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Infecções cutâneas no esporte

Infecciones cutáneas en el deporte

 

**Mestrado em Ciências da Saúde. Dermatologista. Professor assistente do Centro de Pesquisa

em Doenças Infecciosas, Hospital Universitário Clemente Faria, Montes Claros

**Professora assistente – Campus Darcy Ribeiro

Universidade Estadual de Montes Claros – Montes Claros

Linton Wallis Figueiredo Souza*

Simone Vilas Trancoso Souza**

wallis@uai.com.br

(Brasil)

 

 

 

 

Resumo

          As infecções cutâneas causam grande morbidade física e mental em atletas, principalmente naqueles de alto desempenho, devido o afastamento ou redução das atividades físicas. O conhecimento e divulgação por parte dos profissionais de saúde do esporte da classificação dos esportes pelo grau contato, das medidas profiláticas, o tratamento rápido e adequado, a percepção da necessidade do afastamento temporário por motivos da doença, da intensidade do esporte ou da medicação utilizada são fatores que otimizam a qualidade da atividade física praticada, bem como minimiza o tempo necessário para a recuperação. O retorno à prática desportiva será proporcional à gravidade da doença, a intensidade da atividade esportiva e ao tempo necessário para o tratamento da infeccção que serão correlacionados ao esporte amador ou de elite.

          Unitermos: Esporte. Infecção cutânea. Pele.

 

 
EFDeportes.com, Revista Digital. Buenos Aires, Año 16, Nº 163, Diciembre de 2011. http://www.efdeportes.com/

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Introdução

    As infecções cutâneas relacionadas a atividades esportivas compreendem um grupo de manifestações que inclui as infecções fúngicas (tinea pedis, tinea glabra, onicomicose), bacterianas (principalmente furunculose), parasitárias (escabiose e leishmaniose tegumentar americana) e virais (principalmente herpes simples), podendo estar isoladas ou associadas1,2. Geralmente, essas infecções tendem a ser banalizadas, principalmente quando assintomáticas ou crônicas. Por vezes, são menosprezadas devido à falta de entendimento ou inconsciência do risco. Mais ainda, no meio desportivo, os indivíduos aprendem a conviver com dor e até com lesões, e nem sempre levam de imediato ao conhecimento médico suas dermatoses. As infecções cutâneas, além do contágio, provocam limitações nas atividades esportivas, tais como restrição das atividades, absenteísmo e incapacidade temporária. Podem se constituir em sério problema para a organização e o desempenho da equipe desportiva. Dependendo da gravidade e extensão do quadro clínico, um caso de infecção aguda ou cutânea contra-indica a participação desportiva, principalmente em esportes de contato intenso como o judo, caratê e futebol, assim como as de contato intenso limitado como voleibol e basquete3,4. A presença de processos infecciosos cutâneos durante a prática de exercícios, tanto em nível recreativo quando competitivo, pode impedir a sua realização ou reduzir o rendimento em atletas de alto desempenho. O objetivo deste estudo foi revisar as principais infeccções cutâneas relacionadas a atividade esportiva, o seu tratamento, assim como determinando o seu caráter contagioso e as formas de prevenção evitando afetar os demais componentes quando em equipe.

Infecções cutâneas

1.     Infecções cutâneas bacterianas

    As principais são o impetigo, como uma infecção superficial produzida por um estafilococo ou estreptococo, cuja transmissão se produz pelo contato pessoal através de mãos, fômites, colchões, toalhas e equipamentos desportivos5. As lesões bolhosas são geralmente causadas por Staphylococcus aureus e geralmente são mais graves, acometendo principalmente a face e membros. As lesões crostoas e não bolhosas são geralmente causadas por estreptococos. A transmissão significa um risco de contágio muito alto. O tratamento se dará através de limpeza com água, sabão neutro, seguida da aplicação de algum antibiótico tópico à base de fusidato de sódio ou mucipirona. Para a prevenção é muito importante evitar os esportes aquáticos ou de contato e seguir obrigatoriamente a norma de não compartilhar o material desportivo, assim como lavar as mãos3,5.

    A foliculite bacteriana aparece em zonas cobertas e é produzida por um estafilococo. É importante reduzir a fricção na pele do local afetado e utilizar roupas de algodão. Está indicado o uso de loções epidermolíticas e antibióticos tópicos, e por vezes é necessário o uso de quinolonas ou eritromicinas. O risco de contágio é baixo, razão pela qual se recomenda restabelecer a atividade física três a quatro dias após o início do tratamento4,5.

    O furúnculo é um abscesso cutâneo produzido por Staphylococcus aureus em um folículo piloso. Os fatores precipitantes incluem principalmente os portadores nasais da bactéria, além do uso do uniforme da equipe, os microtraumas, o suor, a pele gordurosa, a falta de higiene e, em algumas ocasiões, a pressão excessiva na pele. Pode-se utilizar antibióticos (quinolonas ou tetraciclinas), mupirocina tópica nas narinas do portador nasal, profilaxia antibiótica tópica nas narinas dos familiares e quando em concentração, para os que dormem no mesmo quarto. Deve-se evitar o calor local, pois aumenta o risco de disseminação hematogênica e, por vezes, é necessário a drenagem do pus. A participação desportiva é condicionada pela gravidade do quadro clínico6.

2.     Infecções cutâneas produzidas por vírus

    O herpes simples é uma das infecções virais mais freqüentes no desportista. Apresenta-se muito freqüentemente em lutadores e jogadores de rúgbi, principalmente na cabeça, pescoço e membros superiores. É muito contagioso para crianças. Quanto aos adultos, 95% deles já foram infectados pelo herpervirus e geralmente não desenvolvem a doença. Quando houve lesões ativas deve-se evitar esportes de contato ou natação, tanto para prevenir de infecções bacterianas secundárias, herpes gladiatorum ou mesmo pela dor no local afetado. O herpes gladiatorum é uma das formas mais infecciosas causadas pelo vírus do herpes simples, sendo transmissível por contato pele a pele. Está muito associado a esporte de contato intenso, como o judo e o MMA (mixed martial arts) devido ao stress emocional e aos traumas diretos na pele. Após iniciado o tratamento tópico (penciclovir ou aciclovir) geralmente associado ao tratamento sistêmico (aciclovir), o atleta poderá retornar às competições assim que houver melhora clínica. A profilaxia antiviral com aciclovir somente é indicado quando a dermatose é recorrente7.

    As verrugas são lesões freqüentes produzidos pelo papilomavírus, que podem localizar-se em qualquer parte da pele. O suor e a compressão facilitam o desenvolvimento de verrugas plantares ou papilomas, que são extremamentes dolorosas quando sofrem compressão ou trauma direto. No tratamento conservador, preferencial em verrugas vulgares, utiliza-se o ácido salicílico e o ácido retinóico. O tratamento para verrugas plantares deve ser mais agressivo e inclui a cauterização química, a crioterapia, a eletrocauterização, resguardando o uso da bleomicina intralesional para lesões resistentes. Contra-indica-se a vaporização com laser de CO2 devido a baixa eficácia e pelo alto custo. Todos devem ser utilizados sempre que o atleta estiver fora de período de competições1.

3.     Infecções cutâneas produzidas por fungos

    O intertrigo interdigital ou pé-de-atleta é a infecção causada por dermatófitos e bácterias, que produzem lesões interdigitais do pé muito pruriginosas e recorrentes. A bromidrose interdigital é bastante indicativo da etiologia bacteriana8. É importante saber que a prevenção será feita com uso de soluções adstringentes ou spray a base de formol para os calçados e banheiros, uso de spray antimicóticos (duas vezes ao dia), meias de algodão, tênis que permita boa aeração e secando bem as regiões entre os dedos dos pés após o banho. O tratamento será feito com cremes antimicóticos, como o ciclopirox, os imidazólicos, soluções com cloridrato de alumínio e às vezes cremes com formalina por curto período4. Nos casos de lesões recorrentes, faz necessário o uso de imidazólicos orais (fluconazol, itraconazol).

    A tinea cruris e a tinea corporis são produzidas pelo Epidermophyton floccosum e Trichophytum rubrum, que fazem surgir placas anulares ou circinadas, principalmente na região inguinal. É importante nesses casos utilizar roupa folgada e evitar umidade persistente nessas regiões. O tratamento é semelhante ao do pé-de-atleta, geralmente associado ao uso de imidazólico oral1,4.

    A pitiríase ou tinea versicolor, causada pelo Malassezia furfur, é uma doença de pele não-contagiosa, mas com grande prevalência. O local mais comum é no tronco, estendendo-se posteriormente aos ombros. No seu tratamento utiliza-se o sulfeto de selênio em forma de xampu e os cremes antimicóticos já citados. A cura produz-se antes da repigmentação, às vezes persistindo a lesão hipopigmentada podendo ser necessário o uso de fototerapia focal ou mesmo terapia fotodinâmica9.

4.     Infecções cutâneas produzidas por parasitas

    A sarna ou escabiose é uma exoparasitose produzida pelo Sarcoptes scabiei e é transmitida pelo contato direto, equipamentos ou através do contágio sexual. O prurido noturno intenso e a lesão eritematosa linear e tortuosa nas mãos e punhos facilitam o diagnóstico. Ocasionalmente surgem pápulas, vesículas, bolhas ou nódulos inflamatórios e, finalmente, uma dermatite eritematosa. É necessário tratar o atleta e todos aqueles que têm contato com ele com permetrina10. e por vezes é necessário o uso de ivermectina oral. A roupa será lavada separadamente em alta temperatura. É obrigatório interromper a prática de esportes de contato durante o tratamento4.  

    A pediculose apresenta três formas: a capitis, a corporis e a pubiana, esta mais freqüente em atletas. O tratamento é semelhante ao utilizado na escabiose. Também é imperativo suspender a prática de esportes de contato durante o tratamento4,10.

    A leishmaniose tegumentar americana é uma parasitose causada pela Leishmania sp, que nas Américas tem como principal agente etiológico a Leishmania braziliensis que pode causar lesões cutâneas ou mucosas. É muito prevalente em atletas em esporte de montanha em regiões tropicais de mata fechada como o mountain bike, alpinismo de escalada ou caminhada2. O tratamento é feito com antimônio pentavalente, devendo o atleta permanecer completamente fora das atividades esportivas por todo o período do tratamento que são de 20 dias para a leishmaniose cutânea e 30 dias para a leishmaniose mucosa. A cura somente é determinada após 90 dias do final do tratamento medicamentoso, mas o atleta pode retornar às atividades esportivas após 72h do término da medicação. Casos resistentes ao antimônio devem ser tratados com Anfotericina B em uso hospitalar11.

Infecções cutâneas e atividades esportivas

    É necessário classificar os esportes de acordo com o grau de contato ou colisão entre os participantes ou entre estes e as estruturas à sua volta e quanto à intensidade de esforço, para poder estabelecer uma base que defina a relação entre o tipo de infecção e a participação desportiva. Por isso, os esportes são classificados conforme proposto por Diaz, Guillen & Carrero4 (tabela 1).

Tabela 1. Classificação dos esportes de acordo com a intensidade do exercício e tipo de contato

 

Tabela 2. Relação de esportes e normas de autorização para a participação desportiva em relação ao tipo de esporte e tipo de infecção cutânea

    Em geral, nos casos de infecção cutânea contagiosa, é contra-indicada a participação em todos os tipos de esportes de contato intenso, limitado ou não7. Em caso de infecção não-contagiosa, será autorizada a prática de esportes nos quais não haja contato intenso, pois este contato pode agravar o quadro clínico do indivíduo por trauma ou por infecção secundária8. Finalmente, nas doenças onde o tratamento medicamentoso pode causar miopatias (gentamicina, antimônio) ou arritmias cardíacas (antimônio, eritromicina, clindamicina) deve-se evitar esportes que necessitem de grandes esforços físicos11.

    Além dessa classificação, é necessário levar em conta algumas regras para o tratamento e a recuperação das doenças infecciosas de um atleta, principalmente se for de elite. A primeira premissa nesses casos é que a recuperação deve ser rápida. Sempre serão utilizados os medicamentos "permitidos" que não estejam presentes nas listas de substâncias proibidas. Serão utilizados medicamentos não agressivos e, dentro do possível, os que não prejudiquem o desempenho. Finalmente, se evitará o uso de medicamentos de uso contínuo4.

    Os profissionais de saúde do esporte devem monitorar os indivíduos e seu fatores agravantes para infecção cutânea promovendo ações de prevenção primária que incluem medidas de higiene, assim como ações secundárias que se dão pelo tratamento rápido e eficiente das dermatoses infecciosas e suas complicações. Além disso, conhecer também as normas que regulam o retorno à atividade física e, em muitos casos, o afastamento ou a participação quando em nível competitivo. Por fim, o retorno à prática desportiva será proporcional à gravidade da doença, a intensidade da atividade esportiva e ao tempo necessário para o tratamento da infeccção que serão correlacionados ao esporte amador ou de elite.

Referências

  1. Pleacher MD, Dexter WW. Cutaneous fungal and viral infections in athletes. Clin sports Med 2007; 26(3):397-411

  2. Schubert S, Grimm M. Travel medicine. Internist (Berl). 2009 Jul;50(7):841-51.

  3. Kolbach RM, Cossio TML, Saenz de Santa Maria PML, Carreno ON, de la Cruz FC, Fajre WX. Dermatosis em los desportistas. Rev Med Chil 2008; 136(2):249-255.

  4. Díaz JFJ, Guillén JR, Carrero JAT. Prevalencia de enfermedades infecciosas en el deporte. Arch Med Deporte 1999; 72:343-8.

  5. Bowers AL, Huffman GR, Sennett BJ. Methicillin-resistant Staphylococcus aureus infections in collegiate football players. Med Sci Sports Exerc. 2008; 40(8):1362-7.

  6. Levy JA. Common bacterial dermatoses: protecting competitive athletes. Phys Sportsmed. 2004; 32(6):33-9.

  7. Meulener M, Smith BL. Herpes gladiatorum with ocular involvement in a mixed martial arts fighter. Cutis. 2011; 87(3):146-7.

  8. Bonnetblanc JM, Bédane C. Erysipelas: recognition and management. Am J Clin Dermatol. 2003; 4(3):157-63. Review.

  9. Qiao J, Li R, Ding Y, Fang H. Photodynamic therapy in the treatment of superficial mycoses: an evidence-based evaluation. Mycopathologia. 2010; 170(5):339-43.

  10. Winokur RC, Dexter WW. Fungal infections and parasitic infestations in sports: expedient identification. Phys Sportsmed. 2004; 32(10):23-33.

  11. Ministério da Saúde. Manual de vigilância epidemiológica de leishmaniose tegumentar americana. 2nd ed. 2007 - 182 pp.

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