:

Aluno A: Ih, eu não sei onde é isso não!

Professora: O ponto 1 é a cantina, certo? Olhem ao redor de vocês! Onde está a cantina?

Aluno A: Pra lá!

Professora: Agora olhe no seu mapa.

Aluno A: O mapa mostra pra lá, oh.

Professora: Certo, então vire o mapa assim! (professora mostra o posicionamento do papel onde o mapa está desenhado)

    A atividade foi finalizada, contudo, durante todo o trajeto a professora intervinha mostrando as direções evidenciando as estruturas arquitetônicas e o mapa desenhado.

    Na semana seguinte após verificar as dificuldades de leitura dos mapas a atividade foi desenvolvida no anfiteatro do colégio de aplicação da Universidade.

    Para essa aula o planejamento foi realizado fundamentado na Metodologia da Mediação dialética (ARNONI, 2007). No primeiro momento da aula foi possível registrar as seguintes falas dos alunos no item Resgatando/registrando.

Resgatando/Registrando

Professora - O que é um espaço físico?

Aluno L.é pra deficiente?

Aluno Alpra deficiente.

Aluno C. – é físico

Aluno J. – espaço pra fazer esporte

Aluno M. – preparo físico

Aluno E. – fazer atividade diferente

Aluno P. – espaço é aqui

Aluno L. – exercício físico

Aluno P. – pra pessoas com cadeira de rodas

 

Professora - O auditório é um espaço físico?

Aluno J, M, P e Lsim

Aluno MSim, porque tem muito espaço.

 

Professora: Um lugar pequeno é espaço físico?

Aluno Jsim, só que é menor

Aluno Marpra brincar

Aluno E. A.hidroginástica, musculação...

Aluno M. – academia

 

Professora - É possível desenhar um espaço físico?

Aluno K.é muito difícil, tem que ter paciência, tem que fazer o trabalho completo, se errar tem que fazer de novo.

Aluno E. T. – não sei.

Aluno Lnão, é impossível, porque é muito grande pra caber no papel.

Aluno Lutem que desenhar em uma folha muito grande.

Aluno E Tnão cabe a sala na folha.

Aluno Maré muito grande.

    Diante as respostas foram realizadas as seguintes problematizações.

Problematizando

Professora - O que é um mapa?

Aluno Ké o planeta que a gente vive.

Aluno Eonde marca pra correr.

Aluno Jlocal que procura.

Aluno Lutem Santa Catarina, Brasília, Foz do Iguaçu, são todas capitais.

Aluno E TMaringá, Porto Alegre.

 

Professora pode ter um mapa só da cidade de Maringá?

Aluno Knão.

Aluno Jpode sim.

Aluno Lsim, tem os bairros, as esquinas.

Aluno Kporque tem várias cidades.

Aluno Mmapa pra viajar.

Aluno LuBrasília, Argentina, Inglaterra, França, está tudo no mapa.

 

Professora o que tem no mapa de Maringá?

Aluno Lbairros.

Aluno P a história de Maringá, quando Maringá nasceu, e por isso Maringá é mais velho. Você sabia que se chama Maringá porque é Maria que é um nome mais Ingá que é um doce?

Aluno LuMaria é a mãe de Deus. O mapa representa as capitais do Brasil.

Aluno Cmapa no lixo.

Aluno Almapa é pra viajar, pra ver onde são as cidades.

 

Professorae o que é um mapa de corrida de orientação?

Aluno Jé quando queria achar os objetos, e com o mapa achava.

 

Professora - O mapa pode ser lido?

Aluno Mpra localizar.

Aluno Llê o lugar, como no mapa do tesouro, segue o caminho e acha o tesouro.

Aluno Jtem um mapa na lista telefônica.

Aluno Lna minha casa tem um mapa de uma empresa que faz mapa, é o mapa de Maringá, com todos os bairros.

Aluno Marporque é cheio de cidade pra conhecer.

 

Professora – como se lê um mapa?

Aluno Marilendo.

Todos: Não sei, não!

 

Professora Um mapa precisa ter letras

Aluno Maí não tem assunto.

Aluno Jnão tem letra, mas tem ponto de referência. Dá pra ir daqui da UEM até a catedral porque tem os pontos de referência, tem o terminal, o Willie Davis...

 

Professora - Para que serve um mapa?

Aluno E TMaringá

Aluno Jpra se localizar e localizar alguma coisa.

Aluno Ppara ter a informação, para conhecer os outros lugares.

Aluno Marpra não se perder.

Aluno Epara localizar onde a gente está para não ficar perdido, para chegar no lugar que queria.

 

Professora - Qualquer pessoa pode ler um mapa?

Aluno Jsim, porque é fácil de saber qual é um mapa de cidade e um mapa de um país.

Aluno Msim, porque tem muitas informações.

Aluno Lsim, porque é só ler.

 

Professora e quem não sabe ler? Consegue ler um mapa?

Aluno P e E – não

Aluno M – aí não.

Aluno Jsim, pelos desenhos, pelos pontos.

 

Professora Ler um mapa não é ler as palavras, tem desenhos, tem que saber entender e interpretar o que está desenhado, certo?

Aluno Mentão dá sim.

    Findada as problematizações foi explicado aos alunos (conteúdo científico) o que era corrida de orientação e suas finalidades.

    Para verificar se os mesmos haviam se apropriado do conteúdo trabalhado foi solicitado no quarto item do planejamento – o produzindo - que desenhassem o espaço físico da sala em que estavam (anfiteatro) em uma perspectiva vista de cima para baixo.

    As respostas emitidas no primeiro momento do planejamento – resgatando/registrando – evidenciou que os mesmos não tinham clareza dos conceitos espaço físico, mapa. Alguns deram respostas aleatórias, outros repetiam o que o colega havia dito. No item produzindo alguns desenhos evidenciaram riqueza de detalhes, outros rabiscos primitivos necessitando ser explorado pela professora oralmente para identificar e registrar o que era cada desenho. Foi possível verificar que 52% da turma conseguiram localizar o ponto de controle. Os demais solicitaram ajuda dos professores para posicionamento da folha/mapa.

    Na atividade da terceira semana os alunos foram conduzidos a sala de vídeo que foi solicitado uma atividade similar, porém deveriam marcar o ponto de controle em seus mapas e esconder um objeto no local sem que os colegas vissem, como nos exemplos abaixo.

Figura 3. Exemplos de mapas desenhados pelos alunos

    Durante a atividade descrita acima, três alunos não conseguiram localizar o ponto de controle. Limitaram-se a andar pela sala e observarem os colegas. Um outro aluno, por sua vez, aqui identificado como “C”, escondeu um objeto e quando o colega chegou ao ponto de controle marcado no mapa não achou nada. Dirigiu-se até a professora e perguntou:

Aluno LÉ isso aqui na parede, pro?

Professora: Deixe-me ver o mapa.

Professora: onde está marcado o “X”?

Aluno L – Aqui oh! (aponta para o local correto) Mas, não tem nada!

Professora: “C” você escondeu o objeto?

Aluno “C” – escondeu!

Professora: Onde está?

Aluno “C”Peguei tá aqui na mochila!

    Ao final da atividade foi possível constatar que os alunos, com exceção de três deles, conseguiram entender a proposta, contudo nem sempre o mapa era posicionado adequadamente.

Algumas considerações

    Atualmente, as pesquisas referentes à apropriação de conhecimentos e perpassam por uma visão diminuta de que isso só é possível por meio da maturação.

    Se considerarmos as diferenças econômicas e culturais, entenderemos que o desenvolvimento cognitivo e motor, ou seja, o desenvolvimento do homem em uma totalidade se diferencia de acordo com a cultura de inserção em que ele se coloca. Leontiev pontua que:

    Se um ser inteligente vindo de outro planeta visitasse a Terra e descrevesse as aptidões físicas mentais e estéticas, as qualidades morais e os traços de comportamento de homens pertencentes ás classes e camadas sociais diferentes ou habitando regiões e países diferentes dificilmente se admitiria tratar-se de representantes de uma mesma espécie (2004, p. 293).

    Nesse prisma, Vigotski (2001) atribui enorme importância ao papel da interação social no desenvolvimento do ser humano, repousando sua crítica sobre a idéia de que a criança contém todos os estágios do futuro desenvolvimento.

    Nesse caso, para o autor, a maturação biológica é fator secundário no desenvolvimento das formas complexas do comportamento humano, porque essas dependem da interação da criança com a cultura. Segundo o modo como se processa o seu desenvolvimento, as condições em que ela se faz podem ser formadas de maneira inadequada ou não se formar.

    Vigotski (1997) distingue ainda o defeito e a compensação, assinalando que qualquer defeito ante o organismo pressupõe a tarefa de superá-lo. Essa contradição possui um fator negativo e um positivo. O negativo refere-se à quebra da atividade e o positivo configura-se no estímulo de outras funções, de forma a impulsionar e estimular o organismo a uma atividade acentuada com vistas a compensar a insuficiência e, assim, superar as dificuldades.

    À luz dessas considerações está sendo possível verificar que quando oportunizadas a vivencias teóricas e práticas é possível que pessoas com deficiência intelectual se aproprie de conceitos científicos. Sem intenção de nos evidenciarmos pretensiosos, os primeiros resultados vem demonstrando que é possível, alguns em maior proporção, outros em menor, atuar nas funções psicológicas superiores, desafio esses que esperamos atingir e levar a efeito na fase subsequente desta pesquisa.

Nota

  1. Dependendo da obra consultada a grafia do nome do autor aparece escrito de várias formas. Para esse texto optamos pelo nome adotado na edição em português.

Referências

  • ARNONI, M. E. B.; OLIVEIRA, E. M.; ALMEIDA, J. L. V. Mediação Dialética na Educação Escolar: teoria e prática. São Paulo: Edições Loyola. 2007.

  • BARROCO, S. S. Psicologia histórico-cultural: contribuições para o encontro entre a subjetividade e a educação. Organizadoras Marisa Eugênia Melilo Meira, Marilda Gonçalves Dias Facci – São Paulo: Casa do Psicólogo R, 2007.

  • CAMPOS, L. A. S.; GONÇALVES, A. E.; LEAL, S. M. O. CARDEAL, C. M. Corrida de orientação: um desporto interdisciplinar por natureza. EFDeportes.com, Revista Digital – Buenos Aires – Año 15 – N° 149, Outubro de 2010. http://www.efdeportes.com/efd149/corrida-de-orientacao-um-desporto-interdisciplinar.htm

  • ESCOBAR, M. O.; BRACHT, V. Metodologia do ensino de educação física. São Paulo: Cortez, 1992.

  • GALLAHUE, DAVID L. et al. Compreendendo o desenvolvimento motor: bebês, crianças, adolescentes e adultos. Tradução Maria Aparecida da Silva Pereira Araújo. São Paulo: Phorte Editora, 2003.

  • LEONTIEV, A. O desenvolvimento do psiquismo humano. 2. ed. São Paulo: Centauro, 2004.

  • MENDES, E. G. Evolução histórica da concepção científica de deficiência mental. Departamento de Psicologia. Universidade Federal de São Carlos, 2006.

  • OLIVEIRA, F. S.; BARROSO, J. S.; COSTA JUNIOR, O. M. Corrida de orientação enquanto conteúdo da educação física escolar. EFDeportes.com, Revista Digital. Buenos Aires – Año 13 – N° 119, Abril de 2008. http://www.efdeportes.com/efd119/corrida-de-orientacion-conteudo-da-educacao-fisica-escolar.htm

  • PASINI, C. G. D., DANTAS, M. Disciplina de orientação e o currículo de educação física do ensino superior. Uma inclusão necessária. Resumo da dissertação de Mestrado em Educação pela Universidade Vale do Rio Verde de Três Corações, 2003.

  • SOARES, C. L. Educação Física: raízes européias e Brasil. Campinas, SP: Autores associados, 2004.

  • _______________. Imagens da educação no corpo: estudo a partir da ginástica francesa no século XIX. Campinas, SP: Autores Associados, 1998.

  • VIGOTSKI, L. S. A construção do Pensamento e da Linguagem. São Paulo: Martins Fontes, 2001.

  • _______________. Obras escogidas V – Fundamentos de defectologia. Madrid. Visor Dis., S. A., 1997.

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