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O ensino da Educação Física na Educação de Jovens e Adultos

La enseñanza de la Educación Física en la Educación de Jóvenes y Adultos

 

*Graduada pela Universidade Luterana do Brasil. ULBRA, Canoas RS

**Mestre pela Universidade Federal do Rio Grande do Sul

Docente da Universidade Luterana do Brasil. Orientadora do Estágio IV

(Brasil)

Joice Mari Ferreira da Cruz*

Paula Andreatta Maduro**

joiceaqui@hotmail.com

 

 

 

 

Resumo

          O presente trabalho aborda a prática pedagógica obrigatória de Estágio em Educação Física IV, realizada na Escola Municipal de Ensino Fundamental Rio de Janeiro, com quatro turmas de Educação de Jovens e Adultos, EJA, na cidade de Canoas, Rio Grande do Sul, no segundo semestre de 2012. O objetivo geral do trabalho foi estimular nas aulas de Educação Física, nos alunos da EJA, o interesse pela prática regular de atividade física. A fim de atingir os objetivos satisfatoriamente foram realizados discussões e debates acerca de nossas habilidades motoras básicas, aulas práticas e vivências corporais variadas, noções de nutrição e as atividades mais adequadas ao estilo de vida de cada um, além disso, foram realizadas dinâmicas e aulas expositivas, bem como pesquisas na internet e palestras participativas, onde os alunos interagiram e trocaram suas experiências. Ao longo das aulas pude observar o despertar do interesse pela busca da atividade física em muitos alunos, que atentamente participaram das aulas, questionaram e contribuíram com suas experiências e pontos de vista, estimulando muitas vezes outros colegas que ficaram curiosos com as colocações que foram surgindo. Acredito ser papel do profissional que trabalha com a cultura corporal do movimento fazer da Educação Física uma disciplina procurada e essencial em turmas de EJA, na qual muitas vezes são os únicos momentos em que o indivíduo terá contato com as práticas corporais e poderá refletir sobre seu corpo e sua saúde para obter uma melhor qualidade de vida.

          Unitermos: Prática pedagógica. Educação Física. Educação de Jovens e Adultos.

 

Prática Pedagógica submetida como requisito para conclusão da disciplina de Estágio IV do curso de Licenciatura em Educação Física na Universidade Luterana do Brasil em 2012/2.

 

 
EFDeportes.com, Revista Digital. Buenos Aires - Año 18 - Nº 180 - Mayo de 2013. http://www.efdeportes.com/

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Introdução

    A escola de hoje possui grande desafio, pois vem sendo frequentada por grupos sociais e culturais distintos, cada qual com suas particularidades e necessidades. Garantir o convívio, estimular a curiosidade e ainda selecionar na sociedade itens que possam garantir melhor qualidade de vida aos estudantes, se trabalhados em sala de aula, tornam-se tarefas cada vez mais importantes para que a educação faça sentido.

    A Educação Física nas turmas de Jovens e Adultos pode possibilitar a inserção social do aluno, possibilidades de exercício da cidadania e melhoria da qualidade de vida, pois a disciplina proporciona o contato com a cultura corporal de movimento, promovendo a saúde, melhor gestão do tempo de lazer e diferentes formas de expressar afetos e sentimentos.

    O presente trabalho aborda a prática pedagógica obrigatória do Estágio em Educação Física IV, da Universidade Luterana do Brasil, realizada na Escola Municipal de Ensino Fundamental Rio de Janeiro, com quatro turmas da EJA, Educação de Jovens e Adultos, no segundo semestre de 2012. A instituição localiza-se na cidade de Canoas, RS e atende crianças, adolescentes e adultos do bairro Mathias Velho, nos turnos diurno e noturno.

    Melhora da auto-estima, confiança, possibilidades de análise crítica dos valores sociais, como padrões de beleza, saúde, desempenho e competição exacerbada foram oferecidos através da disciplina de Educação Física, pois ela desperta nos educandos o prazer e a satisfação advindos da prática da atividade física e o conhecimento sobre a importância dos conteúdos para a saúde.

    Inicialmente foram realizadas observações dos alunos e reuniões com a professora de Educação Física da escola a fim de serem definidos conteúdos a serem trabalhados, procurando atender as necessidades das turmas. Após a construção dos objetivos e a fim de atingi-los satisfatoriamente foram realizados jogos de desenvolvimento do movimento e de expressão corporal, atividades de estimulação das competências verbais e não-verbais, dinâmicas, vídeos, aulas expositivas sobre assuntos elencados pelos alunos, assim como jogos pré-desportivos e adaptados na área do Esporte.

    Silvino Santin, Cíntia Assis, Vicente Molina e os Cadernos de orientação do Ministério da Educação para a Educação de Jovens e Adultos, foram algumas das bibliografias utilizadas na fundamentação teórica deste trabalho, colaborando para melhor compreensão das necessidades dos alunos jovens e adultos no âmbito da Educação Física.

    Através deste trabalho foi possível perceber a importância da Educação Física, principalmente em turmas de EJA, onde a prática de atividade física nem sempre ocorre fora do ambiente escolar. Constatamos que é preciso que os profissionais na escola instiguem nos educandos o prazer pelo exercício, que ocorre através de práticas corporais que tenham sentido para os indivíduos, onde suas dúvidas, necessidades e curiosidades, dentro da cultura corporal do movimento, sejam ouvidas, respeitadas e discutidas afim de que possam construir conhecimentos que os auxiliem na busca pela autonomia dentro e fora da escola.

Diagnóstico da EMEF Rio de Janeiro

    A Escola Municipal de Ensino Fundamental Rio de Janeiro situa-se no bairro Mathias Velho na cidade de Canoas – RS, à Rua Rio de Janeiro, nº 360. Atende em média 1200 alunos nos três turnos, sendo 200 na Educação de Jovens e Adultos (EJA), tem uma boa estrutura física e materiais adequados para aulas de Educação Física. Conta com campo de futebol, quadra e ginásio coberto, além de laboratório de ciências, sala de informática, biblioteca, quatorze salas de aula, que são todas utilizadas durante os turnos da manhã e também a tarde. O quadro de pessoal é composto por cinquenta e dois professores, sendo cinco para a disciplina de Educação Física e quatorze funcionários.

    Para atender os alunos em seu todo e respeitando as suas individualidades a instituição está implantando gradativamente o Ensino Fundamental de nove anos nos turnos da manhã e tarde. Em seu Projeto Político Pedagógico tem como filosofia oportunizar condições para o pleno desenvolvimento do aluno levando-o à conscientização de suas potencialidades e limitações tornando-se um cidadão crítico, responsável, participativo, livre e integrado à filosofia democrática da realidade comunitária em que vive.

    Os ambientes da escola são todos bem organizados e extremamente limpos e bem conservados, percebe-se que os alunos, ao menos os estudantes da EJA contribuem para manter os espaços desta forma. Além disso, os funcionários de maneira geral são muito dedicados, se mostrando prestativos e bem dispostos, o que nem sempre é comum em escolas públicas.

    Percebi que há um bom relacionamento entre os professores e demais funcionários da escola e também com os estagiários e bolsistas, que no semestre de 2012-2, no turno da noite, foram quatro, uma estagiária da pedagogia séries iniciais, uma estagiária de supervisão pedagógica e uma acadêmica do curso de Química da ULBRA, bolsista do PIBID (Programa Institucional de Bolsas de Iniciação a Docência) e uma de Educação Física.

    Durante a convivência nos horários de intervalo na sala dos professores e também nas observações realizadas nas turmas, conversei com alguns professores, alunos e também com as estagiárias e pude observar que todos se preocupavam com a qualidade da aprendizagem dos estudantes. Notei que os docentes trocavam informação sobre o desenvolvimento das turmas e também de cada discente, individualmente. O desenvolvimento da aprendizagem e mesmo da disciplina e respeito ocorre em conjunto, pois até o guarda que fica na portaria mantém uma postura de referência para os estudantes. Quando chegam alunos atrasados, por exemplo, ele relembra as regras da escola e conversa pacientemente com os estudantes e só então chama a supervisora pedagógica.

    Os alunos chegam na escola as 18h e 45 minutos, pois antes da aula, que inicia as 19h, recebem janta, porém muitos não jantam e chegam só depois. Os atrasos devem ser justificados junto a supervisão pedagógica, caso contrário não é permitida a entrada na escola.

    Desde meu primeiro contato percebi que a escola tinha interesse em acolher os estagiários, solicitando o preenchimento da documetação necessária para iniciar o estágio obrigatório.

    A professora de Educação Física da noite é formada há 23 anos pelo Instituto Porto Alegre e trabalha há aproximadamente 20 anos na educação, além da disciplina também exerce o cargo de vice-diretora da escola. Constatei durante nossas conversas que a professora tinha muito claro os objetivos com os alunos da EJA, além de muito material coletado sobre diversos temas envolvendo a saúde e o cuidado com o corpo. Entretanto, não realizava aulas práticas, pois conforme ela os períodos eram muito curtos, perdia-se muito tempo com o deslocamento, e também porque ocorriam diversos conflitos entre alunos quando estavam em ambiente mais “descontraído”.

    Antes de iniciar as observações nas turmas conversei com a professora de Educação Físiaca para saber como seriam realizadas as aulas e o que ela gostaria que fosse trabalhado, então decidimos que além de aulas teóricas sobre alguns temas, as turmas também fariam práticas, durante os 45 minutos de aula, além disso o respeito e a convivência seriam temas sempre presentes nas aulas, pois conforme o relato da professora, quando saem da sala para aulas práticas, não conseguem se entender.

    A Educação de Jovens e Adultos é organizada por segmentos e conforme a demanda de estudantes são formadas as turmas, neste semestre existem duas turmas no segmento 1, que são as turmas de alfabetização e pós alfabetização, que equivalem aos anos iniciais do ensino fundamental, e quatro turmas no segmento 2, que são chamadas de Totalidades, os ciclos sao completados em um semestre. A Totalidade 1 equivale à 5ª série do ensino fundamental da modalidade antiga, e também as Totalidades 2A, 2B e 2C que equivalem a 6ª a 8ª séries cada uma.

    O estágio foi realizado nas quatro turmas do segmento 2, compreendendo a Totalidade 1, Totalidade 2A, 2B e 2C.

Diagnóstico das turmas

    Foi possível observar durante uma semana um período na disciplina de Educação Física em cada turma, na outra semana observei aulas de outras disciplinas, apenas para perceber o relacionamento entre os estudantes, pois não teve aula de Educação Física devido a compromissos da professora com tarefas relacionadas com o cargo de direção que ela também exerce.

    Inicialmente estive na Totalidade um que equivale a 5ª série, a turma é composta por 36 alunos, sendo 14 homens e 21 mulheres, presentes na aula estavam 5 homens e 19 mulheres. A maioria da turma é composta por pessoas acima de 40 anos que retornaram aos estudos depois de muitos anos fora da escola, notei que são muito atentos e participativos, trazem para as aulas situações do cotidiano que ilustram os conteúdos, achei fantástico. Nas duas semanas em que estive presente nas aulas notei que os alunos que estavam em uma semana, não estavam na outra e segundo os professores, as faltas são uma característica marcante da EJA.

    Já nas turmas de Totalidade 2 (turmas A,B e C) a maioria dos alunos são adolescentes e/ou adultos jovens que estudavam durante o dia e passaram para o noturno por motivos de trabalho ou que retornaram para a escola depois de situações de repetência e evasão, poucos são os que estavam fora da escola por muito tempo.

    Na Totalidade 2A estão matriculados 37 alunos no total, porém a média de freqüência é de 15 a 18 alunos, durante as observações nesta turma percebi que tanto na disciplina de Educação Física como nas aulas de Português e História, os alunos conversavam muito e os professores pediam muitas vezes para que ouvissem e prestassem atenção nas explicações e/ou nas discussões que ocorriam durante a aula.

    Na Totalidade 2B de 36 alunos matriculados estavam presentes nas aulas de observação apenas 15 alunos em uma semana e na outra semana 13, notei que conversavam sobre namoros, festa e trabalho, alguns ouviam música no celular, era preciso que a professora pedisse para guardar assim que entrasse, pois senão continuavam despreocupados. Durante a aula de Educação Física foi lido pela professora um quadro com as proteínas e os produtos onde podem ser encontradas, não percebi interação dos alunos durante a aula, apenas um ou outro se expressava sobre o conteúdo.

    Na Totalidade 2C existem 39 alunos matriculados, com freqüência boa segundo os professores, pois normalmente comparecem entre 20 e 25 alunos. Nesta turma também não percebi muita interação em relação aos conteúdos, porém conversavam sobre outros assuntos durante a aula e saíam para banheiro e água com bastante freqüência.

    Nas três turmas da totalidade 2 foi possível verificar muita conversa e pouca atenção em aula, já na totalidade 1, ao menos nas aulas em que observei percebi o contrário, pois as conversas ocorriam devido as discussão suscitadas pelos conteúdos e estimuladas pelo professor. Outro fato marcante e observado nas quatro turmas é de que os alunos conversam e interagem apenas com o colega ao lado e/ou mais próximo e muitas vezes não sabem nem como se chamam os outros colegas.

    Durante atividade que realizei em meu primeiro dia de atuação, depois de conversarmos sobre como seriam nossas aulas e depois de participarmos de dinâmica de apresentação, solicitei que escrevessem ao final da aula as expectativas de aprendizagens para o final do semestre e me entregassem, pedi que relatassem o que gostariam de aprender, como gostariam de estar no final deste ano em relação às aulas de Educação Física, e em muitos relatos li que gostariam de ser mais desinibidos e também que gostariam de conhecer todos os colegas e assim “ter mais amigos”.

    Diante do observado e conversado com os estudantes acredito ser papel da disciplina de Educação Física promover a socialização dos alunos, além de atividades onde possam melhorar o relacionamento consigo mesmo, e com isso facilitar o convívio com os outros.

    Serão realizadas 2 aulas por semana em cada turma, nas quatro turmas do segmento 2 da EJA, que foram iniciadas no dia 29 de agosto de 2012, com previsão de conclusão para o dia 21 de novembro do mesmo ano.

Referencial teórico

    Conforme o caderno elaborado para a Educação de Jovens e Adultos no País (2006), valorizar e respeitar a diversidade da população, garantindo políticas públicas como instrumento da cidadania e de contribuição para redução das desigualdades sociais foram os objetivos do Ministério da Educação ao criar, em 2004, a Secretaria de Educação Continuada, Alfabetização e Diversidade (SECAD), que através do departamento de Educação de Jovens e Adultos vem contribuindo para a conclusão da Educação Básica de pessoas que não tiveram acesso na idade adequada.

    A Educação de Jovens e Adultos, EJA, prevista na Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (LDB, Lei nº 9394/96) e na Constituição Brasileira de 1988 é obrigatória pelos três poderes públicos no nível de conclusão do Ensino Fundamental para maiores de 15 anos e no nível de conclusão do Ensino médio para maiores de 18 anos.

    Ricos em experiências de vida, os alunos da EJA chegam à escola com valores e crenças já constituídos, origens, idades, vivências profissionais, históricos escolares, ritmos de aprendizagens e estrutura de pensamento completamente diferente. Pessoas com responsabilidades sociais e familiares diversas, inseridos no mundo do trabalho e que pautam seus valores éticos e morais a partir das experiências vivenciadas.

    Segundo pesquisa realizada pela revista Nova Escola (2011) a presença de adolescentes na Educação de Jovens e Adultos no Ensino Fundamental é alarmante, pois quase 20% dos matriculados possuíam entre 15 e 17 anos entre o período de 2004 e 2010. A pesquisa mostra os diversos motivos que levam os jovens a freqüentar esta modalidade em vez de estar na educação básica regular, dentre as causas estão a vulnerabilidade, o trabalho, a gravidez precoce, a reprovação e desmotivação, e com isso a evasão, a distância de casa da escola e também por decisão da gestão escolar, que muitas vezes empurra casos considerados problemáticos para as turmas de EJA.

    De acordo com SCHEIBEL e LEHENBAUER (2008) parece ser cada vez mais importante verificar o quanto o jovem e o adulto precisam descobrir-se como a peça fundamental de sua história, como um ser social que se relaciona com o meio a fim de atingir plena autonomia. E a escola é um espaço importante, e que pode auxiliar na formação de cidadãos conscientes de si próprios e do contexto em que estão inseridos, pois segundo as autoras, nos jovens e adultos toda experiência que tenha sido um fracasso gera uma auto-imagem negativa, levando-os a timidez, insegurança e muitos bloqueios.

    Possibilidades de inserção social, exercícios da cidadania e melhoria da qualidade de vida são encontradas através da inclusão da Educação Física na EJA, pois a disciplina representa o contato com a cultura corporal de movimento aos alunos, promovendo a saúde, formas criativas de utilizar o tempo de lazer e expressar afetos e sentimentos nos mais diversos contextos de convivência.

    Conforme a Secretaria de Educação Continuada, Alfabetização e Diversidade, SECAD (2006) em seu volume 3, é importante lembrar que na maioria das vezes os alunos de EJA já possuem uma opinião formada sobre a Educação Física pautada em suas experiências anteriores, que muitas vezes os fazem rejeitar a disciplina, e transformar estas opiniões torna-se em enorme desafio para os professore da EJA.

    Sob o enfoque de SANTIN (2003) a Educação Física nem sempre foi considerada importante, nem mesmo por alguns de seus profissionais, pois não é posta como real educação humana, e é vista muitas vezes apenas como suporte para atividades esportivas, nas palavras do autor:

    “É interessante observar que a Educação Física é a única que conseguiu criar leis para que certos alunos fossem dispensados, alegando razões que, olhadas com atenção, mostram que exatamente esses dispensados são os que mais necessitam da atenção do educador. Mas como, para alguns, Educação Física é sinônimo de determinado perfil físico e de desempenhos atléticos, parece ser normal a dispensa. Note-se ainda que em nenhum curso alguém é dispensado da História, da Gramática, da Matemática ou Línguas porque tem problemas de aprendizagem.” (SANTIN, 2003, p. 81)

    Sob a concepção de Araújo (2008) a LDB dificultou a inserção da Educação Física nos cursos supletivos, pois estabelece a disciplina como facultativa nos cursos noturnos, deixando a critério dos discentes a opção de assistir e participar das aulas. O que gera ainda mais distanciamento dos alunos com a cultura corporal de movimento, pois as aulas de Educação Física passam a ser representadas por aulas de tempo livre, de entregar a bola, de conversar sobre assuntos extra-escolares, do lazer ou mesmo o tapa buraco de outras disciplinas.

    Segundo escreve Hanauer (2009) em reportagem para a Nova Escola, é nas aulas de Educação Física que os alunos convivem de perto com a realidade social, pois é através do contato com os colegas em quadra, ou mesmo na sala de aula que eles aprenderão a respeitar diferentes opiniões e a vencer seus próprios limites como medo, a vergonha e a timidez, conhecendo melhor a si mesmos e às pessoas com quem convivem.

    O Conselho Federal de Educação Física (CONFEF, 2009) debate sobre a qualidade de vida, que se bem discutida nas aulas, pode ultrapassar a questão da saúde. Na reportagem afirma-se que ao pensar a qualidade de vida como objetivo e conteúdo de ensino, a disciplina se volta para a vida concreta dos alunos, auxiliando-os a desenvolver competências que estimulem um estilo de vida saudável, através de capacitação para realizar atividades físicas e quando conseguem refletir, por exemplo, sobre hábitos do cotidiano.

    Em se tratando de Educação Física escolar na EJA, ASSIS (2010) afirma que é possível perceber em aulas práticas, onde todos estão expostos, que o papel do professor e o cuidado na direção da tarefa proposta são fundamentais, pois basta que haja alguma situação ou mesmo um olhar, onde os alunos sintam-se constrangidos para que se instale a inibição, fazendo com que o aluno se coloque alheio a proposta corporal, pois muitas vezes já carrega o estigma de que não consegue, e uma vez posto de lado, muitas vezes até deixa de participar de ações e atividades simples que percebe ser capaz.

    Ainda na visão de Assis (2010) as intervenções nas aulas de Educação Física em uma proposta para jovens e adultos devem considerar que as pessoas que ali estão:

    “...tem direito e possibilidades de acesso a múltiplas atividades que lhe façam sentido. Neste aspecto é importante ressaltar que a oferta de vivências corporais deve aproximar-se de seu interesse e oportunizar a curiosidade e experimentação.” (ASSIS, 2010, p. 6)

    Parafraseando Paulo Freire (1979), um compromisso verdadeiro com a realidade e com as pessoas que nela se encontram só é possível se desta realidade e destas pessoas se tem uma consciência verdadeira que enxerga as necessidades das partes e do todo, caso contrário inexiste compromisso autêntico, pois aquele que se julga comprometido com a realidade não pode concebê-la como algo dado e imutável.

    Questão importante de ser levada em conta em todas as disciplinas e em especial na Educação Física de Jovens e Adultos é a capacidade de escuta, pois como diz Molina (2002) somente é possível haver diálogo com o diferente se possuímos a atenção que é gerada na capacidade de escutar os outros e a nós mesmos. Observar que estudantes de um mesmo grupo, por exemplo, precisam de tempo e estímulos diferentes para a aprendizagem, e isso só se dá quando a prescrição e explicação são substituídas pela compreensão e interlocução.

    Através da capacidade de ouvirmos o outro é que podemos enxergar e respeitar as singularidades e diversidades culturais presentes nos grupos onde atuamos, oferecendo aos alunos oportunidades de participar do diálogo sem que o mesmo perca sua identidade. Para Molina (2002) escutar e dar atenção facilitará a gestão de afetos e gostos que estão presentes nas relações interpessoais, que inclusive, pode influenciar as estratégias didáticas dos professores.

    É essencial que se invistam nas pessoas para que possamos ter uma sociedade diferente, uma das formas desse investimento é educar de forma integral. É preciso que a educação seja pautada na melhoria da condição humana, levando professores e alunos a valorizarem-se a si próprios e a serem responsáveis pelas mudanças em nível pessoal e profissional.

    Como sugerem Scheibel e Lehenbauer (2008) uma proposta educativa assim construída estimula um novo pensar e uma nova direção para a educação, pois trabalhar na Educação de Jovens a Adultos, com a intencionalidade do desenvolvimento integral, para os autores é uma ousadia. Ousadia porque estará sendo estimulada a formação de sujeitos capazes de atuarem nas mais diversas dimensões do ser humano de forma integrada e equilibrada, seguros e descobridores de suas potencialidades e oportunizando que cada um se modifique internamente, enxergando a si, ao outro e ao mundo com outros olhos.

Considerações finais

    O objetivo geral deste trabalho foi estimular nos alunos jovens e adultos da EJA o interesse pela prática regular de atividade física, o estágio foi realizado na Escola Municipal de Ensino Fundamental Rio de Janeiro, no bairro Mathias Velho em Canoas/RS no período de 29/08/2012 à 21/11/12. A fim de atingir tais objetivos satisfatoriamente foram realizadas discussões e debates a cerca de nossas habilidades básicas, aulas práticas e vivências corporais variadas, noções de nutrição e atividades mais adequadas ao estilo de vida de cada um, além disso, foram realizadas dinâmicas e aulas expositivas, bem como pesquisas na internet e palestras participativas onde os alunos interagiam e trocavam suas experiências.

    Inicialmente reuni-me com a professora responsável pela disciplina na escola, questionando-a sobre os conteúdos já trabalhados e os que haviam sido previstos para a realidade dos alunos. Conforme ela, atividades práticas não eram muito indicadas, já que conflitos ocorriam com freqüência, então as aulas eram todas teóricas, onde em cada aula eles discutiam sobre alguma reportagem relacionada a saúde, retiradas de jornais ou revistas atuais.

    Antes de iniciar o estágio realizei dinâmicas, a fim de saber como era o relacionamento interpessoal nas turmas e as expectativas dos alunos quanto às aulas de Educação Física e suas reais necessidades dentro do segmento da EJA. Posteriormente, fui organizando as aulas procurando aliar os interesses dos educandos e as necessidades observadas em cada turma. Pude constatar grandes dificuldades de relacionamento e muito desconhecimento em questões relacionadas à saúde.

    Ao longo das aulas pude observar o despertar do interesse pela busca de atividade física em muitos alunos, que atentamente participavam das aulas, questionavam e contribuíam com suas experiências e pontos de vista, estimulando muitas vezes outros colegas que ficavam curiosos com as colocações que iam surgindo. Em contrapartida outros estudantes ficavam a mercê de tal conhecimento, pois chegavam atrasados, faltavam bastante e muitas vezes deixavam de participar para realizar trabalhos de outras disciplinas, pois a Educação Física é facultativa nos cursos noturnos.

    Para o planejamento das aulas utilizei-me dos conhecimentos adquiridos em diversas disciplinas durante o curso, bem como pesquisei mais sobre cada uma delas como: atletismo, ritmo e expressão corporal, nutrição, e principalmente treinamento e avaliação física e fisiologia, todos com objetivo da melhora da qualidade de vida por meio do exercício físico.

    Autores como SCHEIBEL e LEHENBAUER contribuíram para reflexão e organização deste trabalho, bem como as leis nacionais que norteiam o ensino na Educação de Jovens e Adultos, além disso, para embasamento teórico foram utilizados artigos e dissertações sobre o tema.

    A Educação Física na EJA é um desafio necessário e possível, pois os alunos jovens e adultos desconhecem suas possibilidades corporais e ficam maravilhados quando percebem suas capacidades e conquistas, são mais experientes, no entanto necessitam de tanto ou mais atenção do que alunos mais jovens, pois se encontram mais fragilizados pela disciplina, seja por experiências mal sucedidas, pelo desconhecimento ou mesmo pela falta de prática e com isso a timidez.

    É papel do profissional que trabalha a cultura corporal de movimento fazer da Educação Física disciplina procurada e essencial nas turmas da EJA, na qual muitas vezes são os únicos momentos em que o indivíduo terá contato com práticas corporais e poderá refletir sobre seu corpo e sua saúde.

Referências

  • ARAÚJO, Rafael Vieira. O Ensino de Educação Física na Educação de Jovens e Adultos, sob um olhar Psicopedagógico. Monografia. Universidade Estadual de Goiás. Sob a orientação da Profª. MS. Alba Cristhiane Santana. 2008.

  • ASSIS Cíntia. Educação Física na EJA: Lugar de corpos possíveis. 1° Seminário de Educação de Jovens e Adultos da PUC/Rio 2010. Disponível em www.seeja.com.br, acesso em 5 de Out de 2012.

  • BRASIL, Lei de Diretrizes e Bases da Educação. Disponível em www.mec.gov.br, acesso em 12 de Out de 2012.

  • BRASIL, Educação Física na Educação de Jovens e Adultos. Secretaria de Educação Continuada, Alfabetização e Diversidade, SECAD. Volume 3.. Brasília, 2006. 50 p.

  • BRASIL, Trabalhando com a Educação de Jovens e Adultos, Alunas e Alunos da EJA. Secretaria de Educação Continuada, Alfabetização e Diversidade, SECAD. Caderno 1. Brasília, 2006. 50 p.

  • FERNANDES, Elisângela. No meio do caminho havia (muitas) pedras: Conheça os motivos que fazem com que alunos entre 15 e 17 anos cursem a EJA. Revista Nova Escola, Porto Alegre, p. 96 à 101, Ago de 2011.

  • FREIRE, Paulo. Educação e Mudança. Rio de Janeiro, Ed. Paz e Terra. p. 21, 1979.

  • HANNAUER, Fernando Cristyan. Educação Física: Considerações sobre formas de manter o aluno interessado nas aulas. Revista Nova Escola, Porto Alegre, p. 24, Jul./Set 2009.

  • MOLINA, Vicente. Capacidade de escuta: Questões para a formação docente em Educação Física. Porto Alegre, Revista Movimento, ano V, Nº 1 – JAN / ABR 2002 p. 60 ESEF/ UFRGS.

  • PARANÁ, Educação Física: Ensino Médio. Secretaria de Estado da Educação. Distribuição gratuita. Curitiba, PR 2ª edição, 2006.

  • REVISTA Confef (Conselho Federal de Educação Física). Qualidade de Vida: Um tema que extrapola a questão da saúde. p. 5, 2009.

  • SANTIM, Silvino. Educação Física: Uma abordagem Filosófica da Corporeidade. Coleção ensaios, política e Filosofia. Editora UnIjuí, 2003.

  • SCHEIBEL, Maria Fani LEHENBAUER, Silvana (Orgs.). Saberes e Singularidades na Educação de Jovens e Adultos. Editora Mediação, Porto alegre, 2008.

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