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A Educação Física no ensino superior do Brasil

Educación Física en la educación superior en Brasil

Physical Education in higher education in Brazil

 

Professor Doutor da Secretaria de Educação do Estado de São Paulo

Pesquisador, membro da equipe da USP do Núcleo de Estudos

Ensino e Pesquisa do Programa de Assistência

Primária de Saúde Escolar, PROASE

José Eduardo Costa de Oliveira

prof.zedu@usp.br

(Brasil)

 

 

 

 

Resumo

          A universidade é uma instituição pluridisciplinar de formação dos quadros de profissionais de nível superior, de pesquisa, de extensão e de domínio e cultivo do saber humano. Ela provê educação, tanto terciária (graduação) quanto quaternária (pós-graduação) e gozam de autonomia para executar suas finalidades, em estrita observância ao texto constitucional (BRACHT e CRISÓRIO, 2003). Na intencionalidade de discutir e analisar a Educação Física no ensino superior brasileiro, o presente ensaio apresenta duas perspectivas para aqui tratar o tema. Na primeira, discutindo os processos de formação inicial e continuada, relacionadas à Reforma da Educação Superior no Brasil, e suas interfaces com as Diretrizes Curriculares da Educação Física; na segunda, discuti os principais modelos de currículo de formação profissional em vigor na atualidade. Numa perspectiva de uma análise conclusiva, o presente ensaio assevera que algumas críticas e limitações podem ser tecidas após essas considerações. Entre elas, que o currículo técnico-científico promoveu mudanças importantes na EF brasileira, ao introduzir novos conhecimentos de base científica e filosófica, e também ao desestabilizar as forças conservadoras que se apoiavam na tendência tradicional-esportiva. E, conforme se mencionou – é mais viável que o tradicional desportivo. No entanto, algumas críticas também são passiveis de serem tecidas, pois, quando aparece na sua forma – pura – corre o risco de não contribuir para a "vivencia" das experiências práticas durante as aulas na graduação. Acerca das Diretrizes Curriculares da Educação editadas, conclui-se que através das diversas resoluções que foram citadas e discutidas ao longo do texto, que as mesmas estão inseridas num complexo de reforma da educação superior no Brasil, e expressam a reformulação por qual passa todo o Estado brasileiro e coadunam com o projeto de formação humana, construído pela classe hegemônica, com vistas à formação do cidadão trabalhador adaptável as novas demandas do capital.

          Unitermos: Educação Física. Ensino Superior. Brasil. Formação profissional.

 

Resumen

          La universidad es una institución de formación multidisciplinar de profesionales de educación superior, de investigación, de extensión y de dominio y cultivo del conocimiento humano. Proporciona educación, tanto en el nivel de grado y posgrado y disponen de autonomía universitaria para llevar a cabo sus propósitos, en estricto cumplimiento con el texto constitucional (BRACHT y CRISÓRIO, 2003). Con el propósito de debatir y analizar la Educación Física en la educación superior en Brasil, este trabajo presenta dos enfoques para abordar el tema. En primer lugar, discutir los procedimientos para la formación inicial y permanente relacionados con la Reforma de la Educación Superior en Brasil, y sus vínculos con las Directrices Curriculares de Educación Física; en segundo lugar, discute los principales modelos de currículos de formación profesional vigentes en al actualidad. Desde la perspectiva de un análisis definitivo, este ensayo afirma que algunas críticas y limitaciones pueden ser articuladas después de estas consideraciones. Entre ellas, que el currículo científico-técnico promovió importantes cambios de la EF en Brasil, al introducir nuevos conocimientos de base científico y filosófico, y también para desestabilizar a los sectores conservadores que se basaban en la tendencia tradicional-deportiva. Y, como se ha mencionado, es más viable que lo tradicional deportivo. Sin embargo, algunas críticas también son susceptibles de ser articuladas, porque cuando aparece en su forma pura se corre el riesgo de no contribuir a la “vivencia” de las experiencias prácticas durante las clases en la graduación. Sobre las Directrices Curriculares de Educación publicadas, se concluye que a través de las diversas resoluciones que se han citado y debatido a lo largo todo el texto, que las mismas están inmersas en un complejo de reforma de la educación superior en Brasil, y expresan la reformulación por la cual atraviesa todo le Estado brasileño y son coherentes con el proyecto de la formación humana, construida por la clase hegemónica, con miras a la formación del ciudadano trabajador adaptables a las nuevas demandas del capital.

          Palabras clave: Educación Física. Educación Superior. Brasil. Formación.

 

Abstract

          The university is an institution of multidisciplinary training for professionals with higher education, research, extension and field and cultivation of human knowledge. It provides education at both tertiary (undergraduate) and quaternary (graduate) and enjoy autonomy to carry out its purposes, in strict compliance with the constitutional text (BRACHT and CRISÓRIO, 2003). The intent of discussing and analyzing the physical education in higher education in Brazil, this paper presents two approaches to address the issue here. At first, discussing the procedures for initial and ongoing training related to the Higher Education Reform in Brazil, and their interfaces with the Curriculum Guidelines of Physical Education on Monday to discuss the main models of training curricula in place today. From the perspective of a definitive analysis, this essay asserts that some criticisms and limitations can be woven after these considerations. Among them, the scientific-technical curriculum promoted important changes in EF in Brazil, to introduce new knowledge base of science and philosophy, and also to destabilize the conservative forces that were based on trend-traditional sports. And, as mentioned - is more viable than the traditional sports. However, some critics also are liable to be woven, because when it appears in your way - pure - is at risk of not contributing to the "experience" of practical experience in class at graduation. About Curricular Education edited, it is concluded that through the various resolutions that have been cited and discussed throughout the text, which they are embedded in a complex reform of higher education in Brazil, and express the reformulation which passes all Brazilian state and are consistent with the design of human, built by the hegemonic class, with a view to training the citizen worker adaptable to the new demands of capital.
          Keywords: Physical Education. Higher Education. Brazil. Training.

 

 
EFDeportes.com, Revista Digital. Buenos Aires, Año 16, Nº 160, Septiembre de 2011. http://www.efdeportes.com/

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Introdução

    A universidade é uma instituição pluridisciplinar de formação dos quadros de profissionais de nível superior, de pesquisa, de extensão e de domínio e cultivo do saber humano. Ela provê educação, tanto terciária (graduação) quanto quaternária (pós-graduação) e gozam de autonomia para executar suas finalidades, em estrita observância ao texto constitucional (BRACHT e CRISÓRIO, 2003).

    Porém, este direito não proíbe o Estado de verificar o uso desta prerrogativa nas atividades que lhes são próprias.

    O crescimento do ensino superior brasileiro apresenta números significativos, especialmente pela participação do setor privado, onde os cursos de licenciatura e de graduação integram este contexto que se complementa na expansão da pós-graduação (lato e stricto-senso), ao apresentar um crescimento de aproximadamente quatrocentos por cento (BETTI, 2001).

    Como em outras áreas, a solução encontrada tem sido a regulação governamental através de processos de avaliação de instituições, cursos e alunos. Contudo, neste período, a própria área sofreu grandes transformações, a exemplo da regulamentação da profissão, o surgimento de novas áreas de atuação, a transcendência para alem da Educação Física escolar, a extensão dos seus benefícios para todas as idades, e cisão entre o bacharelado e a licenciatura, a criação dos conselhos de Educação Física, e, finalmente, mudanças nas próprias diretrizes curriculares nacionais, que ainda apresentam algumas indefinições (HUNGER In: HADDAD, 2006).

    Nesse sentido, Educação Física no ensino superior também se constitui desde a década de 80, numa questão crucial para a área no Brasil, tendo sido objeto de inúmeras publicações e debates sobre suas posições epistemológicas, metodológicas, avaliativas e da tão discutida crise de identidade da área.

    Considerando o exposto, e, na intencionalidade de discutir e analisar a Educação Física no ensino superior brasileiro, o presente ensaio apresenta duas perspectivas para aqui tratar o tema. Na primeira, discutindo os processos de formação inicial e continuada, relacionadas à Reforma da Educação Superior no Brasil e suas interfaces com as Diretrizes Curriculares da Educação Física; na segunda, discuti os principais modelos de currículo de formação profissional em vigor na atualidade.

A formação do profissional de Educação Física

    Nesse mesmo ínterim, inicia-se considerando que, nas últimas décadas, com o surgimento de um novo panorama educacional, as mudanças no sistema de ensino se acentuaram e o ensino superior não ficou à margem deste processo de intensa transformação.

    Novos níveis e modalidades de educação emergiram, a exemplo da EAD (educação a distancia – nas modalidades de graduação e de pós-graduação), a ampliação do número de docentes, o aumento da oferta de cursos, a abertura de novas instituições de ensino superior (IES), bem como o maior número de alunos, que estabeleceram um contexto de crescente demanda e competitividade no setor.

    É também neste período que se verifica uma extraordinária revolução no campo do conhecimento, quer pelo desenvolvimento de novas formas, novos meios de produção e disseminação de informações, através do uso de modernas tecnologias.

    Contudo, este processo dinâmico resultou em novos desafios para a Educação Física, entre eles, o de estabelecer a harmonia no crescimento do ensino superior, no que diz respeito à conciliação de aspectos quantitativos e qualitativos, além de considerar o papel crucial que a educação tem para o desenvolvimento do país.

    Assim, a formação profissional, para o presente ensaio é entendida como um processo sempre inacabado, em constante movimento de reconversão, e a escola reconhecida como um espaço privilegiado para tal.

    De acordo com Nóvoa (2007), estar em formação implica num investimento pessoal, um trabalho livre e criativo sobre os percursos e os projetos próprios, com vista à construção de uma identidade, que é também uma identidade profissional.

    Além disso, o autor destaca que o contexto histórico atual da formação profissional sofre profundas transformações nas práticas econômicas, políticas, sociais, culturais, exigindo a reestruturação da sociedade nos seus mais diferentes setores, e, em razão do avanço da ciência e da tecnologia, esse processo de mudanças altera a estrutura do sistema de produção e de contratação, bem como requer, também, novas exigências profissionais (novos conhecimentos, habilidades, atitudes e valores).

    Além do mais, essas mudanças e a implantação de novas reformas educacionais provocam transformações significativas na escola superior e influem no processo de ensino-aprendizagem desenvolvido na sala de aula, obrigando o docente a alterar o seu papel, sendo necessário um esforço para reconstruir a competência docente, capacitando o mesmo a novos desafios.

    Incluir momentos de reflexão nos projetos de formação dos educadores físicos é essencial, pois não é espontânea e nem exclusiva da própria prática. Também é fundamental nesse processo o referencial teórico, que garante na formação inicial, uma proposta curricular que permita ao futuro profissional aprender a refletir sobre seu processo de aprendizagem e analisar práticas concretas.

    Numa breve esteira da historicidade, foi a partir de meados do século XIX que observou-se a criação de instituições de formação de professores que passaram a produzir e reproduzir o corpo de saberes e do sistema de normas da profissão docente, desenvolvendo um papel crucial na elaboração dos conhecimentos pedagógicos.

    Na Educação Física, com o Decreto-lei n° 1.212/1939 cria-se na Universidade do Brasil (UB), a Escola Nacional de Educação Físca e Desportos (ENEFD) e, com isso, o primeiro modelo de currículo de formação de profissionais a ser seguido nacionalmente.

    Conforme Molina Neto e Molina In: Bracht e Crisório (2003), o currículo se resumia ao cumprimento das disciplinas específicas de cada curso, oriundas de dezessete matérias que tinham, respectivamente, seus professores catedráticos com o direito e poder de escolher um ou mais assistentes de sua confiança.

    Em relação ao caráter sexista, estava explícita a diferenciação entre homens e mulheres quanto ao ensino da Ginástica Rítmica ministrado, pois somente as alunas realizavam a mesma. Além disso, os professores de Educação Física desenvolviam aulas para os meninos e as professoras para as meninas.

    A Resolução n° 69/1969, do Conselho Federal de Educação (CFE), aprovou-se no Brasil o segundo modelo oficial de currículo para a formação dos profissionais da Educação Física. Esse modelo nacional se caracterizava por um bloco de matérias obrigatórias, subdivididas em básicas e profissionais, que constituía o chamado currículo mínimo. Cada IES de Educação Física teria a liberdade de complementá-lo, de acordo com as características e necessidades de suas regiões. O curso passou a ter uma duração mínima de 1.800 h/aula, ministradas, no mínimo em três anos e no máximo cinco anos.

    Com a implementação da Resolução n° 03/1987, do CFE vivenciou-se na Educação Física uma relação pioneira de formação universitária, pois, foi conferida as IES, total autonomia na composição curricular para a formação própria de um perfil profissional, a partir do momento em que se reinterpretou o previsto na Reforma Universitária de 1968.

    Assim, o currículo mínimo passou a não ser mais concebido como um elenco de disciplinas obrigatórias, e sim, áreas do conhecimento, dentro das quais as matérias e disciplinas do currículo seriam definidas pelas IES. A preocupação por uma formação do profissional de Educação Física generalista e humanista se configurou no grande mote daquela reformulação curricular, preconizada na Resolução 03/87. A carga horária mínima da Educação Física passou a ser de 2.880 h/aula, com possibilidade de titulações em Licenciado e/ou Bacharel em Educação Física.

    Com essa Resolução, possibilitou-se a cada IES elaborar seu próprio currículo, com ampla liberdade para ajustar-se, numa ótica realista, às peculiaridades regionais, ao seu contexto institucional e às características, interesses e necessidades de sua comunidade escolar, quer no plano docente ou discente.

    Em 2002, surge o quarto modelo de currículo sob a égide de duas bases de orientações normativas que tratam, diferenciadamente, as integralidades e terminalidades da "licenciatura". Com isso, quebra-se a tradição da formação generalista e ampliada na EF que, de maneira indistinta, formava o profissional para trabalhar no âmbito escolar e no não-escolar.

    Esse modelo curricular previu, em sua Resolução 02/2002, uma carga horária de, no mínimo, 2.800 horas e no mínimo em três anos letivos, em que a articulação teoria-prática garanta, nos termos dos seus projetos pedagógicos, as seguintes dimensões dos componentes comuns: 400h de prática como componente curricular, vivenciadas ao longo do curso; 400h de estágio curricular supervisionado a partir do início da segunda metade do curso; 1800h de aulas para os conteúdos curriculares de natureza científico-cultural e 200h para outras formas de atividades acadêmico-científico-culturais.

    Já as diretrizes da Graduação (bacharelado) da Educação Física, previstas na Resolução 07/2004, desafiam as instituições formadoras a organizarem seus currículos inspiradas na autonomia institucional; garantindo a articulação entre ensino, pesquisa e extensão; concebendo a graduação como formação inicial; promovendo a formação continuada; pautando a ética pessoal e profissional; estimulando a ação crítica, investigativa e reconstrutiva do conhecimento; empreendendo a construção e gestão coletiva do projeto pedagógico; desenvolvendo a abordagem interdisciplinar do conhecimento; reconhecendo a indissociabilidade teoria-prática; e garantindo a articulação entre conhecimentos de formação ampliada e específica (KUNZ, 2003).

    Acerca da questão que trata de algumas das - diretrizes nacionais para a EF – o presente ensaio afirma que estas constituem orientações para a elaboração dos currículos que devem ser, necessariamente, adotadas por todas as instituições de ensino superior.

    Segundo o MEC, o Conselho Nacional de Educação, dentro da perspectiva de assegurar a flexibilidade, a diversidade e a qualidade da formação oferecida aos estudantes, as diretrizes devem estimular o abandono das concepções antigas e herméticas das grades curriculares, de atuarem, muitas vezes, como meros instrumentos de transmissão de conhecimento e informações, e garantir uma sólida formação básica, preparando o futuro graduado para enfrentar os desafios das rápidas transformações da sociedade, do mercado de trabalho e das condições de exercício profissional (CONFEF e CNE/CP 21, 2001).

    Seu objetivo é levar os alunos à - aprender a aprender – o que engloba, aprender a ser, aprender a fazer, aprender a viver juntos e aprender a conhecer, garantindo a capacitação de profissionais com autonomia e discernimento para assegurar a integralidade da atenção e a qualidade e humanização do atendimento prestado aos indivíduos, famílias e comunidades.

    Assim, a Educação Física fica caracterizada como uma área de estudo, elemento educacional e campo profissional caracterizados pela análise, ensino e aplicação do conjunto de conhecimentos sobre o movimento humano, intencional e consciente, nas suas dimensões biológica, social e psicológica (CONFEF e CNE/CP 21, 2001).

    Ao se discutir a formação profissional continuada em Educação Física, que, a partir da exposição das diretrizes para a formação inicial, não se pode aqui deixar de discutir a necessidade permanente de atualização profissional.

    As transformações socioculturais da sociedade vêm provocando profundas mudanças e alterando as necessidades da população brasileira. Esse fenômeno provocou uma rápida expansão e diversificação dos campos de atuação profissional, relacionados à tradição da Educação Física nas perspectivas da educação, da prática esportiva, do exercício corporal para a saúde/qualidade de vida e do lazer.

    O campo de atuação do profissional será delimitado por sua competência e comprometimento ético. Hoje, a atividade física, a prática esportiva formal e informal são direitos dos cidadãos definidos na Constituição e constituem-se num meio efetivo para a conquista de um estilo de vida ativo dos seres humanos, reconhecido como importante fator para a qualidade de vida de toda a população.

    Para Berticelli (2006), a formação continuada em Educação Física deverá atender à necessidade do profissional compreender a natureza dinâmica do conhecimento especializado, e obter a competência do desenvolvimento intelectual e profissional, autônomo e permanente.

    Assim, considerando essa necessidade de constante atualização e aprimoramento, o compromisso da formação inicial é preparar para enfrentar os desafios das rápidas transformações da sociedade, do mercado de trabalho e das condições do exercício profissional, estabelecendo, assim, um elo com a formação continuada.

    A consciência de que o exercício profissional competente exige atualização de conhecimentos e preparação contínua deve ser alertada durante os cursos de graduação. Além de ser uma exigência do mercado de trabalho, a constante atualização no seu campo profissional é um dever ético para com a profissão.

    Pois, nesse mesmo sentido, destaca-se que as novas diretrizes sinalizam para a preparação de um profissional adaptável a situações novas e emergentes, com progressiva autonomia profissional e com condições para contribuir na produção de conhecimentos.

    No entendimento do presente ensaio, não é demais repetir que a organização do currículo deve ser concebida com o propósito de estabelecer um perfil do formado, no qual a graduação constitui apenas uma etapa inicial da formação profissional, num processo de educação autônomo e continuado.

    Assim, espera-se que o egresso possua uma sólida formação na área de conhecimento da Educação Física e esporte, oriunda de sua formação profissional fundamentada na competência teórico-prática, de acordo com um perfil adaptável às novas e emergentes demandas sociais no seu campo, para cujo desafio deverá estar apto. Em outras palavras, além do domínio de conhecimentos, técnicas e habilidades que servem de base para a intervenção profissional, o egresso deverá ser preparado para sua educação autônoma e continuada.

    Pilatti e Vlastuin (2005) defendem o encorajamento à realização de estudos independentes, visando uma progressiva autonomia profissional e intelectual do aluno, o que requer, no seu ponto de vista, incrementar a organização curricular dos cursos com a oferta de cursos seqüenciais complementares, previstos na LDB brasileira, como uma das modalidades de educação continuada.

    O ensaio enfatiza também, que as decisões a este respeito deverão estar muito claras nos projetos pedagógicos. De uma maneira geral, a educação continuada parte do desenvolvimento de um estado de alerta proporcionado ao aluno - ainda na formação inicial - quanto à dinâmica da produção do conhecimento técnico e científico, fator que caracteriza os cursos de graduação como o passo inicial de uma longa caminhada de formação profissional.

Os principais modelos de currículo de formação profissional

    Em face da questão dos principais modelos de currículo de formação, implantados nas IES na atualidade, a partir desse ponto inicia-se uma leitura à luz da ótica do tratamento dado à relação – teoria x prática – e nas relações que constituem o eixo principal dos problemas e limitações que afetam, hoje, esses currículos, que por sua vez, derivam de dois modelos: o tradicional esportivo; e a orientação técnica-cientifica.

    O currículo tradicional-esportivo enfatiza as chamadas disciplinas "práticas". Aquelas especialmente esportivas.

    Nesse modelo, o conceito de prática está baseado na execução e demonstração por parte do graduando, de habilidades técnicas e/ou de capacidades físicas, tanto durante as aulas, bem como nas avaliações. A exemplo disto cita-se as provas práticas, onde o educando deve obter um desempenho físico-técnico mínimo para poder ser aprovado (TAFAREL In: GUEDES, 1997).

    Há separação entre teoria e prática nessa concepção.

    Teoria é o conteúdo apresentado na sala de aula - qualquer que seja ele – oriundo tanto das disciplinas esportivas, bem como das advindas das ciências humanas, sociais ou biológicas.

    A ênfase teórica se dá nas disciplinas como a fisiologia, a filosofia, a sociologia, a psicologia, a pedagogia e etc. Quer sejam elas gerais ou aplicadas. Este modelo iniciou-se ao final da década de 60 e consolidou-se na década de 80, acompanhando a expansão dos cursos superiores - privados - em Educação Física no Brasil e a esportivização da área.

    Esta é uma concepção ainda prevalecente em muitos cursos, especialmente nas instituições privadas, que enxergam a Educação Física sob uma ótica mercadológica, e, portanto, mais como uma profissão do que uma disciplina acadêmica, e onde as IES privilegiam - o processo de ensino, a aula - em detrimento da pesquisa.

    Ou seja, são instituições tidas – apenas - como de ensino, relegando a um segundo plano, mesmo que clandestinamente, a extensão e a pesquisa universitárias. Razões sociais de qualquer IES seja ela pública, privada, universidade ou centro universitário.

    O currículo de orientação técnico-científica valoriza as disciplinas teóricas - gerais e aplicadas - e abre espaço ao envolvimento com as ciências humanas e as ciências sociais. O conceito de prática é outro: trata-se do conceito de "ensinar a ensinar" e não simplesmente praticar. Um exemplo são as "seqüências pedagógicas" e os “processos de ensino/aprendizagem” (BRACHT E CRISÓRIO, 2003).

    O conhecimento flui da teoria para a prática, e a prática é a aplicação dos conhecimentos teóricos na seguinte seqüência: da ciência básica para a ciência aplicada e daí para a tecnologia.

    Em alguns cursos, propõem-se disciplinas de síntese, como por exemplo: "processo ensino-aprendizagem de habilidades motoras" e "programas de EF", que auxiliam nesta transição da teoria para a prática.

    Como conseqüência, ocorre uma valorização da - prática de ensino e do estágio supervisionado. Disciplinas autônomas que passam a ser responsabilizadas, quase que exclusivamente, pela aplicação e integração dos conhecimentos adquiridos nas outras disciplinas.

    O modelo técnico-científico, após seu surgimento no Brasil em meados da década de 80, consolidou-se no início da década de 90, acompanhando as mudanças conceituais e epistemológicas da Educação Física e o intenso e tenso debate na área, na busca por identidade unitária para a área.

    Recebeu muita influência da concepção que vê a Educação Física como área de conhecimento (disciplina acadêmica) ou ciência, sendo responsável pela produção de conhecimentos científicos sobre o "homem em movimento", nas perspectivas biológica, psicológica e sociológica (OLIVEIRA, 2011).

    Disto resultou um considerável aumento no número e na carga horária das disciplinas de fundamentação científica e filosófica. O currículo de orientação técnico-científica encontra-se em vigor nos cursos de muitas universidades públicas e algumas particulares.

    Na opinião do texto, o modelo técnico-científico é mais viável que o primeiro, por vislumbrar uma formação mais crítica do educando, propiciando o seu empoderamento e dando subsídios para o mesmo atuar diretamente no próprio processo de construção e aquisição do conhecimento, particularmente depois de sua formação universitária, através do ensino – pela e para a pesquisa.

    Nesse modelo, a transferência da teoria para pratica é papel da disciplina de – prática de ensino e da de estágio supervisionado.

Considerações finais

    Face ao que foi exposto, numa perspectiva de uma análise conclusiva, o presente ensaio assevera que algumas críticas e limitações podem ser tecidas após essas considerações.

    Entre elas, que o currículo técnico-científico promoveu mudanças importantes na EF brasileira, ao introduzir novos conhecimentos de base científica e filosófica, e também ao desestabilizar as forças conservadoras que se apoiavam na tendência tradicional-esportiva. E, conforme se mencionou – é mais viável que o tradicional desportivo.

    No entanto, algumas críticas também são passiveis de serem tecidas, pois, quando aparece na sua forma – pura – corre o risco de não contribuir para a "vivencia" das experiências práticas durante as aulas na graduação. O que é de fundamental importância para a Educação Física, quer seja na formação do bacharelado ou do licenciado, resultando em dificuldades de ingresso no mercado de trabalho, quando os egressos desses currículos são submetidos a avaliações práticas, durante um processo seletivo de colocação profissional, por exemplo.

    Isso pode ocorrer, principalmente, em casos onde não exista uma estratégia bem delimitada nas disciplinas de estágio supervisionado e de prática de ensino. Pois, nesse currículo, são elas as responsáveis por essa contextualização da teoria. O que demanda um processo de intensa trans e interdisciplinaridade dentro do currículo técnico–científico.

    Numa segunda critica, que não há garantia de que o conhecimento produzido nestas subáreas de pesquisa seja generalizável para os vários cenários onde ocorrem às práticas profissionais, pois o contexto da prática é incerto, complexo e variável.

    Os profissionais não pensam, agem e falam como pesquisadores; pois, profissionais e pesquisadores trabalham em diversas comunidades epistêmicas; pensam e agem de maneira diferente, porque tiveram diferentes experiências de socialização, além de serem diferenciadas as exigências das suas carreiras profissionais e as demandas no seu trabalho.

    A maneira de organizar os currículos neste modelo de orientação técnico-cientítica dificulta a integração e aplicação do conhecimento científico, na medida em que isola as disciplinas, a partir de sua filiação sub-disciplinar à disciplina acadêmica.

    Em suma, este currículo - pode não considerar - as realidades comportamentais, culturais e políticas das práticas de trabalho.

    Para o ensaio, o ideal seria uma integração entre os dois currículos e o empoderamento das disciplinas de prática de ensino e de estágio supervisionado, visando à contextualização do conteúdo aprendido na teoria, culminando assim numa maior inserção dos egressos no mercado de trabalho, sem desconsiderar a formação crítica e autocrítica do educando, as vivências, o ensino pela pesquisa, e, principalmente, as exigências do mercado de trabalho de uma sociedade de bens de consumo, como a da contemporaneidade. Diga-se de passagem, aspectos fundamentais a serem considerados na formação e concepção do profissional de educação física e de esporte.

    Acerca das Diretrizes Curriculares da Educação editadas, conclui-se que através das diversas resoluções que foram citadas e discutidas ao longo do texto, que as mesmas estão inseridas num complexo de reforma da educação superior no Brasil, e expressam a reformulação por qual passa todo o Estado brasileiro e coadunam com o projeto de formação humana, construído pela classe hegemônica, com vistas à formação do cidadão trabalhador adaptável as novas demandas do capital.

    Em se tratando de um ambiente que objetiva oferecer ao educando uma formação integral, os aspectos históricos e sociais das práticas corporais, assim como os aspectos técnicos propriamente ditos, devem ser difundidos e analisados para que se possa ter um cidadão crítico e consciente - que pratique a sua motricidade - sabendo o porquê da sua eleição e as possíveis implicações, tanto para si mesmo, como ao mundo ao seu entorno.

    A escola de formação superior, no sentido mais amplo, foi até décadas passadas considerada como disseminadora ou mantenedora de uma visão de mundo, de homem e de sociedade impregnada da ideologia burguesa, que se caracterizava pela transmissão de um saber destituído de crítica ou de atividades mecânicas que reproduziam os fatos sem considerar a história e as expectativas dos alunos.

    Assim sendo, mesmo sem saber, o professor, em uma atitude transitiva e ingênua, programava as atividades que avaliasse a sua adequação e pertinência para todos os alunos.

    Os estudos sócio-culturais e a formação profissional, sob o ponto de vista de formação profissional, a área em tela é muito importante para a formação dos profissionais de Educação Física, tanto para os cursos de Bacharelado como o de Licenciatura.

    Portanto, qualquer tentativa de discutir a formação e a atuação do profissional de Educação Física e do esporte, em face de uma possível proposta de mudança para a área, através de novos conteúdos e ou estratégias de ensino, deve ser realizada considerando a dinâmica simbólica da área, ou seja, enquanto um fenômeno social e histórico, situado e culturalmente determinado e constantemente atualizados por meio de novos significados, que são produzidos pelo público envolvido nessas ações.

    A universidade, por sua vez, pode contribuir com os seus aprendizes, fomentando o estágio supervisionado, a prática de ensino e as atividades complementares, para que através dessas ferramentas os alunos possam produzir novos significados, baseados no contexto social e cultural da própria área.

Referências bibliográficas

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