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A Educação Física em escolas indígenas: a percepção de seus atores

La Educación Física en las escuelas indígenas: la percepción de los actores

The Physical Education in indigenous schools: the perception of their actors

 

*Universidade Estácio de Sá

**Prefeitura Rio de Janeiro – SME, 7ª CRE

(Brasil)

Profa. Juliana Dias Pereira*

Esp. Elizabeth da Silva Gomes**

Ms. Kátia Maria Fiúza Cislaghi*

Dr. José Antonio Vianna*

javianna@hotmail.com

 

 

 

 

Resumo

          O presente estudo teve como objetivo verificar os procedimentos e conteúdos trabalhados na Educação Física em duas Escolas Indígenas no estado de Mato Grosso, a partir da percepção dos Caciques, dos professores de Educação Física e dos jovens indígenas. Para o estudo em questão foram entrevistados 9 alunos indígenas, com idade entre 15 e 26 anos. Também foram entrevistados 3 professores, além dos caciques de ambas as tribos. Os instrumentos utilizados foram 3 questionários semi-estruturados contendo 15 perguntas para os alunos, 13 perguntas para os professores e 15 perguntas para os caciques. Obteve-se como resultado que a identidade cultural indígena está sendo abandonada e poucos são os indígenas que procuram manter sua cultura e raízes.

          Unitermos: Educação Física Escolar. Escola indígena. Identidade cultural.

 

Resumen

          Este estudio tuvo como objetivo verificar los procedimientos y contenidos que se trabajan en la Educación Física de las escuelas indígenas en el estado de Mato Grosso, desde la percepción de los caciques, de los profesores de Educación Física y de los jóvenes indígenas. Para el estudio en cuestión se entrevistó a nueve estudiantes indígenas con edades de 15 a 26 años. También se entrevistó a tres profesores, además de los caciques de ambas tribus. Los instrumentos utilizados fueron tres cuestionarios semiestructurados que contienen 15 preguntas para los estudiantes, 13 para los profesores y 15 preguntas para los jefes. Hemos obtenido el resultado que la identidad cultural nativa está siendo abandonada y hay pocos indígenas que tratan de mantener su cultura y raíces.

          Palabras clave: Educación Física. Escuelas indígenas. Identidad cultural.

 

Abstract

          This study aimed to verify the procedures and content worked in physical education two Indigenous Schools in the state of Mato Grosso, from the perception of Chiefs, the Physical Education teachers and young indigenous people. For the study in question were interviewed nine indigenous students, ages 15 to 26 years. Also interviewed were three teachers in addition to the Chiefs of both tribes. The instruments used were three semi-structured questionnaires containing 15 questions for the students, 13 teachers and questions for 15 questions for the chiefs. We obtained the result that indigenous cultural identity is being abandoned and there are few Indians who seek to maintain their culture and roots.

          Keywords: Physical Education. Indigenous school. Corporal culture.

 

 
EFDeportes.com, Revista Digital. Buenos Aires - Año 16 - Nº 158 - Julio de 2011. http://www.efdeportes.com/

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Introdução

    Ao longo da história do Brasil, a busca pela melhoria na qualidade de vida fez com que os povos indígenas se adaptassem aos novos tempos e a novos espaços. Esta adaptação fez com que estes povos buscassem outros métodos de sobrevivência, costumes e tradições fora de seus padrões culturais.

    O processo de aculturação das comunidades indígenas tem sido objeto de preocupação da sociedade vigente. Para iniciar este estudo sobre a cultura indígena, procurou-se levantar os conceitos de alguns autores que abordaram o tema e coteja-los com a percepção dos atores na Educação Física em escolas indígenas.

    Com foco no processo de aculturação, Limberti (2009) observou como a cultura dos não índios interferiu na cultura dos índios, o que influenciou no seu modo de vida, separou grupos estáveis e destruiu a visão de mundo de grupos indígenas. O autor verificou em sua obra a construção do conceito da identidade que o índio Kayowá tem de si mesmo, mostrando como a união dessa tribo foi afetada por problemas econômicos e de classe social - que atingem também outros segmentos da sociedade.

    Ao que tudo indica as atividades físicas e esportivas também fazem parte desse processo. Embora Pinto e Grando (2009) argumentem que o Brasil pouco sabe sobre as necessidades dos indígenas no que diz respeito ao esporte e ao lazer, Fassheber (2010) observou que a prática do futebol entre os índios Kaingang é a prática recreativa mais comum na tribo. Assim os Kaingang são considerados aculturados não somente por jogarem o futebol, mas por usufruir de outros aspectos culturais que a sociedade urbana (outros povos) oferece.

    A fim de entender como ocorreu a mutação nas atividades e jogos indígenas, Jurema (2009) observou que da mesma forma da sociedade urbana, os indígenas também são reconhecidos pelos seus méritos.

    Com foco nos jogos tradicionais da tribo, os jogos não tradicionais e o lúdico indígena, Pereira (2006) observou como o Programa Segundo Tempo contribuiu na formação social do povo indígena, em específico as crianças. Seu trabalho explica que cada tribo desenvolveu experiências particulares conforme suas organizações sociais, econômicas, políticas e suas formas de ver e pensar sobre o mundo. Os dados coletados pelo autor sobre os significados culturais dos jogos, danças, lutas e brincadeiras, sustentam que os valores tradicionais foram progressivamente substituídos por valores e costumes da cultura urbana.

    As brincadeiras, as danças, os cantos e as lutas fazem parte dos rituais da cultura indígena (LIMA; GONÇALVES JÚNIOR; FRANCO NETO, 2007). Acredita-se que o resgate e valorização dos jogos indígenas, fortalecem a identidade cultural e o auto-respeito dos índios (PINTO; GRANDO, 2009).

    Atualmente os jogos dos povos indígenas foram transformados em políticas públicas socioculturais e esportivas com a finalidade de divulgar esses elementos da cultura indígena para a sociedade não indígena e para aproximar as etnias indígenas existentes em todo o Brasil. Diferente do esporte moderno, o grande objetivo dos participantes nos jogos não é vencer e sim comemorar. No início dos jogos, os pajés entram na arena para a realização de rituais característicos da cultura indígena, o que contribui para o resgate e o fortalecimento de suas tradições e costumes.

    Em perspectiva distinta da proposta de isolamento cultural, pode-se observar a percepção que as culturas evoluem a partir do contato com culturas diferentes, quando ocorre a transformação de ambas – característica do processo de civilização. Assim, pode-se argumentar que a influência do mundo civilizado na cultura indígena também pode ser benéfica para estes.

    Os efeitos do esporte enquanto fenômeno sócio-cultural da modernidade também podem ser percebidos nas comunidades indígenas. Se por um lado as inter-relações e interdependências entre o esporte e a cultura são percebidas positivamente - o esporte é visto internacionalmente como direito de todas as pessoas, e os benefícios que o esporte favorece não deve ser considerado em termos individuais, mas compreender a relação sócio – cultural e política da sociedade (TUBINO, 1992; TUBINO; SILVA, 2006) - por outro lado, a Lei Diretrizes e Bases da Educação Nacional – LDB 9.394/96, no seu artigo 78 enfatiza que é necessário proporcionar aos índios, suas comunidades e povos, a recuperação de suas memórias históricas, a reafirmação de suas identidades étnicas e a valorização de suas línguas e ciências.

    Dessa forma, é preciso considerar que a elaboração de projetos esportivos educacionais para essa população, deve ter como princípio a manutenção e a valorização da cultura e das tradições dos povos indígenas.

    Assim, investigar a Educação Física em escolas indígenas pode contribuir para aprofundar a compreensão dos procedimentos pedagógicos para a educação dos povos indígenas por meio da Educação física e esportes.

    Este estudo se propõe a identificar na percepção de seus atores como ocorrem as aulas de Educação Física em escolas indígenas, verificando os procedimentos e conteúdos trabalhados nas aulas com indígenas “jovens” em duas tribos no estado de Mato Grosso.

Metodologia

    Este trabalho se caracteriza como um estudo de caso realizado de forma exploratória. Os sujeitos investigados foram 3 jovens do sexo masculino e 3 do sexo feminino, dois caciques, os representantes da Fundação Nacional do Índio (FUNAI) e os professores de Educação Física em duas tribos indígenas no estado de Mato Grosso. Os entrevistados responderam a questionários semi-estruturados elaborados especialmente para esta investigação.

    A autorização para participação no estudo ocorreu conforme o Termo de Consentimento Livre e Esclarecido para maiores e o Termo de Consentimento Livre e Esclarecido para menores. Os resultados foram analisados a partir da interpretação e triangulação dos dados coletados dos indivíduos das tribos B e X, respeitando a capacidade de verbalização dos informantes (THIOLLENT, 1980; GOMES, 1994).

Resultados e análise de dados

A percepção dos alunos na Comunidade Indígena B

    Questionados sobre os jogos que mais gostavam nas aulas de Educação Física, os alunos indicaram o futebol e o vôlei. Conforme a opinião do entrevistado A3 além de fazer amizade, os jogos movimentam o corpo e possibilitam aprender sobre a cultura indígena e a cultura do branco (homem não indígena).

    O handebol era o jogo que os alunos menos gostavam. Os alunos informaram não gostar também do basquete, por acharem estes esportes violentos, embora não tenham apresentado justificativa.

    Os informantes manifestaram interesse em aprender jogos diferentes dos praticados nas aulas - futsal, basquete e natação.

    Os jogos nas aulas de Educação Física adquirem um caráter de fruição, pois quando não estão na escola todos os alunos trabalham em casa. Todos os alunos costumam jogar futebol quando não estão na escola e acham que a Educação Física ajuda a fortalecer o corpo e a mantê-lo em forma.

    A escola assumiu um papel importante na vida dos jovens, que manifestam um sentimento de perda quando não vão para as aulas:

    “Quando eu não estou na escola, eu fico meio arrependido.” SIC (Entrevistado A4)

    A escola fornece nas refeições tanto o alimento indígena como o alimento do branco (homem não indígena). Os alimentos que os alunos mais gostam de consumir são: peixe, beiju (farinha de mandioca), biscoito, suco, arroz com carne, arroz com frango, macarronada, pães e bolo. No dia a dia os alunos gostam de usar roupa de branco (homem não indígena).

    Em casa os alunos utilizam aparelhos eletrônicos como: rádio, TV, computador e celular, possibilitando-os assim assistirem TV todos os dias. Esta análise confirma o estudo de Fassheber (2010), no qual o autor considera os índios aculturados não somente por jogarem o futebol, mas por usufruírem de tudo aquilo que o branco (homem não indígena) oferece.

A percepção dos Professores na Comunidade Indígena B

    Na aldeia existiam dois professores sem formação específica para ministrar as aulas de Educação Física - um deles era formado em pedagogia, que ministrava aulas de História e Matemática e o outro professor também formado em Pedagogia, que ministrava aulas de Matemática e Ciências da Natureza.

    Para o entrevistado P2 a importância do trabalho dos professores na aldeia estava na aplicação dos jogos da cultura urbana para os jovens indígenas - o professor realizava algumas adaptações nos jogos. Para o entrevistado P1 a importância da Educação Física tinha outro foco:

    “Conscientizar, educando os alunos para saberem seus direitos e deveres.” (Entrevistado P1)

    O relato do entrevistado P2 confirma o estudo de Jurema (2009), no qual o autor observou como ocorreu a mutação do esporte do branco nas aldeias indígenas e como conseqüência, os jogos indígenas foram abandonados. Por outro lado, Pinto e Grando (2009), compreendem que o esporte pode ajudar a acabar com o preconceito e a discriminação, valorizando o direito e a realidade dos indígenas. Mas pode-se analisar que o resultado desse processo é que os próprios indígenas podem deixar de valorizar os jogos indígenas e a sua identidade cultural.

    As atividades aplicadas pelos professores que ministravam atividades de Educação Física em suas aulas eram:

  • Esportes tradicionais: futebol, vôlei e handebol.

  • Esportes indígenas: arco e flecha, força de cordão, corrida com a tora do buriti, arremesso de lança, iawsaire (danças corporais), toin (futebol com o joelho) e uka-uka (lutas indígenas).

    Na percepção dos professores, o futebol era o jogo que os alunos mais gostavam de participar, o que caracteriza a hegemonia do futebol inclusive entre os indígenas.

    As aulas de Educação Física na escola ocorriam em dois dias, sendo quarta-feira Educação Física para os meninos e na sexta-feira Educação Física para as meninas. Sem explicar a separação por gênero, os professores informaram que os principais aspectos ensinados eram a convivência humana e a terem disciplina na aldeia.

    A atitude dos professores ao se relacionar com os alunos é de muita cobrança e rigidez, os professores passam trabalhos e aplicam provas para os seus alunos.

    Na opinião do entrevistado P1 o cacique deve participar na escola para ter um acompanhamento dos alunos, pois o cacique é a maior autoridade na aldeia e a sua principal atuação estava na divulgação da cultura indígena por meio de palestras sobre a cultura e a história da aldeia.

A visão do Cacique na Comunidade Indígena B

    Líder na aldeia há dezenove anos e representante da Fundação Nacional do Índio (FUNAI) há 6 anos, o cacique participava de tudo que acontecia na aldeia, incluindo as comemorações existentes como: o batizado do milho, dia do índio, dança das mulheres e a dança das máscaras.

    Segundo o cacique a sua participação na escola seria:

    “Verificar o que está acontecendo na escola, se os professores estão dando aula bem, se tem material suficiente para todos os alunos. Faço palestras sobre o alcoolismo e sobre a cultura indígena, as palestras acontecem toda semana.” SIC (Cacique B).

    O cacique destacou a importância das atividades corporais na escola:

    “É importante fazer as atividades na escola. Eles valorizam os jogos indígenas e eu falo para eles participar, para não esquecerem sua cultura.” SIC (Cacique B)

    Na opinião do cacique a escola é boa, porque os alunos devem aprender o ensino da cultura indígena e da cultura do branco (homem não indígena) por intermédio do professor branco e do homem indígena, comparando assim as duas culturas.

    “Fortalecer a cultura indígena, porque se não fortalecer acaba o indígena.” (Cacique)

    Ao que tudo indica, existe uma preocupação com a manutenção dos limites entre as diferentes culturas.

    “A roupa que o jovem indígena usa na aldeia não deve ser a mesma usada na escola, pois além dos índios fazerem o uniforme para o uso na escola, a escola é do branco e o uniforme se torna padrão dentro das normas da escola do branco.” (Cacique B)

    As mães indígenas trabalhavam na escola como merendeiras. Para a aquisição de alimentos para o uso na escola o governo estadual enviava verba para a aldeia. Para o cacique os alimentos que a escola deve oferecer para os jovens indígenas são: farinha, peixe, mandioca e carne de animais silvestres, pois esses alimentos não contêm “química” e conservantes, por serem naturais, encontrados na natureza.

    Segundo o cacique os indígenas também se utilizam de aparelhos eletrônicos e eletrodomésticos como já foi observado no relato dos alunos e dos professores, tais como: aparelho celular, TV, geladeira, fogão, ventilador, freezer, lâmpada, rádio e computador. Segundo o entrevistado é interessante que os jovens indígenas tenham o contato com os aparelhos:

    “No outro mundo tem índio nos USA e na Austrália e vai passar por aqui. Quando os índios saem e voltam para a aldeia, eles voltam com idéias novas e acabam usufruindo dessas idéias.” SIC (Cacique B)

    O relato do cacique apresenta uma percepção diferente do que Limberti (2009) analisou em seu estudo, no qual a cultura dos brancos (homem não indígena) interferiu na cultura dos índios, destruindo assim a visão de mundo dos grupos indígenas. Ao que tudo indica os indígenas têm uma visão utilitária dos conhecimentos e da educação não indígena.

    A permissão do cacique para os indígenas irem até a cidade revela o poder aquisitivo dos indígenas: os indígenas da aldeia que tem carro próprio vão para a cidade quando querem. Aqueles que não têm carro vão de carona em carros que são fretados pelos próprios índios.

    Havia na aldeia um Posto de Saúde, que na avaliação do cacique

    “Não é bom, pois existem somente enfermeiros, não há médicos no Posto de Saúde, mas há medicamentos suficientes para o uso das aldeias”. (Cacique B)

    Em relação ao transporte (ambulância), se acaso alguém estivesse com ferimentos graves, não havia transporte para deslocar essa pessoa até a cidade se o médico não estivesse presente.

A percepção dos Alunos na Comunidade Indígena X

    Os alunos informaram que os jogos que mais gostavam nas aulas de Educação Física eram o futebol de gêmeos, corrida no campo e vôlei. Corrida ao redor do campo e alongamento eram as atividades que os alunos menos gostavam. Segundo os entrevistados as atividades mais aplicadas pelos professores de Educação Física em suas aulas eram futebol, polichinelo e carrinho de mão. Assim como na tribo B pode-se perceber que a cultura dos brancos (homem não indígena) interferiu na preferência do jovem indígena. Das atividades ministradas, o futebol e o futebol de gêmeos eram os jogos em que os alunos mais gostavam de participar.

    Alguns alunos revelaram que gostariam de praticar atividades diferentes como natação no rio, corrida do buriti - aproximadamente 25 km distante da aldeia, corrida do buriti sozinho e corrida com uma criança nas costas. Os mesmos não eram estimulados a nadar no rio por motivos de segurança - os rios contêm o jau (peixe grande) e a sucuri (cobra grande), ambos matam o homem para se alimentar.

    Quando não estavam na escola os alunos jogavam dominó e o jogo de xadrez – jogos não indígenas e trabalhavam em casa para ajudar a família.

    Os entrevistados achavam a Educação Física importante para aprenderem e passarem a conhecer várias atividades que pudessem ser repassadas futuramente para outros alunos.

    Também pode ser observada uma perspectiva de preparação para as competições indígenas na fala do entrevistado A1:

    “Porque por meio da Educação Física o nosso próprio corpo físico, começa a se preparar para vencermos competições que vamos participar.” SIC (Entrevistado A1)

    Diferente da tribo B todos usavam uniformes nas aulas de Educação Física o mesmo uniforme usado em sala de aula, embora a participação nos jogos era descalços. No dia a dia os alunos usavam roupa do homem urbano.

    Em casa os alunos tinham TV e celular, o que os estimulava a assistirem TV todos os dias e consumirem os mesmos alimentos do homem não indígena – arroz com feijão, verduras, leite com café, canjica com leite e pasteis.

A visão do Professor na Comunidade Indígena X

    Na aldeia X existia um professor formado em Educação Física que manifestava a sua percepção da importância do trabalho do professor na aldeia:

    “Sempre ajudando a comunidade, transmitindo meu conhecimento principalmente aos alunos na sala, para que todos possam me conhecer e se torne um dia futuro educador.” SIC (Professor)

    Na opinião do professor o cacique deve participar na escola:

    “O cacique é autoridade máxima dentro de sua comunidade, geralmente é muito conhecido pelos brancos (homem não indígena). Dentro da escola na aldeia, quem ordena tudo são os professores que conhecem a educação.” SIC (Professor)

A visão do Cacique na Comunidade Indígena X

    O cacique da Comunidade Indígena X já contava sete anos de liderança na aldeia. O cacique participava dos eventos na aldeia, incluindo as comemorações existentes como: Bakururu (pinturas corporais).

    Para o cacique X a pratica de atividades físicas e dos jogos indígenas na escola era importante para que os jovens aprendessem a jogar “os jogos indígenas e do branco”. Para o entrevistado o jovem indígena deve freqüentar a escola para aprender sobre a história e o ensino da tribo X.

    Na opinião do cacique a escola é boa, porque a escola é rigorosa e tem materiais suficientes para o ensino, no entanto o processo de aculturação se manifesta na fala do entrevistado sobre as vestimentas.

    “A roupa que o jovem indígena usa na aldeia deve ser a mesma usada na escola, pois a cultura X é assim, usando roupa de branco (homem não indígena), por isto os alunos devem usar no esporte também” (Cacique X).

    Segundo o cacique os indígenas não utilizavam aparelhos eletrônicos e eletrodomésticos, pois na maioria das aldeias ainda não havia energia elétrica. Somente em algumas aldeias da comunidade indígena X havia eletricidade, como na aldeia onde moram os alunos entrevistados. Para o cacique não é interessante que os jovens indígenas tenham o contato com os aparelhos eletrônicos do branco (homem não indígena).

A visão do Representante da Fundação Nacional do Índio (FUNAI) na Comunidade Indígena X

    Para o representante da FUNAI a pratica de atividades físicas e dos jogos indígenas na escola eram importantes por fazerem parte da educação.

    Diferente da visão do Cacique, para ele o contato dos jovens indígenas com os aparelhos eletrônicos era interessante para que os mesmos aprendessem a utilizar.

    A sua avaliação do Posto de Saúde não foi boa. Embora existissem medicamentos suficientes e um grupo multidisciplinar de enfermeiros e uma dentista, a presença do médico na aldeia central ocorria de 15 em 15 dias.

Conclusões e recomendações

    Por meio das informações levantadas, pode-se perceber que tanto os alunos indígenas da tribo B como os jovens indígenas da tribo X, preferiam praticar nas aulas de Educação Física os esportes tradicionais urbanos com pouco interesse pelos esportes indígenas, o que revela o abandono progressivo de suas culturas. Os alunos indígenas não só usufruíam dos esportes do branco (homem não indígena) como também, das vestimentas, dos aparelhos eletrônicos e eletrodomésticos e da alimentação.

    Verificou-se a carência de professores com formação em Educação Física – o que não garante a preservação da cultura indígena. Ao contrário do professor de Educação Física, os professores investigados, formados em Pedagogia, ministravam nas aulas tanto os esportes indígenas como os esportes convencionais. Ao que parece, mais do que a formação específica na área é necessário que o profissional qualificado tenha consciência do seu papel social junto a estes grupos.

    Os estudos sustentam que através dos jogos indígenas há preservação da identidade cultural. A prática dos jogos indígenas pode contribuir para fortalecer a identidade cultural dos índios, no entanto, os jovens entrevistados manifestaram maior interesse em jogos da cultura não indígena.

    Fica então evidenciada a importância dos caciques e dos professores de ambas as tribos, atuando juntamente com a Fundação Nacional do Índio (FUNAI), para demonstrar a importância da identidade cultural de cada tribo e como os indígenas podem aproveitar o melhor de sua própria cultura e da cultura alheia sem perder as suas raízes.

    Recomenda-se o aprofundamento de estudos sobre o tema investigado, de forma a estabelecer estratégias e procedimentos que possam contribuir para o fortalecimento da identidade cultural indígena nas aulas de Educação Física destinadas a estes grupos culturais.

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