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Resposta do cortisol sérico de HIV-1 

soropositivos expostos ao exercício submáximo

La respuesta del cortisol sérico de HIV-1 seropositivos expuestos al ejercicio submáximo

 

Especialista em Cinesiologia. Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS)

Aluno do programa de pós-graduação (Mestrado) em Bioquímica

da Fundação Universidade Federal do Pampa (UNIPAMPA)

Leandro Cattelan Souza

leandrocattelan@hotmail.com

(Brasil)

 

 

 

 

Resumo

          Introdução: O vírus da imunodeficiência humana infecta, preferencialmente, os linfócitos T-auxiliares e as células apresentadoras de antígenos, devido a sua afinidade aos receptores CD4 e aos co-receptores CCR5 e CXCR4. À medida que estas células vão sendo depletadas, o sistema imune fica comprometido e o indivíduo suscetível a infecções oportunas. Evidências sugerem que o exercício pode causar uma linfocitopenia transitória tanto em soropositivos como soronegativos. O cortisol foi referido como agente hormonal responsável por essa imunosupressão transitória. Objetivos: Este estudo pretende verificar a resposta do cortisol sérico de HIV-1 soropositivos expostos ao exercício submáximo e discutir uma possível correlação deste com parâmetros imunológicos. Metodologia: Seis adultos não-treinados, portadores do HIV-1, foram expostos a um exercício com intensidade que abarca a faixa de 65-80% da reserva cronotrópica por 15 minutos. Foram coletadas amostras sangüíneas pré e pós-teste para análise da cortisolemia. Resultados: Foi encontrado um decréscimo nos valores séricos de cortisol após a realização do exercício (pré-teste 20,5 mcg/dl; pós-teste 14,7 mcg/dl); no entanto, a diferença não foi estatisticamente significativa (Wilcoxon p = 0,14). As mulheres tiveram uma maior queda da cortisolemia em relação aos homens; porém, sem significância estatística (Mann-Whitney p = 0,70. Não foi encontrado uma correlação significativa do cortisol com as variáveis idade, percentual de gordura, massa magra, freqüência cardíaca máxima, VO2max. e CD4 pré-teste. Conclusão: Este estudo sugere que o exercício de orientação aeróbia seguindo os protocolos aqui empregados não é capaz de provocar uma resposta hipercortisolemiante em HIV-1 infectados não-treinados. Este achado é importante, pois esta população é acometida pelo catabolismo protéico e acúmulo de gordura centrípeta. Ademais, por razões endrocrinoimunológicas, pode-se inferir que o exercício submáximo seja seguro para esta população.

          Unitermos: Exercício. HIV/AIDS. Sistema imunológico.

 

 
EFDeportes.com, Revista Digital. Buenos Aires, Año 16, Nº 162, Noviembre de 2011. http://www.efdeportes.com/

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Introdução

    Do ponto de vista imunopatogênico, o HIV age infectando e destruindo principalmente os linfócitos T-auxiliares e as células apresentadoras de antígenos, como os macrófagos; leucócitos estes de importante incumbência fisiológica (TORTORA & GRABOWSKI, 2002; KUBY, 1997).

    Para que o HIV infecte essas células, ele precisa ligar-se a receptores de superfície CD4, presentes principalmente nos linfócitos T-auxiliares e macrófagos e, não obstante, a co-receptores quinoquinas, cujos principais são o CCR5 (macrófagos) e CXCR4 (linfócitos) (ALKHATIB et al, 1996; DORANZ et al, 1996; WU et al, 2006).

    A ligação do vírus aos receptores e co-receptores ocorre através da interação de suas proteínas antigênicas, a gp 120 e a gp 41, as quais, respectivamente, permitem a fusão do vírus à célula e a posterior endocitose do nucleocápside viral ao citoplasma hospedeiro (KUBY, 1997; MONTAGNIER, 1994).

    À medida que a contagem de células T-CD4+ diminui vertiginosamente, chegando ao valor inferior a 200 células/mm3, a AIDS pode ser diagnosticada, estando o soropositivo vulnerável a doenças oportunistas (GARRET JR. & KIRKENDALL, 2003).

    Em termos restritos, os linfócitos T-CD4+ agem secretando citocinas, como o interferon-gama ativador de macrófagos, as interleucinas ativadoras da produção de anticorpos e células T-citotóxicas e o crescimento de eosinófilos e mastócitos, assim como fatores estimuladores de colônias, que amplificam a leucocitopoiese na medula óssea (SILVERTHORN, 2003). Em outras palavras, os linfócitos T-CD4+ possuem incumbência de imunorregulação, ativando tanto a imunidade mediada por células como humoral-mediada (GUYTON & HALL, 1998).

    Segundo Pedersen & Hoffman-Goetz (2000) o exercício físico moderado a intenso induz um recrutamento das subpopulações de linfócitos teciduais para o componente vascular, com estes imunócitos permanecendo ligeiramente aumentados após o exercício. No entanto, durante um esforço submáximo alguns estudos apresentam queda na contagem de linfócitos T-CD4+, o que pode indicar que o estresse induzido pelo exercício pode ocasionar linfocitopenia. (PEDERSEN & HOFFMAN-GOETZ, 2000).

    Nesse sentido, Rosa & Vaisberg (2002) exprimem que ocorre uma diminuição da proliferação linfocitária após período de exercício extenuante, o qual é decorrente, principalmente, da ação da epinefrina e do cortisol. Com efeito, Weineck (2005) exprime que ocorre uma leucocitose no período agudo do exercício, resultado do efeito quimiotáxico das catecolaminas e, sobretudo, do cortisol, fazendo com que tanto células exterminadoras naturais como demais linfócitos migrem do endotélio vascular para a corrente sangüínea. Subseqüentemente, ocorrer-se-ia uma diminuição das concentrações séricas de leucócitos, fenômeno denominado de “homing”, no qual os leucócitos migrariam de volta às vasculaturas e aos tecidos linfáticos. Deste modo, ocorreria uma “open window” imunológica de algumas horas.

    Okutsu e col. (2004) estudaram o efeito deste glicocorticóide em cultura, ao coletar plasma de sete homens saudáveis após exercício extenuante e misturá-lo com células mononucleares. Os resultados mostraram que os níveis de cortisol endógeno eram capazes de aumentar o número de receptores CXCR4 em linfócitos, podendo ser o mecanismo responsável pela linfocitopenia encontrada pós-exercício. Este achado seria contraproducente, especialmente para indivíduos HIV-infectados, pois tornar-se-iam os linfócitos mais vulneráveis ao acoplamento virológico.

    Especificamente, o exercício físico agudo é capaz de produzir uma resposta bifásica do sistema imunológico. Desse modo, o exercício físico de alta intensidade (acima de 60% do VO2max) é capaz de aumentar em 50 e até 100% os níveis de leucócitos no período pós-imediato do exercício; inversamente, ocorre uma queda em 30-50% dos leucócitos circulantes no período imediato tardio do exercício, ocorrendo a expensas da epinefrina e do cortisol, sendo que a epinefrina sérica diminui logo após a interrupção do exercício e o cortisol permanece elevado por mais de duas horas (ROSA & VAISBERG, 2002). Os mesmos autores relatam uma diminuição da proliferação linfocitária em maratonistas após uma prova exaustiva, permanecendo por várias horas e conseqüente da cortisolemia elevada pós-exercício.

    Evidências sugerem que HIV soropositivos apresentam alterações nos hormônios andrenocorticais, reportando estados de hipercortisolemia (CHRISTEFF et al, 1997; CLERICI et al 1997; CHRISTEFF et al, 1992), o que poderia ser tanto causa como conseqüência do catabolismo protéico-imunológico e protéico-miológico e osteológico encontrados nesses indivíduos.

    O objetivo deste estudo é verificar o impacto do exercício submáximo na cortisolemia de HIV-1 soropositivos, discutindo uma possível implicação endocrinoimunológica, com base em preceitos teóricos.

Metodologia

Delineamento da pesquisa

    O estudo é de delineamento transversal, do tipo pré-experimental, com abordagem quanti-qualitativa.

População e amostra

    A amostra da pesquisa é configurada como não-probabilística por conveniência, composta por 6 voluntários portadores de HIV tipo 1, dos quais 3 são homens com média de idade de 43 anos e 3 são mulheres com média de idade de 34 anos. A amostra pertence a uma população de 900 soropositivos do COAS (Centro de orientação e apoio sorológico) da cidade de Uruguaiana-Rs.

    Os indivíduos são todos sedentários, eutróficos, com contagem de células CD4+ superior a 200 células/mm3 e não apresentam co-morbidades ou restrição ao exercício físico.

Protocolo experimental

    Inicialmente, os indivíduos foram submetidos a uma avaliação morfofuncional para determinação da composição corporal e aptidão cardiorrespiratória. Uma semana depois, os indivíduos foram submetidos a uma carga aguda de exercício aeróbio em esteira rolante (caminhada-corrida) pelo tempo de 15 minutos, em intensidade submáxima, precedido de um aquecimento de 10 minutos em zona subaeróbia.

    Foram coletadas amostras de sangue antes e imediatamente após a sessão de exercício.

    A primeira coleta foi realizada às 8h com os indivíduos em jejum, logo após a coleta os indivíduos receberam um alimento (barra de cereais) com índice glicêmico de 78 e carga glicêmica de 14,1, de acordo com Foster-Powell (2002) e Brand-Miller et al (1995), com a finalidade de que não realizassem o exercício em jejum.

Avaliação morfofuncional

    Foram realizadas mensurações de massa corporal, estatura, IMC e composição corporal (modelo bicompartimental), sendo esta, através do protocolo de 3 dobras de Pollock (1975). A avaliação funcional constou do teste submáximo de caminhada de 1 milha de Rockport Walking Institute (1986) para mensuração indireta do VO2max.

Coleta e análise do sangue

    Foram coletados de cada indivíduo 4 ml de sangue da veia cefálica, pelo método à vácuo (vaccutainer) no período pré-teste (-30 minutos) e pós-teste (+ 15 minutos). O sangue coletado foi imediatamente centrifugado a 3.000 rpm por 10 minutos e acondicionado em tubos eppendorf e mantidos refrigerados para posterior análise. O cortisol foi determinado pelo método de quimioluminescência.

Desenho de estudo

Resultados

Características antropométricas

    Um panorama ilustrativo dos resultados pode ser consultado na tabela 01. As médias dos indicadores antropométricos da amostra são: massa corporal média de 63,6 kg (± 15,9 kg), altura média de 162,4 cm (± 12,3 cm), IMC de 23,6 kg/m2 (± 2,4 kg/m2), percentual de gordura de 20% (± 11,5 %), massa isenta de gordura de 51,73 kg e massa gorda de 12,09 kg (± 6,24 kg).

Tabela 01. Características antropométricas

Aptidão cardiorrespiratória

    Do ponto de vista cardiovascular e respiratório, nas variáveis analisadas, os participantes da pesquisa possuíam as seguintes médias: freqüência cardíaca de repouso de 66,3 bpm (± 7,71 bpm), freqüência cardíaca de reserva de 114,1 bpm (± 8,28 bpm), freqüência cardíaca máxima de 181,42 (± 6,55 bpm), pressão arterial sistólica de repouso de 88,33 mmHg (± 11,69 mmHg), pressão arterial diastólica de repouso de 58,33 mmHg (± 7,52 mmHg) e VO2max. de 38,01 ml.kg.min. (± ml.kg.min.). Uma visão mais detalhada pode ser vista na tabela 02.

Tabela 02. Características cardiopulmonares

Indicadores imunológicos, virológicos e farmacológicos

    Através da leitura dos prontuários dos pacientes, puderam-se exprimir as presentes valorações.

Tabela 03. Indicadores imunológicos, virológicos e farmacológicos da amostra

Resposta do cortisol no teste experimental

    Durante o teste experimental, as variáveis fisiológicas agudas possuíam intensidade correspondente a 65-80% da FC de reserva e duração de 15 minutos. Neste intervalo percentual, a faixa cronotrópica real teve a média de 140-157 bpm (± 4,88 – 4,96 bpm). O teste experimental foi precedido por alongamento ativo-estático para as cadeias musculares anterior e posterior do tronco e extremidades e um aquecimento a 40-50% da FC de reserva por 10 minutos, com cronotropia real de 111-123 bpm (± 5,60-5,38 bpm). A faixa de velocidade média teve um mínimo de 5,5 km/h (± 1,04) e um máximo de 7,3 km/h (± 1,03). Detalhes completos podem ser visualizados na tabela 04.

Tabela 04. Informações da intensidade do teste experimental

    Antes da realização do teste (valores pré-teste), a amostra possuía cortisolemia média de 20,5 mcg/dl (± 4,48 dcg/dl). Após o teste (valores pós-teste), a média da cortisolemia foi de 14,7 mcg/dl (± 4,47 mcg/dl), representando uma queda média de 5,7 mcg/dl (± 8,14 mcg/dl). A tabela 05 ilustra detalhadamente esses resultados.

Tabela 05. Valores da cortisolemia pré e pós-teste

    Fazendo uma comparação intergênero, os pacientes do gênero masculino tiveram uma média pré-teste de 19,4 mcg/dl (± 2,6 mcg/dl) e pós-teste de 15,2 mcg/dl, resultando num decréscimo de 4,2 mcg/dl (± 3,1 mcg/dl). A tabela 06 (abaixo) resume estes valores.

Tabela 06. Valores da cortisolemia pré e pós-teste – grupo masculino

    Os pacientes do gênero feminino, por sua vez, demonstraram cortisolemia pré-teste média de 21,5 mcg/dl (± 6,32 mcg/dl) e pós-teste de 14,3 mcg/dl (± 6,93 mcg/dl), representando uma queda de 7,2 mcg/dl (± 12,2 mcg/dl); i.e., uma queda cortisólica superior a dos homens em 1,5 mcg/dl. A tabela 07, abaixo, evidencia estes valores.

Tabela 07. Valores da cortisolemia pré e pós-teste – grupo feminino

Discussão

Resposta do cortisol

    Os pacientes passaram de um valor cortisolêmico de repouso (em jejum) na média de 20,5 mcg/dl (± 4,48 mcg/dl) para um valor médio de 14,7 mcg/dl (± 4,46 mcg/dl) imediatamente após o teste, representando um decréscimo de 5,7 mcg/dl (± 8,14mcg/dl) na cortisolemia.

    O ritmo circadiano da liberação pulsátil do cortisol para as primeiras horas da manhã – dentro de parâmetros fisiológicos – resulta em uma cortisolemia mais elevada (8h: 5,0 a 25,0 mcg/dl segundo o laboratório Instituto H. Pardini).

    Nota-se, portanto, que os pacientes estavam próximos ao limite máximo, com uma paciente (número 3), estando em estado hipercortisolêmico (27,5 mcg/dl); a cortisolemia sofreu decréscimo, majoritariamente, para valores medianos após a intervenção aguda com exercício de endurance.

    Do ponto de vista fisiológico, o exercício submáximo realizado provocou queda considerável nos valores de cortisol sérico dos pacientes. Ressaltam-se as pacientes 2 e 3 que tiveram queda média de 14 mcg/dl. No entanto, estatisticamente, esse decréscimo cortisolêmico não foi significativo (p = 0,14), assumindo 5% de significância, conforme o teste de ordenação sinalizada de pares combinados de Wilcoxon. Vide gráfico 01 para detalhes ilustrados.

Gráfico 01. Ilustração da resposta do cortisol ao teste submáximo. Resultados expressos em mcg/dl de sangue

    Sob uma perspectiva comparativa, as mulheres expressaram uma maior queda cortisolêmica em relação aos homens (queda média de 7,3 mcg/dl contra 4,3 mcg/dl). Fisiologicamente, ambos os grupos obtiveram resultados consideráveis de resposta do cortisol a sessão de exercício.

    Em contrapartida, sob o prisma estatístico (teste de Wilcoxon com significância de 5%), a resposta tanto dos homens quanto das mulheres não foi estatisticamente significativa (p = 0,10 e p = 0,28, respectivamente). Não obstante, utilizando o teste U de Mann-Whitney, não se verificou uma diferença significativa na resposta do cortisol intergêneros (homens vs. mulheres), assumindo grau de significância de 5% (gráficos 02, 03 e 04).

Gráfico 02. Ilustração gráfica da resposta do cortisol dos pacientes do gênero feminino. Resultados em mcg/dl de sangue.

 

Gráfico 03. Ilustração gráfica da resposta do cortisol dos pacientes do gênero masculino. Resultados em mcg/dl.

 

Gráfico 04. Comparação intergênero da resposta cortisólica. Valores em mcg/dl.

    A resposta decrescida do cortisol ao exercício submáximo encontrada neste estudo vai ao encontro das suposições literárias acerca de uma hipotética queda deste glicocorticóide durante exposições agudas a um trabalho físico moderado ou de curta duração em indivíduos soronegativos (GARRET JR. & KIRKENDALL, 2003; MACARDLE e col., 2003; FOSS & KETEYIAN, 2001).

    Não obstante, este achado assemelha-se às evidências de Ortega et al (1992) que encontraram um decréscimo na cortisolemia em homens jovens destreinados após submetê-los a um exercício em bicicleta ergométrica por 15 minutos a uma intensidade correspondente a 50% do VO2max..

    Partindo do pressuposto dos efeitos catabólicos de níveis elevados do cortisol, os achados do presente estudo, embora não demonstrem queda significativa na cortisolemia após intervenção com o exercício, demonstram que a faixa cronotrópica correspondente a 65-80% da FC de reserva não foi capaz de elevar os níveis de cortisol da amostra sob análise.

    Nesse sentido, pode-se inferir, a partir do que fora cunhado por Weineck (2005), Rosa & Vaisberg (2002) e Pedersen & Hoffmann-Goetz (2000), que uma resposta deletéria nas subpopulações linfocitárias do tipo T não tenha ocorrido.

    Esta hipótese pode ser fomentada pelo que fora documentado por Shinkai et al (1996), onde adultos sedentários submetidos a exercício em bicicleta estacionária por 60 min. a 60% do VO2max foram divididos em dois grupos, os que tiveram resposta do cortisol e os que não tiveram. Ambos os grupos mostraram granulocitose, linfocitose e monocitose durante o exercício; no entanto, durante o período de recuperação imediato do exercício, o grupo sem resposta significativa do cortisol evidenciou uma contagem total de linfócitos em níveis levemente infrabasais, ao passo que o grupo com resposta significativa do cortisol evidenciou uma linfocitopenia após 2 horas e meia da interrupção do exercício.

    De fato, uma leucocitose induzida pelo exercício depende da via hormonal para sua ocorrência, sendo o cortisol um destes hormônios; no entanto, outros hormônios como as catecolaminas e as endorfinas também são responsáveis pelo recrutamento (quimiotaxia) intravascular durante o exercício (PEDERSEN & HOFFMANN-GOETZ, 2000).

    Questiona-se também, um possível aumento do cortisol sérico algumas horas após a coleta realizada, pois o cortisol além de possuir importante função metabólica durante o exercício, participa da recuperação após o mesmo, mostrando-se elevado até ou por mais de 2 horas (WEINECK, 2005; DUCLOS e col., 2003; ROSA & VAISBERG, 2002).

    Todavia, não se encontrou evidências de que o cortisol responda bifasicamente ao exercício, com flutuações de acréscimo e decréscimo na circulação. Em vista disso, o que se hipotetiza aqui é que estes níveis de cortisolemia não tenham sofrido um aumento exponencial ou permanecendo a níveis suprafisiológicos no período pós-imediato tardio do teste.

    Objetivando verificar uma interação entre as variáveis cineantropométricas e imunológicas da amostra, analisou-se através do teste não-paramétrico de Spearman a interação do cortisol pré e pós-exercício com a freqüência cardíaca máxima, idade, percentual de gordura, massa magra, VO2max. e contagem de CD4+ pré-teste, em virtude de se tratarem de indicadores morfofisiológicos de aptidão física. A tabela 08 demonstra os resultados das correlações.

    Analisando, portanto, a relação do cortisol sérico pré-teste, verifica-se uma correlação positiva, porém sem significância estatística, deste com o percentual de gordura (Spearman r = 0,25 e p = 0,62).

    Logo, valores cortisolêmicos em repouso foram maiores nos indivíduos do gênero feminino (mulheres = 21,5 mcg/dl; homens = contra 19,4 mcg/dl), assim como o foram os valores de percentual de gordura (28,64% contra 11,4%), o que está em concordância com o promulgado por Haas et al (2007), Epel et al (2000) e Moyer et al (1997) que sustentam a interação entre cortisol e maior acúmulo de gordura e redistribuição da adiposidade.

    No que concerne ao cortisol pós-exercício, salienta-se a correlação positiva sem significância estatística deste com a variável idade (Spearman r = 0,31 e p = 0,54), o que pode explicar, teoricamente a menor queda dos níveis séricos de cortisol dos sujeitos masculinos, os quais possuem média de idade superior às mulheres (43 anos contra 34 anos) – conforme WILMORE & COSTILL (2001) indicando a idade como uma variável relacionada com as respostas orgânicas.

Tabela 08. Correlação cortisol vs. variáveis cineantropométricas e imunológicas

    Acerca dos mecanismos fisiológicos que levaram a queda do cortisol sérico, exprimir-se-ão cinco hipóteses: (1) atraso no alcance no pico do cortisol; (2) aumento do turnover cortisólico; (3) inibição endorfínica da liberação de corticotrofina; (4) intervenção da dieta pré-exercício; (5) resposta adrenocortical prejudicada; (5) hipótese multifatorial.

    O atraso no pico do cortisol pode ter acontecido isolada ou concomitantemente ao aumento do turnover do cortisol, em razão da intensidade moderada a intensa do exercício, assim como de sua duração não ser prolongada (GARRET JR. & KIRKENDALL, 2003; MCARDLE e col. 2003; FOSS & KETEYIAN, 2000).

    Uma inibição da liberação de corticotrofina pode ter ocorrido em razão do efeito inibitório hipotalâmico de opióides endógenos, como a endorfina que mostra aumento frente ao exercício (KANALI & KRUEL, 2001 apud GUYTON & HALL, 1997 e WILMORE & COSTILL, 2001).

    A dieta pré-exercício, apesar de possuir baixa carga glicêmica, pode ter interferido na resposta do cortisol, fenômeno sustentado por Kanaley et al (2001) apud Brandenberger e & Follenius (1975) e Brandenberger e col. (1982) que advogam que a resposta do cortisol ao exercício precedido de dieta pode ser suprimida.

    Em outra perspectiva, Mayo et al (2002) reportam que indivíduos HIV-soropositivos podem possuir disfunções subclínicas no eixo hipotálamo-hipófise-adrenal, mostrando valores superiores de cortisol do que indivíduos soronegativos durante o repouso. Nesse sentido, conjetura-se que esta população possa ter uma reserva adrenal diminuída em vista da cortisolemia elevada, possuindo uma resposta adrenocortical atenuada durante o exercício.

    Finalmente, teoriza-se a possibilidade de uma interatuação das hipóteses supramencionadas.

    Portanto, o exercício submáximo de média duração aliado a uma dieta pré-exercício de baixa carga glicêmica parece ser capaz de evitar uma resposta excessiva do cortisol de HIV-infectados, demonstrado por este estudo.

    Nesse contexto, o sujeito 1 foi o único a mostrar aumento do cortisol dentre os pacientes. Acredita-se que isto tenha ocorrido por ter sido o primeiro a participar do teste, ficando apenas 30 minutos em repouso após a refeição pré-teste antes de ser submetido ao teste. Os demais pacientes tiveram um tempo maior, superior aos 30 minutos, o que pode ter sido suficiente para estabilizar os níveis insulínicos e glicêmicos antes da realização do esforço físico.

    Desafortunadamente, por motivos que ultrapassam a alçada de um pesquisador e orientadores, não foi possível obter os resultados dos parâmetros imunológicos e virológicos objetivados a serem investigados com a interação da cortisolemia, motivos estes já comentados anteriormente.

    Espera-se intensamente poder dar continuidade a este estudo, assim que se tenha disponibilidade de recursos de infra-estrutura e sistema político-científico sólidos e substanciais.

    Este estudo sugere que o exercício submáximo realizado na faixa de 65-80% da reserva cronotrópica não é capaz de promover um efeito hipercortisolemiante em HIV-1 infectados, podendo-se inferir, com base na literatura revisada, que não provoque efeitos deletérios do ponto de vista imunológico.

    Mais estudos precisam ser realizados para a investigação da resposta do cortisol ao exercício em HIV-1 soropositivos, assim como é necessário investigar a correlação entre os sistemas neuroendócrino e imunológico para que, portanto, consigamos propiciar maiores informações fisiológicas para a planificação e quantificação do treinamento para esta população.

    Por fim, a realização do treinamento físico de orientação aeróbia e anaeróbia deve ser estimulado para propiciar melhor qualidade de vida aos soropositivos.

Conclusões

  1. Este estudo sugere que o exercício de orientação aeróbia realizado em intensidade submáxima e com carga de característica progressivo-regressiva não é capaz de provocar uma resposta hipercortisolemiante em HIV-1 soropositivos;

  2. Este achado é importante, pois evidencia que o exercício submáximo não provoca um incremento no catabolismo normalmente encontrado nesta população.

  3. Em razão de vários estudos evidenciarem a proporcionalidade direta do cortisol com linfocitopenia em soronegativos, pode-se – com base no achado desta pesquisa – inferir que o exercício submáximo em aerobiose seguindo as características deste estudo não é deletério para o sistema imune da população em apreço;

  4. Por fim, salienta-se a necessidade de estudos que analisem a correlação de hormônios como cortisol e catecolaminas com o perfil imune e virêmico de HIV-1 soropositivos no intuito de elucidar as regulações endocrinoimunes destes indivíduos frente a exercício de diferentes intensidades, a fim de alicerçar a prescrição do exercício. Sugere-se, também, a padronização do tempo da refeição pré-teste para todos os indivíduos e a coleta sangüínea pós-teste em diferentes intervalos de tempo ao longo de 48-72 horas.

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EFDeportes.com, Revista Digital · Año 16 · N° 162 | Buenos Aires, Noviembre de 2011
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