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Efeitos do exercício físico sobre a cartilagem articular

Efectos del ejercicio físico sobre el cartílago articular

 

*Fisioterapeuta, mestre em Ciências

do Movimento Humano, CEFID-UDESC, Florianópolis, SC

**Fisioterapeuta, Instituto de Ortopedia e Traumatologia

de Passo Fundo, Passo Fundo, RS

***Fisioterapeuta, Florianópolis, SC

****Fisioterapeuta, mestrando em Fisioterapia CEFID-UDESC, Florianópolis, SC

*****Fisioterapeuta, coordenador do Mestrado

em Fisioterapia CEFID-UDESC, Florianópolis, SC

Lisiane Piazza* | Marcelo Luza**

Thiele de Cássia Libardoni*** | Eduardo Luiz Stapait****

Gilmar Moraes Santos*****

thielelibardoni@yahoo.com.br

(Brasil)

 

 

 

 

Resumo

          A cartilagem articular caracteriza-se como um tecido altamente organizado e complexo, o qual tem como função primária a absorção e redistribuição das forças biomecânicas aplicadas à articulação. Exercícios físicos podem ser benéficos na redução da dor e melhora da função de articulações com osteoartrose. No entanto, cargas excessivas podem conduzir a piora da doença. Sendo assim, este estudo teve como objetivo revisar a literatura sobre os efeitos do exercício físico sobre a cartilagem articular através de estudos publicados nas bases de dados Portal Periódicos da CAPES, Pubmed e Scielo utilizando os unitermos cartilagem, exercício e atividade física nas línguas inglesa e portuguesa. Através da análise dos artigos, constatou-se que exercícios de maior intensidade e carga, como salto e corrida podem ter efeitos deletérios sobre a cartilagem articular. Já exercícios de menor intensidade podem ser considerados mais seguros, uma vez que apresentam efeitos benéficos sobre a cartilagem articular.

          Unitermos: Cartilagem. Exercício. Articulações.

 

Abstract

          Articular cartilage is characterized as a highly organized and complex tissue, which has as its primary function the absorption and redistribution of biomechanical forces applied to the joint. Exercises may be beneficial in reducing pain and improved function of joints with osteoathritis. However, excessive loads can lead to worsening of the disease. Therefore, this study aimed to review the literature about the effects of exercise on the articular cartilage through studies published in the databases of the CAPES Periodicals Portal, Scielo and Pubmed using the keywords cartilage, exercise and physical activity in English and Portuguese. By analyzing the articles, it was found that exercise of higher intensity and load, such as jumping and running may have deleterious effects on articular cartilage. Since lower-intensity exercise may be considered safer, since they have beneficial effects on articular cartilage.

          Keywords: Cartilage. Exercise. Joints.

 

 
EFDeportes.com, Revista Digital. Buenos Aires - Año 17 - Nº 170 - Julio de 2012. http://www.efdeportes.com/

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Introdução

    A função primária da cartilagem articular é absorção e redistribuição das forças biomecânicas aplicadas à articulação através das atividades do dia-a-dia (MOSHER; LIU; TOROK, 2009)1, fornecendo uma superfície sem atrito durante o movimento articular e melhorando a congruência da superfície articular. Para cumprir estas tarefas, a cartilagem se apresenta como um tecido altamente organizado e complexo. Sendo um tecido avascular, aneural e alinfático, são a matriz da cartilagem e seus componentes os mais importantes para a transmissão de cargas2.

    A compressão da cartilagem reduz o conteúdo de água e altera a orientação das fibras de colágeno na matriz extracelular, com influencias no tempo de relaxação transverso (T2) quando este tecido é observado em imagens de Ressonância Magnética Nuclear (RMN)1.

    A degeneração da cartilagem articular, de causa principalmente mecânica, é hoje uma das maiores preocupações na área da ortopedia e reumatologia (REZENDE et al, 2000)3, uma vez que esta possui relação direta com a osteoartrose. Exercícios físicos podem ser benéficos na redução da dor e melhora da função do joelho e quadril com oesteoartrose4. No entanto, cargas excessivas nas articulações destes pacientes podem conduzir a piora da doença com maior resposta inflamatória, dor e edema articular5.

    Inúmeros estudos têm investigado os efeitos do exercício físico sobre a cartilagem articular em modelos vivos e animais, com articulações saudáveis ou com osteoartrose. Sendo assim, este estudo visa realizar uma breve revisão de literatura a respeito dos efeitos do exercício físico sobre a cartilagem articular, a fim de verificar se existe um consenso entre os estudos quanto aos efeitos dos exercícios sobre este tecido, bem como indicações quanto à melhor carga, intensidade e freqüência que devem ser realizados a fim de não causar danos à cartilagem.

Métodos

    Para realização deste estudo foram pesquisados artigos das revistas que são acessadas por meio da base de dados portal periódicos da CAPES, além das bases de dados Pubmed e Scielo. Os unitermos usados para a busca foram: cartilagem, exercício, atividade física, cartilage, exercise e physical activity. Foram selecionados manualmente os artigos referentes aos efeitos do exercício / atividade física sobre a cartilagem, realizados em humanos ou animais.

Resultados e discussão

Efeitos do exercício físico sobre a cartilagem articular de animais

    Armstrong et al. (1993)6 realizaram uma menisectomia medial unilateral em dois grupos de ovelhas. Em uma semana de pós operatório, um grupo (n=5) entrou em um regime de exercício de caminhada moderada (24km/semana) enquanto o outro grupo (n=5) não realizou exercícios. Dois grupos (n=6 e n=8) de ovelhas não operadas foram usadas como controles exercício e sem exercício para os respectivos grupos menisectomizados. Seis meses após a cirurgia todos os grupos foram sacrificados e suas articulações do joelho foram examinadas macroscopicamente. Em ambos grupos, a menisectomia induziu a mudanças na cartilagem e no osso típicas de uma osteoartrite inicial. No entanto, os animais menisectomizados sujeitos ao programa de exercícios desenvolveram lesões na cartilagem mais severas e osteófitos do que os grupos não exercitados. Enquanto a atividade das células na cartilagem femoral do grupo menisectomizado e exercitado foi similar ao controle que não realizaram menisectomia, no entanto nos animais não exercitados foi maior. Desta forma, os autores concluíram a partir destes dados que neste modelo animal o exercício exacerbou as lesões induzidas na cartilagem articular pela menisectomia.

    Little, Ghosh e Rose (1997)7, avaliaram o efeito do exercício na síntese in vitro da grande agregação de proteoglicanos e dois pequenos proteoglicanos, biglican e decorina, na cartilagem articular feitas a partir de duas regiões de sustentação de peso no terceiro osso carpal de cavalos que foram submetidos a exercício moderado ou extenuante. Para alcançar este objetivo, 20 cavalos foram submetidos a um programa de exercício, o qual iniciou com uma fase de resistência em oito semanas (fase 1) seguida da fase de alta intensidade com duração de mais oito semanas (fase 2). Os cavalos foram divididos em dois grupos de forma randomizada para a fase três de treino com mais 17 semanas. O Grupo A (exercício moderado) treinou com aumento na intensidade e duração de quatro semanas enquanto o grupo B (exercício extenuante) tiveram aumento no treinamento de intensidade e duração de duas semanas. Na fase quatro, os cavalos foram repousados por 16 semanas. A profundidade completa da cartilagem articular explantada da faceta radial dorsal, faceta intermediária dorsal e côndilo palmar do terceiro osso do carpo foram coletados e culturados. O conteúdo de proteoglicanos na cartilagem e liberação no meio da cultura foram mensurados.

    Os autores constataram que o exercício extenuante em cavalos pode conduzir a um distúrbio na biossíntese dos proteoglicanos nas regiões da cartilagem articular submetidas a altos estresses de contato. Estas anormalidades metabólicas, que persistem após 16 semanas de cessar os exercícios, podem ter efeitos deletérios nas propriedades bioquímicas do tecido. As alterações observadas no metabolismo da cartilagem articular nos cavalos que se exercitaram de forma extenuante podem representar um fator predisponente para degeneração na cartilagem e osteoartrite em estágios tardios.

    Chang et al. (2010)8, investigaram a influência a longo prazo do exercício em esteira nas mudanças na massa óssea e cartilagem articular de ratas ovariectomizadas. 60 ratas foram divididas de forma randomizada em quatro grupos: ovariectomizadas, ovariectomizadas com exercício na esteira, exercício na esteira somente e controle. As ratas dos grupos de exercícios realizaram 36 semanas de exercício em uma esteira com velocidade de 12m/min, correndo na esteira 60 minutos por dia, cinco dias por semana. Após 36 semanas, as seguintes variáveis foram comparadas entre os quatro grupos: massa óssea, a qual foi avaliada pelo volume ósseo trabecular e densidade mineral óssea e cartilagem articular nos joelhos, a qual foi avaliada pela análise histológica e escore de Mankin modificado. Os autores observaram que as ratas do grupo ovariectomizadas (com e sem exercício) apresentaram menor densidade mineral óssea e massa óssea do que as não ovariectomizadas (com ou sem exercício), indicando que o exercício faz pouco para preservar a massa óssea. No entanto, o grupo de ovariectomizadas sedentárias apresentou um pior escore no Mankin do que o grupo que fez exercício. A cartilagem articular nas ratas ovariectomizadas sedentárias foi relativamente mais fina, hipocelular e teve mais fendas que os outros três grupos. Sendo assim, este estudo sugeriu que a longo prazo o exercício protege a cartilagem articular em ratas ovariectomizadas mas não retarda a perda de massa óssea após a menopausa.

Efeitos do exercício físico sobre a cartilagem articular de humanos

    Roos e Dahlberg (2005)4 avaliaram os efeitos do exercício moderado no conteúdo da glicosaminoglicana (GAG) na cartilagem do joelho em sujeitos com alto risco de osteoartrite no joelho. 45 sujeitos que realizaram menisectomia parcial medial, três a cinco anos previamente ao estudo foram randomizadas para participar de um regime de exercícios supervisionados três vezes por semana por quatro meses com duração de uma hora cada sessão ou a um grupo controle de não intervenção. Os objetivos dos exercícios foram melhorar o controle neuromuscular, força muscular e capacidade aeróbica. Os autores observaram através dos pacientes com risco de osteoartrite de joelho que realizaram os exercícios que a cartilagem articular de humanos adultos tem um potencial pra se adaptar a mudanças na carga. Sendo assim, segundo os resultados do estudo, exercícios moderados podem ser um bom tratamento não somente para melhorar os sintomas articulares e a função, mas também para melhorar o conteúdo da GAG na cartilagem do joelho em pacientes com alto risco de desenvolver osteoartrose.

    A COMP (proteína oligomérica da matriz cartilaginosa) é uma proteína da matriz, que é estudada como um potencial marcador na cartilagem no processo de osteoartrite. Andersson et al (2006)9 monitoraram os níveis da COMP durante um ensaio clínico randomizado de exercício físico ou repouso em indivíduos com osteoartrite sintomática e radiográfica do joelho. Amostras de sangue foram coletadas de 58 indivíduos em tempos pré definidos antes e após exercício e repouso em um grupo de treinamento e um grupo controle. O programa de exercícios consistiu de exercícios de sustentação de peso objetivando o aumento no controle postural e força na extremidade inferior. Os exercícios foram realizados em 5 estações com intensidade maior ou igual a 60% da freqüência cardíaca máxima. Foi realizada uma hora de exercício supervisionado, consistindo na sessão de alta intensidade, a qual foi realizada duas vezes na semana. Além disso, exercícios caseiros por pelo menos 30 minutos todo dia foram prescritos para os outros dias durante as seis semanas do período de intervenção.

    Em um segundo estudo suplementar, sete indivíduos foram submetidos ao mesmo programa de exercícios e amostras de sangue foram realizadas em intervalos fixos, antes, imediatamente após, 30 e 60 minutos após a sessão de exercício e então com intervalo de 60 minutos para outras cinco horas após exercício para monitorar as mudanças a curto prazo na COMP. Os autores observaram que antes do exercício ou repouso não houveram diferenças significativas nos níveis da COMP entre os grupos. Após 60 minutos de exercício os níveis da COMP aumentaram. Após 60 minutos de repouso os níveis reduziram e após 24 horas não houve mudanças entre o início e fim do estudo. No segundo estudo, a COMP aumentou imediatamente após o exercício e reduziu aos níveis de base após 30 minutos. Sendo assim, os autores concluíram que os níveis da COMP aumentaram durante o exercício em indivíduos com osteoartrite de joelho, enquanto que os níveis reduziram durante o repouso. O aumento nos níveis da COMP foram normalizados 30 minutos após exercício. Além disso, não houve aumento após seis semanas do programa de exercícios indicando que qualquer efeito do exercício supervisionado na cartilagem é transitório.

    Mosher, Liu e Torok (2009)1 realizaram estudo a fim de caracterizar os efeitos da idade e nível de atividade física na espessura da cartilagem e reposta T2 imediatamente após a corrida. A espessura da cartilagem e os valores da imagem da RMN de T2 de 22 corredores de maratona e 15 controles sedentários foram comparados antes e depois de 30 minutos de corrida. Corredores e grupo controle foram estratificados por idade. Os valores de base da RMN T2 e as mudanças na espessura na cartilagem e valores de T2 após corrida foram comparados entre os grupos. Após a corrida, os valores de T2 da RMN reduziram na cartilagem superficial femoral e tibial com um decréscimo na espessura da cartilagem. Menores valores na espessura da cartilagem T2 foram observados na zona média da cartilagem e não foram observadas mudanças na camada mais profunda. Não houve diferença na deformação da cartilagem ou na resposta T2 para corrida como função da idade ou nível de atividade física. Sendo assim, os resultados deste estudo chegaram às seguintes conclusões: Primeiro, os resultados da mensuração da espessura da cartilagem após a corrida revelaram que sujeitos idosos possuem a cartilagem mais espessa independente do nível de atividade física. Segundo, estes resultados confirmam que com cargas compressivas cíclicas, como as que ocorrem durante a corrida, uma redução em T2 ocorre preferencialmente perto da superfície articular. Isto é consistente com estudos in vitro prévios que demonstraram menor rigidez compressiva na zona superficial da cartilagem. Terceiro, os resultados não demonstraram diferenças na resposta T2 da cartilagem entre os compartimentos medial e lateral, nem entre as regiões centrais descobertas de cartilagem ou posterior cobertas de cartilagem. Isto sugere que na articulação normal mais estresse uniforme nos tecidos são gerados na cartilagem femoral tibial durante o exercício de corrida.

    Helmark et al. (2010)5, aplicou o método de microdiálise em joelhos com osteoartrite a fim de revelar mudanças nos marcadores bioquímicos da cartilagem e inflamação, intraarticularmente e na sinóvia, em resposta a uma única aplicação de carga mecânica na articulação. Participaram deste estudo 31 mulheres com osteoartrite do joelho, as quais foram randomizadas em dois grupos: não-exercícios (NE) ou exercícios (E). Para o grupo E foi utilizado o protocolo de extensão do joelho de uma perna. Após cinco minutos de aquecimento em bicicleta estacionária os sujeitos foram posicionados em um leg-press com o joelho flexionado a 90° e então foi realizado de cinco a sete repetições máximas. Após, a carga de trabalho de aproximadamente 60% de uma repetição máxima foi aplicada e os sujeitos completaram 25 séries de 10 repetições. Durante cada série de 10 repetições a perna de trabalho foi extendida contra uma plataforma vertical, enquanto a perna de repouso foi posicionada em uma plataforma horizontal.

    Foi realizado um bloqueio nervoso periférico logo abaixo do ligamento inguinal para aplicação de dois cateteres de microdiálise, os quais foram perfundidos em um ritmo lento (2μl/minuto) com uma solução de ringer-acetato e glicose marcadas radioativamente, permitindo a determinação da recuperação relativa e cálculo das concentrações intersticiais inflamatórias e biomarcadores da cartilagem ao longo de um período de três horas. Foi observado um aumento significativo da interleucina-10 (substância condroprotetora) em ambas posições do joelho no grupo E ao longo das três horas após o exercício enquanto que a interleucina-10 se manteve estacionada ao longo do tempo no grupo NE. A interleucina-6 e 8 apresentaram significante aumento ao longo do tempo independente do grupo e posição do cateter. A proteína oligomérica da matriz cartilaginosa reduziu intra-articularmente no período pós exercício no grupo E comparado ao grupo NE. Sendo assim, constatou-se neste estudo que o exercício causou um aumento nas concentrações intra-articulares e peri-sinoviais da interleucina-10 no grupo de mulheres com osteoartrite de joelho. Isto sugere um efeito positivo do exercício na resposta da citocina anti-inflamatória condroprotetora em pacientes com osteoartrite de joelho e pode contribuir para explicar os efeitos benéficos que o exercício tem nesta doença.

    Woollard et al (2011)10, analisaram as mudanças no volume da cartilagem do joelho em indivíduos que completaram um programa de exercícios terapêuticos para osteoartrite no joelho. Foram avaliados 13 indivíduos com osteoartrite no joelho, os quais realizaram uma RMN para quantificar as mudanças no volume da cartilagem nos côndilos femoral e tibial, em toda superfície do platô tibial na avaliação inicial e após um ano de intervenção. Foram também realizadas mensurações da estrutura corporal e função através do índice de massa corporal, avaliação do alinhamento do eixo do joelho, movimentos e força do joelho além das limitações na atividade e níveis de atividade através de um questionário específico previamente ao programa de exercícios terapêuticos. Após seis meses, foi realizada uma reavaliação das mensurações clínicas de força e movimento do joelho e após um ano, foi realizada a RMN a fim de observar a cartilagem do joelho, além de ser realizada novamente uma avaliação do alinhamento do joelho e preenchimento dos questionários. Os autores observaram que na região central do côndilo femoral houve uma perda do volume médio da cartilagem de 3,8%. Já as outras três superfícies articulares da tibiofemoral tiveram uma mínima mudança no volume médio da cartilagem. Assim, o menor volume na cartilagem no côndilo femoral medial foi altamente variável e a média na redução da cartilagem estava dentro da amplitude previamente relatada. Sete dos 13 indivíduos não apresentaram redução no volume da cartilagem menor do que o erro padrão da mensuração. Sendo assim, segundo os autores, as mudanças no volume da cartilagem, podem ser influenciadas mais por fatores pessoais (índice de massa corporal, varo do joelho, alterações na cinemática durante a marcha) do que pelo programa de exercícios terapêuticos.

    Niehoff et al (2011)11 investigaram o efeito da corrida e do salto na deformação da cartilagem do joelho e as mudanças nos níveis séricos da proteína oligomérica da matriz cartilaginosa (COMP) após estas duas atividades e se as mudanças no volume da cartilage se correlacionavam com as mudanças nos níveis desta proteína, a qual é um biomarcador sérico que monitora o metabolismo da cartilagem. O volume da cartilagem do joelho e espessura foram determinados usando RMN assim como a concentração da COMP a partir de amostras do soro antes e após as cargas in vivo em 14 adultos saudáveis (sete homens e sete mulheres). Os participantes realizaram diferentes intervenções de carga com 30 minutos de duração em três dias diferentes. Uma intervenção foi designada com pequena freqüência e alta amplitude (100 saltos verticais a partir de uma plataforma com altura de 73 cm), outra com alta freqüência e pequena amplitude (corrida a uma velocidade de 2,2m/s (3,96km)) e uma intervenção sem carga (repouso em uma cadeira), sendo as intervenções randomizadas.

    Amostras de sangue foram realizadas imediatamente antes, imediatamente após e 0,5h, 1h e 2h e 3h após intervenção. Imagens pré e pós carga nos planos coronal e axial foram feitas pela RMN e foram usadas para determinar as deformações na cartilagem patelar, tibial e femoral. Os autores constataram que os níveis séricos da COMP aumentaram imediatamente após a corrida e após a queda livre. Após a intervenção com corrida, o volume e espessura da cartilagem reduziram na patela, tíbia medial e fêmur e tíbia lateral. A intervenção com salto conduziu a redução no volume e espessura na patela medial e lateral da tíbia A deformação na cartilagem foi mais pronunciada após corrida comparada a queda livre sendo significante somente na lateral da tíbia. Encontrou-se uma correlação significante entre as mudanças na COMP sérica e no volume da cartilagem após queda livre, mas não após a corrida. Através destas constatações, os autores concluíram que intervenções com exercícios in vivo regulam diferentemente as concentrações da COMP sérica e deformações na cartilagem do joelho. As relações entre as mudanças na COMP e o volume na cartilagem parecem depender tanto dos fatores mecânicos como bioquímicos.

    Ginckel et al. (2011)2 investigaram os efeitos do exercício in vivo na deformação da cartilagem do tornozelo e recuperação em voluntário saudáveis. O volume 3D da cartilagem do tálus e da tíbia foram calculados pela RMN 3D antes e após 30 flexões do joelho bilateral realizadas dentro de um minuto. Os autores observaram que a média das mudanças 3D no volume para a cartilagem talar após o exercício foram 10,41%, 8,18%, 5,61% e 3,90%. Para a cartilagem tibial a média das mudanças foram 5,97%, 5,75%, 0,89% e 1,51%. Para a cartilagem talar, todas mudanças foram significantes, exceto após 30 minutos após o exercício. Para a cartilagem tibial as mudanças não foram significativas. Em todas mensurações não houve diferenças significantes nas mudanças no volume relativo entre ambas placas de cartilagem. Sendo assim, contatou-se neste estudo que a perda substancial na deformação da cartilagem do tornozelo após cargas in vivo foram restauradas em 30 minutos para o tálus. O envolvimento de todas as áreas de contato da cartilagem pode ser associado com a qualidade da manutenção da cartilagem no tornozelo, uma vez que a cartilagem do tálus tende a desenvolver um papel crítico na atenuação do choque quando comparado a cartilagem tibial.

    Os principais achados deste estudo sugeriram uma considerável deformação para a cartilagem do tálus assim como da tíbia após 30 flexões do joelho. A cartilagem do tálus recuperou-se dentro de 30 minutos após o exercício. Para a cartilagem tibial, as mudanças no volume não foram significantes. As propriedades do material da cartilagem como a rigidez dinâmica e a permeabilidade são sugeridas como contribuintes para as respostas de deformação in vivo neste estudo. No entanto, estas propriedades não são fatores determinantes sozinhos. Um tempo de recuperação relativamente lento reflete uma redução na permeabilidade hidráulica caracterizando camadas mais superficiais da cartilagem do tornozelo. Como a baixa permeabilidade da cartilagem do tornozelo tem sido associada a um aumento na rigidez in vitro para a carga, esta observação pode destacar o papel de envolvimento da área de superfície no grau de deformação descoberto.

    Levando em consideração que novas técnicas de RMN usando 3T tem sido desenvolvidas incluindo T1r e T2r, mensurações de tempo de relaxação que detectam precocemente a degradação do colágeno e proteoglicanos da cartilagem, Luke et al. (2010)12 avaliaram 10 corredores de maratona assintomáticos, os quais realizaram uma RMN 2 semanas antes, dentro de 48 horas após, além de 10 a 12 semanas após correr em uma maratona. As seqüencias T1r e T2r da RMN dos corredores foram comparadas com os controles com mesma idade e gênero que fizeram RMN no início da pesquisa e 10 e 12 semanas após. Segundo os autores, os corredores não demonstraram nenhuma grande mudança morfológica na RMN após corrida na maratona. Os estudos pós maratona, no entanto, revelaram maiores valores na T2r e T1r em todas áreas da cartilagem articular do joelho exceto no compartimento lateral. Os valores T2r recuperaram a linha de base exceto no côndilo femoral medial após 3 meses. Os valores médios de T1r aumentaram após a maratona e permaneceram aumentados em 3 meses. Sendo assim, concluiu-se que os corredores apresentaram elevados valores de T1r e T2r após a maratona, sugerindo mudanças bioquímicas na cartilagem articular, sendo que os valores de T1r permaneceram elevados após 3 meses de redução da atividade. A articulação patelofemoral e o compartimento medial do joelho demonstraram as maiores mudanças no sinal, sugerindo que estas estão com maior risco para degeneração neste grupo de indivíduos.

    Sendo assim, este estudo encontrou que a corrida de longa distância causa mudanças bioquímicas na cartilagem articular. A corrida de maratona possui efeitos bioquímicos dinâmicos na cartilagem articular com mudanças no fluído da matriz conforme demonstrado pelo aumento e recuperação do tempo de relaxamento T2r e elevados valores de T1r. Através das análises morfológicas padrão da RMN, não foram observadas mudanças grosseiras após a maratona nos corredores. A carga da corrida não causou defeitos agudos estruturais na cartilagem articular de joelhos com anatomia normal como esperado pelos resultados de outros estudos. Mudanças significantes nos valores de T1r e T2 foram similares em corredores e controles, no entanto, no período pós maratona as mudanças foram observadas, sugerindo que a carga de corrida de 26,2 milhas foi responsável por estas mudanças.

    A fim de determinar a deformação na cartilagem do tornozelo (tálus) após cargas usando o cálculo das mudanças no volume em 3D e estabelecer se existe alguma diferença na mudança do volume entre quatro exercícios de sustentação de peso, Ginckel et al. (2011)13, aplicaram exercícios com aumento no impacto (flexão bilateral dos joelhos / flexão unilateral do joelho/ saltos) assim como dois tipos de carga: dinâmica e estática (flexão joelho unilateral e postura estática unilateral) em 13 sujeitos saudáveis. Baseada na RMN, reconstruções 3D da cartilagem do tálus foram geradas para determinar o volume 3D antes e depois de quatro exercícios de sustentação de peso em 13 sujeitos saudáveis, sendo os exercícios realizados em dias separados. Estes compreenderam 30 flexões de joelho bilateral durante um minuto, 30 flexões de joelho unilateral em um minuto, dois minutos na postura estática unilateral e 10 saltos de 40cm de atura caindo em um único pé. A média da deformação (redução no volume) do tálus foi de 8,3% após flexão do joelho bilateral, 7,7% após flexão do joelho unilateral, 14,6% após postura estática unilateral, 12,5% após saltos. A deformação foi maior após a postura estática do que na flexão unilateral dos joelhos, sugerindo que a cartilagem do tálus apresenta substancial deformação durante cargas in vivo caracterizada pela maior deformação (maior volume de mudança) após carga estática do que dinâmica.

    Helmark et al. (2011)14, investigaram os efeitos diretos dos exercícios de sustentação de peso na cartilagem no joelho osteoartrítico determinado por marcadores bioquímicos da cartilagem e inflamatórios no fluido sinovial e urina. Participaram 11 sujeitos com osteoartrite no joelho. No primeiro dia de teste, os sujeitos responderam a um questionário e fizeram exames de sangue e urina e na mesma ocasião foi aspirado o fluido sinovial do joelho com maior intensidade dos sintomas. No segundo dia, aproximadamente 3 meses após o primeiro dia de teste, os sujeitos realizaram exercício com carga moderada no mesmo joelho a qual foi determinada como 60% de uma repetição máxima. Após cinco minutos de aquecimento em uma bicicleta, os sujeitos foram posicionados em uma máquina de leg-press. Foram realizadas 10 séries de oito repetições, sendo a perna de trabalho extendida com o joelho flexionado a 90°. Foi aspirado novamente o fluido sinovial do joelho 15-30 minutos após a sessão de exercícios e amostras de sangue e urina foram coletadas no mesmo tempo. A determinação da proteína oligomérica da matriz cartilaginosa (COMP) bem como de outros marcadores foram realizados no fluido sinovial e urina. Uma significante redução foi encontrada na concentração do fluido sinovial da COMP após os exercícios, enquanto os outros marcadores permaneceram sem mudanças. Sendo assim, os autores concluíram através deste estudo que 30 minutos de carga mecânica em um único joelho em sujeitos com osteoartrite de joelho resultam em uma redução na concentração da COMP no fluido sinovial.

    Urquhart et al. (2011)15 realizaram uma revisão sistemática sobre os efeitos da atividade física na articulação do joelho, constatando que as relações entre atividade física e estruturas articulares do joelho diferem. Os autores observaram uma forte evidência para uma associação positiva entre atividade física e osteófitos tibiofemorais. No entanto, também encontraram forte evidência para a ausência de uma relação entre atividade física e estreitamento no espaço articular, um método substituto para avaliar a cartilagem. Evidenciou-se limitada evidência de estudos com RMN para uma positiva relação entre atividade física e volume da cartilagem e forte evidência para uma relação inversa entre atividade física e defeitos na cartilagem. Desta forma, esta revisão sistemática encontrou que as estruturas do joelho são afetadas diferentemente pela atividade física. Embora a atividade física esteja associada com um aumento nos osteófitos radiográficos, não há relatos de aumento no espaço articular, mas evidências emergentes de um aumento associado no volume da cartilagem e redução nos defeitos na cartilagem na imagem de RMN. Levando-se em consideração que otimizar a saúde da cartilagem é importante na prevenção da osteoartrite, os achados deste estudo indicaram que a atividade física é benéfica, ao invés de prejudicial à saúde das articulações.

Conclusões

    Exercícios de maior intensidade e carga como salto e corrida podem levar a efeitos deletérios sobre a cartilagem articular. As deformações causadas na cartilagem do joelho em exercícios de agachamento são reversíveis após 30 minutos do término do exercício. Em contrapartida, exercícios de menor intensidade, podem ser considerados mais seguros, uma vez que apresentaram efeitos benéficos na cartilagem articular.

    No entanto, mesmo a caminhada sendo uma atividade amplamente realizada pela população em geral, poucos são os estudos que avaliaram os efeitos desta atividade sobre a cartilagem articular. Sendo assim, acredita-se ser necessária uma maior exploração dos efeitos deste exercício sobre a cartilagem articular.

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EFDeportes.com, Revista Digital · Año 17 · N° 170 | Buenos Aires, Julio de 2012  
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