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A capoeira na educação infantil. Jogando dentro do ambiente escolar

La capoeira en la educación infantil. Jugando dentro del ambiente escolar

 

*Mestre em Educação Física. Professor Pesquisador

da Universidade Federal de Pelotas, UFPel

**Professor do PPGEF da Universidade Federal de Pelotas, UFPel

Coordenador do Grupo de Pesquisa: Cultura, Infância

(Brasil)

Kelber Ruhena Abrão*

kelberabrao@gmail.com

Marcio Xavier Bonorino Figueiredo**

bonorinosul@gmail.com.br

 

 

 

 

Resumo

          Este trabalho tem por objetivo discutir a proposta da utilização da Capoeira dentro do ambiente escolar, especificamente na educação infantil. A escolha do tema surgiu a partir da necessidade da criança movimentar-se dentro do espaço escolar, a ideia é abordar assuntos e conteúdos que são poucos trabalhados nas aulas de Educação Física Escolar. Desta forma, o objetivo geral deste é realizar uma discussão crítica sobre a utilização da capoeira juntamente com o uso de instrumentos e canções musicais desenvolvendo o ritmo dos alunos, pois dado a importância de estimular a criança motoramente desde a sua infância, principalmente nas atividades voltadas a psicomotricidade, preocupando-se com a criança nos aspectos motores, cognitivos e afetivos.

          Unitermos: Capoeira. Educação Infantil. Escola.

 

 
EFDeportes.com, Revista Digital. Buenos Aires, Año 16, Nº 159, Agosto de 2011. http://www.efdeportes.com

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A Capoeira entendida como Jogo

    O jogo, como elemento pedagógico é utilizado desde a Era grega e romana, desta forma, a relação entre o jogo, a educação e o desenvolvimento da criança é antiga em nossa história. Brougère (2000) aponta que o jogo como ferramenta educativa surge apenas no século XVI, sendo pensado como recurso educativo a partir do século XVIII, com o romantismo.

    Para os gregos, Platão utilizava a expressão “aprender brincando” analisando a sua importância para a sociedade. Aristóteles sugeria os jogos como forma de preparo a vida adulta e, por outro, como recreação.1 Já em Roma, há referências de jogos destinados para o preparo físico e posteriormente à fabricação de doces em formato de letras destinadas ao aprendizado.

    Na Idade Média, o Cristianismo impõe uma educação disciplinadora. Neste período, não existia espaço para os jogos, sendo considerados como delitos, em decorrência a associação aos jogos de azar,

    No renascimento, surgem novos ideias, possibilitando outras concepções pedagógicas aos jogos. Em seus estudos Ariès (1980), observou que nos séculos XVI e XVII havia dualidade quanto às concepções pedagógicas dos jogos e das brincadeiras. Sob uma vertente, tais atividades eram consideradas tendo como única intencionalidade a distração, por outro lado, eram recriminadas pelos moralistas que associavam o brincar ao vício e aos prazeres carnais.

    Segundo Brougère (2000), antes de se pensar o jogo como um lugar possível de educação, havia três modos de estabelecer as relações entre o este e a educação. O primeiro, remetia ao pensamento aristotélico, o de recreação, o jogo seria o relaxamento indispensável. No segundo, aparece na educação como um artifício pedagógico, no qual o interesse que a criança manifestava pelo jogo era transformado em formas de ensinar. Já o terceiro, era tido como uma atividade que permitia ao pedagogo observar bem como compreender a personalidade da criança adaptando-a ao ensino.

    Sendo assim, o jogo a partir de seu vínculo com a educação é justificado no espaço educacional como necessária, como oposição e complementareidade do trabalho intelectual da criança. A recreação passa a ser tratada como um momento escolar não consagrado à educação, mas complementar.  

    No século XVI, o jogo surge na educação de crianças durante o processo de ler e escrever sendo um suporte atrativo. Passa a se utilizar os aspectos do jogo para estimular a criança na realização e empenho de suas atividades escolares. Para Brougère (2000), os exemplos típicos deste período são os doces em forma de letras, aquilo que viria a chamar-se de artifício pedagógico.

    No século XVIII, tendo por base as ideias de Rousseau, emerge a concepção da criança como ser natural e distinto do adulto. Nesse período, passa-se a ter uma valorização da espontaneidade e a educação passa a ser ajustada às necessidades infantis. O jogo passa a ser associado e valorizado á educação, prevalecendo o consenso positivo dessa atividade.

    Para Brougère (1997), o que permite atribuir ao jogo algum valor educativo está relacionado com uma história, sendo que esta possui uma origem ideológica. Tal origem está relacionada aos pensamentos pós-Rousseau, que favoreceu tornar o jogo um suporte pedagógico. Ainda para Brougère (1997), o movimento do pensamento romântico traz uma ruptura ao racionalismo do período renascentista. Para isto, não foi a razão que colocou o jogo no centro da educação, e sim a exaltação da natureza, na qual a criança era tida como a maior representante da natureza humana.

    No início do século XIX, após a Revolução Francesa, houve inúmeras transformações pedagógicas. Havia uma preocupação muito grande em por em prática os princípios de Rousseau, Pestalozzi e Fröebel, através de métodos próprios para a educação. Desse período em diante, o jogo, passou a ser objeto de estudo de diversos profissionais e de diversas áreas de estudo. A crescente valorização do tema repercutiu na produção de teorias epistemológicas sobre o ato de brincar. Profissionais como pedagogos, psicólogos, antropólogos entre outros passam a se interessar pela atividade e pela cultura lúdica.

    Em resumo, percebemos que ao longo da história o jogo teve diferentes concepções. Hoje ele é reconhecido como um direito fundamental do ser humano objetivando uma melhor qualidade de vida, principalmente para as crianças, despertando desde cedo o espírito de cooperação e solidariedade. Nesse sentido, os jogos foram criados a partir do “vir-a-ser”, pois trabalha com a simulação de fatos na qual o indivíduo pode relacionar-se através do lúdico.

    Sob a luz das ideias de Rousseau e Pestalozzi, os trabalhos de Fröebel Montessori, e Decroly contribuíram para uma nova concepção que passava a respeitar e compreender a criança como um ser da sociedade. Tais estudos propiciaram elencar estratégias educacionais baseadas na ação livre e na utilização de jogos e materiais lúdicos.

    Fröebel (1975) trabalha com a discussão do jogo enquanto ação livre e espontânea, tendo esta a supervisão e orientação de um adulto. Sendo este o pai dos jardins de infância, suas teorias colocam os jogos e brinquedos como elementos chave da educação infantil.  Para ele, durante o período pré-escolar as crianças deveriam se desenvolver de forma livre. Sua grande criação, os jardins de infância, voltavam-se para a família e não para as estruturas escolares.

    Nesse sentido, Brougère (2000) afirma que para Fröebel o jogo é tido como o mais alto grau de desenvolvimento de uma criança nesta idade, não devendo o jogo ser visto como algo frívolo, mas sim uma manifestação profunda e significativa à criança. Fröebel (1975) trabalha com a ideia de que o jogo antecipa o que a criança virá a tornar-se.

    Ainda para este autor, o jogo possibilita uma auto-educação e um auto-ensino. A pedagogia do jogo deve apoiar-se em um material, porém a exploração espontânea e livre deste deverá ser educativa, sendo este material fortemente simbólico e sobretudo não-didático O principal exemplo de um material deste tipo é a bola, pelo seu grande valor simbólico e pela inúmera gama de jogos que podem ser realizados a partir deste material.

    Montessori (1980), num primeiro trabalha com a ideia de jogos para crianças retardadas2, posteriormente, através do aperfeiçoamento de seus estudos, passa a utilizá-los para a educação de crianças normais. Tal teoria seria denominada como método montessoriano.

    Este método visava realizar uma experiência pedagógica com um objeto didático, esperando assim as reações das crianças. Grande parte desse material eram objetos proporcionais ao tamanho infantil.

    Para Montessori (1980), o brinquedo era visto como algo inferior na vida da criança e o jogo era tido como uma atividade ociosa.  Construía-se uma pedagogia que marginalizava o jogo em prol de exercícios, tarefas que valorizava a criança rumo a um objetivo. Era preciso entender o “jogo educativo”, não o confundindo com um trabalho livre direcionado, através de confusas que dispersam a atenção.

    Tendo por princípio epistemológico as ideias de Dewey, isto é, a pedagogia baseada no interesse natural da criança, Decroly (1978) considera o jogo como um lugar essencial das aprendizagens. Para este, havia uma transição entre o jogo e o trabalho presente nas atividades rotineiras das crianças, pois é principalmente pelo jogo que a criança se difere do adulto (1978, p.15). Seu método ficou conhecido como Unidade de Centro de Interesse, e tinha como objetivo preparar a criança para a vida, através do trabalho em equipe, porém mantendo a individualidade de cada um. No entanto, para este autor, a educação não se afirma em preparar a criança para a vida adulta, e sim, ajudá-la a resolver os problemas específicos de cada período da vida. A partir disso, as crianças deveriam, na escola, ser classificadas em grupos psicológicos homogêneos, de acordo com suas necessidades primordiais como alimentação, respiração, asseio, jogo e trabalho. Todas as atividades escolares deveriam ser em sintonia com estas necessidades.

    De acordo com Delocroly (1978), esse método tido como globalizante é realizado pelas crianças em três estágios: observação3, associação4 e expressão5. Desta forma, surge na escola, duas vertentes por trás do jogo, sendo a primeira que propõe à criança jogos dirigidos e coletivos e a segunda que da aos exercícios um teor lúdico, aproximando-os do jogo, os jogos educativos.

    Apesar de que os estudos em torno do jogo sejam oriundos da Pedagogia, eles passam a influenciar várias outras correntes de pensamento. Tendo a biologia e a psicologia como ciências preocupadas em responder as questões e funções em torno do brincar.

A capoeira no ambiente escolar

    A capoeira, ao longo da sua história, sofreu inúmeras repressões bem como transformações para poder se afirmar no ambiente escolar. Nesse sentido, é apenas em 1930 com a criação e oficialização legal da Luta Regional Baiana6, estruturada a partir de Manoel dos Reis Machado7 e seus discípulos que a capoeira passa a assumir um caráter que possibilita a sua institucionalização, através de um método sistematizado de escrita que poderia ser utilizado em diversas instituições de ensino. O modelo de capoeira criado por Mestre Bimba e seus discípulos passou a ser reconhecido pela sociedade civil, sendo Bimba reconhecido em 1957 pelo ministro da educação como Instrutor de Educação Física.

    Passados cinquenta anos após a criação da capoeira Regional é que houve um aumento significativo no número de instituições que passaram a adotar a capoeira como prática. Ambientes como as creches, ao se utilizarem desta prática corporal possibilitam alternativas reais de intervenção pedagógica com crianças em idades que variam do 0 aos 6 anos. Fatores como o movimento, a musicalidade, isto é, elementos que regem a Educação Infantil, associados à capoeira aperfeiçoam as interlocuções entre os saberes e fazeres pedagógicos.

    Na escola, tendo por base o Referencial Curricular para a Educação Infantil (1998) MEC, tem por objetivos a formação integral da criança8, bem como as suas identidades. Em detrimento deste Referencial, a capoeira ultrapassa o fator motor, através do trabalho e conhecimento cultural que ela proporciona. Muitas escolas ainda não possuem a dimensão da importância do ensino da capoeira no que tangue os aspectos dos processos de ensino aprendizagem no que diz respeito a uma relação interdisciplinar.

    Se tratando da Educação Física escolar, a capoeira não deve ser vista como um simples ato de jogar os pés de um lado para o outro. Deve-se se fazer uma análise muito mais abrangente desses movimentos. Nas aulas, são trabalhados conceitos históricos, fundamentos das lutas, o ensino de canções, brincadeiras musicadas e jogos estimulando o gosto e proporcionando a vivência de elementos até então desconhecidos.

    Durante as aulas, as crianças passam a experimentar ações de flexibilidade, coordenação, percepção espacial, possibilitando a mesma um encontro com o seu corpo, bem como com as suas limitações. Em seus estudos, Feldenkrias (1985) trabalha com o conceito de como se forma a auto-imagem e como ela governa todos os nossos atos, através de três fatores, entendidos como hereditariedade, educação e auto-educação.

    No processo de ensino aprendizagem da capoeira, é necessário que o educador trabalhe com todo um universo de ordem cognitiva, motora e afetivo-social. Durante o processo de ensino, condições são estabelecidas para que a criança vá adquirindo de forma sistêmica os conteúdos da capoeira, através da ação pedagógica da ação e reflexão.

    A metodologia do ensino de capoeira na Educação Infantil deve priorizar a tomada de consciência do seu próprio corpo, através do lúdico, por meio das brincadeiras. Em cada atividade, o professor deve enxergar os benefícios psicológicos, fisiológicos e sociais, sem que estas sejam atividades de impacto, evitando assim lesões e acidentes.

    Os objetivos, tanto no aspecto recreativo quanto esportivo, deverão contribuir para o aperfeiçoamento do indivíduo como ser social. As atividades colaboram tanto com o desenvolvimento motor quanto com a melhora dos processos de aprendizagem.

O movimento da capoeira dentro da escola

    A partir da premissa de que a educação valoriza o sujeito, deve-se compreender a importância do movimento humano como elemento de cultura, experimentação, descoberta e ressignificação do mundo infantil. Em sua essência, o ser humano é basicamente movimento. Desta forma, é no período da infância que existe a necessidade de se explorar o meio em que se vive, através da manipulação de objetos e as mais variadas experimentações do movimento.

    O movimento na Educação Infantil se constitui como principal elemento da cultura corporal humana. A capoeira, por se tratar de um jogo de movimentos corporais auxilia na ampliação das diferentes habilidades motoras como caminhar, correr, saltar, pular. Segundo Pérez (1994), durante a fase pré-escolar os movimentos são considerados verdadeiros núcleos cinéticos. A capacidade da criança em mover-se de forma autônoma está relacionada a fatores neurológicos que permite a ela desenvolver movimentos mais complexos. Ainda para este autor, os movimentos infantis são divididos em três estágios. O primeiro estágio, o inicial, é representado pela tentativa da criança em executar um determinado padrão de movimento fundamental, na qual os movimentos espaciais e temporais são tidos como pobres. O segundo estágio, elementar, utiliza-se de um maior controle e coordenação rítmica dos movimentos fundamentais. Para que a criança avance do primeiro para o segundo estágio é necessário que ela passe pelo período de maturação. O terceiro estágio é denominado como maduro, sendo caracterizado como eficiente através da biomecânica do movimento, através da coordenação e execução do movimento. Normalmente, a criança encontra-se no estágio maduro entre os 5 e 6 anos, quando já possui o domínio das habilidades fundamentais.

    Para Tani (2005), as habilidades básicas de uma atividade motora se dão a partir do padrão mais básico: a locomoção. Para este autor, as atividades de locomoção são aquelas que permitem o corpo deslocar-se na direção vertical ou horizontal, de um lado para o outro no espaço, exemplificado pelo ato de andar, correr, escalar e saltar. Na capoeira, a criança passa a realizar os movimentos de ginga, rolê, fuga, meia volta e volta ao mundo. Posteriormente, há as habilidades de manipulação, que são aquelas que possibilitam o sujeito relacionar-se com o objeto, arremessar, chutar e pegar são tidas como exemplos. Por fim, existe o terceiro grupo, as habilidades de equilíbrio, entendidas como aquelas capazes de fazer com que o indivíduo recupere e mantenha o equilíbrio em relação à força da gravidade. Os movimentos de adução, rotação e abdução, fazem parte deste grupo. Na capoeira, nesse momento a criança passa a realizar os ataques frontais como benção, martelo, aramada e os ataques voadores como meia lua, queixada, martelo voador.

    A capoeira dentro do ambiente escolar deverá ser essencialmente prática, focada no jogo da roda, funcionando como um agente facilitador com o movimento na educação infantil. A capoeira irá auxiliar na ampliação de diferentes qualidades físicas e dinâmicas de movimentos. Os alunos iniciarão a partir dos movimentos naturais, exemplificado a partir da ginga, isto é, uma variação do ato de andar. As brincadeiras infantis de crianças com idades entre 5 e 6 anos feitas a partir da capoeiragem, caracterizam-se pela (re)produção de ações humanas, que são realizadas com o objetivo de dominar o mundo dos objetos humanos, surgindo assim as relações sociais. Nessa perspectiva, pode-se dizer que a brincadeira tem um papel crucial no desenvolvimento da criança, que ao substituir um objeto por outro, trabalha com o significado das coisas e se submetem as regras de comportamento próprios desta relação.

A musicalidade na capoeira na Educação Infantil

    De acordo com Bréscia (2003), a música é tida como uma linguagem universal, estando presente desde os primórdios da humanidade. Com base nos seus estudos antropológicos, as primeiras músicas eram usadas em rituais, estes poderiam ser dos mais variados, nascimento, morte, casamento, fertilidade entre outros.

    Na era grega, o ensino da música era tido como obrigatório, Pitágoras considerava que as melodias, ou seja, uma sequência de sons aliada a algum instrumento, provocava reações no ser humano, podendo inclusive mudar o comportamento do mesmo. Bréscia (2003) trabalha com a ideia de que os elementos que compõem a música (som, ritmo, harmonia e melodia), contribuem de forma efetiva para a reestruturação da ordem cognitiva do homem, pois induz tanto o movimento corporal como a afetividade.

    Segundo Bréscia (2003), na Educação Infantil, a musicalidade permite a criança além de desenvolver a noção de esquema corporal, além de permitir a maior sociabilidade entre os pares. Trabalha-se também como o reforço das dimensões cognitivas/linguística, psicomotora e sócio-afetiva da criança.

    No que tange ao desenvolvimento cognitivo e linguístico quanto maior a riqueza de estímulos que a criança receber melhor será o seu desenvolvimento intelectual. Nessa ótica, a participação ativa da criança ao ouvir, tocar e ver possibilita o desenvolvimento da acuidade auditiva e coordenação motora.

    No aspecto psicomotor, a musicalização faz com que as crianças aprimorem suas habilidades motoras, pois o ritmo é um fator importante para a formação e equilíbrio do sistema nervoso. Segundo Mársico (2005), a música é tida como um mecanismo capaz de propiciar uma descarga emocional, aliviando tensões. Atividades simples como dançar, bater palmas são experiências ricas que permitem a criança desenvolver o senso rítmico.

    No desenvolvimento sócio-afetivo, a criança vai formando a sua personalidade. Neste período a auto-estima começa a se manifestar e ela passar a aceitar suas características individuais, bem côo as suas limitações. A musicalização através de atividades coletivas possibilita a socialização, compreensão e a cooperação. Nesse momento, a criança passa a adquirir o conceito de grupo.

    De acordo com Mársico (2005), cada vez mais o desenvolvimento auditivo passa a estar comprometido, em detrimento aos estímulos visuais oriundos do mundo moderno. Nesse sentido, utilizar cada vez mais o universo sonoro passa a ser uma necessidade pedagógica.

    Tratando-se a capoeira, a musicalidade proporciona à criança a noção de tempo-espaço, pois através dos elementos do som como altura, duração, intensidade e timbre, a mesma passa a ser melhor localizar no ambiente através da expressão corporal. O uso de instrumentos típicos da capoeira como berimbau atabaque e pandeiro trabalham com a motricidade fina, isto é, a capacidade do sujeito em manipular com destreza pequenos objetos e entendida como uma das competências básicas a ser desenvolvida na Educação Infantil.

    Para Piaget (1975), o período compreendido entre os zero e 6 anos de idade, a criança passa por estágios denominados sensório-motor, simbólico e intuitivo. No período denominado sensório-motor as atividades relacionam o som e o gesto. A criança passa a expressar-se corporalmente para representar aquilo que ouve. Já no período simbólico, através do significado de representação, o surgimento da linguagem, desenho e imitação passa a perpassar na mente da criança. Através da capacidade de formar imagens mentais, o faz de conta, o jogo simbólico através do processo de nomear aquilo que não possui nome, nomalismo. Nesse momento, na capoeira, a criança passar a receber em uma cerimônia aleatória, apelidos dos capoeiristas, o seu nome de capoeira. Já no período dos 4 aos 6 anos, tido como idade dos porques, o pensamento da criança centrado apenas no seu ponto de vista. A partir daí, na roda de capoeira, a criança dessa idade a trabalha o conceito de irmandade, que dentro do jogo é tido pela relação de parceria e respeito mútuo. Ela passa a questionar o porquê de não haver vencedores e perdedores no jogo, negando as origens do objetivo natural dessa arte, entendida como jogar com o outro e não contra o outro. Durante as rodas, a musicalidade é expressada através do canto, este contribuiu no desenvolvimento fisiológico da fala. Nas músicas são ditas parábolas e ditados populares, bem como a história de opressão que o negro sofrera em nossa sociedade.

Considerações

    A capoeira é tida como uma atividade física completa, sendo ideal para o desenvolvimento físico da criança em idade escolar. Durante as etapas da educação infantil, a criança se depara com um universo novo a cada dia, devendo esta desenvolver-se adquirindo a destreza para transpor obstáculos e se defender diante as ameaças.

    Ao praticá-la, esta passa a desenvolver e trabalhar o corpo de forma única, pois falar de corpo torna-se bastante difícil falar, pois esquecemos ou fomos levados a nos esquecer que somos corpo, de que nossas comunicações cotidianas com o muno ocorrem através dele e com ele. Sendo de extrema importância (re)pensar as questões do corpo na educação, desvelando as concepções, valores e os reais significados que estão implícitos nas ações escolares.

    O ritual da capoeira é importante para a valorização, bem como o conhecimento da cultura afro-brasileira, permitindo o resgate sócio-histórico de nossa cultura. A capoeira promove a melhora da auto-estima, pois possibilita o exercício de lidar com o outro, contribuindo para a formação de indivíduos mais criativos e autônomos, fazendo com que a criança ao vivenciar a capoeira, desperte para diversas áreas de interesses, como os cantos, instrumentos musicais e pela variação de movimentos corporais que a sua prática proporciona.

Notas

  1. Entendida como atividade oposta ao turno de trabalho.

  2. Termo utilizado na época para classificar o indivíduo cujo desenvolvimento mental era inferior ao índice normal da população para a sua idade.

  3. Classificado na escola como as ciências naturais, cálculo e geometria.

  4. Classificado na escola como geografia e história.

  5. Classificado na escola como linguagem, trabalhos manuais, ginástica e música.

  6. Capoeira Angola.

  7. Mestre Bimba.

  8. Segundo De Marco (2005), a formação biopsicossocial compreende a pessoa humana constituída por suas dimensões físicas, emocionais, sociais e espirituais. O desenvolvimento na criança de uma imagem positiva, independente e de confiança em suas próprias capacidades e percepção de suas limitações e de seus colegas: a curiosidade e o interesse da criança, oferecendo um ambiente rico, estimulante e desafiador.

Referências

  • BRASIL. Ministério da Educação. Referencial Curricular Nacional para a Educação Infantil. Vol. 3. Brasília: 1998.

  • BRÉSCIA, Vera Lúcia Pessagno. Educação Musical: bases psicológicas e ação preventiva. São Paulo: Editora Átomo, 2003.

  • BROUGERE, Gilles. Brinquedo e Cultura. São Paulo: Editora Cortez, 1997.

  • ________________. Jogo e educação. Porto Alegre: Artes Médicas, 2000.

  • DE MARCO, Alfredo. Face Humana da Medicina: do Modelo Biomédico ao Modelo Biopsicossocial. São Paulo: Editora Casa do Psicólogo, 2005.

  • FELDENKRAIS, Mosché. Consciência pelo movimento. São Paulo: Editora Summus Editorial, 1977

  • FROEBEL, Friedrich. The Education of Man. Nova Iorque: Editora Appleton, 1975.

  • MÁRSICO, Leda Osório. A criança e a música: um estudo de como se processa o desenvolvimento musical da criança. Rio de Janeiro: Editora Globo, 2005.

  • MONTESSORI, Maria. Formação do Homem. Rio de Janeiro: Editora Portugália, 1980.

  • Peres, Luiz. Conductas Motrices em la infância y adolescencia. Madrid: Editora Gymnos, 1994.

  • PIAGET, Jean. A formação do símbolo na criança.: imitação, jogo e sonho, imagem e representação. Rio de Janeiro: LTC, 1975.

  • TANI, Go. Educação física escola: fundamentos de uma abordagem desenvolvimentista. São Paulo: Editora EPU, 2000.

  • VYGOTSKY, Levy. Jogo, brinquedo, brincadeira e a educação. In: Kishimoto. São Paulo: Cortez, 1985.

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