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A Pedagogia da Cooperação no ensino superior

La Pedagogía de la Cooperación en el nivel superior

 

*Professor e Pesquisador da Faculdade de Turismo e Hotelaria, Universidade

Federal Fluminense. Doutorando em História, Política e Bens Culturas, Fundação

Getúlio Vargas. Mestre em Estudos do Lazer, Universidade Federal de Minas Gerais

Especialista em Jogos Cooperativos, Centro Universitário Monte Serrat. Especialista

em Lazer, Centro Universitário SENAC. Graduado em Turismo, Anhanguera Educacional

**Mestre em Química, linha de pesquisa Historia da Química, Universidade Federal

do Rio de Janeiro. Graduada em Química, Universidade Federal Fluminense

desenvolvendo pesquisas sobre Epistemologia e o Ensino de Ciências

Bernardo Lazary Cheibub*

Ana Maria de Souza Santos Cheibub**

bernardocheibub@gmail.com

(Brasil)

 

 

 

 

Resumo

          O presente trabalho versa sobre a contribuição dos jogos cooperativos nos processos de ensino e aprendizagem. Tem como problema central a relevância da pedagogia da cooperação na qualificação crítica do ensino superior. Os dados secundários, com bibliografia nas áreas de Cooperação, Lazer e Educação, e os relatórios semanais da vivência prática na livre-docência foram essenciais para refletirmos acerca dos diversos “con-tatos” e “con-tratos” que se construíram neste contexto. Estes dados, selecionados e organizados, contribuíram para as análises sobre a importância de atitudes cooperativas e empáticas relacionadas às estratégias de ensino que facilitam as infinitas possibilidades de trocas inter-dependentes na prática acadêmica.

          Unitermos: Cooperação. Jogo. Educação.

 

 
EFDeportes.com, Revista Digital. Buenos Aires - Año 18 - Nº 180 - Mayo de 2013. http://www.efdeportes.com/

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    A possibilidade de refletir sobre as relações existentes nos processos de ensino e aprendizagem, em conjunto com práticas lúdicas pedagógicas, foi um dos estímulos à construção deste artigo. Dentre estas práticas, a pedagogia da cooperação, representada na perspectiva do jogo, surgiu como possibilidade de facilitar a horizontalidade das relações e as trocas inter-culturais existentes nas atividades de lazer entrelaçadas à educação.

    O interesse pela relação educação/cooperação surge em meio ao panorama de competitividade e individualidade em que se encontra a sociedade ocidental contemporânea. Reflexões a respeito desta condição nos trouxeram a necessidade de aprofundamento no assunto. O foco no Ensino Superior é justificado pela experiência de um dos autores do presente artigo como Professor Universitário do curso de graduação em Turismo da Universidade Federal Fluminense, onde existe a oportunidade de exercitar em sala de aula a cultura da convivência e cooperatividade.

    A cooperação é um tema que vem merecendo a atenção de vários pesquisadores das áreas de Psicologia, Esporte e Educação. Sua pedagogia tem como pilar a prática cooperativa inserida nos diversos contextos da ciência do ensino. Definir este termo não é tarefa fácil, já que a idéia de cooperação está entrelaçada a uma ação. De uma tentativa de realizar tal tarefa, surge a formulação de Guillermo Brown: “A cooperação é a capacidade de trabalhar em prol de uma meta comum. Tem a ver com o desenvolvimento das habilidades necessárias para poder resolver problemas em conjunto” (1994: 25). De acordo com Fábio Brotto, a cooperação, ocorre quando “os objetivos são comuns, as ações são compartilhadas e os resultados são benéficos para todos” (2001: 27). Em uma situação cooperativa, o indivíduo percebe que o atingimento de seus objetivos é, em parte, conseqüência da ação dos outros. Esta percepção, que relaciona as conquistas individuais à ação direta do grupo, é refletida de forma positiva no comportamento social do indivíduo. Um aluno que aprende a trabalhar cooperativamente em sala de aula, vai entender que essa dinâmica se aplica à sua comunidade.

    Ao pensarmos em cooperação, inevitavelmente relacionamos esta idéia ao seu antagônico, a competição, “[…] processo onde os objetivos são mutuamente exclusivos, as ações são individualistas e somente alguns se beneficiam dos resultados” (Brotto, 2001: 27). A competição cria um padrão de vencedor, “o mais forte”, como conseqüência, surgem irremediavelmente à marginalidade e à opressão (Ray apud Brown, 1994: 15). Estas questões nos remetem a discussão sobre o mito da natureza competitiva do homem.

    A teoria da seleção natural de Charles Darwin é comumente mal interpretada - quando se associa adaptação à força bruta – sendo utilizada para absolver comportamentos competitivos excessivamente agressivos.

    Dizer que quanto melhor um indivíduo se adapta ao meio ambiente em transformação, maiores são suas chances de sobreviver e se reproduzir, não implica, necessariamente, que o melhor modo de adaptação seja a competição (Brotto, 2003: 40).

    O próprio Charles Darwin afirma que para a raça humana, o valor mais alto de sobrevivência está na inteligência, no senso moral e na cooperação social (Orlick, 1989). Estudos realizados em diferentes áreas demonstraram “[…] que a maior parte das relações entre organismos vivos são, essencialmente, cooperativas, caracterizadas pela coexistência, interdependência e simbiose em vários grupos” (Brotto, 2003: 40-41).

    Demerval Saviani propicia uma importante reflexão ao afirmar que: “[…] a forma da sociedade é determinada pelo modo como é produzida a existência humana em seu conjunto” (1944: 1) e que a validade da produção desta existência é estabelecida pela experiência.

    Assim, enquanto os elementos não validados pela experiência são afastados, aqueles cuja eficácia a experiência corrobora necessitam ser preservados e transmitidos às novas gerações no interesse da continuidade da espécie (Saviani, 1944: 1).

    Assim como Saviani, Terry Orlick afirma que: “Aqueles comportamentos que se tornam parte do seu repertório dependerão muito do aprendizado social que ocorre num ambiente social.” (1989: 23). Em outros termos, são as normas culturais que determinam se a sociedade é competitiva ou cooperativa (Brown, 1994).

    Se a competição foi aprendida e apreendida, devemos analisar sua relação com a educação e com a cultura no desenvolvimento do sujeito social. Nas palavras de Brotto (2003), temos sido condicionados a competir, fruto do processo de aprendizagem atual, treinados “via escola, família, mídia”, sendo assim, a competição passa a ser a opção “natural” para nosso crescimento e realização.

    De acordo com Orlick (1989), a competição é a responsável pelo desgaste moral da sociedade e pela decadência da qualidade de vida. O autor sugere a cooperação como solução pessoal e coletiva para o quadro de degradação moral que se apresenta. Neste aspecto, a análise de Orlick nos parece ingênua, pois sugere arbitrariamente a substituição de um modelo (competitivo) por outro (cooperativo). Brown (2004) afirma que a competição é uma parte fundamental do sistema cultural dominante em nossa sociedade. Tal como Brown, entendemos a competição como um elemento integrante da sociedade, e como tal não pode ser desprezada. Defendemos a idéia de coexistência, ou seja, devemos dialogar entre as possibilidades, reconhecendo qualidades em cada um dos diferentes processos e seus valores embutidos.

    David W. e Roger T. Johnson (1989) realizaram inúmeras pesquisas sobre a Competição e a Cooperação, particularmente, no contexto educacional. “A maior parte de suas conclusões indicam que o processo ensino-aprendizagem é enriquecido quando os alunos são colocados em situações de aprendizagem cooperativa” (Brotto, 2001: 33). De acordo com Brown (1994) o enfoque da cooperação na educação abriu um largo espaço para a prática e reflexão de educadores e críticos.

    Dentro do contexto do ensino superior, a cooperação se mostra pertinente. Uma das responsabilidades da Universidade é formar cidadãos que vão atuar diretamente na sociedade, tanto na aplicação do conhecimento profissional como na propagação de idéias em suas relações inter-pessoais. É neste segundo aspecto, principalmente, que uma cultura para cooperação pode insurgir. As vivências em sala de aula muitas vezes funcionam como marcos (referências) de situações reproduzidas no cotidiano. Esta tendência pode ser encarada como uma conseqüência positiva, já que pode fazer da sala de aula um núcleo ativo de renovação social, ou pode, simplesmente propiciar a manutenção de uma ordem educacional baseada no controle do indivíduo. Masetto destaca que:

    No âmbito do conhecimento, o ensino superior percebe a necessidade de se abrir para o diálogo com outras fontes de produção de conhecimento e de pesquisa, e os professores já se reconhecem como não mais os únicos detentores do saber a ser transmitido, mas como um dos parceiros a quem compete compartilhar seus conhecimentos com outros e mesmo aprender com outros, inclusive com seus próprios alunos. (2003: 14)

    O modelo educacional, baseado na relação vertical professor-aluno, geralmente é fechado para introdução de novos elementos, gerando uma repetição alienada das práticas educativas, por isso apresenta limites estritos como meio de transformação social. Já a cooperação, quando inserida na sala de aula, proporciona ao aluno um espaço de discussão, sua intenção é estimular a reflexão e o questionamento visando o enriquecimento que as trocas proporcionam. Paulo Freire (2005) reforça a importância da horizontalidade e do diálogo como bases da educação, bases estas que geram inquietações e questionamentos. A cooperação pode facilitar este processo de abertura e troca, minando paulatinamente o medo de se expor, de falar, de arriscar, de ajudar, sem julgamentos prévios ou ulteriores.

    Uma questão que deve ser considerada é a formação dos educadores. A necessidade de analisar a contribuição da pedagogia da cooperação para o estímulo do aluno - visando o melhor aprendizado do conteúdo específico de sua cadeira e abrindo espaço para percepções críticas de ordem pessoal e profissional – nos remete a questão: qual é o papel do professor e quais são as competências necessárias para sua formação? Mogilka (2003) coloca que, sem desprezar o conhecimento científico, a formação do educador deve se basear não somente nos saberes. O autor acrescenta que a formação baseada também nas competências1 procura ajudar o sujeito que,

    […] aprende a utilizar os saberes em situações operativas e existenciais. Isso se dá sempre em contextos sociais, pois nós dificilmente vivemos situações completamente individuais, característica que permite superar, se for bem trabalhada, o ensino academicista e livresco, que tanto afasta os alunos (especialmente das classes populares) do saber elaborado. (2003: 143)

    Dentro deste entendimento, a cooperação pode trazer uma nova perspectiva para os processos acadêmicos: a possibilidade de se promover ações e relações educativas, capazes de contribuir para a diminuição das barreiras existentes entre pessoas e grupos, por intermédio da prática do Jogo Cooperativo - considerado a principal ferramenta de ação da pedagogia da cooperação.

    O jogo em si transmite valores e mensagens; a comunicação se articula de maneira muito mais clara, dentro da forma de linguagem característica que o jogo agrega. Uma analogia interessante na relação cooperação/competição e jogo é que: a cooperação significa jogar com o outro, enquanto que na competição joga-se contra o outro. No Jogo Cooperativo não há vencedores e perdedores, opressores e oprimidos, existe um objetivo comum a todos.

    Segundo Rubem Alves:

    [...] o jogo afirma que a ordem da vida não deve ser controlada através da imposição de um poder a ele estranho. Ele expressa o anseio por uma nova forma de organização social, organização que proporcione o prazer apesar da dor, que expresse a liberdade apesar da coerção. (1986: 171).

    Winnicott coloca que: “É no brincar, e somente no brincar, que o indivíduo, criança ou adulto, pode ser criativo e utilizar sua personalidade integral: e é somente sendo criativo que o indivíduo descobre o eu” (1975: 80). De maneira simplificada, é no jogo que a pessoa tem a possibilidade de arriscar, de revelar sua personalidade e, a partir desta vivência, criar.

    No tocante a validade do jogo como ferramenta, o sociólogo Nelson Carvalho Marcellino afirma que o mesmo não deve ser considerado apenas “[…] um instrumento leve e eficaz para facilitar o processo de aprendizagem, para a adequação conformista de indivíduos a uma inquestionável sociedade estabelecida. Longe disso, é uma questão de participação cultural” (2005: 45) Luciana Marcassa fala sobre a possibilidade que o jogo dá ao aluno, “[…] mediante uma experiência lúdica e educativa, (de) refletir sobre a realidade que o cerca e praticar a liberdade como um exercício de cidadania e participação social.” (2004: 132).

    Com a inserção da cooperação na Universidade, a questão central não é mais a simples transmissão de conhecimentos, mas a forma como este conhecimento é recriado em sala de aula. No jogo cooperativo, o processo é o mais importante, diferentemente do jogo competitivo, onde o foco permanece simplesmente no resultado final. Por este motivo, o primeiro possibilita uma participação mais ativa, integrante e inclusiva.

    A horizontalidade das relações e a intensidade da comunicação, encontradas no interior do jogo cooperativo, estimulam a participação do aluno de maneira mais crítica e acarretam em um envolvimento criativo dos diferentes sujeitos constituintes do Ensino Superior.

Nota

  1. De acordo com o autor: “Competência é a faculdade de mobilizar saberes, habilidades, técnicas e experiências prévias para solucionar, com sucesso e eficácia, situações problemáticas, geralmente em contextos sociais práticos e definidos” (2003: 143).

Referencias

  • ALVES, R. A. (1986). A gestação do futuro. Campinas: Papirus.

  • BROWN, G. (1994) Jogos Cooperativos: teoria e prática. São Leopoldo, RS: Sinodal.

  • BROTTO, F. (2001). Jogos Cooperativos: o jogo e o esporte como um exercício de convivência. Santos, SP: Projeto Cooperação.

  • BROTTO, F. (2003). Jogos Cooperativos: se o importante é competir, o fundamental é cooperar! Santos, SP: Projeto Cooperação.

  • FREIRE, P. (2005). Pedagogia do Oprimido. Rio de Janeiro: Paz e Terra.

  • JOHNSON, D. W., JOHNSON, R. T. (1989). Cooperation and competition: theory and research. 2nd ed. Edina: Interaction Book Company.

  • MARCASSA, L. (2004). Lazer – Educação. In: GOMES, C. L. (Org.) Dicionário crítico do Lazer. Belo Horizonte: Autêntica. p. 126-133.

  • MARCELLINO, N. C. (1989). Pedagogia da Animação. Campinas: Papirus.

  • MASETTO, M. T. (2003). Competência pedagógica do professor universitário. São Paulo: Summus.

  • MOGILKA, M. (2003). Educar para a Democracia. Cad. Pesq., São Paulo, n. 119.

  • ORLICK, T. (1989). Vencendo a competição. São Paulo: Círculo do Livro.

  • SAVIANI, D. (2004). A nova lei da educação: trajetórias, limites e perspectivas. Campinas, SP: Autores Associados.

  • WINNICOTT, D.W. (1975). O brincar e a realidade. Rio de Janeiro: Imago.

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