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A compreensão do fenômeno bullying nas escolas, dentro
do processo de formação de professores nos cursos
de Licenciatura em Educação Física

La comprensión del fenómeno bullying en las escuelas, dentro del proceso
de formación de Profesores de la Licenciatura en Educación Física

The understanding of the phenomenon bullying in Schools, in the process
of formation of Physical Education Teachers

 

*Discente do Curso de Licenciatura em Educação Física

do Centro Universitário Moura Lacerda

** Profissional de Educação Física, pesquisador e docente

do Centro Universitário Moura Lacerda

Tatiana Rodrigues da Silva*

Prof. Dr. José Eduardo Costa de Oliveira**

prof.zedu@usp.br

(Brasil)

 

 

 

 

Resumo

          A violência escolar, mais especificamente aquela travestida de um fenômeno derivado de um desequilíbrio de poderes dentro do ambiente de aprendizagem da escola, denominado Bullying, sempre foi alvo de inquietações em todas as sociedades, no mundo todo e em todos os tempos (OLIVEIRA, 2012). Assim, partindo da intencionalidade de discutir e analisar como os alunos dos cursos de formação de professores em Educação Física veem a questão do Bullying nas escolas, enquanto um fenômeno que pode comprometer o seu trabalho docente, e, portanto, o processo ensino/aprendizagem; recorreu-se à abordagem qualitativa de André (1995) para se entrevistar 50 discentes de dois cursos de formação profissional, nos municípios de Ribeirão Preto e Jaboticabal, ambos pertencentes ao Estado de São Paulo, Brasil. Numa perspectiva de uma análise conclusiva, ficou evidente, com o término da pesquisa, que os aspirantes a Professores de Educação Física Escolar não estão totalmente familiarizados com esse importante e grave problema educacional, que acomete as crianças e jovens em idade escolar, justamente no momento de formação e consolidação de suas personalidades, a retraírem-se, ou aquilo que se contrapõe a isto - às explosões de fúrias e de violência - contra todo um ambiente escolar, que muitas vezes termina em agressões físicas sérias, oriundas de um sentimento que se construiu nas relações sociais na escola durante anos.

          Unitermos: Compreensão. Bullying. Escolas. Formação de professores. Licenciatura. Educação Física.

 

Resumen

          La violencia escolar, específicamente aquella deriva de un fenómeno derivado de un desequilibrio de poder dentro del ambiente de aprendizaje de la escuela, llamado bullying siempre ha sido objeto de preocupación en todas las sociedades de todo el mundo y en todo momento (OLIVEIRA, 2012). Así, sobre la base en la intención de debatir y analizar cómo los estudiantes de formación docente en Educación Física ven el problema del bullying en las escuelas, como un fenómeno que puede poner en peligro la enseñanza, por lo que el proceso de enseñanza-aprendizaje; apelaron al enfoque cualitativo de André (1995) para entrevistar a 50 estudiantes de dos cursos de formación profesional en los municipios de Ribeirão Preto y Jaboticabal, ambos pertenecientes al Estado de São Paulo, Brasil. Perspectiva de un análisis concluyente, era evidente, con el final de la investigación, los aspirantes a profesores de Educación Física no están totalmente familiarizados con este importante y grave problema educativo que afecta a niños y jóvenes en edad escolar, en el momento formación y consolidación de su personalidad, a retractarse de sí mismo, o que los que se oponen a este - los arrebatos de ira y violencia - en contra de un ambiente escolar en su totalidad, que a menudo termina en asalto físico serio, que surge de la sensación de que construido en las relaciones sociales en la escuela durante años.

          Palabras clave: Conocimiento. Bullying. Escuelas. Grado de formación docente. Educación Física.

 

Abstract

          School violence, specifically that travesty of a phenomenon derived from an imbalance of power within the learning environment of the school, called Bullying has always been the subject of concerns in all societies around the world and at all times (OLIVEIRA, 2012). Thus, based on the intention to discuss and analyze how students of teacher training in Physical Education sees the issue of bullying in schools, as a phenomenon that can compromise their teaching, and therefore the teaching / learning process; appealed to the qualitative approach of André (1995) to interview 50 students from two vocational courses in the municipalities of Ribeirão Preto and Jaboticabal, both belonging to the State of São Paulo, Brazil. Perspective of a conclusive analysis, it was evident, with the end of the research, the aspiring Physical Education Teachers are not fully familiar with this important and serious educational problem that affects children and young people of school age, just when formation and consolidation of their personalities, to retract itself, or that which is opposed to this - the outbursts of rage and violence - against an entire school environment, which often ends in serious physical assault, arising from a sense that constructed in social relations at school for years.

          Keywords: Understanding. Bullying. Schools. Teacher training. Physical Education.

 

 
EFDeportes.com, Revista Digital. Buenos Aires, Año 18, Nº 184, Septiembre de 2013. http://www.efdeportes.com/

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Introdução

    A violência escolar, mais especificamente aquela travestida de um fenômeno derivado de um desequilíbrio de poderes dentro do ambiente de aprendizagem da escola, denominado Bullying, sempre foi alvo de inquietações em todas as sociedades, no mundo todo e em todos os tempos (OLIVEIRA, 2012). Portanto, em razão de algumas características peculiares desse fenômeno, dentre elas, a capacidade desses comportamentos gerarem danos psíquicos e emocionais irreparáveis em suas vítimas, a Escola, enquanto instituição é uma entidade social que deve educar para a aquisição do conhecimento, assim como tem ou deveria ter em suas bases os valores éticos e morais, suficientes, para nortear os comportamentos dos indivíduos dentro de uma sociedade, principalmente aqueles tidos como inadequados.

    O termo Bullying (no Reino Unido) ou Mobbying (na Noruega e Dinamarca) ou Harcèlement Quotidieén (na França) ou Prepotenza (na Itália) ou Yjime (no Japão) ou Agressionen Unter Shülern (na Alemanha) ou Acoso y Amenaza entre Escolares (Espanha) e Maus-tratos entre Pares (em Portugal), são termos diretamente relacionados ao significado de “valentão”, “tirano”, com referência ao verbo “brutalizar” (FANTE, 2005).

    Bullying: um subconjunto de comportamentos agressivos, caracterizados pela sua natureza repetitiva e pelo desequilíbrio de poderes, geralmente dos pares no ambiente escolar, onde a vítima não consegue se defender, em razão de fatores como a diferença de estatura, força, maturidade, por pertencer a um grupo menor e/ou mais vulnerável perante os agressores (FANTE, 2005. p. 28).

    (...) os comportamentos envolvidos no Bullying são variados: palavras ofensivas, humilhação, difusão de boatos, fofoca, exposição ao ridículo, transformação em bode expiatório, acusações, isolamento, atribuição de tarefas pouco profissionais ou áreas indesejáveis no local de trabalho, ameaças, insultos, sexualização, ofensas raciais, étnicas ou de gênero (ABER, 2003. p. 109).

    Nesse sentido, portanto, é no cenário escolar que se visualiza uma grande quantidade de atos de violência, quer sejam eles simbólicos ou físicos, e que perpassam pela intimidação de professores, pelo desrespeito à diversidade, a depredação do patrimônio público e o privado, os furtos, o tráfico de drogas, o preconceito e etc. (DEBARBIEUX, 2003).

    Considerada uma das instituições responsáveis pela formação de cidadãos, conscientes de seus direitos e deveres em sociedade, capazes de respeitar e conviver com a pluralidade cultural, as escolas são, atualmente, verdadeiros palcos para o caos e a intolerância, onde a violência física e a psicológica permeiam todos os agentes envolvidos no processo ensino/aprendizagem no Brasil e no mundo, ao se observar uma violência que se faz presente na vida cotidiana e que ameaça, diariamente, a integridade física, psicológica e, principalmente, a dignidade humana.

    Para que se possa compreender este fenômeno, é preciso situá-lo num contexto social mais amplo, levando em consideração os condicionantes de grande parte da população brasileira, como a exclusão, por exemplo, onde é possível que a análise de tal aspecto possa levar, talvez, ao entendimento da violência como uma manifestação desta mesma civilização, que se rebela contra esse contexto da desigualdade social.

    Estes mesmo sentimentos (de intolerância) estão presentes no cotidiano escolar; observados no dia-a-dia de professores e alunos, nos mais diversos níveis de ensino, do público ao privado, do ensino fundamental ao universitário, e, inclusive, atingindo, também, a pós-graduação (ABER, 2003).

    Smith et al. (2002) concordam ao relatarem que o fenômeno da violência constitui, atualmente, um dos maiores obstáculos pedagógicos, nos diferentes níveis de ensino, por interferir diretamente no processo ensino-aprendizagem, evidenciando tanto as dificuldades dos professores em ensinar, quanto à dos alunos em aprender; assim como é um dos fatores mais evidentes do processo de exclusão social que a criança brasileira conhece desde seus primeiros anos de convivência em sociedade, fazendo a escola de hoje, uma das instituições que mais perpetua a discriminação e a intolerância.

    Segundo alguns especialistas em educação, quando se fala sobre as dificuldades em se esclarecer professores e demais agentes escolares acerca destes comportamentos inadequados, dentro do ambiente escolar, essa problemática esbarra em outra, também configurada entre os grandes entraves didático-pedagógicos da educação contemporânea: a formação de professores (OLIVEIRA, 2012).

    Bourdieu (1989) assevera que uma das formas de violência que deve ser amplamente discutida, não somente pelo fato de como ela se manifesta, mas por considerar suas diferentes categorias, tais como: a violência visual, a simbólica, a violência contra o patrimônio público e etc., quase sempre é antecedida ou justificada, prévia ou posteriormente, por uma violência conhecida como: simbólica.

    O próprio conceito de violência simbólica foi criado pelo referido pensador francês - Pierre Bourdieu - na tentativa de descrever o processo pelo qual a classe dominante, economicamente, impõe sua cultura aos dominados, partindo do princípio de que a cultura ou o sistema simbólico é arbitrário, uma vez que não se encaixam numa realidade dada como natural (OLWEUS, 2003).

Sendo que, este tipo de violência é exercida pelo poder da imposição das ideias, transmitidas da doutrinação política e religiosa, das práticas esportivas, da educação escolar, da vida cotidiana e das práticas policiais, entre outras. Define-se como formas da violência simbólica, por exemplo, e de acordo com Oliveira (2012):

  1. A violência surda – definida como as ameaças, xingamentos, humilhações e as zombarias, assim como o rejeitar, o não dar atenção, que poderiam ser ilustrados com os maus tratos, repetidos diariamente, durante toda infância de uma criança;

  2. A violência doméstica e a vitimização – definida como todo ato ou omissão praticado por pais, parentes ou responsáveis, contra a criança e/ou adolescente que, sendo capaz de causar dano físico, sexual e psicológico à vítima; o que resulta, de um lado, numa transgressão do dever de proteção do adulto e, de outro, numa coisificação da infância, ou seja: seria também uma negação do direito que as crianças e adolescentes têm de ser tratados como sujeitos e pessoas em condições peculiares de desenvolvimento;

  3. Negligência – também definida como uma violência, através de atos de omissão, nos quais os responsáveis não provêm adequadamente, no aspecto nutricional, os nutrientes essenciais para que o corpo e o psiquismo da criança e/ou adolescente se desenvolvam corretamente.

    Sendo que todas as três manifestações supracitadas fazem parte do convívio social que se desenrola no ambiente escolar, quer sejam eles atos cometidos pelos pares e/ou pelo próprio processo educacional que negligenciam, vitimizam e humilham os atores escolares.

    Especificamente no que diz respeito às agressões verbais, onde se incluem os casos de Bullying, que, para Olweus (2003), numa perspectiva histórica, esse fenômeno comportamental é tão antigo quanto à própria existência da escola, onde o referido pesquisador da Universidade de Bergen - Dan Olweus - Noruega, foi pioneiro em estudá-lo.

    Já no início dos anos 1970, ele investigou o problema dos agressores e suas vítimas na escola, embora somente na década de 1980, após três adolescentes, entre 10 e 14 anos de idade cometeram suicídio, aparentemente provocado por situações graves de Bullying, as instituições sociais europeias e mundiais passaram a demonstrar interesse pelo tema, sendo ele também o primeiro em desenvolver critérios para a detecção do problema, possibilitando que o mesmo fosse tratado de maneira específica, diferente de outros comportamentos inadequados no ambiente escolar (FANTE, 2005).

    A presença do fenômeno do Bullying é inegável em todas as escolas mundiais, podendo-se afirmar que - 100% delas - apresenta e/ou já apresentou, em algum momento, algum caso relacionado, independentemente de sua localização, clientela, turno, nível de ensino, tamanho e jurisdição (pública ou privada), sendo responsável pelo estabelecimento de um clima de medo e perplexidade no ambiente de aprendizagem, deixando educadores e demais agentes escolares impotentes perante os fatos (FANTE, 2005).

    Smith e Sharp (1994) em seus estudos na Inglaterra relatam que atos de violência nos espaços escolares possuem estreita ligação com as conotações emocionais, e, portanto, recebem outro termo para designá-los, como, por exemplo: a agressividade, as perturbações, o desengajamento, o desinteresse pela aprendizagem e os comportamentos antissociais.

    Em estudos na década de 80, os mesmos autores focalizaram estes comportamentos ou violências cometidas; os alunos envolvidos foram denominados como – Bullyies (termo em inglês sem tradução literal na língua portuguesa, que define o agente causador da ação do Bullying, mas que deriva da gíria britânica – bully – que significa – valentão).

    Os autores ainda definem que são quatro os fatores que contribuem para o desenvolvimento de um comportamento de Bullying:

    Primeiro – a atitude negativa dos pais ou de quem cuida de crianças ou adolescentes; segundo – uma atitude tolerante ou permissiva, quanto ao comportamento agressivo da criança ou do adolescente; terceiro – um estilo de paternidade que utiliza o poder e a violência para exercer controle sobre a criança e o adolescente, e, quarto – uma tendência natural da criança ou do adolescente a ser arrogante.

    Outro fato importante verificado pelo mesmo estudo de Smith e Sharp (1994) é que a maioria dos Bullyies são meninos, porém as meninas também o podem ser, principalmente quando se utilizam de métodos indiretos, como a “fofoca”, a manipulação de amigos, as mentiras e a exclusão de outros de um grupo social qualquer.

    Nesse sentido, o Bullying tem sido um problema inerente às escolas, podendo acometer interferências gravíssimas e de forma irreversíveis às pessoas sob sua influência, tolerada por décadas no ambiente escolar, mas que somente no final do século XX ganhou a atenção de pesquisadores e da sociedade brasileira.

    Assim, esta constatação acerca da tipicidade do Bullying no ambiente escolar torna possível afirmar que esta modalidade de violência representa-se como a de maior ocorrência, dentre as mais comuns manifestações de violência, quase que típica da cultura jovem.

    Retomando Olweus (2003), o autor nos relata que, em relação - as causas da ação do agressor - onde seus empreendimentos acabam por irradiarem-se coletivamente pelo(s) admirador (es) do (s) agressor (es), numa forma que o autor denomina de “aliciamento”, ou seja: as ações inadequadas são repetidas e ratificadas pelos pares. O poder desse agressor é exercido pela imposição de sua autoridade no ambiente escolar, que pode estar respaldada pela sua força física, tamanho ou idade, geralmente superiores a das vítimas, e, o que ainda é pior, muitas vezes torna-se um modelo de comportamento a ser seguido por outros alunos, que podem aderir ao grupo numa estratégia de autodefesa para não transformar-se, também, em vítima e/ou por uma questão de inclusão nos grupos sociais que se formam na adolescência. Aquilo que o autor chama de efeito bad boy: a criação de grupos que circulam pelo ambiente comum da escola e/ou no entorno delas, intimidando, depredando, agredindo e humilhando seus pares.

    Como causas para estes comportamentos, pode-se encontrar a carência afetiva dos alunos, em relação aos pais, a ausência de limites, o excesso de pátrio-poder sobre os filhos (autoritarismo), maus tratos físicos e/ou psicológicos e etc.

    No que tange às - vítimas - via de regra, esses, raramente se manifestam no sentido de pedir ajuda diante dos acontecimentos, por temerem denunciar os agressores e a situação se agravar, ou por uma questão de resiliência ou vergonha de uma maior exposição perante os pares.

    Fante (2005) delimita três tipos de vítimas:

    Primeiro, a vítima típica: aquela que sofre a agressão do Bullying podendo ser um indivíduo e/ou um grupo, geralmente pouco sociável ou com algum comportamento que difere da cultura escolar local, sofrendo comportamentos agressivos e contínuos de terceiros.

    Segundo, a vítima provocadora: aquela que, de alguma forma, explícita e/ou camuflada, provoca e atrai ações agressivas contra as quais não lida com eficiência. Típico dos alunos com hiperatividade, imaturos ou inseguros, sendo responsáveis pelos casos de tensões que se instauram no ambiente escolar, mesmo frente a pequenas situações.

    E, por fim, a vítima agressora: sendo aquela que produz os maus-tratos ou reproduz os maus-tratos que ela sofre de terceiros. Tendendo a buscar por indivíduos mais fracos (física ou psicologicamente) que ele, retificando ou ratificando sua autoridade, sua autoestima ou a sua dominação.

    Existem também as consequências do Bullying, que afetam não só as vítimas, mas os familiares e as relações que se estabelecem nesse ambiente, bem como no trabalho, resultando em queda de rendimento e deficiências no desenvolvimento social e emocional, além dos prejuízos para a saúde física e mental dos vitimizados. Em casos extremos, existe a possibilidade eminente do suicídio, frente à continuidade das agressões.

    Dentre algumas consequências fisiológicas estão algumas psicossomáticas, tais como a enurese, a sudorese, taquicardias, insônia, cefaleias, dores epigástricas, bloqueios de raciocínio, ansiedade, estresse, depressão, pensamentos mórbidos, sentimento de vingança, agressividade, impulsividade, hiperatividade e, como uma das piores consequências: o uso e a dependência de substâncias químicas, tais como medicamentos, álcool ou drogas.

    Especificamente na infância, Fante (2005) relata que se pode verificar casos de explosões de cólera, episódios transitórios de paranoia ou psicose conhecidas como Borderline Personality Disorder (Transtornos de Personalidade Limítrofe), provocando alterações no sistema límbico dos envolvidos, comprometendo a regulação da emoção e da memória pelo hipocampo e pala amídala, localizada abaixo do córtex, no lobo temporal.

    Ainda de acordo com os estudos de Olweus (2003), o autor também observou um grupo de adolescentes entre 13 e 16 anos de idade, vítimas de Bullying, e concluiu que havia a possibilidade de um grande percentual desses (54%) tornarem-se depressivos aos 23 anos de idade, em função da perda da autoestima.

    Trata-se, portanto, de um fenômeno comportamental, presente não só nas escolas, mas em toda a sociedade brasileira, comum em um país que parece ser o único em todo o mundo que aceita essa cultura com tanta naturalidade, e que pode ser a gênese de vários outros transtornos de personalidade, que acomete crianças e adolescentes, desde os seus primeiros anos de escolaridade; o que justifica, portanto, a necessidade de que trabalhos de investigação científica, como este, direcionem seus olhares a este importante fenômeno comportamental, que gera intimidação e constrangimento, como é o caso do Bullying.

Objetivos

    Assim, a presente investigação partiu da intencionalidade de discutir e analisar como os alunos dos cursos de formação de Professores de Educação Física veem a problemática do Bullying nas escolas, enquanto um fenômeno que pode comprometer o seu trabalho docente, e, portanto, o processo ensino/aprendizagem, e: Compreender, melhor, esse importante fenômeno comportamental do ambiente escolar contemporâneo.

Materiais e métodos

    Método: na presente proposta de pesquisa, recorreu-se à abordagem qualitativa de André (1995), para o delineamento do estudo, baseando-se no interesse em analisar e compreender o fenômeno do Bullying, não vinculado apenas a dados estatísticos e quantitativos, pois, segundo Minayo; Deslandes e Gomes (2007), essa abordagem visa uma maior proximidade do pesquisador para com a realidade que se quer conhecer, investigar e analisar, sendo ela capaz de aprofundar a complexidade de fenômenos, fatos, processos específicos de grupos, mais ou menos delimitados em extensão, e capazes de serem atingidos de forma mais intensa, sendo aquela capaz de incorporar a questão do significado e da intenção, como inerentes aos atos, relações e às estruturas sociais, visando à transformação e a construção humana, significativas.

    Este estudo configurou-se, também, como pesquisa estratégica, possibilitando entender à realidade e adequá-la aos objetivos propostos, pois, esta modalidade baseia-se em teorias oriundas das ciências sociais, tendo como finalidade principal lançar luz sobre determinados aspectos de uma realidade, utilizando-se de instrumentos básicos de qualquer pesquisa, tanto no que diz respeito aos aspectos teóricos, como os metodológicos, porém, almejando a ação como finalidade primária, e, portanto, adequada segundo ponto de vista do autor do presente trabalho. (ANDRÉ, 1995).

    Procedimentos de Pesquisa: visando potencializar as chances de alcançar os resultados esperados, alguns procedimentos foram utilizados, sendo eles: a) a documentação indireta (pesquisa bibliográfica); b) a documentação direta (entrevista formal), pois o estudo qualitativo prevê maior flexibilização, capacidade de reflexão e de interação do pesquisador com os sujeitos, direcionando o processo de comunicação entre os pares, estabelecendo estratégias e procedimentos que permitem considerar as experiências do ponto de vista do informador (ANDRÉ, 1995).

    No caso da pesquisa bibliográfica, ela foi realizada em livros, textos, periódicos especializados em educação e saúde pública, artigos científicos, monografias, dissertações de mestrado, teses de doutorado, anais de congressos, simpósios, conferências e de materiais (eletrônicos) coletados pela Internet, de onde foram extraídos os conteúdos, sintetizados, prevalecendo às opiniões dos autores. Segundo Minayo (2006), é neste tipo de abordagem, desenvolvida com base em material já elaborado, que permite ao investigador a cobertura de uma gama de fenômenos muito mais ampla do que aquela que poderia se pesquisar diretamente, particularmente quando o problema de pesquisa requer dados muito dispersos pelo espaço.

    As entrevistas: as questões da mesma foram elaboradas de forma semiestruturada, previamente agendadas com os atores sociais; posteriormente foram gravadas e transcritas, compostas por um conjunto de perguntas destinadas a conhecer e analisar como os futuros professores de Educação Física, formados nos cursos de Licenciatura, conhecem e/ou estão prontos a lidarem com a problemática do Bullying. Para Minayo; Deslandes e Gomes (2007), a entrevista perfaz uma das estratégias mais utilizadas dentro dos processos de pesquisa de campo, sendo ela, sobretudo, uma conversa a dois, e/ou entre vários interlocutores, sempre realizada por iniciativa do próprio pesquisador, que por sua vez, deve ter por finalidade levantar informações pertinentes para um determinado objeto de pesquisa. No caso específico da modalidade conhecida como - semiestruturada - os mesmos autores asseveram ser nesta modalidade aquela que combina, concomitantemente, perguntas fechadas e perguntas abertas, sendo que o entrevistado, por sua vez, tem a possibilidade de discorrer e argumentar sobre o próprio tema, sem que necessariamente tenha que se prender apenas às questões que foram formuladas. Assim, foram elaboradas um total de seis questões, que podem ser apreciadas no roteiro das entrevistas, a seguir:

  • Questão 1: como futuro Professor de Educação Física Escolar, você conhece a problemática do Bullying nas escolas?

  • Questão 2: o que é o Bullying?

  • Questão 3: quais as formas mais típicas de manifestações de Bullying nas escolas?

  • Questão 4: você se acha preparado para lidar com o Bullying no ambiente de aprendizagem da escola?

  • Questão 5: como o Bullying pode inferir negativamente no seu trabalho docente e no processo de aprendizagem dos discentes?

  • Questão 6: em sua opinião, qual seria uma estratégia (sua, da Educação Física ou da coletividade da escola) para o enfrentamento do Bullying no ambiente escolar?

    Os Sujeitos de Pesquisa: segundo Bardin (1977) e Minayo; Deslandes e Gomes (2007), a definição amostral em uma pesquisa qualitativa não se encontra vinculada à representatividade numérica, ou seja, neste tipo de abordagem metodológica preconiza-se a amostra capaz de indicar as irregularidades presentes nos enunciados, quer fossem eles escritos, falados ou observados, assim como que pudesse apontar suas peculiaridades, direcionando a atenção diretamente para o aprofundamento da compreensão do problema de pesquisa, e não com a generalização.

    Considerando-se o fato de o cenário das Instituições de Ensino Superior, formadoras dos profissionais que atuarão no ambiente de aprendizagem da escola, e, portanto, diretamente com o fenômeno do Bullying, o recorte foi composto por 50 (cinquenta) alunos de graduação, dos cursos de Licenciatura em Educação Física dos municípios de Ribeirão Preto e Jaboticabal (São Paulo, Brasil), escolhidos aleatoriamente dentro dos 8 (oito) semestres (períodos) que compõe a formação profissional em questão, bem como pelo fato de se acreditar que eles poderão tornar-se importantes agentes, nos processos de enfrentamento e minimização da problemática, após seus ingressos no mercado de trabalho escolar.

    A Análise de Dados: para a realização da análise dos dados encontrados utilizou-se a técnica de Análise de Conteúdo, modalidade de Análise Temática, que de acordo com Bardin (1977) é fundamentada no tema, o qual pode ser representado graficamente através da palavra, frase e resumo, além do fato de se definir tema como a unidade de significação que se liberta naturalmente de um texto analisado, segundo certos critérios relativos à teoria e que serviu de guia à leitura. A Análise Temática de um determinado texto resume-se em descobrir os núcleos de sentidos que fazem parte da comunicação, estuda a tendência, valores, opiniões, atitudes cuja presença tem alguma representação para o objeto definido (MINAYO, 2006). Para Minayo, Deslandes e Gomes (2007), a análise de conteúdo também é aquela que perfaz um conjunto de técnicas de análise de comunicações, que objetiva através de procedimentos sistemáticos, descrever o conteúdo das mensagens, dos indicadores, quer sejam eles qualitativos e/ou quantitativos, permitindo a inferência de conhecimentos, que sejam relativos às condições de produção e recepção destas mesmas mensagens, podendo ser subdividida de várias maneiras, sendo elas:

    Primeiro, a análise de avaliação ou representacional, que se presta a medir as atitudes do próprio locutor, quanto aos objetos de que fala, considerando-se a que linguagem representa e reflete quem a utiliza. Segundo, a análise de expressão, que trabalha com indicadores que visem à inferência formal; e numa terceira, a análise de anunciação, que por sua vez costuma ser utilizada para se analisar entrevistas com características abertas, trabalhando com as condições de produção da palavra, como a análise das estruturas gramaticais, a lógica da organização dos discursos; além da análise das figuras de retórica, e, por fim, a análise temática, que consiste no conceito central do tema, objetivando descobrir os núcleos do sentido que compõe a comunicação e cuja presença, assim como sua frequência de aparição, pode significar algo para o objetivo analítico eleito pelo pesquisador (MINAYO; DESLANDES e GOMES, 2007).

    Procedimentos Éticos para a Realização da Pesquisa: a investigação foi norteada pelos procedimentos estabelecidos pelas recomendações da resolução 196/96 do Conselho Nacional de Saúde. Em relação aos sujeitos de pesquisa, foi utilizado um TCLE – Termos de Consentimento Livre e Esclarecido, alertando-os de todas as bases que norteavam a investigação, assim como da importância e dos riscos da participação de cada um, onde, uma via ficou em posse do pesquisador, e outra em poder dos sujeitos do estudo.

    Este estudo fez parte do PIC (Programa de Iniciação Científica), do setor de Pós-graduação do Centro Universitário Moura Lacerda, do ano letivo de 2013; onde o mesmo foi contemplado como uma bolsa de estudos institucional para o desenvolvimento da presente pesquisa.

Análise de dados

    Analisando as falas dos entrevistados, depreendeu-se que, em relação à questão dos sujeitos de pesquisa serem indagados sobre terem conhecimento da problemática do Bullying nas escolas; a totalidade dos entrevistados respondeu que tem ciência da ocorrência desse fenômeno comportamental no ambiente escolar, mas, imediatamente ao serem questionados a definirem o fenômeno, na questão subsequente, muitos demonstraram certa dificuldade de entendimento desses comportamentos, fazendo menção, apenas, aos casos mais evidentes, como a coerção direta de alguns alunos mais fortes, emocionalmente e fisicamente que outros, esquecendo-se e/ou mostrando certo espanto quando o entrevistador, durante as conversas informais que balizaram as entrevistas, que os casos de Bullying também perfaziam os comportamentos de intolerância, de segregação, da designação de apelidos, da chacota, dos olhares de negatividade, as diferentes formas de humilhações, das zombarias e das rejeições nos grupos sociais, bem como dos demais comportamentos que podem acometer vítimas a prejuízos irreversíveis na autoestima, bem como desencadeando outros comportamentos de violência por parte dos das vitimados e/ou dos agressores.

    Na própria questão 3, as análises das falas também demonstraram que os sujeitos de pesquisa evidenciaram três manifestações de Bullying, que na opinião deles, perfaziam as mais frequentes no ambiente escolar, sendo elas: os xingamentos nos momentos de coletividade e como maneira de subjugar outros; a coerção dos mais velhos aos mais jovens, particularmente em horários de filas de cantinas, sanitários e nas aulas de Educação Física; e a colocação de apelidos depreciativos.

    No entanto, apesar destas dificuldades iniciais, suscitadas pelas três primeiras questões das entrevistas, a grande maioria dos sujeitos de pesquisa não hesitou em relatar que se sentem preparados para o enfrentamento do Bullying no ambiente escolar, quando ingressarem no mercado de trabalho.

    E, por fim, depreendeu-se das análises que os entrevistados têm consciência dos riscos que o fenômeno Bullying pode desencadear nos seus trabalhos pedagógicos, comprometendo também, a aprendizagem dos alunos sob sua tutela, caso ações de enfrentamento não seja empreendidas para a amenização desses aspectos. No entanto, nenhum deles soube relatar algum tipo de estratégia didático-pedagógica, quer fosse empreendida pessoalmente, pela área de conhecimento da Educação Física, ou pela coletividade escolar, que pudesse evitar ou minimizar os comportamentos de Bullying no ambiente escolar.

Conclusões

    Na perspectiva de uma análise conclusiva, ficou evidente, com o término da pesquisa, que os aspirantes a Professores de Educação Física Escolar não estão totalmente familiarizados com esse importante e grave problema educacional, que acomete as crianças e jovens em idade escolar, justamente no momento de formação e consolidação de suas personalidades, a retraírem-se, ou aquilo que se contrapõe a isto - às explosões de fúrias e de violência - contra todo um ambiente escolar, que muitas vezes termina em agressões físicas sérias, oriundas de um sentimento que se construiu nas relações sociais na escola durante anos.

    Talvez, a culpa não possa recair, apenas, nesses futuros profissionais, pois, o que parece é que os cursos de formação profissional, particularmente na área de conhecimento em Educação Física, mas, quiçá, também em outras áreas da licenciatura e da pedagogia, e que compõe as grades do ensino básico brasileiro, onde atemática parece não fazer parte dos currículos de formação profissional, relegando os professores a agirem com base em suas intuições, sem respaldo técnico-científico para enfrentamento dessa difícil realidade das escolas brasileiras e mundiais.

    Pois, não só o Bullying, mas também a violência escolar de maneira geral, que está enraizada na cultura escolar, comprometendo o trabalho docente e, consequentemente, o processo ensino-aprendizagem, e que esbarra, claramente, na falta de preparo profissional para lidar com esses comportamentos indesejados no ambiente de aprendizagem da escola.

    Por fim, que esse trabalho possa instigar outros pesquisadores a investigarem e a discorrerem, com ainda mais minúcias, o problema da formação profissional de outras áreas da licenciatura, para que se possa enfrentar a violência escolar com as ferramentas pedagógicas apropriadas, devolvendo à escola, a imagem de um ambiente saudável e seguro aos filhos da sociedade.

Bibliografias

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EFDeportes.com, Revista Digital · Año 18 · N° 184 | Buenos Aires, Septiembre de 2013
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